Crítica: A Chegada (Arrival)
Direção: Denis Villeneuve
Elenco: Amy Adams, Jeremy Renner, Forest Whitaker, Michael Stuhlbarg, Mark O’Brien, Tzi Ma, Max Walker e Abigail Pniowsky.
Conseguindo a proeza de mensurar o aspecto de uma jornada humana, mas ao mesmo tempo em uma escala global, A Chegada do diretor Denis Villeneuve não somente se torna uma das melhores ficções científicas em tempos como uma obra ao mesmo tempo passível de divagações a ponto de ficarmos marcados após sua exibição. Um belo e não menos melancólico drama pessoal e reflexivo sobre sentimentos humanos, onde invariavelmente estamos presos ao tempo, sem nos darmos conta da importância do ciclo que nos cerca, independente das dores a que estamos sujeitos.
Iniciando de maneira destruidora como poucos filme poderiam fazer, conhecemos a especialista em linguística Dra. Louise Banks (Adams) sendo convidada a servir como intérprete depois que 12 naves alienígenas, sem um motivo claro, estacionam em grandes cidades ao redor do mundo. A partir deste momento, obviamente, entra todo o medo por parte dos governos mundiais para saber quem são ou o que desejam os alienígenas. Trabalhando num ambiente exclusivamente masculino, Louise jamais tem sua capacidade posta em dúvida por questões de gênero (uma armadilha fácil para filmes medíocres). Auxiliada pelo cientista Ian (Renner), cria-se um elo sensível com o público por apresentar suas práticas acadêmicas não somente como necessárias para compreender as motivações dos visitantes (assim como uma metáfora histórica e antropológica para o primeiro contato em dois povos – ou raças – que jamais sabiam da existência uma da outra).
Vamos aos poucos adentrando aquela atmosfera de tensão (jamais terror) que abre uma série de discussões atemporais que vão desde a relatividade entre ciência x religião, da “lógica” do amor incondicional que podemos ter (apesar de todos os percalços que a vida traz), passando pela questão de como nós – habitantes do mesmo planeta – ainda vivemos numa sociedade dividida por fronteiras e individualismos.
Todos os conceitos por trás destas intenções não são facilmente explicados, mas jamais podemos dizer que são confusas. Remetendo diretamente a clássicos como 2001, Solaris e Contato, o longa dirigido por Dennis Villeneuve se mostra tão relevante na sua narrativa que o diretor se consolida como um dos grandes nomes da atualidade depois de obras como Sicário, Os Suspeitos e o Homem Duplicado. A narrativa sem grandes saltos aparentes consegue transformar uma simples cena em algo grandioso em emoções para o espectador devido também ao excepcional trabalho técnico da sua equipe. Auxiliado novamente pelo excelente Jóhann Jóhannsson na trilha sonora, somos inseridos numa atmosfera do desconhecido (com batidas que me remeteram a um canto de baleia), como na cena em que somos apresentados às naves junto com a protagonista ou até mesmo no detalhe para sermos inserimos dentro do ponto de vista da Dr. Louise quando, ao pôr o headset do helicóptero, o som automaticamente é adaptado para o que a personagem ouve.
Elogiável também é o belo trabalho de Villeneuve no uso das câmeras. Com movimentos sutis (e não menos belos) e enquadramentos que sempre estão criando uma lógica visual (auxiliado pela plasticidade da fotografia de Bradford Young remetendo bem ao estilo Emmanuel Lubezki em Árvore da Vida), as cenas são entrecortadas de maneira elegante e por vezes com um movimento de cima para baixo representando todo contexto alienígena. Villeneuve mostra durante toda a projeção completo respeito à inteligência do espectador sem jamais cair ou apelar para o sentimentalismo barato. Entretanto, isso não significa que não aborde o contexto (como visto no relacionamento da protagonista e sua filha), sendo que tudo é permeado de belos e delicados momentos para engrandecer o simbolismo entre vida e morte.
