Crítica: Oppenheimer
Oppenheimer
Direção: Christopher Nolan
Elenco: Cillian Murphy, Emily Blunt, Robert Downey Jr., Alden Ehrenreich, Florence Pugh, Scott Grimes, Jason Clarke, Kurt Koehler, Tony Goldwyn, John Gowans, Macon Blair, James D’Arcy, Tom Conti, Hap Lawrence, Christopher Denham, Kenneth Branagh e Gary Oldman.
Oppenheimer é um estudo de personagem dentro de uma dos mais covardes atos da história da humanidade ao usar a ciência para criar a arma mais destrutiva já vista: as bombas atômicas lançadas pelos Estados Unidos sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki culminando o fim definitivo da Segunda Guerra Mundial.
Dentro desse contexto totalmente indefensável, o diretor Christopher Nolan é hábil ao criar discussões morais através do cientista J. Robert Oppenheimer (Murphy), responsável pelo projeto Manhattan que criou a bomba nuclear na cidade de Los Alamos, no estado do Novo México, entre os anos de 1943 e 1945, assim que receberam a notícia de que os nazistas estavam à frente das pesquisas sobre a quebra das partículas que possibilitariam a construção de uma bomba.
Ambicioso em sua abordagem, tal elemento é feito quase de maneira transcendental com simbolismo religioso da ciência, não tentando justificar a existência quântica, mas uma nova visão sobre a relação do homem com elementos vistos como um poder quase divino numa narrativa com contornos épicos como Nolan está habituado a fazer.
Como aquele indivíduo encara a responsabilidade de criar um poder tão destrutivo e sua posição dentro do entrelaçamento da política americana diante do seu famigerado macarthismo (onde pensar em coletivo para o bem do país era sinal de comunismo, ao mesmo tempo em que falar em sindicalização de trabalhadores é algo mais grave que o fascismo nazista)?
Seja como for, um mundo se reformulando seria a justificativa para tanto? Até porque o nazismo foi derrotado sem precisar da bomba… Todavia, a permissão para tal crueldade partiu do presidente americano com ciência do governo russo. Mas o Japão mais cedo ou mais tarde iria se render devido aos intensos bombardeios sofridos. Ou o fato de que a continuidade das pesquisas não levou a Rússia a manter seus estudos sobre o assunto na Guerra Fria, teve relevância? Seria uma hipocrisia de Oppenheimer? Uma resposta ao nazismo, por ser judeu? Ou egoísmo em se achar o centro da atenção e que tudo deveria passar por ele sem saber que os cientistas poderiam ser descartados em prol da guerra? Inclusive ele serve quase como um messias do mal diante da comunidade cientifica e ao mesmo tempo lida com as crises do casamento.
Ou seja, uma série de questionamentos morais que o filme propõe a se fazer, não se limitando a narrar cronologicamente fatos que são de conhecimento comum. Inclusive devemos lembrar que historicamente o próprio Albert Einstein solicitou ao governo americano para acelerar a criação da bomba devido à vantagem nazista nas pesquisas; e ainda tem o fato de que Alfred Nobel, criador do prêmio da Paz, inventou a dinamite, mostrando como essa relação não é simples.
É essa uma das qualidades (temática) que o longa traz. Outras das discussões que podem surgir é de Oppenheimer soar parcial, pois o filme não mostra a visão japonesa diretamente. E nesse momento me dei conta novamente da moralidade que o filme discute, pois ficamos, uma vez que estamos no ponto de vista dos cientistas, na apreensão do sucesso dos testes de uma arma que irá matar mais de 200 mil pessoas inocentes. Mas o roteiro de Nolan não permite que deixemos de nos importar, pois a crueldade da política americana para as decisões tomadas para decidir (de maneira até pessoal) qual cidade iriam bombardear é sem precedentes.
