10 Board Games Modernos Mais Influentes

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Catan - Caixa

 

 

Esse artigo 10 Board Games Modernos Mais Influentes, abordando os jogos modernos, é o irmão gêmeo do artigo anterior (10 Board Games Clássicos Mais Influentes). Portanto, aqui serão tratados os jogos de tabuleiro modernos, ou seja, lançados a partir do Catan, em 1995.

 

Desse modo é fundamental fazer um esclarecimento, muito pertinente, até para evitar eventuais discussões fora do escopo do artigo, nos comentários. O texto anterior trava dos jogos clássicos, que a maioria da comunidade boardgamer já não jogo tanto, com exceção talvez do Magic: The Gathering. Quem joga 18xx provavelmente joga versões mais modernas, e quem joga wargames clássicos e Warhammer tende a jogar apenas isso. Do mesmo modo, excluindo um grupo pequeno de pessoas que jogam os dois, normalmente quem joga o RPG tradicional, nem sempre joga board games também.

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No caso dos board games modernos a conversa é outra, porque atualmente eles são o tipo de jogo mais jogado. Nesse caso, é muito comum confundir gosto pessoal com influência, o que é natural, porque quando se gosta de um jogo ele se torna importante. Entretanto, nessa hipótese, o referido jogo é importante apenas e principalmente para aquela pessoa e para os demais que também gostam desse jogo. Um jogo influente é outra história, porque ele impacta profundamente no hobby, de modo geral e para todos, independentemente de se gostar dele ou não. Com isso, alguém pode até não gostar de jogos como Catan ou Zombicide, por diversas razões, mas não dá para desconsiderar a sua grande influência.

 

Esse esclarecimento é fundamental, porque certamente ficaram de fora diversos jogos que são campeões de preferência das pessoas (Como assim não aparece o Selene?!?!). Só que conforme foi muito bem explicado essa não é uma lista de jogos mais populares, mas sim os mais importantes e mais influentes.

 

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Imagem BGG: Brass Birmingham e Gloomhaven

 

Então não basta ser um jogo excelente, também é preciso que tenha sido realmente relevante, pelo menos no nível dos demais jogos. Desse jeito, apenas para exemplificar, o Brass: Birmingham e o Gloomhaven são jogos fenomenais, os dois TOP1 do BGG, e com uma legião de fãs. No mesmo ranking BGG, salvo engano, a quarta colocação foi a posição mais alta alcançada por Android Netrunner e Twilight Imperium IV. Porém esses dois últimos foram mais influentes para o hobby, que os dois primeiros, e por isso eles estão na lista e os outros não. As razões por trás disso serão explicadas na seção específica de cada um dos jogos.

 

Antes de tratar dos jogos modernos mais influentes vale fazer um breve comentário sobre como eles se diferenciam dos jogos clássicos do texto anterior. As opiniões variam, mas de modo geral o que diferencia os board games modernos dos board games clássico reside principalmente em três fatores.

 

O primeiro desses fatores diz respeito ao fato dos board games modernos, prestigiarem mais a estratégia e o planejamento de longo prazo, que outros elementos. A aleatoriedade através do rolamento de dados e da mecânica role-e-mova é uma marca registrada dos board games clássicos. Por outro lado, os board games modernos, tentam ao máximo atenuar a importância do fator sorte, especialmente quando isso influência muito o resultado das partidas.

 

O segundo fator é a exclusão da possibilidade de eliminação de jogadores, especialmente no começo da partida. Os jogos modernos só laçam mão desse elemento nos jogos de curtíssima duração, em especial os party games. No sentido oposto, nos board games clássicos a eliminação de jogadores era bastante comum.

 

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Imagem BGG: Love Letter

 

Isso acarretava uma grave falha de design, especialmente nos jogos longos. Quando a eliminação de um dos jogadores ocorria, especialmente no começo, ele ainda teria de esperar às vezes horas para jogar novamente. Isso só se verifica em jogos modernos, quando uma partida é tão rápida que o jogador eliminado não precisa esperar quase nada para voltar a jogar. Um exemplo disso é o Love Letter.

 

O terceiro fator é a quantidade de ações disponíveis ao jogador, o que aumenta consideravelmente os caminhos possíveis para ganhar a partida. Isso impacta diretamente na profundidade estratégica, além de tornar o jogo menos repetitivo, porque sempre há muita coisa diferente para fazer. Nos jogos clássicos, cada jogador fazia praticamente duas ações no máximo, uma das quais normalmente era rolar o dado e se mover pelo tabuleiro.

 

Não bastassem todos esses fatores, outra questão importante é que o foco dos jogos modernos não são apenas as famílias, crianças e adolescentes. Eles também atendem a um público adulto, que compõe a maioria da comunidade boardgamer, ávida por jogos médios e pesados. Com isso, os jogos de tabuleiro deixaram de ser “coisa de criança”, e passaram a ser coisa de adulto também. Para atender a esse público mais exigente, os jogos modernos precisaram aumentar a qualidade dos componentes, mas principalmente se sofisticarem em termos de design, arte gráfica, mecânicas e regras.

 

Os board games listados a seguir foram fundamentais para essa mudança de paradigma, seja no formato de produção e comercialização, na criação de novas mecânicas e introdução de novos elementos. Desse modo, os 10 jogos modernos mais influentes são os seguintes:

 

 

 

01 – CATAN (1995)

 

Catan é um jogo de 1995, criado por Klaus Teuber, com arte de diversos artistas entre os quais Volkan Baga, Tanja Donner, Pete Fenlon e muitos outros. O jogo tem diversas mecânicas, mas as que predominam e que o fizeram tão relevante e influente são a Gestão de Recursos e a Negociação. Esse jogo recebeu a mais importante premiação do universo dos board games, o Spiel des Jahres, em 1995.

 

Não há a menor dúvida de que Catan está entre os mais influentes jogos de tabuleiro de todos os tempos. Com todo o merecimento, o ano de seu lançamento marca o início da Era dos Jogos de Tabuleiro Modernos. Porém, é importante frisar que o Catan não era o único board game moderno, ou, melhor dizendo, com características modernas. Jogos com esse perfil já existiam pelo menos desde os anos 50, como é o caso do Diplomacia de 1959. Mas tais jogos além de muito poucos e esparsos eram a exceção e não a regra.

 

Na década de 1990 houve um amadurecimento do conceito e os jogos deixaram e ter apenas características modernas para se tornarem efetivamente board games modernos.

 

Portanto, no que pese ter começado com o lançamento do Catan, a Era dos Board Games Modernos foi o resultado de todo um processo e não de uma ruptura abrupta. Não aconteceu como se não houvesse nenhum jogo, mesmo que remotamente moderno, e que num passe de mágica o Catan tivesse criado todo um novo conceito de jogos de tabuleiro.

 

Na mesma época do Catan já existiam jogos modernos de grandes designers como, por exemplo, Gardens of Alhambra (1992) de Dirk Henn, Modern Art (1992) e Medici (1995) de Reiner Knizia, Manhattan (1994) de Andreas Seyfarth e o El Grande (1995) de Wolfgang Krammer.

 

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Imagem BGG: Catan

 

 

Qualquer dos excelentes jogos de tabuleiro, citados acima, poderia, tranquilamente, ter iniciado a Era dos Board Games Modernos, no lugar do Catan. Mas existe uma diferença, que faz toda diferença, e ressalta toda a genialidade do Catan, que faz dele “o Catan”. No Catan, mesmo sendo um jogo competitivo, a negociação e a interação entre os jogadores é fundamental. Desse modo, mesmo competindo, os jogadores acabam cooperando entre si, em certa medida, o que representou uma quebra de paradigma em termos de board games.

 

Aliado a isso havia também a questão da vitória estar relacionada não ao confronte direto mais sim à melhor gestão de recursos, o que era outra inovação. Esse dois fatores (entre outros, mas principalmente esses dois fatores) transformaram o Catan em um enorme sucesso de vendas e de crítica, conquistando corações e mentes, especialmente do público norte-americano. O sucesso não dependia mais da vitória em combate e de um exército mais forte, mas sim negociar melhor e gerenciar melhor seus próprios recursos.

 

Nenhum outro jogo, mesmo outras obras-primas que vieram logo depois, tais como, Tigris & Euphrates, Carcassonne e Puerto Rico, apesar de todo o seu estrondoso sucesso, não conseguiu repetir o mesmo feito do Catan. Isso além do fato, de evidentemente o Catan ter aberto as portas para tais jogos.

 

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Imagem BGG: Carcassonne, El Grande, Tigris & Euphrates,  e Puerto Rico

 

A indústria dos jogos que já dava sinais de buscar um caminho alternativo ao tradicional esquema “exército X contra exército Y”, acabou dando uma guinada de vez, após o enorme sucesso do Catan. De 1995 em diante, todos queriam mais e mais jogos “german style”, posteriormente chamados de “euro games”, tanto nos EUA, quanto na própria Europa.

 

Além disso, quase 30 anos após seu lançamento o Catan ainda se mantém um jogo muito relevante, mesmo disputando mercado com jogos muito mais novos. O Catan ainda possui um impressionante volume anual de produção e vendas. Isso sem falar que frequentemente surge material novo, novas edições, expansões e edições temáticas, para atender a uma verdadeira legião de fãs no mundo todo. O jogo tem um lugar de destaque nas maiores feiras e convenções de board games ao redor do globo e um prestigiadíssimo campeonato mundial.

 

Por tudo isso, não há a menor dúvida de que o Catan está merecidamente entre os jogos de tabuleiro modernos mais influentes de todos os tempos.

 

 

 

02 – EL GRANDE (1995)

 

El Grande é um jogo de 1995, criado por Wolfgang Kramer e Richard Ulrich, com arte de Doris Matthaus. Esse é outro jogo que explora várias mecânicas, dentre as quais Gestão de Mão, Seleção de Cartas, Movimento de Área, Seleção de Ações e Leilão. Mas, sem dúvida alguma, Influência de Área é a mecânica que brilha, e ele ainda é sua principal referência, mesmo 30 anos após seu lançamento.