Simbolismos e metáforas que o longa traz até mesmo no linguagem alienígena visto em círculos como um ciclo que se inicia. Mas, o contato com os visitantes não somente abre espaço para as análises geopolíticas de um mundo de nações separadas cuja ação de uma delas poderia pôr em risco a existência de todos, assim nada mais admiravelmente lindo que a primeira frase dita por Louise para os visitantes no primeiro contato seja: ”Eu sou humana”. A montagem tem um papel fundamental para o impacto do filme , pois por mais que aparente que estamos vendo uma estória linear, somos surpreendidos e atingidos por seu desfecho. Todavia, a beleza do trabalho não está somente por organizar os eventos, mas, ao nos pormos no lugar da protagonista, sentimos toda a gama de sensações pelos eventos que ela percebe que terá que percorrer novamente (aqui mais uma vez comprovando o excelente trabalho de Amy Adams que a torna novamente uma fortíssima candidata às premiações).
Conseguir aglutinar dentro de um texto sobre um filme que abre tantas margens é quase uma prepotência, principalmente por envolver experiências tão subjetivas, universais e belas como são os sentimentos que somente cada um poderia sentir.
Cotação 5/5
Rodrigo Rodrigues
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A Chegada e Contato, meus filmes preferidos de tematica espacial
Altair
Bem vindo
Eu concordo com você !
Esta historia é muito interessante, eu gosto muito deste tipo de roteiro, te mantém no suspense até o final!! Revisei a trajetória de Denis Villeneuve e me impressiona que os seus trabalhos tenham tanto êxito, um dos meus preferidos é A Chegada por que faz com que o espectador se sente a ver o filme vale a pena vê-la, além de todo o elenco fazer uma excelente química.
bons comentários os do Oscar e da Raissa queria ver o critico se manifestar sobre eles seria um bom debate
Puxa vida, como são as coisas… eu li a crítica e concordei com tudo, ai vim ler os comentários e tb concordei com os que apontaram muitos problemas no filme rsrsrs… já não acho mais o filme tão bom.
Discordo do seu entendimento do filme. Achei decepcionante e amargamente abaixo das expectativas. Colocá-lo no patamar de um Contato, assim, se mostra um exagero. É de fato um ótimo filme, competente, tecnicamente muito bom, mas é “sem sal” demais e diminuto em alguns conceitos técnicos e filosóficos. SPOILERS: por exemplo qd os heptapods (nome ruim, parece que copiou Guerra dos Mundos, podiam ter pensado em algo melhor) dizem que estão ajudando os humanos para que no futuro os humanos ajudem eles, ali já se estabelece que então eles vieram do futuro e que portanto, tudo deu certo, e quebra-se a tensão e o suspense acerca do resultado da empreitada. Outro exemplo de pequenêz do diretor foi evitar mostrar imagens das naves até que a personagem as visse. A ideia foi boa, mas a realização não, pq teve vários jornais que a protagonista assistiu antes de ver pessoalmente as naves, então primeiro que ele mente ao tentar nos fazer ver as naves pelo prisma da Lois Lane, segundo que fica artificialmente “segurando” o visual das naves (em Godzilla isso é feito de forma mais natural e organica ao não mostrarem o monstro). Outro problema: o idioma dos pods era quase indecifravel, ai “do nada” ela não só entende como o pod que resta passa a falar muito com ela, rsrs, explica tudo, etc… não faz sentido. Ok, ela tenta explicar que “com o tempo se entende a lingua deles, ela passa a fazer sentido”, mas o que não explica é pq o pod antes não falava muita coisa e depois fala muito. O fato do pod Abbot “entrar em processo de morte” foi decepcionante… uma entidade tão avançada que previu a explosão, salvou os humanos, mas acaba ferido? Algo está fora de escala nisso. Outro ponto meu: pra mim, caiu no melodrama sim… talvez por eu ser mãe, me afetei mais que o crítico pelo drama da filha, o que acendeu a luz de alerta que isso foi proposital, então foi exagero do Villeneuve. A resolução geopolitica rapida e rasteira tb me incomodou, assim como a simples “saida em retirada” dos militares americanos, sem nenhuma explicação plausível nem nada. A reação do Arqueiro dos Vingadores rsrsrs abandonando a filha qd a mãe conta o futuro dela, fala sério, não condiz em NADA com o mostrado dele até então, não bate com o perfil psicológico dele, ou seja, é outro erro do filme.
