Crítica: A Ilha dos Cachorros (Isle of Dogs)
Direção: Wes Anderson
Roteiro: Wes Anderson, Roman Coppola, Jason Schwartzman e Kunichi Nomura
Elenco: Koyu Rankin, Bryan Cranston, Edward Norton, Bill Murray, Jeff Goldblum, Greta Gerwig, Liev Schreiber, Bob Balaban, Scarlett Johansson, Harvey Keitel, F. Murray Abraham, Tilda Swinton, Ken Watanabe e Yoko Ono
Nota 4/5
Em sua segunda animação, podemos reafirmar que o inconfundível estilo de Wes Anderson se adapta em qualquer gênero, independente de outros aspectos narrativos que trazem personagens (humanos ou não) com particularidades dentro de uma fábula. Se em O Fantástico Sr. Raposo (2009) o diretor trouxe a história de uma família de raposas como uma metáfora para discutir assuntos do conflitos do universo adulto (assim como agora, a animação não é exatamente para crianças), neste A Ilha dos Cachorros, Anderson novamente faz um trabalho de animação fabuloso para discutir assuntos sociais – como o preconceito – políticos e até ecológicos dentro de uma atmosfera que transita entre o singelo e os momentos em que desperta certa comoção. Portanto, para analisar a obra, é quase inevitável desmembramos a sua forma e conteúdo de maneira distinta, pois se o roteiro escrito pelo próprio diretor em parceria com Roman Coppola, Jason Schwartzman e Kunichi Nomura se apresenta problemático (falarei mais adiante), a animação em Stop-Motion é um caso à parte pelo extenuante (e belo) processo de realização, ainda que seja capaz de invocar um sentimento de ternura e beleza particular que casa perfeitamente com a proposta apresentada pelo diretor.
Iniciado com um prólogo contando uma fábula do Japão feudal em que duas dinastias representam cães e gatos, respectivamente, a obra já apresenta sua abordagem fantasiosa quando, nos dias atuais, o prefeito Kobayashi (Nomura) decide banir todos os cães da cidade devido a uma doença transmitida pelo animais, enviando-os para uma ilha usada como depósito de lixo, mesmo que os cientistas afirmem que há uma cura em progresso. Para dar o exemplo de seu engajamento e perversidade, o comandante decide enviar o cão de seu sobrinho Atari (Rankin) para o local, e consequentemente fazendo o jovem partir na busca do amigo canino na ilha de lixo e contando com a ajuda de um grupo de cães liderados pelo Chief (Cranston).
Não vou tentar me aprofundar mais no resumo da história porque a própria obra traz mais informações e núcleos que a animação deveria (um dos ditos problemas em seu roteiro); o que acaba causando um certo inchaço da história e perda de foco, como na inclusão da personagem Tracy (Gerwig) que tenta desmascarar as verdadeiras intenções criminosas do prefeito, a questão do atentado ao professor Watanabe (Ito), a tal disputa ente as dinastias, a busca em si de Atari pelo seu cão (tudo isso em conjunto com a necessidade em si de desenvolver os arcos dos personagens propriamente ditos).
Mas, estamos falando de uma obra de Wes Anderson que possui atrativos suficientes para quem acompanha e admira os trabalhos do diretor. Portanto, usando sua câmera sempre com planos e movimentos com os enquadramentos sempre feitos de maneira simétrica, o diretor ainda consegue imprimir um ritmo ágil e divertido, mesmo que tal narrativa, por momentos, seja quase comprometida pela inserções de flashbacks de alguns personagens que quebram um pouco o ritmo do filme.
Entretanto, isso não significa que tais indivíduos não possam ser admirados em suas construções, principalmente quando os personagens não humanos trazem personalidades próprias tão peculiares devido ao trabalho de um grande elenco que emprestou suas vozes. Além do próprio Bryan Cranston trazendo credibilidade e identificação de um personagem acostumado a crueldade que foi submetido a vida toda, ainda temos Edward Norton, Bill Murray (não seria um filme de Wes Anderson sem ele), Jeff Goldblum integrando os outros componentes do grupo de cães de personalidade distintas, fora Greta Gerwig, Liev Schreiber, Bob Balaban, Scarlett Johansson, Harvey Keitel, F. Murray Abraham, Tilda Swinton, Ken Watanabe e ainda Yoko Ono (interpretando uma cientista homônima) – e neste momento me alegro que a obra corra pouco risco de chegar ao circuito com sua cópias em versões dubladas.
Ademais, é bem vindo para a doçura daqueles pequenos personagens que, mesmo dentro de se apresentar auto suficientes de suas abordagens fantasiosas devido a sua interação com humanos, ainda apresentam tons inocentes como o fato da personagem Oracle (Swinton) ter um aura mística diante dos cães ao se manter informada assistindo noticiários. O que nos traz naturalmente de volta ao trabalho em que a animação se mostra o principal elemento narrativo de A Ilha dos Cachorros. Se normalmente já sou admirador do stop motion pelo fato do amor intrínseco que o mecanismo traz pelo processo de demorar dias para criar uma cena de segundos, aqui a obra ainda é permeadas de detalhes que engrandecem a narrativa.