 

Uma curiosidade é que o lançamento de El Grande ocorreu na mesma época que o Catan, ou seja, 1995. Assim, é perfeitamente possível especular que o El Grande talvez pudesse ter substituído o Catan, como jogo que iniciou a Era dos Board Games Modernos. Porém conforme dito acima, algumas características do Catan (a Gestão de Recursos, a Negociação e a simplicidade) foram fundamentais para transformá-lo naquilo que ele é.

 

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Imagem BGG: El Grande

 

Entretanto, se o Catan foi fundamental para divulgar um novo tipo de jogo, o El Grande demonstrou que esses jogos podiam ter muita profundidade estratégica. Assim, os novos “jogos europeus” (euro games), mais tarde convertidos, em parte dos jogos modernos, atendiam a ambos os gostos: jogadores casuais e hardcores.

 

O El Grande ganhou o Spiel des Jahres de 1996, e teve um enorme sucesso comercial e de crítica. Isso foi fundamental para demonstrar que havia espaço no hobby dos board games, também para os jogos mais pesados e mais complexos. Posteriormente, jogos como Tigris & Euphrates (1997) e Puerto Rico (2002) reforçaram ainda mais essa vertente mais estratégica e voltada para um público mais adulto. Seria impossível pensar em jogos tão característicos do hobby como Scythe, Guerra do Anel, Spirit Island, e Twilight Struggle, sem a mecânica Influência de Área. Mas não se pode esquecer que isso começou com o El Grande, e daí a sua importância e influência.

 

 

 

03 – CARCASSONNE (2000)

 

Carcassonne é um jogo de 2000, criado por Klaus-Jurgen Wrede, com arte de Marcel Grober, Doris Matthaus, Anna Patzke e Chris Quilliams. As principais mecânicas são Alocação de Peças e Influência de Área.

 

Algumas pessoas defendem que o Carcassonne também envolve Alocação de Trabalhadores e Tabuleiro Modular, mas isso é amplamente discutível. No caso do Tabuleiro Modular, o Carcassonne também não se encaixa propriamente no conceito mais aceito dessa mecânica. Isso porque Tabuleiro Modular é mais relacionado com jogos em que o desde o início, todo o tabuleiro está aberto, mas com diferentes configurações. Isso é o que corre em jogos como Zombicide, Projeto Gaia, Gloomhaven e Twilight Imperium IV. Nesse aspecto, o Carcassonne se encaixa mais na mecânica “Map Adition”, em que os jogadores constroem o tabuleiro, adicionando novas peças, conforme vão jogando. Exemplos de jogos com essa mecânica são Mansions of Madness, Tikal, Clank e Tainted Grail.

 

Evidentemente o Carcassonne possui peças (meeples), que são alocados no tabuleiro, mas a noção de Alocação de Trabalhadores vai um pouco mais além. Essa mecânica pressupõe que se aloque uma dessas peças em algum local do tabuleiro para exerce uma ação, ou seja, trabalhar, e daí o seu nome. No Carcassonne a alocação das peças ocorre apenas para ganhar pontos diretamente, sem implicar em nenhuma ação exercida, ou recurso coletado. Além disso, uma vez alocado o tile, só o próprio jogador pode colocar uma de suas peças lá e no momento da alocação. Isso também contraria o entendimento da Alocação de Trabalhadores, que normalmente envolve vários locais do tabuleiro, disponíveis a todos os jogadores ao longo da partida.

 

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Imagem BGG: Carcassonne

 

Assim, independente de envolver ou não Alocação de Trabalhadores, o Carcassonne foi fundamental para essa mecânica, com se verá a seguir. Uma das maiores dificuldades em termos de board games é surgir com algum elemento novo. E é ainda mais difícil criar um elemento novo que influencie os outros board games, sendo largamente adotado por eles. Nesse aspecto, o Carcassonne é o jogo que introduziu nada mais nada menos, que o meeple, ou seja, a peça em formato de homenzinho, que se tornou praticamente um sinônimo de board game moderno. Não sem razão, o meeple é o símbolo do Spiel des Jahres, o maior e mais importante prêmio do universo dos board games. Essa inovação por si só, sem considerar seus demais méritos, já lhe atribui enorme importância, colocando o Carcassonne entre os maiores board games já criados.

 

Vale lembrar que a mecânica Alocação de trabalhadores já existia antes do Carcassonne, e até mesmo antes dos jogos modernos, segundo alguns entendimentos. Certamente não como a forma como a Alocação de Trabalhadores funciona hoje em dia, mas pelo menos em uma versão mais primitiva. Existe muita discussão sobre qual jogo foi o pioneiro que criou a mecânica Alocação de Trabalhadores, especialmente no fórum do BGG. Há quem defenda que até mesmo o Xadrez envolveria uma forma de Alocação de Trabalhadores. Durante alguns anos o jogo mais antigo listado com essa mecânica no BGG foi o Valley of the Mammoths de 1991. Todavia, atualmente se entende que o funcionamento do jogo não inclui propriamente essa mecânica. Dito isso, alguns outros jogos disputam o pioneirismo em termos de Alocação de Trabalhadores.

 

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Imagem BGG: Carcassonne (tabuleiro)

 

O jogo mais aceito como sendo o primeiro com Alocação de Trabalhadores é sem dúvida o Keydom (1998) do designer Richard Bresse. Mas muitas pessoas alegam que esse não é propriamente um jogo de Alocação de Trabalhadores, tal qual o Valey of the Mammots. No lugar do Keydom, o jogo pioneiro em Alocação de Trabalhadores seria o Bus (1999), de Jeroen Doumen e Joris Wiersinga. No mesmo sentido o jogo Way Out West (2000), do renomado designer Martin Wallace também é comumente citado como o primeiro jogo com Alocação de Trabalhadores.

 

Independente de qualquer seria o jogo pioneiro em Alocação de Trabalhadores, todos esses board games têm algo em comum. Todos utilizavam cubos ou marcadores genéricos como trabalhadores. O Carcassonne foi o primeiro jogo a cristalizar o conceito de meeple como um pequeno homenzinho de madeira. Considerando o antropomorfismo dessa peça, ficou muito mais fácil e claro entender a mecânica Alocação de Trabalhadores, porque a peça alocada realmente parecia um “trabalhador”. Por uma questão de honestidade intelectual, é preciso destacar que existem outras considerações importantes sobre esse respeito. Mas estas questões fogem ao escopo desse texto, merecendo um artigo específico.

 

O conceito de meeple fez um sucesso enorme e foi fundamental para a disseminação e divulgação da mecânica Alocação de Trabalhadores, que já há alguns anos é a principal mecânica utilizada nos board games modernos. Não dá nem para começar a calcular a quantidade de jogos que utilizam meeples atualmente, o que demonstra uma influência mesmo que suave do Carcassonne.

 

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Imagem BGG: Carcassonne Plus (Big Box com expansões)

 

Desconsiderando a questão da importância da introdução do meeple, o Carcassonne tem também uma dualidade que explica muito do seu incrível sucesso. As regras são simples, fáceis de ensinar e basicamente o que se faz no jogo é sortear um “tile” (peça quadrada de terreno), colocar no mapa já existente e em cima dela colocar um dos meeples.

 

Entretanto, essa aparente simplicidade encerra uma profundidade estratégica que nem sempre aparece à primeira vista. Portanto, é possível jogar o Carcassonne de forma descontraída, o que é muito importante para atrair novos jogadores para o hobby, como de forma mais estratégica, contando os tiles, o que atende os jogadores mais experientes.

 

O Carcassonne foi (e ainda é) um verdadeiro fenômeno e um dos board games modernos mais bem sucedidos em toda a indústria dos jogos. Ele certamente é aquele que melhor “envelheceu” entre os jogos do início da Era dos Jogos de Tabuleiro Modernos. É possível encontrar jogadores mais antigos que revelam terem enjoado um pouco de Catan, Tigris & Euphrates, El Grande e Puerto Rico. Porém dificilmente se encontra alguém que tenha enjoado de Carcassonne.

 

Para se ter uma ideia, esse é um dos poucos board games modernos com produção ininterrupta em todos os anos, desde seu lançamento. Não houve um ano sequer, nesse quase quarto de século, sem uma nova tiragem do Carcassonne, o que comprova seu enorme sucesso de público. Quanto ao sucesso de crítica, o Carcassonne, além do Spiel des Jahres de 2001, também venceu diversos outros prêmios importantes do setor de board games. Por tudo que foi dito acima, o Carcassonne é, indiscutivelmente, um dos board games modernos mais importantes e influentes.

 

 

 

04 – PUERTO RICO (2002)

 

Puerto Rico é um jogo de 2002, criado por Andreas Seyfarth, com arte de Franz Vohwinkel e Harald Lieske. Entre as principais mecânicas se destacam Seleção de Ações, Ordem de Fases Variável e Pontos de Vitória Ocultos, entre outras.

 

A grande importância do Puerto Rico reside no fato dele ser um jogo euro que mostrou ao mundo o quão interessante esse tipo de jogo pode ser. O Catan também é um jogo euro, mas o Puerto Rico é mais complexo e mais estratégico. Desse modo, de forma muito canhestra é possível afirmar que o Catan era um jogo para família e o Puerto Rico era um jogo para os adultos.

 

No caso do Brasil, a importância do Puerto Rico é ainda maior, porque ele foi um dos primeiros jogos modernos mais complexos lançados aqui.

 

Além disso, não se pode ignorar que o Puerto Rico é um dos jogos que alcançou o primeiro lugar do ranking do BGG. Apenas oito jogos conseguiram isso em mais de 20 anos de BGG, sem contar eventuais bugs e brincadeiras de 1º de abril. Isso demonstra o tamanho dessa façanha, difícil mesmo para outros jogos fenomenais. Os jogos no lugar mais alto do pódio BGG, fora o Puerto Rico são: Paths of Glory (agosto/2001 a Fevereiro/2002 – 8 meses), Tigris & Euphrates (Fevereiro/2002 a Dezembro/2002 – 11 meses), Agricola (Agosto/2008 a Fevereiro/2010 – 1 ano e 7 meses), Twilight Struggle (Janeiro/2011 a Dezembro/2015 – 5 anos), Pandemic Legacy Season 1 (Janeiro/2016 a Dezembro/2017 – 2 anos), Gloomhaven (Janeiro/2018 a Fevereiro/2023 – 5 anos e 2 meses), e Brass Birmingham (Fevereiro/2023 em diante).

