Crítica: Conclave
![Conclave-Reproducao](https://maxiverso.com.br/wp-content/uploads/2025/02/Conclave-Reproducao-1024x576.jpg)
Direção: Edward Berger
Elenco: Ralph Fiennes, Stanley Tucci, John Lithgow, Lucian Msamati, Jacek Koman, Thomas Loibl, Sergio Castellitto, Carlos Diehz e Isabella Rossellini
Em determinado momento, um dos cardeais – não italiano – e um dos favoritos ao cargo de Papa, desabafa sobre o desejo que o próximo pontífice seja alguém que possa admitir seus erros e seguir em frente; mesmo que alguns desses “erros” seja um caso de abuso sexual. Ou, caso não, que o próximo representante de Deus na Terra seja alguém com ideais mais conservadores para manter a tradição Romana dentro da Igreja? Alguém que fale somente em Latim.
O mais elogiável, portanto, desse envolvente e provocador Conclave do diretor Edward Berger é sua capacidade de ao mesmo tempo surgir como um trilher conspiracional dos bastidores da cúria do Vaticano e a discussão sobre as ideologias de maneira exponencial dos candidatos a líder da maior religião em número de adeptos no mundo. Um jogo de xadrez, de cardeais de diferentes etnias que precisam adaptar-se em um mundo tecnológico, de constantes mudanças políticas em que os acordos sobre os votos sejam feitos em grupos segregados em refeitórios (como se fossem gangues) e cochichos no pátio entre pontas de cigarros jogados ao chão.
Após a morte do Papa, o decano Lawrence (Fiennes) é encarregado de organizar a próxima eleição que irá eleger o novo representante da igreja católica. Auxiliado pelo também progressista Cardeal Bellini (Tucci), eles enfrentam a ala mais conservadora liderada pelo Cardeal Tedesco (Castellitto), ao mesmo tempo em que precisam lidar com denúncias sobre o também favorito Cardeal Tremblay (Ligthgow) e também com a chegada de última hora do misterioso Cardeal Benitez (Diehz).
O roteiro de Peter Straughan baseado na novela de Robert Harris (também roteirista), não se limita aos diálogos eficientes sobre racismo, homofobia e todos os assuntos que incomodam a igreja há muito tempo, mas também descortinam um jogo geopolítico dos mais atuais onde o reacionarismo insiste na disputa de “Nós” x “Eles”. Sendo “Nós” alguém que não diferencia alguns desses cardeais de qualquer político de extrema direita e “Eles” aqueles que defendem a discussão entre fé e dúvida sobre a humanidade e, principalmente, diversidade do mundo contemporâneo e até a participação maior da mulher na Igreja – não sendo a toa que a presença de Isabella Rossellini seja vista como alguém que precisava ser discreta, mas possuindo força dentro da trama.
Ralph Fiennes faz de Lawrence alguém sempre lidando com essa dúvida e medo de que, ciente que poderia ser eleito, tem a humildade em reconhecer suas limitações; fazendo com que o personagem de Tucci seja o contraponto por soar, mesmo também com suas dúvidas, mais pragmático pela consciência que tudo ainda é um ato político e que precisam, caso for, quebras as regras num momento crítico. O que nos leva a pensar até sobre o conflito gerado pelos últimos ocupantes do cargo: João Paulo II, Bento XVI e Francisco. Se o primeiro – reconhecidamente um Papa popular -, tinha uma posição absolutamente conservadora, por exemplo, contra casamento homoafetivo (segundo ele, uma ofensa aos valores cristãos), os dois últimos são a síntese entre o conflito do filme: Bento XVI de certa maneira manteve o tradicionalismo dentro da igreja envolta em crimes de pedofilia, quanto Francisco de forma mais progressista foi cedendo a tais questões e sempre que possível se pronunciou sobre regimes totalitários e injustiças sociais – não sendo coincidência que seja um Papa Sul-Americano. Mas lembrando que Francisco é acusado de omissão enquanto arcebispo de Buenos Aires durante a ditadura militar (elementos que podemos ver nos filmes “Dois Papas”, dirigido por Fernando Meirelles e “Papa: Francisco” de Wim Wenders).
A direção de Edward Berger acerta em manter o público no ponto de vista de Lawrence, evitando os acontecimentos externos (no qual ficamos sabendo apenas quando os personagens tomam ciência), e nos mostra a reconstrução dos corredores do prédio do Vaticano, assim como a Capela Sistina, de maneira fiel (até porque seria impossível que conseguissem filmar no local original), o que é muito elogiável. O design de produção ajuda o espectador na imersão dos grandes salões, escadarias e mármores frios dos corredores envoltos no escuro, como palcos dos acertos feitos às escondidas, tudo a cargo da fotografia do diretor Stéphane Fontaine; onde o Fontaine usa as cores com um reflexo do próprio estágio do protagonista, seja em momentos pela escuridão ou pelo vermelho que confundem-se com seu figurino no momento – sendo o vermelho representando não somente o martírio de Cristo, mas também, porque não, a culpa católica.
Criando um clima de constante tensão e apresentando detalhes dos bastidores do clérigo – onde pequenos momentos fazem diferença por mexer com a curiosidade para o grande público -, Conclave, como disse anteriormente, é um tabuleiro de peças em que todos os movimentos são pensados. Onde mesmo esperando o resultando final, somos pegos de surpresa. E o resultado é justamente condizente com tudo o que é discutido pela narrativa até ali.
Nunca vi necessidade particular de praticar uma religião como bússola moral. Respeito – apesar da complexidade – quando uma pessoa aceita determinados desígnios da vida (bons ou ruins) como uma vontade divina; ou, no caso do filme aqui, para votar numa eleição papal. Sendo assim, se a pessoa entende sua decisão em votar em X ou Y como um comando de Deus, eu teria mais vontade em seguir um líder religioso que tenha passado por todas as dificuldades como fome, violência, defesa das minorias e que tenha vindo de uma maneira que questiona exatamente aquilo que essas pessoas dizem aceitar.
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Rodrigo Rodrigues
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bom filme com otimos atores, nota 8 de 10, vai que é sucesso