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salvat-1602-300x300 Resenha: "Marvel's 1602"
Edição definitiva da coleção da editora Salvat

 Tormentas assombram os céus da Inglaterra de Elizabeth I. Após derrotar a Gloriosa Armada de Filipe II, a Rainha dos Mares agora se prepara para o que se anuncia no tempo. Assim como sua vida caminha cada vez mais próxima do fim, o mundo parece fazer o mesmo. Um tesouro antigo, guardado pelos Templários em Jerusalém, viaja em direção à Europa, carregando consigo esperanças e temores. Com a chegada do fim da Era Elisabetana, os ânimos crescem na ardente Espanha das fogueiras da Inquisição, assim como cresce as expectativas de James IV, da Escócia, possível sucessor a anexar a coroa britânica à escocesa, enquanto o Conde Otto Von Doom, da Latvéria, prepara suas peças no grande jogo de xadrez que se instaura no ano de 1602.

Pera, Latvéria? Doom? Sim, é uma história da Marvel ambientada no contexto histórico do início do século XVII, então hoje falaremos de História e Quadrinhos.

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Neil Gaiman, consagrado autor de HQs e livros, como Sandman e Deuses Americanos, junto do ilustrador Andy Kubert, artista responsável pelos desenhos de HQs como Origem (do Wolverine) e Flashpoint, e o colorista Richard Isanove, criaram em 2003 a HQ Marvel’s 1602, uma história para agradar fãs da Marvel, historiadores, e até mesmo o mais ferrenho fã da concorrência!

O projeto surgiu quando Gaiman foi convidado pela Marvel Comics para escrever uma história em quadrinho com os personagens da editora. De acordo com o romancista, a editora deu total liberdade para que ele desenvolvesse uma história de super-heróis, e Gaiman aproveitou a oportunidade para criar algo fora do convencional das histórias da Marvel. A edição de 2015 da coleção de graphic novels da Marvel lançada pela Salvat, traz um texto de Neil Gaiman falando sobre as origens do “1602”, no texto, o autor relata que por conta dos atentados do 11/9, em Nova Iorque, a intenção era escrever um enredo que não se passasse em Nova Iorque (como a maioria das histórias dos heróis da Marvel), e que não fosse repleta de violência.

Assim que os voos foram retomados, após o período de tensão dos atentados terroristas, Neil Gaiman viajou para Veneza, onde o autor diz ter encontrado a cidade vazia, o que permitiu que ele elaborasse a trama inspirado pela histórica cidade. Inspirado nisso, Gaiman pensou em conceber uma história que se passasse num passado antes dos conflitos de hoje, antes dos conflitos do século XX, em que as aventuras da Marvel se situaram.

scott-mckowen-marvel-1602-no-8-cover-captain-america-nick-fury-and-virginia-dare-300x300 Resenha: "Marvel's 1602"Gaiman relata também que parte de sua inspiração veio dos frutos de suas pesquisas para criar “Deuses Americanos”. O autor fez um grande levantamento das lendas e mitos do Novo Mundo, das Américas, e dentre eles, a lenda de Virgínia Dare, a primeira criança britânica nascida no Novo Mundo, ficou em sua memória, aguardando o momento certo de se desenvolver em outro projeto. A lenda remete à colônia de Roanoke, a Colônia Perdida. No ano de 1587, John White, avô de Virgínia, retornou à Inglaterra em busca de novos suprimentos e maior apoio da coroa à jovem colônia das Américas, ao retornar, em 1590, a colônia havia desaparecido misteriosamente.

As lendas do Novo Mundo e o contexto político da Inglaterra no final do reinado da Rainha Virgem compõem o pano de fundo da trama que adapta e contextualiza os personagens da Marvel, que por sua vez, também possuem um contexto para sua escolha. Frente a tarefa difícil de escolher quais personagens da Casa das Ideias, estariam na história, quais protagonizariam e etc, Gaiman decidiu por escolher apenas personagens do início da Era Marvel, pois foi neste mesmo período do começo dos anos 1960′, que Gaiman começou a ler as aventuras de heróis, ainda criança. Além do fato de ser o período de gênese da própria Marvel Comics. Para saber mais, confira nossa matéria sobre os heróis da Era de Prata dos Quadrinhos, neste link.