Claro que temos a consciência do poder destrutivo de bomba no ser humano e o filme mostra isso de maneira rápida durante um discurso de Oppenheimer, mas o longa ainda pode ser acusado de uma visão unilateral. Tanto que o filme não teve a data de estreia confirmada no país nipônico como no restante do mundo. O que é algo mais que compreensível, até porque estamos falando de um filme de Hollywood e por mais que Nolan traga uma visão ampla do personagem, o cinema americano nunca agiu assim. O maior exemplo é quando John Ford, Frank Capra, William Wyler, John Huston e George Stevens fizeram filmes de propaganda americana durante a Segunda Guerra. E mesmo que tenhamos, por exemplo, Clint Eastwood em Cartas a Iwo Jima com as visões dos dois lados (americanos e japoneses), o filme sendo exibido no Japão é uma questão delicadíssima.
O roteiro do próprio Nolan é também hábil na medida do possível em trazer três linhas de tempo (pré-bomba, pós-bomba e a comissão sobre os atos de Oppenheimer). Tendo uma dessas linhas em que a fotografia de Hoyte Van Hoytematoma aposta num preto e branco que acaba tendo duas funções: uma para diferenciar aquele período dos outros dois e de como representar o estado sem vida daquele cenário político. Ademais, a montagem flui bem na maioria das vezes ao transitar por esses períodos e de maneira elegante nas transições entre as cenas; como visto durante uma aula de Oppenheimer há apenas um aluno, depois um segundo, e posteriormente a sala cheia para “explodir” o conhecimento representado num corte abrupto e rápido simbolizando o que aquilo irá resultar.
Claro que a complexidade da história dentro de seus 180 minutos pode cobrar um preço. E fiquei com a sensação por alguns minutos de que a montagem tem um peso muito grande para carregar, tanto que em determinado momento senti um pequena quebra do ritmo ali quando, por exemplo, os cientistas estão quase finalizando os testes e o filme volta ao ser um filme de julgamento e suas convenções (simbólico, portanto, que em tal situação o ator Rami Malek – sim, desde o “Filme do Queen” peguei certa implicância com ele – tenha uma importante participação).
Assim fiquei com a sensação de “não, volta para a bomba porque já tinha até esquecido essa parte do julgamento”. Incluindo, também a trama, não tão paralela, mas tangencial, sobre quem seria o responsável pela denúncia do passado de Oppenheimer e seu relacionamento com a comunista Jean (Pugh); assim como seu conflito com Lewis Strauss (Downey Jr fugindo) e uma reviravolta como algo do tipo em O Grande Truque que talvez não tenha tanto o impacto quanto poderia imaginar pelo foco nas consequências diretas do lançamento do artefato. Tanto que tal elemento narrativo é comprovado no gigantesco e excelente elenco e suas participações especiais como Casey Affleck, Kenneth Branagh e Gary Oldman (criando uma composição com tons de sociopatia, contrapondo com um figurino indefectível da gravata borboleta).
Surgindo inicialmente com a expressão abatida e olhar baixo, Cillian Murphy faz uma ótima composição que vai alternando entre a insegurança e autoafirmação de sua presença dentro da comunidade acadêmica e militar. O ator, que é colaborador recorrente do diretor, tem a chance aqui de ser o protagonista pela primeira vez (tirando o fato do ator ter sido escalado inicialmente para ser Batman na trilogia do diretor), e saiu-se muito bem em expressar sua angústia no olhar de assombro e de sentimentos mistos.
Importante falar também da ótima atuação de Emily Blunt como esposa, pois sua personagem é importante como um verniz de realidade na vida de Oppenheimer e alguém que também sofre com seus vícios.
Com uma linha sonora que aumenta a percepção do impacto tanto físico quanto moral da bomba, Oppenheimer faz um excelente trabalho na sua trilha. E o fato de trazer o som – no caso a falta dele – em momentos decisivos tornam-se decisões acertadas por parte da direção. Nem digo a explosão em si somente, que cada segundo de espera da explosão cria o contra ponto perfeito de maneira objetiva para engrandecer nossa impressão do ato. Assim como Nolan usa isso também de maneira subjetiva (visão do personagem) para criar uma rima em outros momentos em que seu personagem é alardeado pelos aplausos do público com tendo sua mente perturbada pelos gritos das vítimas ecoando na mente até sua explosão – como uma bomba atômica – de angustia e arrependimento.