 

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Imagem BGG: Puerto Rico

 

Só para dar uma ideia do quanto isso é difícil, Caylus, Power Grid, Through the Ages e Terra Mystica, só chegaram ao TOP2. Já Catan, Caverna, Terraforming Mars e só chegaram ao TOP3, El Grande ao TOP4, e Twilight Imperium IV ao TOP5. Só para esclarecer, é possível que essa informação esteja um pouco desatualizada, porque a fonte no BGG é 2017, mas nenhum desses chegou ao TOP1.

 

Mas o Puerto Rico não foi apenas mais um board game nº 1 do ranking do BGG. Ele permaneceu nessa cobiçada posição de Dezembro/2002 a Agosto/2008 e de Março/2010 a Dezembro/2010, quase 7 anos no total. Isso é quase 2 anos a mais que o Gloomhaven, o segundo colocado em termos de permanência no TOP1 do ranking BGG. Além disso, 20 anos após seu lançamento, admiravelmente o Puerto Rico ainda disputava o TOP1, de igual para igual, com jogos muito mais recentes. É muito pouco provável que isso se repita com algum outro jogo.

 

Outra prova da enorme importância e influência do Puerto Rico, tem a ver com representatividade e como populações “não europeias” eram retratadas nos jogos. No Puerto Rico, os jogadores representam fazendeiros ricos, que colonizam a ilha de Puerto Rico através de mão-de-obra escrava, uma situação obviamente polêmica.

 

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Imagem BGG: Puerto Rico 1897

 

Outros jogos também envolvem a exploração de populações nativas como Endeavor, Mombasa e Five Tribes, mas nenhum deles suscitou tantas discussões quanto o Puerto Rico. De um lado havia quem condenasse o revisionismo histórico e que aquilo era apenas um jogo. Do outro lado, havia quem defendesse que isso perpetuava e reforçava um estereótipo negativo da população negra, além de ser ofensivo para muita gente. Para resolver o impasse, surgiu o Puerto Rico 1897, ano da abolição da escravidão na ilha, de modo que os trabalhadores do jogo são assalariados. Só depois dessa discussão se iniciar com o Puerto Rico, é que ela se estendeu para os demais jogos, que também envolviam exploração escrava. Isso demonstra que aquilo que afeta o Puerto Rico acaba refletindo em outros jogos, dada a sua grande importância e influência.

 

 

 

05 – CAYLUS (2005)

 

Caylus é um jogo de 2005, criado por William Attia, com arte de Cyril Demaegd, Arnaud Demaegd e Mike Doyle. As principais mecânicas são Alocação de Trabalhadores, Ordem de Turno: Ação de Reinvindicação, Preparação Variável.

 

Conforme dito acima, não é possível indicar com precisão, qual teria sido o primeiro jogo de Alocação de Trabalhadores. Porém, não há nem mesmo possibilidade de dúvida a respeito de qual jogo tornou essa mecânica conhecida do grande público. Esse jogo é o Caylus, que foi fundamental para divulgar, popularizar e tornar a Alocação de Trabalhadores o que ela é hoje.

 

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Imagem BGG: Caylus

 

A Alocação de Trabalhadores é desde alguns anos a mecânica mais popular, e provavelmente a mais utilizada, nos board games modernos. Ela também é muito importante por ser fácil de entender e principalmente fácil de utilizar. Basta por um meeple em determinada área do tabuleiro e realizar a ação ou coletar o recurso.

 

Essa mecânica é muito característica dos board games modernos. Assim, sendo o Caylus o seu primeiro e um dos principais divulgadores dessa mecânica, não há como negar a grande influência e impacto do jogo.

 

Infelizmente a arte sofrível, que fez dele um jogo muito feio, prejudicou seu desempenho em vendas. Não fosse isso, o Caylus poderia chegar muito mais longe do que chegou, em termos de board game. Em 2019 saiu uma nova versão do jogo (Caylus 1303), com a arte renovada. Essa arte da nova versão é muito mais bonita e elegante, até porque mais feia não dava para ficar.

 

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Imagem BGG: Caylus 1303

 

Infelizmente, houve muitas atualizações nas regras para tornarem o jogo, mais amigável e menos apertado. Essas alterações desagradaram os antigos fãs dos jogos, além de não atrair novos jogadores. E essa espécie de rejeição é muito natural, porque em 2005 ainda não haviam tantos jogos de Alocação de Trabalhadores. Mas em 2019 essa mecânica já foi explorada exaustivamente e de forma muito melhor que no Caylus ou na nova versão Caylus 1303.

 

Independente de não ser mais tão popular e tão importante quanto foi na época do lançamento, não se pode ignorar a grande influência, no mínimo histórica do Caylus. Sem ele talvez a Alocação de Trabalhadores não tivesse alcançado o grau de importância e popularidade que ela alcançou. Com isso, muito provavelmente o hobby dos board games modernos seria muito diferente, hoje em dia.

 

 

 

06 – DOMINION (2008)

 

Dominion é um jogo originalmente de 2008, com uma segunda edição lançada em 2016. O design é de Donald X. Vaccarino, e a arte de diversos artistas entre os quais Matthias Catrein, Julien Delval, Tomasz Jedruszek, entre outros. Entre as principais mecânicas o destaque vai para Construção de Baralho, Seleção Aberta de Cartas, Toma Essa!, Gestão de Mão, entre outras.

 

Nesse jogo de cartas, os jogadores procuram montar os baralhos mais poderosos que conseguirem, a partir e uma reserva comum. O jogo ocorre em turnos de três fases (Ação, Compra e Limpeza), em que os jogadores se atacam e disputam as cartas de pontos de vitória. Para comprar cartas mais são necessárias Cartas de Tesouro, e as cartas de Reino garantem novas habilidades. Quando uma das pilhas de cartas (pontos de vitória ou recursos) a partida termina, e vence aquele que acumular mais pontos de vitória.

 

Esse outro jogo muito importante pela criação de algo novo, em um meio tão explorado quanto a indústria de jogos. O Dominion foi o jogo no qual seu designer, Donald X. Vaccarino criou a mecânica de Construção de Baralho. Isso foi tão genial que atualmente diversos jogos importantes utilizam essa mecânica, tais como Gloomhaven, Great Western Trails, Mage Knight, Jornadas na Terra Média, etc.

 

Atualmente existem outras opções melhores e mais sofisticadas, de jogos de Construção de Baralho. Isso é natural porque as mecânicas e os jogos vão evoluindo. Mas não se pode esquecer, que pelo menos no que tange à Construção de Baralho tudo começou com o Dominion.

 

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Imagem Ludopedia: Dominion

 

Nesse ponto cabe uma explicação que pode economizar muita discussão. A Construção de Baralho, na forma como ela é normalmente considerada, é uma mecânica de jogo, que pressupõem a construção do baralho durante a partida. Levando em conta essa definição, no que pese todo o brilhantismo e excelência do Magic The Gathering, ele não é um jogo de Construção de Baralho. Essa afirmação parece até contra intuitiva, porque o que mais se faz no Magic é construir baralhos, para jogar. Porém, no Magic The Gathering a construção do baralho acontece antes da partida, e não durante ela.

 

Portanto, a definição clássica e mais aceita da mecânica Construção de Baralhos, citada acima, exclui o Magic The Gathering. Essa distinção é fundamental porque o Magic The Gathering é um jogo de 1993, ou seja, 15 anos mais velho que o Dominion. Além disso, o próprio designer já declarou em entrevistas que o Magic The Gathering não foi uma das fontes de inspiração para o Dominion. Isso pode até ser verdade, mas seria algo altamente improvável, por dois motivos.

 

Primeiro porque o Magic The Gathering exerceu, e ainda exerce, uma influência enorme sobre jogos cartas, seja CCG ou LCG. E segundo porque o Dominion é um jogo exclusivamente de cartas em que os jogadores “duelam”, em um cenário de fantasia. Nesse aspecto, o Magic pode até não ter sido a principal fonte de inspiração, mas dizer que ele não exerceu influência alguma é no mínimo um exagero.

 

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Imagem Ludopedia: Dominion (cartas)

 

Independente disso, o Dominion tem outras características que o tornam um jogo muito importante e influente. Para início de conversa são 500 cartas, apenas no jogo base. Isso além de conferir uma rejogabilidade absurda, ainda permite a aplicação de uma variedade enorme de estratégias.

 

Além disso, o Dominion era um jogo acessível por não ser tão caro, sendo uma excelente alternativa aos demais card games, vendidos no “esquema Magic”. Isso também foi importante, porque demonstrou que era possível produzir um bom card game mantendo sempre a mesma estrutura, sem novas regras essenciais, introduzidas pelas expansões. Claro que as expansões do Dominion trazem novidades e modificam um pouco o jogo, mas não de forma tão fundamental quanto acontece com o Magic.

 

No tocante ao preço, obviamente a situação mudou atualmente, porque o Dominion está out-of-print, e dificilmente terá novo relançamento nacional. Isso encarece consideravelmente o jogo, e assim mesmo quando se consegue encontrá-lo à venda.

 

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Imagem BGG: partida de Dominion 2ª Edição

 

Diferentemente do Magic e seus assemelhados, o Dominion não se baseia em uma busca desenfreada por comprar novas expansões e fortalecer seu baralho. Essa é uma das maiores críticas ao Magic. Mesmo sendo excelente (um dos melhores jogos de todos os tempos), seu esquema de venda o tornou caro demais, para manter a competitividade do baralho. No Dominion todos jogam com as cartas do jogo base, ou seja, ninguém tem o seu próprio baralho, fortalecido por cartas indisponíveis aos outros jogadores.

 

Essa foi uma abordagem diferente daquela normalmente utilizada pelos diversos “clones” do Magic, que obviamente tentavam “pegar carona” na onda de seu sucesso. As expansões do Dominion acrescentavam novos elementos, disponíveis a todos, mas de modo geral, sem provocar grandes alterações.

