Crítica: Fragmentado (Split)
Direção: M. Night Shyamalan
Roteiro: M. Night Shyamalan
Elenco: James McAvoy, Anya Taylor-Joy, Betty Buckley, Haley Lu Richardson, Jessica Sula, Izzie Coffey e William Henke
Cotação 2/5
Contém Spoiler!
Tinha me convencido que demoraria muito tempo – ou nunca – para novamente dar uma chance a um filme de M. Night Shyamalan. Seu ego maior que seu talento o afogou em suas próprias convenções ocasionando obras pavorosas como Fim dos Tempos, O Ultimo Mestre do Ar, Depois da Terra e Demônio (este talvez nem tanto) . Um diretor cada vez mais distante do novato que assustou o mundo com O Sexto Sentido e produziu criativas obras, que obtiveram mais elogios que críticas negativas, tornando-se longas relevantes dentro de sua filmografia como Corpo Fechado, A Vila e Sinais. Assim, me perguntando o que me levou a quebra da minha promessa, chegamos a este Fragmentado trazendo o mesmo Shyamalan de sempre: um diretor inquieto em suas ideias, mas insuficientemente capaz de executá-las com qualquer competência ou delicadeza em sua narrativa.
Enfim, Casey Cooke (Taylor-Joy), Claire Benoit (Richardson) e Marcia (Sula) são três adolescentes sequestradas e mantidas em cativeiro pelo personagem de James McAvoy – podemos escolher dentre os vários nomes das personalidades assumidas, mas ficaremos com Dennis por ser o mais “forte” – um homem com personalidades múltiplas possuindo um destino “sagrado” em “apresentar algo maior para o mundo” através das “comidas Sagradas” (no caso, as jovens).
O roteiro do próprio diretor é interessante em apresentar suas premissas, informações e lógica (disse somente apresentar). Mas, assim como o contexto do filme, parece que as personalidades do escritor e do diretor não se falam, transformando a obra numa colcha de retalhos com situações óbvias; sempre servindo às necessidades do próprio roteiro e com poucas (quase nenhuma) cenas evocando realmente algum tipo de tensão (ou acham algo extremamente feliz a decisão de uma adolescente seminua – algo corriqueiro no filme – correndo para se esconder dentro de um armário?). Fora que a necessidade de tentar justificar as ações da persona de Dennis, como algo baseado na “Percepção Sobrenatural” (causada pela psique humana) é sabotada por sua expositividade e principalmente pela presença da Dra. Fletcher (Buckley), uma profissional preocupada mais em palestrar do que resolver o problema que traz consequências de vida e morte (problemas estes que o roteiro deixa a entender que ela sempre mostrou ter conhecimento e se mostrando uma péssima profissional por simplesmente não fazer nada para evitar os acontecimentos).
Outro problema do roteiro é transformar a protagonista em algo unidimensional parecendo ter saído de uma paródia de Todo mundo em Pânico. Claro que nossas reações diante de diversas situações são variadas, principalmente baseadas em nossas experiências passadas, mas soa fora da realidade que uma adolescente sequestrada e possível vítima de abusos aja com tanta naturalidade como Casey diante de uma situação tão extrema e perigosa; como visto, ainda no primeiro ato, a jovem acabando de chegar ao cativeiro mostrando toda uma aparente calma (ao contrário das outras duas) incompatível com o cenário por mais forte que ela fosse . Fora que a intenção de criar certo vínculo traumático com o agressor soa de extremo mau gosto, principalmente por tratar algo de extrema gravidade (estupro de vulnerável) de maneira superficial e irresponsável por mostrar sem alguma consequência após o término do longa. Ademais, para tentar justificar o tal comportamento da jovem, a direção insere de maneira nada sutil, flashbacks sobre alguns fatos da infância de Casey e que acabam quebrando o fluxo do filme e a tensão que ele propõe de tão mal realizados. Pois, mesmo que aceitássemos somente os fatos sobre o passado de Casey (o que seria absolutamente racional), Shyamalan esquece que somos resultados de experiências passadas, mas preferindo transformar a personagem, ainda criança, literalmente numa versão infantil da adolescente.