Um dos maiores prazeres da leitura de “1602” é desvendar quem são os personagens adaptados no contexto histórico. “… o trabalho do leitor é ver se consegue descobrir tudo antes de mim. Eu entreguei a eles coisas bem óbvias e outras não tão óbvias.”

Além do enredo muito bem tramado e envolvente de Gaiman, e da agradável ilustração de Kubert, 1602 traz um trabalho belíssimo nas capas. Scott McKowen utilizou uma técnica chamada “Scratchboard”, em que o artista utiliza uma faca para tralhar as imagens em barro branco chinês e depois cobrir com nanquim, após o processo, McKowen colorizava digitalmente em quatro cores, criando um efeito semelhante às gravuras do período. Destacamos a capa da edição de capa dura em que o autor se inspira na gravura dos conspiradores da explosão do Parlamento, dentre os conspiradores, Guy Fawkes, personagem histórico que junto da intentona contra o Parlamento, inspirou Alan Moore a criar a HQ “V de vingança”.

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Capa inspirada na gravura dos conspiradores da explosão do Parlamento. Detalhe: Assim como os conspiradores da pólvora, os personagens da Marvel em 1602 são traidores do Rei James I

A partir daqui rolará alguns SPOILERS, então quem já está curioso o bastante para ler essa HQ, tchau! Brincadeira, mas saibam que tratarei no próximo parágrafo de alguns detalhes que podem revelar surpresas do enredo de “1602”.

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Heróis da Marvel, em “1602”.

Um acontecimento fez com que o Universo Ficcional da Marvel ocorresse 400 anos antes. Tempestades e fenômenos misteriosos da natureza levaram até os mais incrédulos a acreditar que o Juízo Final se aproximava. Incumbido pela própria Rainha Elizabeth I, seu médico real, o Doutor Stephen Strange, busca sanar os males que assombram o mundo. Enquanto isso, o Chefe da Espionagem Real, Sir Nicolas Fury, e seu assistente Peter Parquagh, contratam os serviços especiais de um cego trovador que quando não está cantando as aventuras dos piratas do navio Fantásticko, age furtivamente como um demônio intrépido. O contrato gira em torno do objetivo de trazer em segurança para Inglaterra a misteriosa relíquia dos Templários vinda de Jerusalém guardada por Donal, o Idoso.

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Mercúrio, Magneto e Feiticeira Escarlate, em 1602

Na Espanha, o chefe da Inquisição, Enrique, junto da irmã Wanda e do irmão Petros, caçam os “sanguebruxos” para queimá-los nas fogueiras do Auto da Fé, antes que Carlos Javier e seus mutanturs os libertassem. Enrico (Magneto), se alia ao católico James IV, rei da Escócia, para tramar contra Elizabeth I, e em troca da ascensão do monarca escocês ao trono inglês, James entregaria todos os “sanguebruxos” britânicos às fogueiras da Inquisição.

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Otto Von Doom, o Formoso, em “1602”

Na Latvéria, o Conde Otto Von Doom, o Formoso, usufrui dos conhecimentos e poderes de seus prisioneiros, os quatro tripulantes do navio Fantásticko, para criar suas máquinas de guerra e arquitetar sua conquista do mundo.

A oeste, um navio cruza o Atlântico rumo à Inglaterra. Nele, a jovem Virgínia Dare, e seu guarda-costas, o índio Rojhaz, buscam apoio da metrópole para a colônia de Roanoke.

Todos os destinos se cruzarão, deverão se cruzar, pois sem a união de todas as peças deste quebra-cabeça fora da caixa do tempo, a própria realidade pode deixar de existir diante dos olhos de Uatu, o Observador.