 

Além disso, o Dominion foi o primeiro jogo exclusivamente com cartas a ganhar o Spiel des Jahres, desde om início da Era dos Jogos Modernos. Isso foi fundamental para inserir os card games, como parte do universo, muito maior dos board games modernos. Atualmente o hobby dos jogos de tabuleiro modernos engloba até mesmo jogos que não têm tabuleiro. Isso se deve em grande medida ao sucesso do Dominion, o que comprova sua grande influência.

 

 

 

07 – 7 WONDERS (2010)

 

O 7 Wonders é um jogo de 2010, criado por Antoine Bauza, com arte de Miguel Coimbra, Dimitri Chappuis, Etienne Hebinger e Cyril Nouvel. As principais mecânicas são Seleção Fechada de Cartas, Ação Simultânea, Gestão de Mão, Coleção de Conjuntos, Poderes Variáveis, entre outras.

Diferentemente do Dominion, o 7 Wonders não é um jogo exclusivamente de cartas, mas esse é o seu principal componente. Por isso, seu enorme sucesso (crítica e público) fortaleceu, ainda mais, o entendimento de que jogos de cartas se enquadram no conceito de board games. Só que o 7 Wonders não é apenas um board game de sucesso. Ele ainda é, até hoje, quase 15 anos após o lançamento, o board game com mais prêmios no currículo.

 

Isso sem falar que ele recebeu prêmios importantes de board games, os principais de cada país, tais como, Deutscher Spiele (Alemanha), As D’Or (França), Golden Geek (EUA), Meeples Choice Award (EUA), Dice Tower (EUA), Japan Boardgame Prize (Japão), Ludoteca Ideale (Itália), Lys Passionné (Canadá), Gouden Ludo (Bélgica), Juego del Año (Espanha), Guldbrikken (Dinamarca), Vuoden Peli (Finlândia), Hra Roku (República Checa), entre outros.

 

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Imagem BGG: 7 Wonders

 

Como se todos esses prêmios já isso não fossem suficientes, o 7 Wonders também foi um dos principais responsáveis pela criação de uma categoria diferenciada do Spiel des Jahres. Na verdade, quem “plantou essa semente” foi o Agricola três anos antes. Como ele era complexo demais para a média dos jogos do Spiel des Jahres, ele recebeu um prêmio especial em 2008. Em 2010/2011 com o lançamento de jogos mais pesados como Dominant Species, Sid Meier’s Civilization, e o próprio 7 Wonders, ficou clara a necessidade de uma nova categoria “expert” para o Spiel des Jahres.

 

Com isso, em 2011, o Spiel des Jahres que já possuía uma categoria para jogos infantis (Kinderspiel des Jahres), passou a ter uma categoria para jogos mais complexos (Kennerspiel des Jahres). O 7 Wonders foi o primeiro ganhador dessa nova categoria.

 

Mas a sua vasta coleção de prêmios importantes recebidos não é o único fator que comprova a grande influência do 7 Wonders. Aconteceu com o 7 Wonders em relação à mecânica de Closed Draft, o mesmo que ocorreu com o Caylus em relação à Alocação de Trabalhadores. Na mecânica de Closed Draft ou Seleção Fechada de Cartas todos os participantes recebem o mesmo número de cartas, seleciona uma para si e passa o restante para o adversário ao lado. Esse processo se repete até que todas as cartas sejam selecionadas.

 

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Imagem BGG: 7 Wonders (cartas)

 

O primeiro jogo com essa mecânica foi o Fairy Tale, porém quem realmente deu visibilidade e colocou essa mecânica no mapa foi sem dúvida o 7 Wonders. Como o jogo foi um sucesso, as pessoas começaram a prestar mais atenção a essa mecânica de Closed Draft. Consequentemente, jogos de sucesso utilizam essa mecânica (Terraforming Mars, Blood Rage, Ilha dos Gatos, Rising Sun, It’s a Wonderful World, Sushi Go e Imperial Settlers).

 

Além disso, o 7 Wonders tem outro mérito que merece destaque. Ele é um jogo CIV, ou seja, de desenvolvimento de civilizações. Jogos desse tipo costumam ser muito complexos. ter partidas muito longas, ter uma grande quantidade de componentes e serem muito caros. Isso é tudo que o 7 Wonders não é.  Ele é simples, agrada a jogadores casuais e hardcores, tem partidas de 30 minutos, uma quantidade normal de componentes e não é muito caro. Porém, apesar de toda essa simplificação, 7 Wonders ainda é um dos melhores jogos CIV de todos os tempos. Um jogo CIV, que é simples e bastante estratégico ao mesmo tempo, e que funciona em partidas de menos de uma hora, é simplesmente fenomenal.

 

Assim, o 7 Wonders provou que jogos bons (principalmente CIV) não precisam ser gigantescos, supercomplexos, ter partidas longas e custarem um rim. Isso foi fundamental para tornar acessível o conceito de jogos com desenvolvimento de civilizações (CIV e 4X), a um público muito maior. Isso influenciou diretamente jogos excelentes nesse estilo “civilização” como Through the Ages, Terra Mystica, Tapestry, Projeto Gaia, Clash of Cultures, Imperial Settlers, Tzolkin, entre outros.

 

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Imagem BGG: 7 Wonders Duel

 

Não se pode deixar de mencionar também a verdadeira enxurrada de versões duel de outros board games, que começou logo após o sucesso do 7 Wonders Duel. Isso é mais uma prova da enorme e duradoura influência que o 7 Wonders tem dentro da indústria dos jogos.

 

Todos esses fatores fazem do 7 Wonders, sem dúvida um dos jogos modernos mais importantes e influentes de todos os tempos.

 

 

 

08 – ANDROID NETRUNNER (2012)

 

Android Netrunner é um jogo de 2012, criado por Richard Garfield e Lukas Litzsinger, com arte de Bruno Balixa, Ralph Beisner, Del Borovic, Adam S. Doyle e muitos outros. Pontos de Ação, Construção de Baralho, Gestão de Mão, Toma Essa!, Poderes Variáveis, entre outras.

 

Como foi dito acima, o Dominion foi um jogo que exerceu grande influência no mercado de card games. Porém, não se pode esquecer que apesar dessa influência ser grande, ainda assim o Dominion não é um CCG. Ele é um jogo para até quatro pessoas e não para apenas duas, com tudo que é preciso para se jogar já na caixa base.

 

O Android Netrunner por sua vez é um jogo muito mais na linha dos CCG, ou seja, um jogador joga contra outro. Apesar disso, existem duas características que tornam esse jogo tão influente.

 

Só para relembrar, em 1993, o Magic: The Gathering teve um sucesso gigantesco, principalmente do ponto de vista comercial, sem precedentes na história dos jogos. Por conta disso, diversos designers e empresas buscaram, ao longo dos anos, obter para si, ao menos uma parte desse enorme sucesso financeiro. Naturalmente, os CCGs posteriores adotaram a fórmula de Richard Garfield, no design de seus “clones”, e a da Wizards of the Coast na comercialização.

 

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Imagem BGG: Magic: The Gathering

 

Assim sendo, a primeira característica marcante do Android Netrunner, e que o difere totalmente dos CCG tradicionais é a sua total assimetria. Como dito antes os CCGs seguem o modelo do Magic: The Gathering, de duelo entre dois jogadores, ambos com baralhos diferentes, mas no mesmo papel. Assim sendo, mesmo com baralhos distintos, os jogadores estão sujeitos às mesmas regras e buscam a vitória da mesma forma. Em outras palavras, cada jogador tenta reduzir a zero os pontos de vida do adversário, ou exaurir seu baralho de compra.

 

O Android Netrunner por outro lado é um jogo totalmente assimétrico, onde um jogador representa uma megacorporação e o outro um hacker solitário ou “runner”. Desse modo, não apenas o baralho, mas o papel de cada jogador e diferente, bem com as regras aplicadas. O jogador/hacker joga com as cartas abertas. Já o jogador/megacorporação joga com as cartas fechadas, de modo que o adversário só sabe o que ele jogou durante a resolução.

 

Na mesma pegada assimétrica, o jogador/megacorporação ganha o jogo se conseguir marcar cartas de agenda em um total igual ou superior a sete pontos. Já o jogador/hacker precisa roubar, do jogador/megacorporação, cartas de agenda em um total igual ou superior a sete pontos, para vencer.

Essa assimetria foi algo novo em relação aos demais CCGs e teve um profundo impacto na legião de fãs desse tipo de jogo. Mas aqui cabe uma explicação fundamental. A assimetria era algo que já existia no mundo dos CCGs, desde o lançamento do jogo Netrunner do mesmo Richard Garfield, que obviamente originou o Android Netrunner. A diferença é que o Netrunner, lançado em 1996, não teve nem de longe, a mesma importância e influência do Android Netrunner.

 

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Imagem BGG: Netrunner (original)

 

Isso, muito provavelmente se deve ao fato do Netrunner ter surgido em uma época muito próxima do Magic. Devido ao fascínio quase religioso, exercido pelo Magic, nas pessoas, não havia muito espaço para nada fora do universo de fantasia medieval (em termos gerais). Nessa época surgiu o Netrunner, com temática cyberpunk, mas ninguém deu bola, ele fracassou retumbantemente nas vendas e terminou descontinuado em desgraça, três anos depois.

 

Na época do relançamento como Android Netrunner, o modelo Magic já dava sinais de desgaste. Mesmo as pessoas ainda gostando muito e jogando muito o Magic, elas já demonstravam o anseio por algo novo e diferente. Richard Garfield e a Wizards of the Coast, que não são bobos nem nada, já tinha um jogo pronto para atender a esse anseio: Android Netrunner.

 

Os dois jogos não são exatamente os mesmos, sendo um a atualização e aprimoração do outro, mas a ideia central se manteve a mesma. O que não se manteve o mesmo foi o mundo ao redor do jogo. Essa diferença da época de lançamento foi determinante, tanto para o fracasso do Netrunner, quanto para o sucesso do Android Netrunner. Então há nesse caso dois fatores a serem considerados.

 

O primeiro é a enorme diferença de sucesso de crítica e público entre os dois jogos, que fez do Android Netrunner um jogo muito maior. O segundo é, evidentemente, o fato do Android Netrunner ser na verdade uma reimplementação do Netrunner, o que faz dos dois “quase” uma mesma coisa. Esse dois fatores permitem afirmar que o Android Netrunner revolucionou os CCGs, introduzindo a assimetria, mesmo esse conceito já existindo, anos antes do seu lançamento.