Concordo com vc e acrescento outros problemas: a conversa com o general chines se da em um loop temporal paradoxal, já que nele a Amy Adams não lembra do que ela mesmo fez em um passado ligado àquele loop… até faria sentido, se todos os outros loops do filme (com a filha por exemplo) não tivessem uma atitude diferente, na qual ela tinha consciência do passado, dentro do loop (fora dele ela nunca tinha). Tb não gostei de qd o diretor nos engana ao mostrar sequencias que se revelam sonhos, isso é um golpe tão baixo de um diretor como é um diálogo expositivo pra explicar algo pro espectador. Uma pena. Outro ponto é o ato de levar as bombas pra nave… em um nível A++ NORAD CONCARIB e sei la o que de segurança Alfa Plus Mega Hiper, jamais os caras conseguiriam pegar e levar aqueles explosivos à nave de forma tão fácil. Do mesmo modo a linguista não deveria poder chegar la e entrar tão facilmente com o amigo dela. São situações necessárias pro andar da narrativa, mas pecaram em verossimilhança. A escrita dos aliens ficou boa, conceito bacana, inclusive o de que não se relaciona com sons, porem na hora H no fim do filme, o que era hiper-complexo e que “levaria anos” pra decifrar, foi esclarecido em uma piscadela, por conveniência do roteiro, ficou forçado, quebrou a suspensão da descrença. E o que dizer da sequencia do celular no climax? Boboca. A Amy Adams pega um celular de um agente master da CIA, nem desbloqueia e usa facilmente (se nem eu deixo celular sem bloqueio, será que a versão Eliot Ness da CIA na maior operação da História dos EUA faria isso???). Qd descobrem, vão atrás dela e ao invés de perguntar o motivo, já dizem que vão “matar” se ela não desligar. Heim?! rsrsrs… Outra coisa, em um momento mostra o Renner caminhando e eles ensinando pros aliens que aquilo era caminhar, e o alien até imita o andar humano… se o alien conhece esse conceito de imitar um ato feito por outro ser, por meio de gestuais que indicam que o que o ser está fazendo é aquilo que está escrito, então o alien podia fazer o mesmo pra ensinar sua linguagem, tipo, faz o gesto DELES para caminhar, e escreve no vidro e pronto, teriamos nossa Tabua (Pedra) de Rosetta pra decifrar a escrita deles. Mas… bem, em conclusão, acho o filme muito abaixo do que a crítica tem dito. Abraço!
Como fã de ficção científica me dói dizer que concordo com vcs Raíssa e Oscar. A concepção de A Chegada é muito boa, tecnicamente o filme é um primor, mas tem muitos problemas, como vcs já citaram.
Concordo com o Oscar e o a Raíssa… um filme muito bom tecnicamente nem sempre é uma grande obra audivisual (tipo o Cloud Atlas por exemplo). Arrival é bom mas tem esses problemas todos que vcs falaram. Queria a opinião do autor sobre as ponderações de vcs dois.
DS9/BSG
Obrigado pelo comentário por indicar o filme de Christopher Nolan.
Entretanto, devo discordar um pouco
O fato de incluir A Chegada no mesmo contexto de obras primas como Solaris e 2001 deve-se não somente pelo fato de SER sobre ficção científica, mas por também usar a ficção científica para construir uma obra reflexiva sobre a natureza humana – e o faz de maneira brilhante.
Não que Interestelar não seja um bom filme de ficção (um obra ambiciosa e particularmente tem momentos excelentes acima da média), mas ainda sim é problemática (tanto filosoficamente quanto tecnicamente).
Abraço
finalmente ficcao cientifica que é CIENTIFICA!!!
Solomon
Realmente, o filme é o que podemos chamar de uma autêntica Ficção científica – ao nível de grande obras como 2001, Solaris e Contato.
Obrigado pelo comentário
Coloca nessa a lista Interestelar, que é tão cientifico que fala de relatividade e redefine nossa visão de buraco de minhoca e negro.