As adaptações dos personagens ao contexto histórico do ano de 1602 é um dos principais pontos da obra, destacarei apenas um caso para exemplificar sem estragar a graça para aqueles que ainda não leram. O Quarteto Fantástico, franquia que deu início à Era Marvel, no ano de 1961, foram transformados em um grupo de exploradores ultramarinos que ao chegarem na mítica “borda do mundo”, no fim dos oceanos, ganharam seus poderes magicamente. Na história original, o grupo de exploradores espaciais entra em contato com nuvens solares que alteram suas estruturas moleculares transformando-os em seres poderosos. Em 1961 o limite do conhecimento e da ciência eram as viagens espaciais, enquanto no ano de 1602, os limites do conhecimento, as aventuras fantásticas, estavam nas viagens marítimas que levaram exploradores e aventureiros a todos os cantos do globo.

“1602” é uma história em quadrinho de 8 capítulos, lançados primeiramente em quatro edições, hoje é possível encontrar edições definitivas que trazem a história completa em um só exemplar. Outras histórias de outros autores se inspiraram no contexto que Gaiman trabalhou, como “1602: Novo Mundo” de Greg Pak e Greg Tocchini, ou “1602: Quarteto Fantásticko” de Peter David e Pascale Alixe. Particularmente achei as outras histórias inspiradas em “1602” muito fracas, com enredos que mais parecem “esticar o chiclete”, ou seja, tentar reaproveitar uma ideia que deu muito certo quando trabalhada de forma excelente por Neil Gaiman e Andy Kubert.

Já leu “1602”? O que achou? Ainda não leu? Não perca mais tempo e vá ler!

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Capas de “1602”
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Raul Cassoni

Professor, historiador e músico. Um hibrido de boêmio com nerd, caso a vida fosse um enorme RPG. Discípulo de Mestre Splinter, Mestre Kame, Senhor Miyagi, Tio Ben, Prof. Xavier, entre outros que me guiaram em meu juramento de pesquisar a Nona Arte "nos dias mais claros e nas noites mais escuras", sempre usando meus "grandes poderes", e conhecimento, com "grande responsabilidade".

8 thoughts on “Resenha: “Marvel’s 1602”

  1. historia supervalorizada… nao tem nada de mais, a ideia é até boa, mas vai ler pra ver… na pratica é meio chatinha, no fim so é legal mesmo ver quem é quem ali (nossa, esse cara aqui é o Dr. Estranho, esse o Prof. Xavier, esse cara aqui é o Steve Rogers…)

  2. Analise interessante, poucos e desimportantes spoilers, contextualizou historicamente, situou o leitor do texto sobre o panorama da obra em si e do contexto editorial dela, muito bom, aprovado

  3. vale mais pela curiosidade do que pela trama em si… pois atrama em si é típica dos crossovers dos anos 90, com um acontecimento central “reunindo” os personagens que no fim confluem para uma resolução em conjunto

    1. nao é bem assim nao, acho que vc leu outra coisa… claro que tudo se resolve no fina, ja que é uma historia fechada, mas cara nem da pra comparar isso com as historias convencionais que vc citou, olha a qualidade do enredo do Gaiman

  4. Gaiman e Kubert. Nao podia dar errado. A história é coesa e amarradinha. Poucas coisas causam estranheza. Gaiman mistura vários elementos da literatura para dar uma nova visão às aventuras de super-heróis. Não há uniformes colantes e a narrativa é mais lenta e densa do que as imagens “dinamicas” das tradicionais histórias do gênero. O mais interessante é como o autor encaixou personagens clássicos em uma trama ambientada há 400 anos. E não se trata de um universo paralelo ou coisa parecida, pelo menos segundo o autor, que informou que a trama se passa toda no universo regular da Marvel e há 400 anos do que todos conhecem hoje. As semelhanças não são por acaso e, de acordo com o escritor, conforme a história vai sendo contada, os leitores vão passar a compreender o que isso significa para a cronologia deste mundo.

    1. eu ja discordo, pra mim so funciona pra quem curte ficar tentando descobrir quem é quem… “ah ta esse bardo é o Murdock, legal”… igual cara que curtia as historias do Alex Ross pra tentar ver as referencias na arte “a placa desse carro tem o numero do disco dos Beatles que da hora”

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