Crítica: Lucky
Lucky
Direção: John Carroll Lynch
Elenco: Harry Dean Stanton, Barry Shabaka Henley, Ana Mercedes, Ron Livingston, Yvonne Huff e Tom Skerritt
Harry Dean Stanton foi um verdadeiro andarilho da indústria cinematográfica e não é para menos. Com mais de 200 aparições (entre Cinema e TV), o veterano ator falecido em Setembro deste ano aos 91 anos de idade, era uma figura fácil de ser reconhecida pelo seu semblante mal humorado e por vezes com bom coração, que volta em meia surgia em alguma obra durante seus mais de 60 anos de carreira. Onde, para parte do público, seu rosto sempre foi mais associado ao personagem Brett do clássico Alien de Ridley Scott (1979). E numa breve pesquisa, dá para perceber se fôssemos enumerar suas participações (curtas ou não) em grandes filmes ficaríamos um bom temo mensurando sua presença nos diversos gêneros que ele atuou, como por exemplo: O poderoso Chefão 2 , Fuga de Nova York, Christine – O Carro Assassino , A Ultima Tentação de Cristo, A Espera de um Milagre, etc. Contudo, isso não impediu do ator construir uma sólida carreira e tenha atingido seu reconhecimento no inesquecível e comovente Paris, Texas de Wim Wenders (1984).
Portando, nada mais lúdico e honrado que este simpático e delicado Lucky do diretor e também ator John Carroll Lynch se transforme do canto do cisne em homenagem a carreira de Stanton, cujo personagem é a própria personificação do ator e sua carreira. Uma obra pauta pelo existencialismo, por vezes melancólico e por vezes cômico, de um homem enfrentando seus fantasmas da mortalidade e solidão, mas sem deixar de tornar uma ode a vida e das poucas alegrias e amizades que ainda restam – mesmo a sua maneira peculiar de demonstrar sentimentos. Inclusive a direção abusa dos closes para demonstrar a fragilidade do corpo envelhecido do personagem (e ator) que mesmo com uma idade avançada (não fica claro qual seja, mas isso não importa), não possui qualquer problema de saúde para espanto do médico, mesmo tendo uma rotina pouco saudável ao ingerir muito açúcar, café e fumando sem controle.
O roteiro de Logan Sparks e Drago Sumonja não tem a intenção de trazer uma obra complexa, pelo contrário. Mas, simplesmente fazer o público acompanhar as rotinas e pensamentos de Lucky (Stanton) que se resumem a fazer palavras cruzadas num restaurante, comprar e fumar uma penca de cigarros, e jogar conversa fora (leia-se curtos e ríspidos comentários) com amigos de um bar, e onde seu grande desafio diário é “enfrentar” a programação de uma cafeteira. Assim, é elogiável a lógica e decisão da direção manter o fluxo do longa sempre de maneira introspectiva — como o próprio personagem – durante toda a projeção para sermos compelidos, como toda a obra cinematográfica, à aqueles momentos sem necessidade de alterar sua velocidade. Até mesmo ao usar uma tartaruga fujona (perdão, cágado), como uma – óbvia – metáfora para representar o protagonista como alguém que possa invocar certo conceito de “imortalidade” ao carregar o peso da morte nas costas, a direção mantém a atmosfera de riso e abatimento daqueles personagens – contando, claro, com a presença do diretor David Lynch numa participação especial. Até porque, é interessante que o simbolismo sobre “céu” e “inferno” seja inserido de maneira simples, como o fato de um determinado momento, ao se dirigir a porta que diz “saída”, a fotografia ressalte o vermelho e o verde cadavérico no rosto de Lucky como sendo um caminho definitivo a tomar. Ou o fato de um determinado momento o personagem encontrar um local que simbolizaria o paraíso ainda estar “fechado” para ele. O importante, neste caso, independente do que seja Lucky não dá mínima e prefere ainda ficar mais um pouco.
Um homem que procura, dentro de suas limitações intelectuais, entender o processo da vida e como encarar a realidade como um processo diário como alguém que jamais parou para questionar sua existência e assunto mais complexos como imortalidade, alma e que se mostra avesso a certas questões atuais, como o fato de ver um casal Gay dentro do restaurante.E quando o faz, é quase como uma criança descobrindo uma palavra nova servindo como um mantra diário. Mas, o mais interessante, entretanto, é como o próprio personagem se vê: alguém simples que viveu muito e como uma dose de ironia ter o nome literalmente associado a “Sorte” por ser a personificação de alguém que pouco saiu de uma linha de grandes riscos durante a vida e parecendo invisível ao restante da sociedade. Ademais, não à toa, que o protagonista tenha servido na marinha durante a guerra (como o próprio ator), todavia, sua função de cozinheiro pouco permitia algum tipo de aventura mesmo participando do conflito, como descobrimos na cena em que ele conversa com o ator Tom Skerritt (com quem contracenou no próprio Alien) . Inclusive, não sendo coincidência também que a obra explore a veia musical do ator com um belo e emocionante número durante uma festa para a surpresa do público presente e daqueles (como eu) pouco tinham ouvido e visto suas outras qualidades artísticas.
Se pautando e sustentando completamente dentro daquela atmosfera empoeirada do deserto, Lucky não é somente uma plataforma consciente para um ator em seus últimos momentos, mas uma reflexão de um homem e ator que abraçou completamente seu fim, mas sem jamais perder sua essência. Até porque ele continua por ai eternamente caminhando a passos firmes através do seu legado.
Nota 4/5
Rodrigo Rodrigues
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Filme sensivel, emotivo e emocionante.
Justa homenagem ao ator. Me lembrou o filme em que um sr acha que ganhou na loteria e sai pelos EUA com o filho atrás do premio que nao existe. O nome é Nebraska ou Montana, é um nome de Estado rsrs
Bem Vindo
Que bom que gostou. E realmente o filme remete a um road movie como o excelente “Nebraska” (O filme foi estrelado por Bruce Dern em 2013) . Bem lembrado
Obrigado pelo comentário.
Se puder dá um curtida na página
Abraços