Crítica: A Hora do Mal (Weapons)

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Horamal (1)

Direção: Zach Cregger

Elenco: Julia Garner, Cary Christopher, Josh Brolin, Alden Ehrenreich, Austin Abrams, Benedict Wong, Ali Burch, Michael Gene Conti , Whitmer Thomas, Callie Schuttera e Amy Madigan

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Seguindo a cartilha dos filmes de terror em se apresentarem como alegorias para um contexto social, A Hora do Mal (Weapons no original – sim, o título brasileiro é um daqueles absurdos tradicionais) soa um bom exemplo de uso narrativo para abordar tais assuntos. Abandono infantil, violência doméstica, Bullying, demonização do feminino, homofobia, paranoias epidêmicas e tragédias com armas em escolas, são alguns dos temas abordados no filme a partir do momento em que 17 de 18 crianças da mesma classe, desaparecem simultaneamente (correndo assustadoramente com os braços abertos em direção à escuridão) num subúrbio americano instalando o caos na cidade; sobrando apenas o pequeno Alex (Christopher) e fazendo com que a jovem professora Justine (Garner) torne-se alvo do desespero dos pais dos alunos.

Já nesse momento, o filme apresenta a discussão sobre aversão à figura do professor numa sociedade cada vez mais conservadora, cuja responsabilidade sobre os atos dos jovens recaem nos ombros acadêmicos sem que a família questione sua a própria ação na criação dos filhos; tratando, assim, a professora como uma bruxa na idade média sendo queimada na fogueira. E não uma jovem profissional como qualquer outra com seus medos e problemas pessoais, mas que nutre um carinho por seus alunos como a maioria de todos professores de ensino infantil . Esse terror dos personagens é real e sentimos nos temas abordados episodicamente pelo longa, como visto no policial vivido por Alden Ehrenreich e seu terror em relação à James (Abrams); um viciado que, pelo uso constante de seringas possivelmente contaminadas, torna-se a personificação dos medos do agente em seus casos extra conjugais.

Essa linha de roteiro não linear é seu principal atrativo quando diretor Zach Cregger entrecorta de maneira eficiente os capítulos encabeçados por um personagem e seu ponto de vista sobre determinado momento da trama e seus próprios traumas; e mantendo o interesse do espectador diante de alguns questionamentos: O que provocou o sumiço das crianças? E qual a participação do jovem Alex?

Fora que esses capítulos permitem o filme criar micros universos que irão se conectando para entendermos o surgimento de novos personagens como a excêntrica tia Gladys (Madigan); que obviamente não poderei dar mais detalhes sem spoilers. Sendo assim, o filme consegue preparar bem o terreno para causar o desconforto para o espectador durante maior parte do tempo, sem necessariamente apelar para sustos fáceis (Jump Scare ou planos para o surgimento de um personagem ao fundo); assim como pela tentativa de Justine em descobrir sobre o que aconteceu aos pais do Alex ou a investigação de Archer (Josh Brolin) sobre as motivações do seu filho – e as outras crianças – em sairem daquela maneira no meio da noite.

Mas, dentro de todos os simbolismos, a situação das crianças seja realmente o mais emblemático do filme. O fato de correrem com os braços daquele jeito remete a uma flecha, um míssil ou, nesse caso, um tiro que atinge diretamente a parcela mais frágil da sociedade que depende dos exemplos e ações dos adultos para sobreviverem; mas que precisam conviver dentro de um mundo que massacres de jovens em escolas, devido a políticas armamentista, como algo corriqueiro – principalmente – nos Estados Unidos. Assim, seria Alex uma dessas figuras negligenciadas no ambiente familiar em busca de vingança contra seus algozes?

Então, se A Hora do Mal abre espaço para tais discussões e ainda evidenciar seu cerne de terror de maneira funcional, é sim um exemplo bem sucedido. Claro, suas raízes ainda estão presas a algumas convenções sobre o gênero como o diretor não tivesse outra opção como apelar para um tipo de personagem habitual aos filmes de terror (não estamos falando de palhaços apesar que rapidamente o filme bebe dessa fonte), e que acaba enfraquecendo, por exemplo, o discurso sobre a demonização do feminino. Seria como dissesse: “Olha, eu vou criticar isso. Mas no final vamos ter que usar tal personagem para fazer exatamente o contrário do que eu prego no filme”. Ou até mesmo se a resolução sobrenatural para assuntos tão mundanos, não seria abster em apontar o dedo para as verdadeiras razões desses problemas. De qualquer forma, é interessante que Zach Cregger sabe exatamente o que faz ao ponto de enveredar intencionalmente para o humor desse caça as bruxas demonstrando um equilíbrio inesperado; o que achei bem arriscado e até pela reação do restante dos espectadores na sessão em que estava confirmar essa teoria. Ainda assim, esse momento absurdo é recheado do grotesco violento como não poderia deixar de ser.

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Rodrigo Rodrigues

"Todo filme é político na medida em que política é toda forma de relação humana em que o poder está implicado" (Costa-Gavras)

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