Crítica: Paterson
Paterson
Diretor : Jim Jarmusch
Elenco: Adam Driver, Golshifteh Farahani, Barry Shabaka Henley, Rizwan Manji , Chasten Harmon e William Jackson Harper
O diretor Jim Jarmusch continua como poucos no cenário independente a apresentar um exercício existencial e idiossincrático sobre pequenos gestos de indivíduos, mas sempre envolto numa atmosfera aparentemente pouco movimentada. Todavia, cheia de camadas e detalhes para que, ao mesmo tempo, possamos testemunhar a beleza destes indivíduos, sejam eles criaturas seculares em Amores Eternos, um homem atrás de redenção com suas ex-mulheres em Flores Partidas ou um motorista de ônibus de uma cidade que dá nome ao filme e ao protagonista.
No filme estrelado por Adam Driver, acompanhamos uma semana da vida de Paterson e suas rotinas melancólicas, por vezes exaltada pela falta de trilha sonora e dominado pelo silêncio da dia a dia, onde a direção valoriza os pequenos detalhes do cotidiano, nas maiorias das vezes cansativo (e servindo até mesmo como uma alegoria sobre um ”Inferno de Dante” diário). Um homem de grande resiliência e avesso a tecnologia e celulares (contexto comum nas obras do diretor) com a justificativa que a esposa sempre o compreender , sendo isso o suficiente em sua vida – e obviamente pelo fato de que sua rotina jamais mudará. O ator faz uma composição elogiável e delicada, tornando Paterson num poço de uma paixão contida pela poesia como alimento par a alma.
Alimentado por este amor pela arte de forma amadora, ele carrega um fardo simbólico por ter o mesmo nome da cidade e ser testemunha ocular de outras rotinas, e assim como a própria não tão animadoras, mas ainda sim mantendo suas importâncias, como a conversa de crianças e suas aventuras escolares passando por adolescente em processo de amadurecimento político e adultos com suas aventuras extraconjugais nem sempre verídicas. Indivíduos que Paterson também encontra dentro de sua própria rotina pós trabalho (resumida a ida ao bar acompanhado com seu cão), que servem como importantes peças dentro do contexto. Como o cantor iniciante de Rap, o rapaz (Harper) com seu amor não correspondido da amada (Harmon) e o dono do bar viciado em jogos de xadrez, onde tudo ainda acaba servindo não somente para engrandecer aquele cenário, como também um alivio cômico, sutil e delicado.
Em Paterson, Jim Jarmusch é capaz de enaltecer estes momentos existencialistas do dia a dia através do estudo de seus personagens, ao mesmo tempo, mantendo tal cenário numa marcha contemplativa, mas sem que se repita em sua essência – ou cansando – e até mesmo conseguir esticar os fatos para sentirmos algum receio pela integridade dos personagens (mas que no fim acabam retornando para o ponto inicial, como um ciclo mecanicamente repetitivo e decepcionante). Como o fato, entre seus poemas repetidos quase como uma mantra, Paterson sempre insinuar certa instabilidade “como fósforos que bastam um atrito para explodirem” ou quando um personagem aparentemente irá cometer um ato trágico somente percebemos que seria impossível levar a frente por não fazer parte daquela natureza.
A direção exalta o contexto soturno também através dos lugares em que vivem os personagens. Tirando as ruas em que Paterson atravessa com seu ônibus, o restante dos locais são bucólicos como a empresa em que trabalha o protagonista. Um local a esmo, vazio e pouco movimentado, onde temos somente a presença do supervisor interpretado por Rizwan Manji (como não poderia de ser, um personagem personificando melancolia e resignação involuntária). E claro não poderia deixa de comentar o trabalho do design de produção ao transformar a residência de Paterson e Laura (Farahani) como um elemento influenciador de suas personalidades, principalmente dela . Devido a sua condição de não conseguir manter um foco, a esposa é uma figura presa ainda mais naquela rotina, onde a fixação por atividades desconexas, em ser uma cozinheira ou uma cantora de country, são exaltadas nas figuras geométricas presente em toda a casa e pela cores escuras ao ponto de soar quase como um transtorno, uma depressão. Como também é interessante o uso do Plongee (característico do diretor) sempre no início de cada dia da vida de Paterson, cujo detalhe é cada vez que passam os dias, personificarmos ainda a ligação do casal. Ratificando por cada vez em que surja a cena do casal acordando , reparamos Laura cada vez mais próxima de Paterson, ao ponto do último dia, ao não acordar ao seu lado, seja justamente o dia de uma nova etapa em sua vida e do casal em si.
Sem deixar de contemplar seus elementos por um segundo Paterson também é uma ode ao acaso e acidentes do destino com pessoas comuns em busca de seus sonhos mesmo que jamais tenham alguma oportunidade para expor. E, apesar de tudo, sempre devemos recomeçar quando uma página em branco de um livro surja em nossa vida de maneira inesperada. Acreditando ou não, você prefere ser um peixe ou uma mula?
Cotação 4/5
Rodrigo Rodrigues
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