Crítica: Glass Onion – Um Mistério Knives Out

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Direção: Rian Johnson

 Elenco: Daniel Craig, Edward Norton, Dave Bautista, Kate Hudson, Kathryn Hahn, Leslie Odom Jr., Jessica Henwick, Madelyn Cline, Noah Segan, Jackie Hoffman, Dallas Robert, Hugh Grant e Janelle Monae.

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Nota 4/5

Neste novo filme da “franquia” Entre Facas e Segredos, Rian Johnson se mostrou capaz de renovar conceitos de elementos pré-estabelecidos sem necessariamente desconfigurá-los, apostando em quebras narrativas que jamais descaracterizam o conceito original; além do mais, é bem vindo que o diretor reconheça o poder crítico que um filme pode oferecer ao trazer sempre grupos contemporâneos e desprezíveis diante da visão de mundo deles, de maneira didática.

Se, por exemplo, em Os Últimos Jedi, o filme traz uma elite exploradora da miséria galáctica, o diretor usou uma visão critica – contudo funcional – de uma família rica numa disputa de classe no bom Entre Facas e Segredos. Sendo assim, este Glass Onion: Um Mistério Knives Out mantém sua pegada influenciada pelo universo de Agatha Christie dentro de um jogo numa ilha isolada, como visto em O Vingador Invisível (1945); sendo levemente baseado no livro O Caso dos dez Negrinhos (1939), um dos livros mais vendidos da História, tendo depois o nome alterado para O Caso dos Dez Indiozinhos (!) e atualmente chamado de E Não Sobrou Nenhum.

Mesmo ao estabelecer na maioria dos personagens figuras dimensionais – no pior significado – de maneira rápida o suficiente para identifica-los (quem são e como agem), o diretor jamais os torna caricatos e desproporcionais ao ponto de perder alguma identificação, e reforça sua visão crítica ao contextualizar a história no período do lockdown forçado pela pandemia de Covid-19, mostrando o comportamento e a visão de vários deles ante aquela situação e mostrando alguns integrantes do grupo fazendo questão de não seguirem as medidas de distanciamento e uso de máscara. Até porque essas figuras na vida real são tão ridículas quanto podem ser. Seja o bilionário Miles Bron (Norton), a política Claire Debella (Hahn), a influencer Birdie Jay (Hudson), o reacionário – igualmente influenciador digital – Duke (Bautista).

Completando o grupo, temos o cientista Lionel (Odom Jr.), e a ex-sócia Andi Brand (Monae) que juntos, a convite de Miles, se encontram em uma ilha grega paradisíaca para um final de semana para um jogo sobre descobrir um assassinato contando com a inesperada ajuda do detetive Benoit Blanc (Craig); esse último, melhor ainda agora, sem o peso definitivo de James Bond (sim, a cena dele na água é uma gag visual com a cena de Cassino Royale), inserindo tons de insegurança aparente somente equivalente a sua rapidez e inteligência para solucionar um mistério.

E se Edward Norton apresenta um Miles seguro de sua genialidade misturado com o carisma que um bilionário traz (não para mim, ok?), Janelle Monáe mostra qualidade quando o filme se desenrola. Ademais, Duke, que deveria ser o mais absurdo de todos ajudado pela composição física bruta de Bautista, se tornar metaforicamente um dos mais reais pelo desejo por arma por complexo de frustração sexual/insegurança masculina; uma espécie de personalidade de extrema direita atual. E não poderia deixar de comentar a composição carismática de Kate Hudson para outro tipo de personalidade desprezível que inunda as redes sociais atuais.

Aliás, trazendo uma curiosa metáfora relacionada à tal cebola do título, referente a aquelas pessoas (“camadas densas, mas, na realidade, o centro – vazio- está à vista”), Rian Johnson é habilidoso até mesmo para não cair em armadilhas que acompanham filmes assim, apesar de que inevitavelmente elas estão lá; uma vez que, a partir do momento que reconta alguns “acontecimentos ocultados anteriormente” durante o crime, a montagem consegue manter o interesse do público nesse exato momento (ao contrário, por exemplo, dos recentes e bons filmes de Kenneth Branagh como Hercule Poirot em que ele usa esses elementos no final para solucionar o crime); ratificando que o crime em si acontece com quase 60 minutos de exibição. E se, ao contrário de Entre Facas e Segredos, onde o design trazia um ambiente clássico (uma antiga mansão), e favorecia o imaginário de seus detalhes, aqui o espaço mais aberto da mansão é usado como uma espécie de anfiteatro, favorecendo seu ritmo mais, digamos, explosivo que seu antecessor.

Mas o diretor sabe também quando e como usar outros pequenos elementos para quebrar uma pequena expectativa e gerar algum sentimento no espectador, seja através de uma tela dividida ou padrão de repetição – nesse caso a sonora. O maior exemplo é visto no quadro de Monalisa, onde os sons dos sensíveis vidros de proteção abrindo e fechando são incrementos com planos fechados nos olhos do famoso quadro, gerando a tensão pelo momento que está por vir.

