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Direção: Jacques Audiard

Elenco: Zoë Saldaña, Karla Sofía Gascón, Selena Gomez, Adriana Paz, Édgar Ramírez e Mark Ivanir

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Por mais que se diga, é quase impossível fazer hoje uma análise de Emilia Perez sem considerar os comentários racistas da atriz e do diretor feitos na ultimas semanas. Mas igualmente impossível também fechar os olhos para os problemas narrativos do filme; o que nos leva – mais uma vez – a pensar que as 13 indicações para o Oscar são mais um efeito da campanha da Netflix do que necessariamente méritos do filme.

Mas os méritos existem e não podemos jogar toda culpa em cima do diretor Jacques Audiard sobre os estereótipos como se fosse exclusividade dele ou desse filme (vide que toda produção americana sobre o país latino tem essa característica em comum), mas de qualquer forma eles existem trazendo esse peso para o longa. Li recentemente de um jornalista mexicano que a obra fica distante de tudo o que aborda, feita por gente que não tem conhecimento ou vinculo alguma sobre o assunto. O que é absoluta verdade!

Não há nada dentro de Emilia Perez que não consiga trazer ao publico uma visão fora do “padrão México” visto habitualmente nos filmes. Seria como se Audiard pegasse uma lista de itens que “deve” e “somente” ter naquele universo: narcotraficantes, presídios, famílias miseráveis, gente tatuada, procissão nas ruas exaltando uma figura quase religiosa etc… E quando tenta fugir disso é para falar de feminicídio! Contudo, ainda é bem vindo que a personagem de Emilia Perez seja vista, além da mudança pessoal, como símbolo dessa transformação para enfrentar a dificuldade política e social que o país tem em lidar com os desaparecidos; cujas principais maiores vítimas são justamente as mulheres sem notícias dos seus filhos ou maridos. No entanto, é uma dicotomia pelo filme não saber exatamente para onde deseja ir quando aborda os dilemas dos personagens principais.

EmiliaPerez_01 Crítica: Emilia PérezUm exemplo é quando Rita (Saldaña) – contratada por um chefão do narcotráfico para uma missão – acaba tornando tudo um pouco confuso porque parece que em determinado momento do longa, nunca sabemos o que a personagem de Saldaña se torna realmente. Não estou dizendo que isso é ruim, mas parece que é um problema maior do roteiro baseado na novela de Boris Razon que necessariamente uma qualidade sobre ambiguidade.

As inserções musicais são problemáticas quando precisam evoluir com a história. Sendo que apenas duas delas funcionem por serem mais elaboradas, mas ainda assim é muito pouco; e apesar de que Saldaña ainda consiga cantar em espanhol (ela tem ascendência Dominicana) conferindo um pouco de autenticidade, soa constrangedor que Selena Gomez (apesar de ascendência Mexicana) não fale a língua de Cervantes e precisa soar com um sotaque estranho que deve ser ainda mais agressivo para o público mexicano (mesmo assim ela é boa atriz suficiente para o papel de esposa de narcotraficante); fora que torna tudo ainda pior pela falta de representatividade de atores mexicanos o fato de Karla Sofia Gascon ser espanhola (sendo que a única presença nativa é da boa atriz Adriana Paz como Epifania, num papel representativo, mas ainda pequeno).

Reafirmo: não é proibido que um diretor retratasse um universo que ele não domine, mas que pelo menos tenha algum tipo de conhecimento e bom senso! Além de que há alguns diálogos que começam vergonhosamente cantados – e não há razão para existir já que não se não assumem como musical -, ao ponto que chega a ser um deboche como a cirurgia de redesignação sexual seja tratada no filme, como visto na sequência no hospital que sinceramente não sei como isso ajuda positivamente na discussão para o assunto tão vital para causa trans.

Se Zoe Saldaña é a ancora do filme sendo literalmente o elo dos universos dos personagens e como porta de entrada do espectador, Karla Sofia Gascon é a personificação atual do “Arte x Artista” devido a suas declarações nas redes sociais – mas, claro que a análise de sua atuação deve abster momentaneamente isso (inclusive, confesso uma grande surpresa quando dei conta de como Emilia Perez irá aparecer no filme). Assim, é visível que a forte presença da atriz confere a Emilia Perez uma força (não somente física em contraste com sua feminilidade), mas sem jamais deixar dúvidas em o que ela realmente quer ser. A boa atuação de Gascon – engrandecendo os dilemas sobre os atos de Emilia e a responsabilidade dos seus atos no passado, que hoje ela combate -, às vezes carrega o peso de um roteiro capenga que a personagem tenta a todo custo contornar por algumas situações soarem contraditórias.

Por exemplo, quando Emilia começa a liderar um movimento social, ela se expõe às câmeras, – e por viver um longo período em anonimato -, não é prudente essa ideia devido ao seu passado. Assim como o fato de um personagem a reconhecer imediatamente para outro momento, alguém que passou mais tempo com Emilia anteriormente, não a reconhecer. Fora que se era a intenção do filme abranger a discussão sobre a situação de vulnerabilidade das mulheres dentro daquele mundo de violência, é ironia que no seu ato final (apressado na sua solução e de certo ponto anticlimático) o diretor torne algumas mulheres convocadas por Rita justamente naquilo que o filme pretendia combater.

Como obra, Emilia Perez é desequilibrado em tudo em que tenta abordar (dilemas, musical e drama), mas transmite uma energia vinda da direção que me parece sincera, de verdade – mesmo que soe estranho aquele contexto, parecendo lidar com tais questões apresentadas mais baseadas no imaginário que necessariamente em uma causa que possa defender. Talvez seja isso mesmo.

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FB_IMG_1634308426192-120x120 Crítica: Emilia Pérez

Rodrigo Rodrigues

Você é chato demais com alguns filmes para alguém que diz gostar de Cinema. - Eu não “gosto” de Cinema. Eu amo Cinema! Mas quando não gosto do que vi, eu não engulo!
FB_IMG_1634308426192-120x120 Crítica: Emilia Pérez

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3 thoughts on “Crítica: Emilia Pérez

  1. O filme nao é nunca bom o suficiente pra Oscar, so chegou a ser cogitado realmente pela forçação de barra, mas tb ta longe de ser tao ruim qt o pessoal ta dizendo

  2. Sinceramente, como que essa porcaria ai chegou a ser cotada para oscar de melhor filme e como essa atriz chinfrim foi cotada pra melhor atriz so se explica em tempos de woke / lacration, tanto que uma musica feita por IA desbancou uma canççao linda do Elton Jon

  3. vc dourou a pilula, passou pano e foi elegante pra nao dizer que o objetivo do filme era claramente lacrar pra ganhar o Oscar em cima dessa necessidade hj em dia de acatar o discurso lacrador… e teria dado certo se nao fosse a atriz ser desmascarada como uma escrota e preconceituosa

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