 

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Imagem BGG: Android Netrunner

 

Outro desdobramento da assimetria, é que o Android Netrunner acrescentou o blefe nos CCGs, algo inédito em termos gerais nesse tipo de jogo. Normalmente os CCGs são jogos de informação aberta, ou seja, cada jogador baixa suas cartas na mesa. Com isso, um jogador pode ver as cartas baixadas do adversário e ter ao menos uma noção aproximada do que ele pretende fazer. Claro que sempre há espaços para reviravoltas, mas de forma geral é assim que funciona.

 

No Android Netrunner, o jogador/megacorporação baixa suas cartas fechadas, por isso seu adversário nunca sabe se aquela carta protegida é uma agenda ou uma armadilha. O resultado é uma mistura do Magic: The Gathering, com o romance Neuromancer, mais o formato Texas Holding do Pôquer e grandes doses de assimetria. Isso é o Android Netrunner.

 

A segunda característica, e a mais determinante, para a influência do Android Netrunner não tem a ver com o designer do jogo, mas sim com a sua forma de comercialização. Obviamente, o que fez o Magic: The Gathering ser um sucesso é que ele pegou algo que já existia, que eram os cards colecionáveis de baseball (algo como nossos álbuns de figurinhas, mas sem o álbum para completar), e atrelou um jogo excelente a esse hobby já existente. Dessa forma, antes de começar a jogar, as pessoas precisavam colecionar as cartas, gastando muito dinheiro no processo, até obterem um baralho viável e efetivo.

 

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Imagem BGG: Expansões do Magic

 

Mas esses baralhos rapidamente se tornavam obsoletos. Isso porque, aproximadamente de três em três anos, surgiam novas edições do Magic com novas habilidades e cartas mais fortes. Nesse meio tempo, entre uma edição e outra surgiam diversas expansões introduzindo cada vez mais novidades. Isso reiniciava todo o ciclo de coleção através da compra desenfreada dos boosters (pacotinhos) da nova edição. Obviamente todos os demais CCGs seguiam essa mesma cartilha estabelecida pelo Magic: The Gathering.

 

Contrariando esse formato, o Android Netrunner adotou um novo modelo de comercialização em que o material do jogo era pré-fixado e divulgado. Desse modo, ao comprar uma expansão ou caixa do Android Netrunner o jogador já sabia de antemão exatamente as cartas existentes no produto. Não havia espaço para o “efeito surpresa”, e cada jogador poderia escolher conscientemente aquilo que queria comprar.

 

Esse novo formato de venda deu origem ao termo Living Card Game (LCG), em contraposição ao Collectible Card Game (CCG). O Android Netrunner era um jogo que excluía o colecionismo, e isso o tornava muito diferente dos demais “card games” da época. Essa mudança foi realmente radical e profunda e influenciou até os demais jogos de cartas posteriores, mesmo aqueles que não eram propriamente card games. Hoje em dia, os card games de maior sucesso, e até mesmo os board games com cartas, seguem muito mais o modelo do Android Netrunner do que o do Magic.

 

Existe outro fator que demonstra, ao menos em tese, a grande influência do Android Netrunner, mas que não se pode ter absoluta certeza a respeito. E nisso vai um pouquinho da teoria da conspiração que tanto tem a ver com o Android Netrunner. Magic: The Gathering e o Android Netrunner são jogos do mesmo criador Richard Garfield e da mesma empresa Wizards of the Coast.

 

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Imagem BGG: Arkham Horror Card Game, card game atual

 

Isso a princípio parece confuso e estranho porque quem lançou o Android Netrunner foi a Fantasy Flight (Asmodée) e não a Wizards of the Coast (Hasbro). Porém, quem possui os direitos sobre o jogo é a Wizards of the Coast que é dona dos direitos do Netrunner original de 1996. O que a Fantasy Flight possuía era a licença para lançamento do Android Netrunner, que não foi renovada. A Fantasy Flight pode até possuir direitos sobre a nova arte e algumas inovações da versão relançada. Mas o jogo em si, e na sua maior parte, é da Wizards of the Coast, que pertence à Hasbro, desde 1997.

 

Assim sendo, mesmo depois de décadas o Magic ainda é uma das “gansas dos ovos de ouro”, tanto da Hasbro quanto da Wizards of the Coast. Por isso, é de se supor que qualquer inciativa, que interfira com o sucesso do Magic, seja removida sumariamente, especialmente se vier de dentro da própria Wizards of the Coast. Evidentemente o Android Netrunner se enquadra nessa descrição de risco, porque o seu formato de venda vai de encontro ao formato do Magic, e que o torna um jogo tão rentável.

 

Por tal motivo não foi surpresa alguma quando depois de apenas seis anos o Android Netrunner foi descontinuado em 2018, apesar do seu enorme sucesso e sua grande base de fãs. Muito provavelmente no embate entre o dinheiro e a inovação lúdica, o primeiro falou mais alto como de costume.

 

Independente da sua curta existência, 2012-2018, não se pode negar que o Android Netrunner exerceu, e ainda exerce, de certo modo, uma forte influência na indústria de jogos. E o pouco tempo que o jogo durou torna essa influência ainda mais admirável.

 

 

 

09 – ZOMBICIDE 1ST EDITION (2012)

 

Zombicide é um jogo de 2012, criado por Jean-Baptiste Lullien, Raphael Guiton e Nicolas Raoult, com arte de Miguel Coimbra, Nicolas Fructus, Édouard Guiton, Mathieu Harlaut e Eric Nouhaut. O jogo tem diversas mecânicas, e as principais são Pontos de Ação, Rolamento de Dados, Movimento em Grade, Gestão de Mão, Tabuleiro Modular, Poderes Variáveis, entre outras.

 

Antes de qualquer coisa é preciso esclarecer, em relação ao Zombicide, que ele é um jogo no estilo ame ou odeie. Muito embora ele tenha muito mais fãs do que detratores, ainda assim ele divide bastante a comunidade boardgamer, especialmente no Brasil. Porém, em se tratando exclusivamente do impacto e influência de um jogo é preciso deixar o gosto pessoal de lado e analisá-lo objetivamente. E sendo objetivo, não há como negar o absurdo impacto que o Zombicide causou na indústria dos jogos, mesmo que se deteste o jogo. É aquela história, a pessoa pode odiar, mas tem de respeitar.

 

No período de 2010/2014, o mundo passava por uma verdadeira febre chamada zumbis. Em 2011, Lady Gaga, que fazia um enorme sucesso na época, colocou o modelo canadense Rick Genest em seu clip “Born This Way”. Esse modelo conhecido, como Zombie Boy, chamava atenção por ter o corpo todo tatuado, inclusive o rosto, com a imagem de um zumbi. No cinema os destaques eram Zombieland e World War Z, dois campeões de bilheteria. E na televisão e plataformas de streaming, Walking Dead e Game of Thrones, com seu exército de zumbis do gelo, reinavam quase absolutos. Quem quiser saber sobre o reflexo da temática “zumbi” nos board games pode acessar o artigo:  https://maxiverso.com.br/blog/2023/04/29/as-fases-tematicas-dos-board-games/

 

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Imagem BGG: Walking Dead e Game of Thrones – Rei da Noite

 

Como não poderia deixar de ser, a onda zumbi também chegou aos board games, através de um jogo que foi um verdadeiro marco da indústria. Esse jogo é o Zombicide, que mais que um jogo já virou uma verdadeira franquia de jogos. O Zombicide é um jogo que explora um cenário moderno de apocalipse zumbi, bem parecido com o que se vê no seriado Walking Dead. Além disso, ele une dois elementos muito populares nos board games, jogos cooperativos com o uso de miniaturas.

 

O jogo foi um sucesso estrondoso e, o que é muito difícil, mantém esse sucesso até hoje, mais de uma década após o lançamento inicial da franquia. Certamente o Zombicide foi um dos jogos que mais trouxe gente nova para o hobby dos board games modernos, tanto no Brasil, quanto no exterior. É preciso tirar o chapéu para a editora CMON, que lançou o jogo certo, na época certa, e soube explorar muito bem a franquia. Primeiro foi o Zombicide na época atual (Season 1,2,3), depois na época medieval (Black Plague, Green Horde), e no futuro (Invader e Black Ops). Atualmente existe uma infinidade de versões com os mais variados temas tais como Velho Oeste, Super-heróis, Fantasia Oriental, entre outros.

 

Mas, apesar do seu estupendo sucesso, não foi isso que tornou o Zombicide um marco na indústria dos jogos, especialmente os jogos modernos. Muitos jogos fizeram enorme sucesso, mas muito poucos realmente influenciaram a indústria dos jogos; Muito poucos foram verdadeiros divisores de águas, a ponto de se considerar um período antes dele e outro após ele. O Zombicide é um desses jogos.

 

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Imagem BGG: Zombicide

 

Tal qual o Android Netrunner, a enorme importância e influência do Zombicide não têm a ver com o jogo em si, mas sim à sua produção e comercialização. O Zombicide foi um jogo produzido no sistema de financiamento coletivo, mas isso não significa muita coisa, porque outros board games também utilizaram essa ferramenta. A diferença é que o Zombicide foi o primeiro board game a atingir a marca de um milhão de dólares captados através de um financiamento coletivo.

 

Na época essa era uma marca considerada inatingível de modo que quando o Zombicide conseguiu essa façanha, todo o mercado internacional ficou boquiaberto. Imediatamente o financiamento coletivo passou a chamar a atenção das grandes empresas que viram nessa ferramenta uma forma muito melhor de levantar recursos. Ao invés de pegar empréstimos no banco com juros altos, ou comprometer o capital próprio da editora, era muito melhor pegar emprestado com os fãs. Além de não se pagar nada, o financiamento coletivo é um excelente termômetro do potencial de vendas do jogo.

 

Como se não bastasse, há ainda uma vantagem fenomenal no financiamento coletivo, pela qual as empresas estão dispostas a pagar caro. O financiamento coletivo é um claro indicativo de quais regiões, até mesmo dentro de um mesmo país, estão mais interessadas no jogo. No nível internacional, as editoras donas do jogo podem saber em quais editoras locais elas devem focar, para incluir no projeto da tiragem mundial. No nível nacional, as editoras podem saber quais as “praças”, mais interessantes para focar em relação à divulgação, logística de distribuição, e lançamento de promoções.

