Crítica: Fome de Poder (The Founder)
Fome de Poder (The Founder)
Direção: John Lee Hancock
Elenco: Michael Keaton, Nick Offerman, John Carroll Lynch, B.J.Novack, Patrick Wilson e Laura Dern
Confrontando o público desde seus segundos iniciais, através de seu protagonista Ray Kroc (Keaton), Fome de Poder parece acreditar fielmente que sua história servirá mais como exemplo, do que propriamente uma análise de um modelo construído por um homem cínico, mau caráter e covarde por trás da história da empresa símbolo da onipresença americana.
O problema que qualquer resolução ou uma possível acidez denunciativa pouco acontece, deixando um forte sabor propagandista jamais diluída ao contrário dos milhares de restaurantes espalhados ao redor do mundo. Tornando-se bem distante (pelo menos contextualmente) de obras que promovem realmente o debate como Nação Fast Food de Richard Linklater e principalmente o documentário Super Size Me de Morgan Spurlock. Fome de Poder ressalta através de seu contexto que a determinação – não que seja crucial – é mais importante que inteligência e educação de um indivíduo (como se um pessoa inteligente e educada não fosse determinada o suficiente para ter algum sucesso na vida). Assim, consequentemente acaba impondo o modelo da meritocracia como ideal sem levar em consideração que qualquer indivíduo de sucesso dependerá de fatores além do esforço pessoal – por isso sempre afirmo que a meritocracia é um dos maiores engôdos da nossa sociedade. E mesmo que por momentos alguma situação ainda permita uma reflexão, o que se sobrepõe é justamente a ideologia do empresário branco e ”determinado”.
Roteirizado por Robert D. Siegel de maneira até que corretamente didática, Fome de Poder é cruel com os fundadores Mac (Offerman) e Dick Mcdonalds (Lynch) por tratarem tais personagens inicialmente como elementos de uma fábula, empresários que jamais se demonstraram gananciosos e que se preocupavam com o bem estar dos seus funcionários (todavia, jamais receberam porcentagem e seus nomes não constam oficialmente como fundadores da rede de restaurantes). O antigo ganha – pão dos irmãos se tornou símbolo de um negócio completamente varrido pelo capitalismo selvagem e cruel personificado na figura de Kroc, cuja no conceito empresarial tinha como objetivo de tornar o McDonald’s numa “Nova Igreja Americana” – arrebatando milhões de fiéis a cada dia – confraternizando e “dividindo o pão”.
Num período que as empresas eram tidas como um negócio de família com um conceito mais modesto de lucro e cujo um lanche completo não chega a 50 centavos, os irmãos Mcdonalds criaram o conceito de atendimento rápido ao agilizar o preparo de maneira cirúrgica. Pensando também em detalhes simples como o fato do cliente não precisar de talheres se tornando um dos pilares do conceito Fast Food. Mas permeando toda sua exibição com uma propaganda do “Sonho Americano”, a obra jamais questiona ou se permite uma brecha para a crítica. Tanto que a fotografia de John Schwartzman é permeada por uma paleta colorida e acalorada para enaltecer o tom por vez fabulosa da história, mas em alguns casos é mais justificada e elaborada que necessariamente tentar enganar ao criar uma imagem de perfeição – e por vezes salientada com plano fechados e câmera lenta nas pessoas comendo um hambúrguer de maneira reverencial. Como na cena em que Kroc e Mac conversam no banheiro, tenhamos uma predominância do amarelo (uma das cores da empresa) como ressaltasse a onipresença da empresa (e até mesmo o sabonete assume a cor amarela).
Contudo, ainda é possível conseguir fazer uma análise lúdica e individual do personagem de Michael Keaton. Mesmo não conseguindo evitar certos maneirismos, o ator se destaca sendo suficientemente intenso e capaz de transformar seu personagem identificável em sua proposta diante do público. Um grande e sagaz observador que entendeu os conceitos do mercado como “Quanto mais suprimento mais demanda”, acurva de aprendizado além da conta sobre o negócio e principalmente escalonar o conceito de franquias de maneira jamais vista ainda na década de 50 (ele percebeu principalmente fonte de renda não viria das vendas dos sanduíches em si, mas todo o sistema imobiliário ligado a empresa).
Levando sua ideologia liberal e valorização da ambição até o fim do filme, Fome de Poder deixa bem que devemos sempre “Fazer pelo país o que ele não fez por você”. Mesmo que a questão não fosse julgar e ou condenar sua política de subjugação de outras empresas (e vidas), não podemos simplesmente aceitar determinados fatos (que não são somente inerentes ao McDonald’s) sejam jogados na nossa frente sem algum tipo de conseqüência – neste quesito, repito, o filme é bem omisso perdendo uma boa oportunidade em criar um intrigante debate. Não pensemos que a obra seja particularmente ruim (pois não é, e acho que até deveria ter sido mais visto) , até porque o longa não possui elementos narrativos que o prejudiquem tanto , mas após seu término resta o gosto de uma obra sem profundidade e superficial (intencional?) como os alimentos que a empresa produz – ainda mais , quando em seus créditos, tente empurrar no espectador uma propaganda humanista tão artificial quanto um Big Mac.
Cotação 3/5
Rodrigo Rodrigues
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