Reparem, por exemplo, na desenvoltura que os personagens apresentam, o que, auxiliado pelas própria vozes citadas acima, dá um tom de naturalidade elogiável – assim como os pequenos, mas fundamentais detalhes, como os pêlos do cães se mexendo e as constantes lágrimas que os personagens deixam rolar em determinadas cenas. Fora que o design de produção é eficiente por criar diversos cenários de maneira distinta em que ocorrem as ações, locais degradados pela ação do homem e natureza, como um campo de golfe e uma fábrica abandonada. Ademais, a fotografia de Tristan Oliver (acostumado com animações) pontua de maneira correta os estados dos conflitos dos personagens, como podemos comprovar em um diálogo entre Chief e Nutmeg em que predominam cores mais escuras – como o roxo – valorizando a temática soturna e solitário do personagem, assim como o uso do contraluz para remeter ao passado em que a segunda fazia números artísticos.
Mantendo o interesse durante seu terceiro ato, mesmo que algumas pontas soltas realmente deixem de ser atendidas devido aos seus excessos temáticos (como a questão da disputa entre, digamos assim, os clãs que defendem os cães e o gatos não ser explorada), A Ilha dos Cachorros pode não ter um resultado como visto, por exemplo, em O Grande Hotel Budapeste ou Moonrise Kingdom, mas ainda é suficientemente capaz de criar uma empatia com seus sentimentos sinceros e emotivos dentro de uma narrativa envolvente.
Rodrigo Rodrigues
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eu assisti… tecnicamente é um apuro, e a gente chega a torcer pro filme ser otimo justamente pela parte tecnica, pelos fofuchos, pelas dublagens fantásticas… pena que nao passa de um mais ou menos… é aquela questao, queremos filmes bons tecnicamente, mas tb queremos que sejam funcionais, entre um filme mediano ainda que com excelencia tecnica como esse, e um blockbuster pasteurizado mas que funciona totalmente como Vingadores Guerra Infinita, acabo ficando com Vingadores, pq ele nao me deixa com esse sentimento de podia ser melhor, claro que tecnicamente os filmes sao incomparaveis, mas o segundo funcionou muito melhor como produto completo que o cult dos cachorros, o que nao deixa de ser uma pena
concordo em genero numero e grau
o filme tinha tudo pra ser uma obra prima mais umas escorregadas citadas pelo Rodrigo e uns vacilos meio novelescos e sentimentalismo impediram isso uma pena ainda assim um otimo filme
Raul Julia
Bem vindo
Os vacilos ou escorregadas, eu nem considero tão graves. É que o diretor não tem tanto estofo para trabalhar tais assunto, mas é bom que ele pelo menos tente. E mesmo assim o filme ainda se torna agradável
Abraços
bom filme boa critica bom site rsrsrsrsrsrs gostei
Termostato
Obrigado pelo elogio ao texto e ao site!
Se puder compartilhe nosso material
Abraços
muito top
gostei de como vc comentou do diretor ter esse estilo próprio e ter outros filmes dignos de nota pelo mesmo motivo, pq vc nao faz um artigo sobre diretores e seus estilos e cita filmes deles assim podemos procurar esses filmes
bom texto parabens vc passou muito bem a deia que o filme traz pra todos acho que vou assistir pq vc conseguiu desperta meu interesse
Americano
Bem vindo
Muito Obrigado pelo comentário e elogios sobre o texto! Fico feliz que tenha despertado seu interesse em assistir a obra. Isso significa que realmente transmiti uma ideia.
Abraço
achei bem legal, parabens pela critic mas de fato tem hora que a historia viaja muito tem flashbakc e vc se perde
Procc
Bem vindo
Bom que gostou do filme e obrigado pelo comentário!
Abraços
stop-motion e massinha me fascinam, com todo cgi a disposicao hj em dia, quem ainda trabalha com essas duas tecnicas merece todos os elogios do mundo, é muito amor ao que faz, muito mesmo
Licitante
Bem vindo
Realmente, uma obra de Stop-Motion merece um reconhecimento a parte. Independente da história!
Abraços
praticamente um TV Colosso melhorado!!!
kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
Melissa
Bem vinda
Acho que é um pouquinho mais que isso rs
Abraços
“Ilha dos Cachorros” traz a encenação característica de Anderson com o adendo do futurismo japonês, há também uma sociedade distópica e comentários sobre a cultura do medo e cibertecnologia. Há flashbacks em animação 2D e os personagens humanos falam apenas em japonês – em muitos momentos sem qualquer tradução. O hipsterismo de Anderson atinge seu grau máximo em um filme que tenta acomodar sua fascinação pela cultura japonesa, seu senso estético aguçado e uma vontade salutar de soar tão contemporâneo quanto milenar. Recomendo muito!
Sidão
Bem vinda
Obrigado pelo comentário
Abraços