 

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Imagem BGG: Família Zombicide

 

O fato é que, atualmente, a viabilização econômica dos projetos de produção da maioria dos jogos utiliza o sistema de financiamento coletivo. E isso inclusive leva a certa deturpação do espírito do financiamento coletivo. Essa ferramenta evidentemente não foi criada para que empresas multimilionárias como CMON, Fantasy Flight ou Ravensbuguer, entre outras, aumentassem sua margem de lucro. A ideia original do financiamento coletivo era justamente o contrário, ou seja, viabilizar economicamente que empresas, realmente pequenas, conseguissem fazer seus projetos saírem do papel.

 

Também é preciso lembrar que plataformas de financiamento coletivo, não trabalham exclusivamente com a indústria de board games. Essas plataformas também financiam livros, canais de Youtube, peças de teatro, filmes independentes e mais uma infinidade de iniciativas.

 

Especificamente em relação aos jogos, a entrada das grandes editoras no sistema de financiamento coletivo criou uma desvantagem e uma vantagem, para as pequenas empresas. A desvantagem é que as editoras passaram a disputar espaço e atenção com empresas muito maiores, muito mais famosas e com projetos muito mais grandiosos. A vantagem é que, mesmo dividindo atenção, editoras pequenas, potencialmente, podem atingir uma quantidade muito maior de pessoas, que buscam os projetos das editoras maiores.

 

Independente de qualquer coisa, o fato é que o financiamento coletivo é, e continuará sendo por muito tempo, o padrão nos projetos dos board games. E isso tudo começou com o financiamento coletivo do Zombicide. É possível que mesmo sem o estrondoso sucesso do Zombicide, as editoras acabariam em algum momento voltando os olhos para o financiamento coletivo. Mas foi assim que as coisas aconteceram e pensar o contrário é mera conjectura. E justamente por esse motivo é possível analisar a indústria dos jogos, pelo menos em termos de financiamento como antes do Zombicide e depois do Zombicide.

 

 

 

10 – PANDEMIC LEGACY SEASON 1 (2015)

 

Pandemic Legacy Season 1 é um jogo de 2015, criado por Matt Leacock e Rob Daviau, com arte de Chris Quilliams. Como todo jogo da mesma franquia, o Pandemic Legacy Season 1 tem diversas mecânicas. Entre as principais se destacam Jogo Cooperativo, Gestão de Mão, Poderes Variáveis, Movimento Ponto-a-Ponto, entre outras.

 

Na verdade, como se pode perceber evidentemente esse jogo é uma variante do jogo de grande sucesso Pandemic (2008), também de Matt Leacock. Mas existe uma diferença gritante. O Pandemic original não possuía o sistema de campanhas e cada partida era única. Isso mudou com o lançamento dessa versão Legacy do jogo original.

 

Um jogo Legacy é uma versão de um board game em que as partidas formam uma campanha e são interligadas umas nas outras. Assim, aquilo que um jogador faz em uma partida repercute por toda a campanha. Isso porque em um jogo Legacy, uma partida começa exatamente do ponto, e nas condições, em que a partida anterior terminou.

 

O Pandemic Legacy é mais um daqueles exemplos em que um jogo não é o pioneiro em determinada inovação, mas se torna sua principal referência. Na verdade o primeiro jogo Legacy foi o Risk Legacy, lançado quatro anos antes em 2011. O criador do conceito foi Rob Daviau, que primeiro aplicou ao Risk Legacy e posteriormente ao Pandemic Legacy, cuja criação divide com Matt Leacock.

 

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Imagem BGG: Pandemic Legacy Season 1

 

Uma coisa muito interessante e que nem sempre fica aparente é o próprio nome do jogo: Pandemic Legacy Season 1. Isso demonstra que a editora tinha tanta confiança no projeto que utilizou logo de cara um nome indicando claramente que haveria uma continuação. E a empresa acertou porque logo de início esse jogo foi um sucesso.

 

Mesmo com sua proposta inovadora, o Risk Legacy não teve, nem de longe o mesmo sucesso do Pandemic Legacy. A primeira dificuldade é que o Risk Legacy era um jogo muito caro, que vinha em uma maleta personalizada. Isso espantava o público porque ninguém estava disposto a pagar tão caro por um jogo, para rasgar e destruir componentes, jogando uma única vez.

 

Além disso, o Risk é um jogo muito antigo (1959), e na verdade uma reimplementação de outro jogo, o La Conquête du Monde (1957). Jogos tão antigos normalmente são ultrapassados e contam com mecânicas incompatíveis com os jogos modernos. Nesse aspecto o Risk além de ter uma preponderância determinante e exagerada do fator sorte, ele além de longo ainda utiliza a Eliminação de Jogadores.

 

Dessa maneira, o Risk é um exemplo clássico de um jogo de tabuleiro clássico, representado tudo aquilo que contraria os jogos modernos. O jogo possui uma grande base de fãs, no mundo todo, mas muito inferior à quantidade de pessoas que joga os boards games modernos.

 

Isso para não falar que os principais jogos de tabuleiro clássicos pertencem ao conglomerado Hasbro, focado muito mais em brinquedos do que jogos. Assim, mesmo que os jogos clássicos como Monopoly, Clue, Game of Life, Candyland e Risk, tenham uma base de fãs gigantesca, conquistada ao longo de décadas, mudanças nesses jogos ficam muito restritas à Hasbro.

 

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Imagem BGG: Risk Legacy

 

Ao contrário disso, editoras de jogos modernos trabalham com um conceito mais coletivo e abrangente. Acresce ainda que os jogos clássicos mantém uma receita de bolo consagrada décadas atrás e que muda muito pouco. Normalmente se adiciona um elemento novo aqui, um recurso eletrônico ali, uma versão temática acolá, mas não passa muito disso. Já no caso dos jogos modernos, os designers e editoras estão sempre ligadas nas novas tendências e inovações que surgem o tempo todo.

 

Conta à favor do Pandemic Legacy também, o fato dele ser bem mais barato, que o Risky Legacy, além de ser lançado em uma época em que jogos modernos já estavam amis difundidos. Basta lembrar que em 2015 já havia lançamentos de jogos modernos até mesmo no Brasil.

 

Por isso, quando surgiu o Risk Legacy o impacto foi pouco, mas quando apareceu o Pandemic Legacy, aí sim as editoras começaram a prestar atenção. Rapidamente elas viram todo o potencial do formato. Há ainda outro fator importante. O Pandemic original já era um jogo consagrado. Ele foi finalista do Spiel des Jahres e do As d’Or, e ganhador do Golden Geek, Gra Roku e do Gouden Ludo, entre outros. Além disso, ele foi fundamental para divulgar o conceito de board game cooperativo, sendo a principal referência desse elemento durante anos, especialmente no Brasil.

 

Por isso, é natural que uma variante de um jogo de tanto sucesso (crítica e público), despertasse o interesse das empresas e da comunidade boardgamer. E foi exatamente isso que aconteceu. Mesmo não sendo tão premiado quanto o jogo original, o Pandemic Legacy também foi indicado ao Kennerspiel des Jahres, e ganhou o As d’Or, o Gra Roku e o Golden Geek.

 

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Imagem BGG: Jogos Legacy, pós Pandemic Legacy Season 1

 

Além disso, o Pandemic Legacy conseguiu algo que pouquíssimos jogos conseguiram. Ele destronou o Twilight Struggle, sendo o TOP1 do ranking do BGG, por quase dois anos até ser derrubado pelo Gloomhaven. Mas desde então ele se mantém firme na segunda posição.

 

É sempre bom lembrar que a indústria dos jogos já foi explorada à exaustão e é absurdamente competitiva. Isso não apenas dificulta muito o surgimento de algo realmente bom e inovador, como também torna as editoras vorazes pelo novo e impactante. O mesmo se pode dizer da comunidade boardgamer que vive à base de novidades tanto no Brasil, quanto no exterior. Basta ver o enorme impacto e influência que o HYPE e o FOMO têm dentro do hobby.

 

Nesse sentido o surgimento do Pandemic Legacy foi algo impactante e revolucionário. De uma hora para a outra, praticamente, diversas editoras criaram versões Legacy de seus jogos. Isso comprova a diferença do impacto entre o Risk Legacy e o Pandemic Legacy. Após o lançamento do Risk Legacy praticamente não surgiu nenhum outro jogo importante com esse sistema, como consequência direta dele. Mas depois do Pandemic Legacy, a quantidade de jogos Legacy é enorme. Basta destacar Seafall (2016), Gloomhaven (2017), Charterstone (2017), Betrayal Legacy (2018), Aeon’s End Legacy (2019), Clank Legacy (2019), King’s Dilemma (2019), Jaws of the Lion (2020), Frosthaven (2022), e mais recentemente Ticket to Ride Legacy: Lendas do Oeste (2023).

 

Não há prova maior da importância e influência do Pandemic Legacy, do que a quantidade, qualidade e relevância de jogos no estilo Legacy que vieram depois e principalmente por conta dele.

 

Por fim, esses são os 10 jogos modernos mais importantes e influentes para a indústria dos jogos, bem como para o hobby dos board games, em si.

 

Um forte abraço e boas jogatinas!

 

Iuri Buscácio

 

 

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Iuri Buscácio

Leitor voraz de filosofia, teatro, literatura brasileira e estrangeira, suspense, e de romances históricos, de fantasia e ficção científica, além de ser fã de quadrinhos americanos e europeus, desde os tempos da saudosa Ebal, amante do cinema e das séries, e também um grande entusiasta e pesquisador dos jogos de tabuleiro, tanto clássicos quanto modernos, cuja trilha sonora é o bom samba, a MPB de qualidade, black music e música pop dos anos 70 e 80.

