A arte de Yuumei e o ambientalismo
Em meio à diversidade da vida na Terra, o ser humano ocupa um lugar de destaque, por ser o único animal capaz de analisar situações, correlacionar fatos, tomar decisões. Essa capacidade, como sabemos, muitas vezes altera e degrada o meio ambiente. Todos nós temos uma noção do impacto do ser humano nos problemas ambientais, os quais assumem diversas formas: desmatamento, poluição do ar, do solo, dos rios e do oceano, aumento do efeito estufa, do buraco na camada de ozônio e extinção das mais variadas espécies de animais e plantas.
UM BREVE PANORAMA
As ações que intensificam os problemas mencionados acima ocorrem há tempos e tiveram um impacto cada vez maior a partir da Revolução Industrial no século XVIII, mas só a partir da década de 70 é que esse impacto ambiental se tornou mais conhecido do grande público, passando a figurar cada vez mais na mídia, e foi também nessa época que se organizou a primeira grande reunião pelas Nações Unidas com foco na questão ambiental, a Conferência de Estocolmo. A partir desse momento, questões ambientais foram se tornando mais presentes nas negociações diplomáticas, especialmente após a Conferência do Rio, de 1992. Com a virada do século, tivemos a Cúpula de Joanesburgo em 2002 e, alguns anos depois, documentários como “Uma Verdade Inconveniente”, do ex-vice-presidente dos EUA, Al Gore, que contribuíram para que muitos tomassem conhecimento do potencial devastador das atividades humanas para o aquecimento global. O documentário, inclusive, costuma ser exibido em escolas brasileiras.
Relatórios como os do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), fruto de pesquisa de cerca de 2,5 mil cientistas mobilizados pela ONU, vêm desde 2007 informando sobre os efeitos da ação do homem para o aquecimento do planeta. Também temos várias ONGs compromissadas com a conservação ambiental e também organizações internacionais, como a já mencionada ONU. Os esforços para aumentar a conscientização têm vindo de vários lados, inclusive de artistas. Não são poucos os que se preocupam com o rastro de destruição deixado pelo ser humano no planeta, e entre eles temos músicos, fotógrafos, escultores, quadrinistas e ilustradores.
ARTE ENGAJADA
Hoje apresento a ilustradora Wenqing Yan, mais conhecida como Yuumei. Apesar de morar nos Estados Unidos, ela nasceu e viveu na China até os 9 anos de idade. A vida em dois países tão diferentes e as visitas esporádicas à sua terra natal tiveram grande influência na sua carreira como artista. Seu pseudônimo, que em chinês é grafado como 幽冥 ou 幽明 significa “luz e escuridão, escuro e profundo, hades e semiescuridão” e, curiosamente, a leitura “yuumei” significa “famoso(a)”, em japonês, algo que ela não tinha conhecimento na época, mas que foi quase um presságio da fama que estaria por vir.
A artista já faz parte do DeviantArt (o maior site de arte e artistas) há mais de 14 anos e, desde o início, seus desenhos já chamavam a atenção na comunidade online. Yuumei é uma das artistas mais conhecidas no site, e não por acaso. Além de ter aperfeiçoado sua técnica e estilo ao longo dos anos, o que conferiu às suas ilustrações um visual cada vez mais bonito, seu trabalho desperta as mais variadas emoções, como a comoção, quando trata dos problemas de sua infância representada em seus desenhos e histórias gráficas e, principalmente, a conscientização ao tratar de temas como o cyber-ativismo e, em especial, o ambientalismo.
Yuumei desenha desde criança, por influência dos pais que, segundo ela, eram do tipo que gostavam de exibir os talentos dos filhos. Como sempre foi interessada pela natureza, era questão de tempo até que essa paixão se refletisse na sua arte, e esse interesse a levou a optar pelo bacharelado interdisciplinar de artes na Universidade Berkeley da Califórnia, onde aprofundou seus conhecimentos de biologia e arte.
O fato de ter nascido na China também foi determinante na sua carreira artística. Yuumei gosta do seu país natal, mas nem todas as suas lembranças são boas, não só em relação aos problemas familiares — seus pais se separaram quando ela ainda era pequena — mas também em relação à poluição excessiva da cidade onde morava, um problema comum em várias cidades chinesas. Yuumei menciona a fumaça espessa que sempre cobria o céu da cidade, e os problemas respiratórios que tinha, decorrentes da poluição. Essa experiência a levou a criar uma das suas histórias gráficas, Knite:
“Uma história sobre sonhadores. A permanente esperança de que, um dia, a neblina de fumaça irá acabar, e as estrelas brilharão mas uma vez no céu poluído da China.”
A história, cujo título é uma mistura das palavras “knight” e “kite”, tem como personagens alguns jovens chineses que, ao cair da noite, soltam pipas com fios de luzes amarrados, lembrando estrelas, num céu onde não é mais possível vê-las há muito tempo. A trama se desenvolve conforme o filho de um político chinês se aproxima do líder do grupo dos soltadores de pipas. Com muita sensibilidade, a artista toca em questões importantes da realidade chinesa. Além da já mencionada fumaça no céu (smog) em cidades, responsável por diversas doenças respiratórias, ela menciona a contaminação de rios por pesticidas, resultando em abortos e infertilidade; o acesso desigual à educação; responsabilidade parental; desigualdade social e más condições de trabalho; a ganância de grandes empresas e a preservação ambiental. Tudo isso entrelaçado numa mesma história, cuja mensagem é a de que só a esperança não basta, e que é preciso agir para mudar o cenário previsto para o futuro.