Ao contrário, por exemplo, de A Origem, Oppenheimer não tem um peão que deixa em aberto o que na realidade ou não ocorreu no seu final, mas uma afirmação de uma mensagem clara sobre o risco que o planeta sempre correu. Ciente de sua participação e os fantasmas que carrega, Oppenheimer é capaz de mostrar como pingo de chuva é um pequeno ato que desencadeia uma onda de movimentos similares a uma bomba. E se esse pingo for substituído pela genialidade e ao mesmo tempo a crueldade humana, não restará nada.
Rodrigo Rodrigues
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TB esperava um pouco mais de ação mas não tem o q falar é um filmaço
Minhas considerações são que, embora haja muito a apreciar e muito a elogiar, o resultado é um verdadeiro desastre. O filme de Nolan é ambicioso, com vários momentos cativantes e brilhantes, mas eles não conseguem se sustentar sozinhos nem se juntar em uma única narrativa ou perspectiva convincente. Apesar de parecer abordar temas globais e até cósmicos, ele acaba indo por um caminho contido e restrito, sem abordar qualquer significado maior por trás dos processos da ciência ou da política. as principais histórias não são sobre a bomba. O laboratório de Los Alamos é o pano de fundo das três principais histórias: a vida romântica e os relacionamentos de Oppenheimer, as tentativas pós-guerra de seus inimigos para revogar sua autorização de segurança e um período ainda mais tarde em que Lewis Strauss – o fundador e presidente da Comissão de Energia Atômica dos EUA – enfrentou audiências do Congresso para confirmá-lo para um cargo no gabinete presidencial. >>> Muito tempo de tela é dedicado aos relacionamentos românticos e sexuais de Oppenheimer, nos quais as mulheres são retratadas como irracionais, histéricas, mentalmente doentes e/ou incapazes de apreciar/aceitar as demandas e pressões sob as quais ele vivia. Mesmo as poucas personagens femininas do elenco que não são alvos de interesses românticos do cientista – mais especificamente, as mulheres da equipe em Los Alamos – têm pouco a dizer ou são usadas para apresentar posições ingênuas ou excessivamente simplistas em comparação com a agitação e as considerações mais complicadas e sérias do “grande homem”. <<< Muito tempo de tela é dedicado aos relacionamentos românticos e sexuais de Oppenheimer, nos quais as mulheres são retratadas como irracionais, histéricas, mentalmente doentes e/ou incapazes de apreciar/aceitar as demandas e pressões sob as quais ele vivia. Mesmo as poucas personagens femininas do elenco que não são alvos de interesses românticos do cientista – mais especificamente, as mulheres da equipe em Los Alamos – têm pouco a dizer ou são usadas para apresentar posições ingênuas ou excessivamente simplistas em comparação com a agitação e as considerações mais complicadas e sérias do “grande homem”. Parece uma série de eventos em cadeia. Os eventos de sua vida são reunidos para formar uma espécie de colagem, com as partes misturadas em ordem aleatória e histórias concorrentes. Infelizmente, “Oppenheimer” não atinge a expectativa criada, se era essa a intenção. E o maior problema é que nenhuma das outras partes da história – especialmente a apresentação rasa de seus relacionamentos, uma tragédia e as cenas de sexo explícitas – não são remotamente tão interessante quanto o que se passa em Los Alamos. A cada poucas cenas no laboratório, a história de repente salta para a pequena sala em que Oppenheimer é submetido a horas de questionamento, ou para uma grande câmara do Congresso, onde testemunhamos perguntas e respostas.
mais um filme que conta so um lado da historia… infelizmente é o que temos pra hj
mais um otimo filme do Nolan, pena que lançado junto com o filme da panfletagem o que o fez perder bilheteria pior que o da panfletagem é bom tb kkkkkkkkkkkkk
talvez o melhor filme do ano… mas é capaz de perder premiação pra Barbie assim como perdeu bilheteria pro filme rosa… faz parte
um dos melhores filmes do Nolan… nao entendo bem a vontade dele de fazer uma biografia mas como sempre ele faz com maestria
filmaço! pena que teve que dividir atenção com a bobeira do Barbie
filme meio parado, tem gente que vai achando que será um A Origem com muita ação e se decepciona mas é um ótimo filme (calma que não é o “melhor do Nolan” nao caia nessa)