10 thoughts on “10 Board Games Modernos Mais Influentes

  1. pra mim o Risk é o jogo mais importante da Historia, depois do xadrez… pq foi ele que nao deixou morrer esse segmento… por decadas o Risk era o unico jogo de fato na industria, no mundo todo, ate aqui no brasil (onde era o War) e manteve geracoe sjogando jogos de tabuleiro, se nao fosse ele, isso ia morrer, nao ia ter Catan nem BGs modernos nem nada assim… eo xadrez é o jogo mais importante pq bom é o único jogo universal e é milenar, nao tem nem o que falar ne

    1. Caro Galiaço

      Quanto ao Xadrez não tem o que discutir. Excluindo todos os parâmetros, ele é o maior e mais importante jogo de tabuleiro da história, muito embora, em boa parte do oriente o GO também tenha um destaque considerável. Eu inclusive gosto muito de Xadrez e jogo ocasionalmente, e, mesmo sabendo um truque ou dois, reconheço que gostaria de saber jogar melhor do que jogo. Todavia essa lista tem parâmetros, ou seja, ela aborda os principais jogos de tabuleiros modernos, que são aqueles lançados de 1995 em diante, ano de lançamento do Catan. Por conta disso, não faria o menor sentido o Xadrez, um jogo ancestral, constar nela.

      No caso do Risk, com todo o respeito acho que você está equivocado. Eu não apenas gosto de jogar board games, mas também estudo esse tema, principalmente no aspecto histórico, e nunca ouvi falar, nem li em qualquer lugar que o Risk tenha sido, em qualquer período, o único jogo a ser produzido e que ele segurou a indústria dos jogos de tabuleiro. Livros de referência como Board and Table Game Antiques de R. C. Bell, Building Blocks of Tabletop Game Design de Geoffrey Engelstein e Isaac Shaley, The History of Board Games de Austin Mardon, A History of Board Games Other Than Chess de H. J. R. Murray, não fazem nenhuma menção a essa grande importância e relevância que o Risk teria para a indústria dos jogos.

      O que existe de evidência e dados verificáveis aponta justamente no sentido contrário, ou seja, que o Risk é um jogo comum. Inclusive, no nível mundial, ele nem é dos mais importantes, na medida em que Monopoly (Banco Imobiliário), Clue (Detetive), Game of Life (Jogo da Vida) Candyland e Scrabble, venderam absurdamente mais, e sempre foram e continuam sendo mais jogados que o Risk. Só para se ter uma ideia da distância segundo a Forbes e o site da Biblioteca do Congresso, e muitas outras, o Monopoly já vendeu mais de 250 milhões de cópias, e esse número já impressionante pode ser ainda maior chegando a 275 milhões. Já segundo essas e diversas outras fontes, o Risk teria vendido 10 vezes menos, ou seja 25 milhões. Até mesmo o Catan, mesmo sendo quatro décadas mais novo que o Risk, já vendeu mais e atualmente está na casa dos 40 milhões.

      O mesmo ocorre no quesito relevância, porque o Catan foi absurdamente mais relevante, significativo e revolucionário que o Risk, não tem como comparar um com outro nesse sentido. Basta pensar que o Risk foi o jogo que criou o estilo Legacy de jogos, muito em voga atualmente, mas quase ninguém deu atenção, para você ver o nível de importância e influência do Risk. Foi necessário o surgimento do Pandemic Legacy, uma variante do clássico Pandemic, esse sim muito mais importante e influente que o Risk, para que as pessoas percebessem o potencial do estilo Legacy. Se o Risk fosse tão importante, logo de cara as pessoas dariam atenção a essa nova forma de fazer jogos (Legacy), o que não aconteceu.

      O que eu acho, mais uma vez com todo o respeito, é que você está confundindo o que ocorre no mundo, com o que ocorre no Brasil. Sem dúvida alguma o War foi um dos jogos de tabuleiro mais importantes da nossa história. Aliás é sempre bom lembra que mesmo sendo uma versão bem aproximada do Risk, o WAR tem grandes diferenças. Só que o WAR nunca reinou sozinho, nem mesmo no nosso país. O Banco Imobiliário, o Detetive, o Scotland Yard, e o Master foram igualmente importantes, principalmente nos anos 80, e nunca deixaram de ser produzidos. O mesmo se pode dizer do Imagem e Ação e do Perfil, alguns anos depois. Por isso, essa ideia de que o Risk, ou o nosso WAR, são os jogos mais importantes porque seguraram as pontas da indústria de jogos, seja no nível nacional e no nível internacional, está totalmente equivocada. Eu sei que é totalmente natural que a gente queria defender a bandeira do nosso jogo preferido, ou daquele que mais nos marcou na juventude. Mas qualquer análise séria deve deixar o sentimentalismo e o gosto pessoal de lado, e procurar ser objetiva, imparcial e se ater aos fatos, naquilo que for possível apurar. Por isso é totalmente que o WAR seja importante para você, e tudo bem, a gente tem mais é que lutar pelo jogo que tanto amamos. Mas certamente isso não se aplica a todas as outras pessoas, nem ao ramo dos jogos de tabuleiro.

      Além disso, o Brasil é um país como quase nenhuma tradição em jogos de tabuleiro. Durante os primeiros vinte anos da Era dos Jogos Modernos, apenas meia dúzia de pessoas sabiam que esses jogos existiam. Só a partir de 2013/2014, é que o público aumentou, quando editoras como Galápagos e Devir começaram a lançar edições nacionais dos clássicos e dos novos grandes títulos, com alguma regularidade. De lá para cá, o mercado nacional de jogos de um grande salto, é verdade, mas ainda assim, a quantidade de pessoas que sequer sabem que existem jogos fora os “tradicionais” ainda é muito pequena. A maioria esmagadora da nossa população tem uma visão distorcida e fora da realidade no que diz respeito a board games. Nada mais justo, porque durante décadas, praticamente apenas Estrela e Grow lançavam jogos por aqui, e ainda assim, apenas meia dúzia de títulos. Por isso, para as pessoas em geral, jogos de tabuleiro ainda se resumem principalmente ao trio Banco Imobiliário/Detetive/WAR, com alguns outros correndo por fora (Jogo da Vida, Imagem e Ação, Perfil, Scotland Yard, Combate, Master, etc).

      Entretanto, quando a pessoa começa a pesquisar um pouquinho mais, e começa a conhecer outros jogos, designers internacionais, as principais premiações do setor, e as editoras estrangeiras, aí ela descobre que existe todo um mundo, que vai absurdamente além, do que se imaginava. O banco de dados do BGG (Board Game Geek), o maior site de jogos de tabuleiro do mundo, conta com mais de 125.000 jogos listados. Claro que a maioria são jogos muito obscuros que ninguém conhece, mas só no ranking geral, com jogos mais conhecidos são mais de 30.000, e isso é muito mais do que aquilo que alguém que só conhece jogos da Estrela ou da Grow imagina que possam existir.

      Para terminar, é sempre bom lembrar que a indústria de jogos de tabuleiro é gigantesca, e atua em uma escala global. Por isso, mesmo os jogos que venderam centenas de milhões de cópias, como o Monopoly, ou que tenham sido verdadeiramente revolucionários como o Catan, ainda assim, são apenas uma fração mínima desse enorme universo. O mesmo se aplica ao caso do Brasil, mas em menor escala. Certamente WAR é o carro chefe da Grow, mas ela possui milhares de outros produtos, especialmente no caso dos quebra-cabeças, que vendem horrores. Desse modo, imaginar que apenas um jogo tenha “salvado” a indústria de jogos é no mínimo um exagero, e bota exagero nisso.

      Um forte abraço e boas jogatinas!

      Iuri Buscácio

    2. eu acho que o cara acertou o tiro, mas no alvo errado… eu diria que o Monpoly foi quem segurou os board games vivos na epoca das vacas frias, nao o Risk (ate por tudo que o autor do texto falou na resposta dele nesse topico), mas mesmo assim, o Monopoly teve ajuda do Scrabble (talvez por sequer parecer ser um jogo de tabuleiro, é quase como se fosse uma coisa a parte, em que tiozinhos de 80 anos jogavam na Europa e nos EUA e se perguntassem pra eles se aquilo era jogo de tabuleiro eles diriam que nao, era Scrabble rs, algo como o Uno foi em ralaçao ao baralho, se perguntasse pros unistas do inicio dos anos 2000 se aquilo era jogo de baralho, diriam que nao, que era Uno rs), a verdade é que ficamos querendo criar rankings e listas que afirmam que isso ou aquilo foi o principal, foi o maior, o unico, etc, e essas definicoes nao sao assim numericas ou objetivas, as vezes varios jogos tem um papel que queremos dar a um só

    1. Caro Nerdola Master

      Rapaz, em primeiro lugar muito obrigado na parte que me toca.

      Em segundo lugar, a ideia é exatamente essa. Mais do que uma seção para apenas divulgar board games, o objetivo destes textos e artigos é justamente fomentar o debate, entre pontos de vistas diferentes, como ocorreu com o Mendes Salles.

      Você inclusive poderia aproveitar o embalo e dar a sua opinião também, evidentemente desde que essa seja a sua vontade.

      Um forte abraço e boas jogatinas!

      Iuri Buscácio

  2. Caramba vc veio com os dois pés no peito hahaha escreveu um texto quase do tamanho do post pra rebater meu argumento kkk sensacional, parabens. Bom, apesar de entender seu ponto de vista e compreender perfeitamente o seu critério, eu vou divergir novamente… assim como vc citou que o Risk Legacy foi um legacy antes do Pandemic Legacy, mas ele não “mudou” o segmento, enquanto o segundo, que veio depois, mudou, eu considero o mesmo com o Pandemic: ja existiam jogos cooperativos antes? Sim. Já existiam jogos cooperativos de sucesso antes? Sim. Algum deles marcou um “antes e depois” nos jogos como o Pandemic? Nao. E apesar de vc dizer que o Pandemic foi mais relevante aqui que no resto do mundo, minhas pesquisas não concordam com essa alegação rs… o Pandemic foi relevante no mundo todo, ele foi um sucesso comercial sem precedentes para jogos cooperativos, ele praticamente apresentou os jogos cooperativos pro pessoal “de fora” do hooby, é um daqueles casos que até quem não é boardgamer ouviu falar e se interessou (algo mais ou menos no mesmo nível do Zombicide). Qt ao El Grande, é um jogo muito bom de fato, poderia de fato ser ele o tal que citam que inaugurou a era moderna, mas nao, essa alcunha cabe ao Catan, ou seja, mesmo com tudo de bom e importante que o El Grande tem, ele acaba “subjugado” pelo Catan, foi o Catan o marco zero dessa febre mundial que começou a partir dele e popularizou os BGs como nunca antes ocorreu (e de novo, isso mesmo considerando que ja tinha jogo moderno antes do Catan, mas fazer o que, foi ele que deu aquele click na populacao mundial e desencadeou tudo o que veio depois…). Com o Pandemic, vale a mesma observação: foi ele que deu aquele click mágico, que marcou uma era, que estabeleceu um antes e depois, popularizou os coops como eles nunca antes tinham sido populares, furou a bolha do hobby e chegou à “população comum” e por ai vai. Listas são sempre fonte de discordância hahaha a sua ta excelente, mas eu discordarei desse único ponto pq pelo que sei de BGs o Pandemic jamais poderia ficar fora de uma lista dessas, e, claro, essa é apenas minha opinião hahaha abraço!