O DESAFIO CHINÊS
O grande desafio é conciliar o progresso material com a preservação ambiental, o que se encontra no conceito de desenvolvimento sustentável, cunhado em 1987 no Relatório Brundtland, cujo objetivo exige equilíbrio entre as dimensões econômica, social e ambiental. Os maiores esforços nesse sentido deveriam vir especialmente dos países desenvolvidos, que podem arcar com os custos. Isso porque existe um tradeoff entre a diminuição da poluição no meio ambiente e um maior nível de renda, já que as empresas que precisam reduzir a poluição acabam tendo que elevar o custo de produção de bens e serviços. Ou seja, são medidas que podem resultar na redução da renda dos proprietários das empresas, trabalhadores e clientes, mas que, em contrapartida, garantirão um meio ambiente com menos poluição e, consequentemente, menos problemas de saúde decorrentes disso.
A China é desde 2006 o maior emissor mundial de dióxido de carbono, devido ao seu crescimento econômico e à sua dependência do uso de carvão como matriz energética. O país é o maior produtor e consumidor de carvão mineral, combustível fóssil muito poluente, o qual corresponde a cerca de 70% da sua matriz de energia, número que vem caindo desde 2013. Por esse motivo, e por ser considerado um país em desenvolvimento, suas obrigações quanto à diminuição de emissões são diferentes daquelas dos países industrializados, o que explica sua resistência em acordos internacionais prévios para redução de emissão de poluentes. Além disso, na conta per capita, quem mais polui é os Estados Unidos: na verdade, segundo dados de 2006, cada chinês emitia apenas um quinto de um norte-americano.
Felizmente, o país parece estar tomando medidas para reverter a situação, investindo no reflorestamento e no aumento da utilização de energia limpa. Além disso, em 2016, a China ratificou o Acordo de Paris, comprometendo-se em reduzir as emissões de gases do efeito estufa. Mesmo que as mudanças sejam lentas e as grandes cidades ainda sofram com a poluição, é um importante passo dado, sem dúvidas.
Quem quiser conhecer Knite pode ler a história gratuitamente no DeviantArt da artista, onde o quadrinho é exibido num arquivo em flash, todo colorido e com transições especiais. Confiram neste link. A história começou em 2010 e tem 5 capítulos até o momento, sem contar os capítulos-bônus. Em 2016, Yuumei anunciou que faria um remake da história, divulgando ilustrações novas e, nesse começo de 2017, anunciou que já começaria a trabalhar no remake.
Além de Knite, a artista criou outras histórias que também podem ser lidas no seu DeviantArt:
Fisheye Placebo
“Tecnologia é a ferramenta. Ela dá poder às pessoas, e tem o poder de controlar pessoas. Para aqueles nascidos no meio desse conflito, a vida de um hacker é uma escolha constante entre Estratégia e Tática. É melhor lutar pela sua visão de futuro, ou viver no decadente conforto do presente?”
1000 Words
“O conto de uma garotinha crescendo com perdas e ganhos.”
Rumination
“Sinta como é estar na pele de uma criança forçada a escolher entre a mãe ou o pai.”
Como podemos ver, Yuumei é um belo exemplo de artista engajada. Sua arte procura aumentar a conscientização do público sobre problemas ambientais visíveis e outros não tão visíveis, mas que existem e apontam para a necessidade de mudanças, muitas das quais dependem de políticas governamentais, mas não menos da iniciativa individual. Todos têm responsabilidade na preservação na natureza, e se cada um fizer sua parte, espalhar a mensagem e cobrar as autoridades, ainda é possível amenizar a acelerada destruição ambiental.
Sites interessantes: Pegada Ecológica, UN Environment, IPCC, Ministério do Meio Ambiente
REFERÊNCIAS:
ABRIL. Guia do Estudante: Atualidades. São Paulo: Abril. Edições de 2008 a 2016.
FAVARETTO, J. A; MERCADANTE, C. Biologia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2003.
LAGO, A. C. Estocolmo, Rio, Joanesburgo: o Brasil e as três conferências ambientais das Nações Unidas. Brasília: FUNAG, 2006.
MANKIW, N. G; TAYLOR, M. P. Economics. 3. ed. Reino Unido: Cengage Learning, 2014.
YuumeiArt
yuumei (Wenqing Yan) @ DeviantArt
Karina Moreira
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posso afirmar com convicção que é o melhor texto sobre Yuumei que já vi na Internet! Parabens! Sou fã dela… Sua comic mais recente e que está em andamento é Fisheye Placebo, que conta a história de como é viver num mundo em que o sistema é extremamente controlador, sendo até proibido a população possuir câmeras e as redes sociais são censuradas. Yuumei também faz fanarts maravilhosas: abusa e usa da iluminação e cores em seus trabalhos. Não podemos deixar de notar a influência das animações japonesas em seu traço, apesar de uma estrutura e estilo bem original. Em suas artes originais, ela criou um acessório que virou sensação, o Axent Wear (saiba +) é um headphone com orelhas de gato que logo mais estará a venda.
É verdade, os fanarts da artista são muito bonitos, e o headphone já foi lançado e foi realmente um sucesso.
No Facebook dela é possível conferir algumas concept arts do remake de Knite, sem falar nas outras novidades e ilustrações que ela vem fazendo.
Vale a pena dar uma conferida!
Obrigada pelo comentário e desculpe a demora na resposta.