Sem jamais deixar de apontar o dedo para aqueles indivíduos, o roteiro do diretor transforma a dinâmica com uma espécie de Twitter em Live-Action. Até porque sendo Miles uma espécie de Elon Musk, cujo pensamento “visionário” de quebra de sistema para melhorar o mundo somente favorece a ele mesmo, com sua ideologia extremista que vê Andi Brand como uma figura social “favorecida” que vive de “fazer-se de vítima” e sente orgulho de sua própria ignorância ao confundir “falar sem pensar com falar a verdade”.

Lembrando que Miles é um personagem sintomático nesse mundo em que a necessidade cultural do resto do planeta durante momentos de crise serve apenas para alimentar seu ego. E pior que não damos conta que eles, os mais favorecidos, que tem o poder para ajudar, serão justamente os responsáveis pela destruição de tudo. Sendo pelo orgulho, omissão ou ganância.

Glass Onion: Um Mistério Knives Out não tem a mínima intenção de ser uma espécie de Assassinato em Gosford Park ou uma paródia escrachada como Assassinato por Morte, mas é divertido e colorido e demonstra um controle eficiente de seu diretor, permitindo o desejo de mais aventuras de Benoit Blanc em outros filmes vindouros.

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FB_IMG_1634308426192-120x120 Crítica: Glass Onion - Um Mistério Knives Out

Rodrigo Rodrigues

Eu gosto de Cinema e todas suas vertentes! Mas não aceito que tentem rescrever a história ou acharem que Cinema começou nos anos 2000! De resto ainda tentando descobrir o que estou fazendo aqui!

17 thoughts on “Crítica: Glass Onion – Um Mistério Knives Out

  1. Nunca fui o maior fã de Star Wars e sinceramente esse lance de “acabaram com meu istá uór” é duro de aguentar, mas por outro lado sou muito crítico do Johson pois de fato encaixar as gags dele em momentos errados arruinou cenas que podiam ser incríveis, como o Luke recebendo seu sabre de luz da Rey, ou o General Hux sendo golpeado por Snoke de um modo ridículo após a fuga dos rebeldes no início do filme. Além disso, escolhas incompreensíveis derrubam a história, como a aventura no casino em Canto Bait e a chegada da Rey à nave de Snoke (se a nave que foi pro casino conseguia fugir da frota, e a Millenium Falcon com o Chewie tb conseguiu fugir após deixar a Rey, e, principalmente, se ambas conseguiram alcançar tanto as naves da First Order qt dos rebeldes, pq raios então ficamos vendo aquela perseguição idiota???). Mas o que mais doeu em todos foi sem dúvida o Luke ser um velho amargo, fugido, cheio de rancor e arrependimento, ter recusado o pedido de ajuda da Rey pra no final fazer aquela representação à distância e… morrer a toa. Um desperdício que tinha como objetivo fazer a Leia ser a protagonista do encerramento da trilogia. A impressão que eu tenho é que a soberba de Johnson o encorajou a tomar essas decisões ruins e seu comportamento pós reação dos fãs comprova isso: ele continuou achando que mandou muito bem. Claro que ta cheio de gente idiota reclamando até do protagonistmo de um negro e uma latina, qt a isso vc tem que ignorar mesmo, mas de resto, as críticas foram bem pertinentes. E o Mark Hammil endossa tudo isso, ele detestou trabalhar com o Johson, falou isso várias vezes, odiou o Luke desse novo filme e acha que o Episodio 8 foi um buraco no coração dos fãs de Star Wars. Mark Hammil é uma pessoa muito sensata qt a isso. Ele está certíssimo.

  2. bom filme, honra os who done it (filmes classicos de detetive) com humor e ironia, e autocritica, muito bom

    1. muito divertido, aqui o Ruim Johnson usou a desconstrução de maneira benéfica, fazendo o Blanc resolver o misterio de cara, isso sim é quebrar convenções de forma inteligente sem ofender fãs nem destruir legados, que é o que ele fez em Last Jedi inclusive tirando sarro dos fãs que reclamaram (ok tem os nerdolas que reclama de tudo mesmo e merecem ser zoados, mas os fãs conscientes que so nao queriam ver o Luke daquele jeito merecem respeito)

  3. Janelle Monáe é inexpressiva demais. No começo, com a “desculpa” de que era a ciclana e tal, nao podia dar bandeira, ainda engana um pouco. Depois, qd ela “se solta” a gente ve que ela é ruim de atuação mesmo.

