Crítica: Animais Fantásticos e Onde Habitam (Fantastic Beasts and Where to Find Them)

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Animais Fantásticos e Onde Habitam (Fantastic Beasts and Where to Find Them)

Direção: David Yates

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Elenco: Eddie Redmayne, Katherine Waterston, Dan Fogler , Alison Sudol , Josh Cowdery , Faith Wood-Blagrove , Jenn Murray , Ron Perlman , Johnny Depp, Colin Farrell, Ezra Miller, Samantha Morton e Jon Voight

Cotação 4/5

Seria muito fácil para os realizadores retornarem a um universo já estabelecido como de Harry Potter apenas como uma aventura caça-níquel corriqueira baseada na saudade do público que cresceu com o pequeno bruxo. Entretanto, para a surpresa e alegria este Animais Fantásticos e Onde Habitam baseado no livro de Newt Scamander (pseudônimo de J.K.Rowling) é uma obra recheada com elementos novos , sem qualquer necessidade obrigatória de uma pré-conhecimento anterior dentro de uma narrativa visualmente cuidadosa. O diretor Dave Yates, depois de comandar os últimos quatro episódios de Harry Potter, apresenta novamente um mundo fantástico, mas como uma espécie de um contexto paradoxo onde esta atmosfera jamais é abandonada em conjunto com algo mais “real”; sem jamais cair no infantiloide de muitas obras adolescentes e ressaltando valores sem cair no moralismo barato, o filme é um belo exemplo de como uma fábula que pode amadurecer sem perder seu encanto.

Newt Scamander (Redmayne) é um magizoologista que chega a Nova Iorque dos anos 20 para uma missão de resgatar criaturas mágicas e salvá-las da extinção (uma espécie de Noé misturado com Darwin), enquanto a comunidade de bruxos se encontra numa grave crise pelo fato das seguintes exposições do mundo mágico diante dos humanos (trouxas, no caso) que poderiam comprometer a existência de ambos. Para ajudar a recuperar os tais animais e descobrir quem estaria por trás das aparições, ele terá a companhia da “agente” Tina (Waterson), de sua irmã Queenie (Sudol) e do humano Jacob Kowalski (Fogler).

Contando com o carisma do elenco, o roteiro não transforma aparentemente Newt num herói seguro de si e de seus poderes. Assim, Redmayne novamente apresenta um personagem com doçura, onde seus olhares e sorrisos estão sempre emanando timidez e fragilidade (inevitavelmente fazemos um paralelo com seus trabalhos anteriores como em Teoria de Tudo e A Garota Dinamarquesa), onde sua química com Tina sempre esta baseada em prol da história e de maneira singela sem forçar um interesse pessoal. E mesmo quando o roteiro insere o contexto romântico, entre Queenie e Jacob, por exemplo, a direção novamente é capaz de conduzir a ação igualmente de maneira sutil e delicada sem cair na pieguice – tanto que acabamos torcendo pelo casal. Para isso é fundamental a atuação de Dan Floger , que servindo com elo com o público , é suficientemente capaz de arrancar risos e simpatia para nos identificarmos com ele e com o relacionamento formado com a carismática e graciosa Alison Sudol.

Tematicamente falando podemos afirmar que o amadurecimento da abordagem do roteiro é notado nos contextos (e críticas) em que são inseridos alguns personagens principalmente o núcleo religioso do personagem Credence (Miller). Servindo ao fanatismo religioso e o adestramento feito em crianças para “servir ao senhor”, temos neste momento uma espécie de metáfora da idade média vinda diretamente de Salem praticando uma inquisição em pleno século 20 e que precisa da ajuda da imprensa para promover a luta contra a tecnologia vigente – tida como amaldiçoada – e é claro para defender as pessoas de bem (não sei por que me vem à mente nossa preconceituosa realidade diária). Todavia, alguns momentos são visíveis que a necessidade de focar no espetáculo visual, algumas frentes soem descartáveis, mal aproveitadas ou até mesmo confusas; como o personagem vivido por John Voight ou a questão do envolvimento do próprio Credence e uma das crianças do orfanato em que ele vive (Ezra Miller transformando seu Credence numa nova versão de Kevin – Precisamos falar sobre Kevin – retraído e vítima da violência doméstica e claro do fanatismo religioso). Assim como as motivações do personagem vivido por Colin Farrell também não são tão claras que junto com os pontos anteriores que acabam enfraquecendo a construção dos personagens, mas nada que possa atrapalhar muito o restante da narrativa.

Mas realmente o que chama a atenção no longa é a direção de artes e toda a concepção da cidade de Nova Iorque misturada ao conceito mágico em conjunto com a ótima reconstituição de época. Abusando de planos com grande profundidade a direção não omite os detalhes da cidade com seus carros da época, ruas e figurinos e inserida na maior parte do tempo numa fotografia acinzentada de Philippe Rousselot que consegue combinar as cores com a temática da cidade pré quebra da bolsa de 29 e em várias cenas com condições climáticas diferentes. Para engrandecer este cenário, até a trilha sonora é interessante ao apostar no Jazz em momentos que dão um clima mais descontraído e bem característico. Tal cuidado é estendido para o figurino dos personagens, principalmente aos agentes com suas vestimentas típicas de um estilo noir e para as mulheres, quando disfarçadas, por exemplo, usando os tradicionais vestidos da época.

Contudo, não podemos deixar de comentar a grande sacada de transformar a sede do congresso mágico numa espécie de QG da CIA nos anos 20, incluindo o tradicional emblema no saguão do prédio visto de cima. Com seu visual Art Déco o local é claramente inspirado na sede de MIB, onde o espaço é permeado de seres fantásticos de um mundo mágico que os humanos não têm conhecimento. Local este concebido como uma repartição pública com suas sessões, departamentos e burocracia, onde preocupação com os detalhes, com mise-en-scene dos elementos e objetos em cena são bem vindas, como podemos ver ao conhecermos o escritório de Tina são bem realizadas. Recheada de mesas e máquinas de escrever datilografando sozinhas e gavetas com vida própria são apresentadas de maneira discreta, mas extremamente eficaz e colaboram para incrementar aquele mundo mágico unificado com o conceito mundano.

Assim, a concepção visual dos personagens criados pelo CGI em sua maioria também seguem esta lógica, como visto nos animais apresentados que se tornam uma adaptação de animais selvagens ao mundo fabulesco (com exceção do combate final no clímax que o excesso da computação gráfica acaba se tornando cansativo e exagerado prejudicando o conceito criado). Outro bom exemplo desta adaptação e quando presenciamos a cena com o personagem mafioso (Ron Perlman) em quem somos apresentados a um cabaré e seus característicos personagens. Usando um humor que aborda uma temática infantil com adulta, a direção consegue atender os dois públicos sem desequilibrar a narrativa; como podemos ver na cena em que se passa dentro joalheria onde Redmayne se saindo- se bem com um humor mais físico, assim como na cena que ocorre dentro do apartamento de Tina em que Queenie usa seus poderes em Jacob causando uma enquete cômica mais apropriada para os adultos sem se tornar ofensiva ou descabida aos mais jovens.

Agradável e eficiente, este Animais Fantásticos e Onde Habitam ao mesmo tempo em que nos insere num novo mundo, criar uma base sólida que, bem aproveitadas, renderá outros cativantes momentos.

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Rodrigo Rodrigues

Eu gosto de Cinema e todas suas vertentes! Mas não aceito que tentem rescrever a historia ou acharem que cinema começou nos anos 2000. De resto ainda tentando descobrir o que estou fazendo aqui!

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