    1. Caro Mendes Salles

      Rapaz, a divergência respeitosa é sempre bem vinda, e é desse confronto saudável de pontos de vista diferentes que a gente consegue construir o consenso, e mesmo quando isso não é possível, no mínimo acabamos revendo nossas respectivas posições, e de qualquer forma acabamos aprendendo mais. Uma das maiores verdades da vida, é justamente que a verdade não tem dono. As pessoas têm é entendimentos, que serão mais ou menos fortes, ou mais ou menos próximos da verdade, conforme o valor dos argumentos que baseiam esses entendimentos.

      Só para deixar uma impressão errônea sobre o meu ponto de vista, eu não acho que o Pandemic, seja irrelevante e apenas o Pandemic Legacy seja importante e influente. Eu concordo com a maior parte daquilo que você escreveu. Isso porque não há a menor dúvida de que o Pandemic foi importante e influente em relação ao aumento da popularização dos jogos cooperativos. A minha discordância é no grau de intensidade dessa importância e influência, principalmente no nível internacional. Assim, o Pandemic foi realmente influente, só que eu acho que o Pandemic Legacy foi mais, justamente porque antes do Pandemic já existiam bons jogos cooperativos inclusive famosos e de muito prestígio, mas no caso dos jogos Legacy, havia um único jogo antes do Pandemic Legacy, sem quase nenhuma expressão. Mas essa é a minha opinião, baseada naquilo que foi possível pesquisar.

      Vale lembrar que até mesmo pesquisas sobre board games são discutíveis. Mesmo sendo um setor milionário, os board games ainda são, inclusive internacionalmente, um mercado de nicho. Desse modo essa área de estudo ainda é pequena e existem muito menos pesquisas e publicações sobre os jogos de tabuleiro, enquanto fenômeno econômico do que se pode pensar. Basta pensar, por exemplo, que não existe acesso a dados oficiais referentes ao volume de vendas de um board game específico, porque essas informações são confidenciais e estratégicas, de modo que as empresas não divulgam. Quando muito se sabe que “até hoje um jogo vendeu milhões de cópias”, mas esses não são dados nem oficiais e nem muito precisos. Dessa maneira, quem se interessa e pesquisa sobre board games tem de se virar, e fazer o melhor possível, com os poucos e imprecisos dados à disposição.

      Para terminar, eu concordo totalmente que qualquer lista é sempre problemática, e depende muito do viés escolhido por seu organizador. E quanto menor, mais problemática. Se ao invés dos 10 jogos modernos mais influentes, a lista tivesse apenas 5, metade dos jogos ficaria de fora, tornando a escolha ainda mais complicada. Por outro lado, se a lisa fosse maior, com 20 ou até mesmo 15 jogos, não há a menor dúvida de que o Pandemic faria parte dela.

      De todo modo, muito obrigado pela sua valiosa contribuição, que só veio engrandecer ainda mais a reflexão proposta no artigo.

      Um forte abraço e boas jogatinas!

      Iuri Buscácio

  3. acho que mais importante que o Pandemic Legacy foi o Pandemic, o original, um divisor de águas, que marcou o antes e depois dos BGs, assim como o Catan… foi o Pandemic que introduziu o conceito moderno de cooperativo e isso mudou pra sempre os boardgames… eu colocaria o Pandemic muito acima nessa lista, acima do El Grande inclusive… vc pergunta pra qualquer boardgamer experiente e ele vai citar o Pandemic como um dos mais influentes, mas pode esquecer de citar o Caylus, o El Grande, o Dominion… perto do Pandemic, esses jogos são bem desimportantes… ok, tecnicamente nao desabono nenhum dos argumentos usados pra por esses que citei (Caylus, El Grande, Dominion) na lista, mas Pandemic obrigatoriamente tem que estar nela, e ai vc tem que “se virar” pra tirar um dos outros hahaha

    1. Caro Mendes Salles

      Eu concordo com você de que o Pandemic é um jogo fantástico, e um dos que eu mais gosto e mais jogo. Além disso, achei o seu comentário muito pertinente e bem elaborado. Porém, sou forçado a discordar do que você escreveu, porque não foram considerados alguns fatores, que eu vou apresentar abaixo, e gostaria que você considerasse.

      O primeiro fator é que os jogos desta lista estão organizados em ordem cronológica de lançamento. Portanto não é uma questão do terceiro da lista ser mais influente que o quinto. Desse modo, se fosse o caso de incluir o Pandemic, o que não é, ele entraria no lugar da lista correspondente a 2008, quando ele foi lançado.

      O segundo fator é que foi considerada a influência dos jogos no nível global e não local. O Pandemic certamente foi muito importante para divulgar os jogos cooperativos no Brasil, e disso não há a menor dúvida. Mas mundialmente não foi isso que ocorreu. Aliás, o Pandemic fez muito mais sucesso por conta da originalidade do tema, do que pela sua natureza cooperativa. Jogos cooperativos já existiam aos montes, mas jogos em que os jogadores faziam o papel de uma equipe da OMS , não havia nenhum.

      O El Grande, apesar de ser um dos melhores board games de todos os tempos, é pouco relevante no mercado nacional. Desse modo, para nós brasileiros, a influência do El Grande é pouca, porém em termos mundiais a história é outra. O Catan certamente foi o grande catalisador que levou à Era dos Jogos Modernos, mas não fez isso sozinho. Outros jogos da mesma época, ou pouco posteriores, foram quase tão importantes quanto. Entre eles destacam-se o Tigris & Euphrates, o Carcassonne, o Puerto Rico e o El Grande (este lançado no mesmo ano do Catan). E, dada a sua enorme qualidade e relevância, não seria nenhuma surpresa se o El Grande fosse o responsável pela Era dos Jogos Modernos, ao invés do Catan. O fato do El Grande ser muito localizado e muito identificado com a Espanha histórica, e o Catan ser baseado em um local fictício e de fantasia, mais genérico e mais acessível, talvez tenha feito a diferença. Mas indiscutivelmente o El Grande se não foi o principal, certamente foi um dos responsáveis, por essa revolução na indústria dos jogos.

      O terceiro fator é que o Pandemic não causou tanto impacto na época de seu lançamento, nem inovou tanto assim. Nesse aspecto, é preciso lembrar que jogos cooperativos ou semicooperativos não são um conceito novo, e que existem jogos assim desde os anos 70. Basta citar o Comunity (1972), o Dungeon! (1975) e o prestigiadíssimo Magic Realm (1979). E mesmo já na Era dos Jogos Modernos, os jogos cooperativos já apareciam desde o início. Como dito anteriormente, antes do Pandemic já existiam diversos jogos cooperativos, e alguns bem importantes e relevantes como o Warhammer Quest (1995), o Shadows Over Camelot (1995), o Arkham Horror 2ª Edição (2005), e o Ghost Stories (2008), A Touch of Evil (2008) e Space Alert (2008), esses três últimos desenvolvidos na mesma época do Pandemic. Então não é como se não existissem jogos cooperativos, ou como se esse conceito existisse mas de forma pouco divulgada, e depois do Pandemic surgissem diversos jogos baseados nesse conceito.

      Por outro lado, com o Pandemic Legacy foi muito diferente. O primeiro jogo Legacy foi o Risk Legacy, só que ele não fez sucesso, não vendeu tanto, e não causou quase nenhum impacto. Isso se deve ao fato do jogo ser bastante caro, bem acima da média, mas principalmente porque foi vendido como uma experiência única. Nesse caso, se comprava o jogo, se vivenciava a experiência e depois se jogava fora. Isso porque os componentes haviam sido destruídos, o que impedia que se vivenciasse a experiência novamente, e por isso não fazia sentido manter o jogo. De modo geral, as pessoas não compraram a ideia de pagar caro em um jogo de tabuleiro descartável. Com isso, como o desempenho em vendas do Risk Legacy foi muito abaixo do esperado, a criação desse novo sistema não alterou muita na coisa no universo dos board games.

      Mas quando surgiu o Pandemic Legacy, tudo mudou porque a estratégia de vendas foi outra. Ao invés de se comprar jogar e descartar, o Pandemic Legacy era uma nova proposta em, que se comprava, se jogava e após o final da campanha a pessoa ficava com uma cópia personalizada do jogo base. Aliado a isso, o Pandemic Legacy teve uma produção mais modesta (o Risk Legacy era vendido em uma maleta!!!!), tornando o jogo mais acessível. Isso fez toda a diferença, e o Pandemic Legacy foi um sucesso, causando um verdadeiro rebuliço na indústria dos jogos. Uma prova disso, é que após o Risk Legacy não surgiu nenhum jogo Legacy relevante, mas após o Pandemic Legacy, outros jogos Legacy, alguns importantes, foram lançados aos montes.

      Por isso, com tudo que o Pandemic normal seja um jogo excelente, e seja o jogo original, ele não chega nem perto do Pandemic Legacy, em termos de influência e impacto na indústria dos jogos. Por isso, o Pandemic Legacy está na lista e o Pandemic normal não está.

      Mas isso não desmerece de forma alguma o Pandemic normal, que é um jogo realmente fenomenal e que todo mundo que curte board games deveria experimentar e conhecer.

      Um forte abraço e boas jogatinas!

      Iuri Buscácio

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