  4. pra quem é fã da Agatha Crhistie eu recomendo os fãs de historias de detetive vao ver mil referencias aos livros dela no filme, recomendo

  5. o primeiro Knives Out é bem melhor, mas esse tb é bem divertido, ja quebra as espectativas logo no começo qd o Blanc mata a charada em 1 minuto e tem umas boas reviravoltas

  6. o Dave Bautista é um cara ate que consciente, falou que nao quer mais fazer filme da Marvel pq quer ser reconhecido como bom ator e quer papeis mais dramaticos e tal , ate ai tudo bem ta certissimo mas em contrapartida so fica tb pegando papel de marombado burrao nos filmes que faz, como o filme dos zumbis e agora esse ai, ele é sempre o mesmo parrudao de QI baixo… ae Bautista te dou uma dica de graça: se continuar assim, sua reputação será pior do que se fizesse so filme da Marvel ta falado

  7. filme bem divertido de descobrir quem dos suspeitos é o culpado, como nos livros de detetives da Agatha Christie e do Sherlock Holmes

  8. Rian Jonson mostra que é um diretor bom, mesmo tendo destruido Star Wars. O primeiro filme da serie Facas e Segredos é melhor, mas esse aqui tb é muito bom. Benoi Blanc é um Hercule Poirot moderno.

    1. Sim, ele é um bom diretor. Já provou isso.
      Mas discordo ele ter “destruído Star Wars”.
      Mas se pensássemos assim, tem uma fila enorme de executivos, outros diretores e fãs na frente.

    2. bom diretor ele é, pena que a vontade de lacrar foi mais forte que o conhecimento dele em Star Wars e ele se perdeu feio nisso, mesmo assim como ele é bom, o filme ainda saiu ate que bem feito, e qd dizem que ele “destruiu meu Star Wars” é pq graças às bobagens dele, ao que ele fez com o Luke e a Rey, o filme 9 ficou aquela porcaria la pra arrumar os erros dele e ate hj a Rainha Louca KK tem que ficar tentando corrigir os erros dele em series como Obi Wan e Andor, e como se diz por ai “a emenda é pior que o soneto” nunca mais vamos nos livrar de todos os problemas que esse desgraçado causou, o fandom jamais vai perdoar tanto a KK quanto o Ruim Johnson por aquele filme 8 e todo o mal que ele causou apesar que a culpa maior é da Maluquete Incompetente mor da indústria cinameatografica, capaz de pegar a maior franquia pop existente e fazer ela flopar com suas decisoes estupidas ao ponto de ter iniciado uma nova trilogia sem planejar o começo meio e fim, deixando pros diretores fazerem o que bem entendessem isso se me contassem eu nao acreditaria que o nivel de amadorismo de uma corporação de Hollywood chega nesse ponto

    3. Rian Johnson é um diretor medio/bom sim, mas tem relatos de muitos atores do filme Last Jedi de que tiveram diversos problemas com ele nas filmagens e ate o Mark Hammill reclamou muito que discordava dos metodos dele, do destino que ele deu a alguns personagens (ele mudou o roteiro conforme suas vontades) e ate da maneira como ele entendia Star Wars, teve declaracoes dele de que ele queria “acabar com os vinculos com o passado da saga” (algo que ele colocou ate num dialogo do Kylo Renn, ou seja, por ego, por motivacoes pessoais, ele fez coisas no filme que geraram todo o caos que veio depois e nem vou falar nada da falta de habilidade dele com o humor, no meio de uma cena tensa ou cena epica ele mete uma piada infame idi#ta e estraga aquele momento, enfim, se vc pega o pacote completo, ele nao é tao bom assim, nos filmes do Benoit Blank ele tem menos autonomia do estudo entao vc ve que a coisa nao desanda

  9. Tem uma minissérie britânica do Caso dos 10 Negrinhos que é excelente, a melhor adaptação de uma obra da Agatha Christie ate hj ja feita, absurdamente fiel e bem produzida. O único problema é que nós leitores ja sabemos o que ocorreu então perde um pouco a graça, mas a minissérie é excepcional, fica aqui minha dica.

  10. Caro Rodrigo Rodrigues

    Achei o texto excelente.

    Só não concordo 100%, porque achei os filmes do Poirot do Kenneth Branagh muito, mas muito ruins, e muito abaixo tanto dos filmes estrelados por Albert Finney (Oscar de melhor atriz coadjuvante para a belíssima Ingrid Bergman) e do Peter Ustinov, quanto da fenomenal série do David Suchet. Até a péssima adaptação de 2001 do Assassinato no Expresso do Oriente, com o Alfred Molina, é melhor que o filme do Branagh.

    Aliás, pelo menos na minha humilde opinião, esses filmes do Branagh só não são as piores adaptações de livros da Agatha Christie, porque nada supera os sofríveis “Caso dos Dez Negrinhos” de 1989 com o Frank Stallone (irmão do Rocky Balboa), e o “Punição para a Inocência” de 1984. Como se não bastasse esse último ser muito ruim (apesar do elenco estelar), ele tem uma trilha sonora maluca e totalmente desencontrada. Segundo reza a lenda, os produtores não quiseram contratar o fantástico Dave Brubeck, para compor uma trilha original, e acabaram pagando muito menos, para utilizar um de seus discos antigos, como se, por um milagre, a trilha sonora fosse combinar com as cenas do filme. Mas mesmo se fosse possível assistir ao filme, excluindo a trilha sonora, ainda sim ele continuaria sendo bem ruinzinho.

    Aliás, para quem estiver lendo, fujam desses dois filmes de 1984 e 1989, como o “Coisa Ruim” foge da cruz.

    Um abraço.

    Iuri Buscácio

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