A atuação de McAvoy, portanto, é capaz de não tornar tudo um desastre, mas parecendo não ter tido tempo de encontrar o tom certo dos personagens (ou devido ao excesso destes); o ator surge primeiramente como um homem de gestos metódicos e assépticos compatíveis com seu estado inicial. Todavia, ao apresentar os outros “personagens” ainda soa como uma caricatura ao representar umas das suas personas com trejeitos e gestos que tentam ser discretos, mas sem muito sucesso. O que acabam tornando suas representações em algo tolo e risível; inclusive chegando ao ponto de incomodar, leia-se vergonha alheia, com uma cena de dança (assim, como a personagem feminina em que a composição do McAvoy se mostra sempre equivocada e estereotipada, mesmo que vejamos a boa intenção do ator). Contudo, com a interpretação do lado mais infantil do personagem, a mesma é interessante por ser concebida ao se mostrar um personagem complexo por ser vítima de traumas infantis – sendo interessante que o ator, ao tentar mensurar tal situação, apresente numa interpretação vocal estranha. Mas somente ao assumir uma personalidade de “líder”, o ator consegue realmente salvar seu trabalho, mesmo ainda com as várias ressalvas; inclusive, podemos comentar como uma boa resolução da direção, o fato de cada persona definir a capacidade física do mesmo, como ele se girasse uma chave quando assume uma personalidade diferente e trazendo assim suas características físicas.
Ademais, tecnicamente falando, o diretor não é suficientemente capaz de trabalhar o conceito de transtorno dissociativo de personalidade como julgou capaz de fazer ao transformar tais elementos algo sobre humano. O que de certa maneira denuncia ser um fardo demasiadamente complexo para compreensão da direção, por Shyamalan ainda é incapaz de apresentar uma narrativa que pudessem ajudar a entender ou se identificar com tal contexto. Fora que o longa ainda trata isso como se fossem um revelação para o espectador, e mesmo que fosse, o impacto é irrelevante para a trama e seu desfecho. Seria como dissesse: “O grande segredo é que ele tem…transtorno dissociativo de personalidade!”. Sério? Se não contasse, eu não saberia!
Durante todo o longa, o diretor, aparentando uma necessidade de mostrar que domina a linguagem cinematográfica, Shyamalan abusa de planos sem qualquer lógica, como o uso de câmeras subjetiva; como visto no terceiro ato, por exemplo, quando uma personagem demonstra um estado de dopagem e a câmera, com a imagem turva, mostra a personagem, consequentemente não pondo o espectador na posição da vítima (o que seria o mais lógico). Ademais, os flashbacks de Casey não seguem um padrão, pois, fora o fato das transições não serem nada sutis em seus cortes, o diretor de uma hora para outra decide usar um fade out (imagem escurecendo) demonstrando total incoerência narrativa. Inclusive, até numa simples conversa com plano e contra plano, o diretor abusa do excesso, como podemos ver nos três longos diálogos entre Dennis e a Doutora que não agregam em nada.
Pelo menos eficiente em sua ambientação, o design de produção consegue mensurar o clima claustrofóbico do local aparentemente isolado com seus corredores e portas, assim como o fato de usar a lógica (finalmente) de refletir os ambientes de acordo com a personalidade do agressor (assim temos um local permeado de gravuras e objetos infantis e outro com um ambiente mais formal e frio como um escritório). Entregando o absurdo do fantástico prometido e esperado durante sua projeção (uma das convenções em que o diretor ficou preso na sua filmografia), Fragmentado é um filme que se obriga a atender as ditas características de suas obras, e dependendo exclusivamente da capacidade do espectador em comprar sua ideia. Todavia, soa quase como uma confissão de culpa que o grande respiro atrativo do filme surja justamente por nos trazer novamente um universo visitado de um dos seus filmes anteriores, e este sim, realmente uma surpresa.
Mas seria isso o suficiente ? Não.
Rodrigo Rodrigues
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Cissa,
Obrigado pelo comentário.
Se realmente gostou do filme , isso não um demérito. Pelo contrário, a discussão sadia sobre um filme somente existem por opiniões diferentes. Assim, até agradeço que não tenha concordado comigo.
Agora, com relação ao ter dado uma nota baixa precisaria esclarecer dois pontos importantes :
1° Eu não gosto de dar nota a um filme, isso é reducionista demais (somente faço por ser um hábito difícil de tirar, pois normalmente alguns leitores pedem isso). Mas o importante é o texto em si, sempre.
2° Com relação a ter tido uma possível má vontade com o filme, tenho que discordar. Eu não analiso o filme baseado na boa (ou má) vontade – isso é coisa de crítico que não tem respeito pela obra e pelos leitores .
Eu formulo minha opinião baseada em critério cinematográficos, cujo exemplos tirei do próprio filme. O objetivo da crítica é fornecer um olhar mais apurado ao leitor e baseado nisso posso dizer que o filme, na minha opinião , é ruim. Mas, proporcionalmente minha opinião não pode ser considerada a verdade absoluta. Mas caso alguém tenha uma opinião diferente, que a exponha baseada nos mesmos critérios que um filme foi analisado.
Abraço e agradeço demais sua opinião.
amei esse filme… fiquei fascinada com a história e achei a atuação do Xavier (kkk) maravilhosa, acho que faltou boa vontade em dar uma nota mais alta