Crítica: Unicórnio
Direção: Eduardo Nunes
Roteiro: Eduardo Nunes
Elenco: Bárbara Luz, Patrícia Pillar, Lee Taylor e Zé Carlos Machado
Nota 3/5
É impossível de se negar que os méritos de Unicórnio do diretor Eduardo Nunes o tornam um filme mais de sensações que propriamente passando pela necessidade de contar uma história de maneira tradicional. Entretanto, isso não é demérito algum, principalmente quando uma obra se mostra segura em sua narrativa e que, por mais “simples” que possa aparentar sua trama, quando juntamos as peças deste cenário, vislumbramos um poema de imagens que revela gradativamente um estudo da protagonista Maria (Luz) e sua transformação; e assim nos damos conta de um gama de sensações, medos e dubiedades. O diretor demonstra novamente sua habilidade para compor cenários de personagens presos dentro de suas rotinas, angústias e mostrando grande controle sobre a narrativa para contar uma história ou transmitir percepções que flertam até mesmo com o suspense. E assim, como feito no seu longa de estreia, Sudoeste (2011), Nunes apresenta sua narrativa de maneira contemplativa e sensorial para contar um estado psicológico através de planos minimamente calculados e invocativos.
Ademais, o roteiro do próprio diretor, baseado no conto homônimo de Hilda Hilst, é econômico em sua forma e (poucos) diálogos, onde o uso de longos planos, movimentos de câmera e cortes elegantes e lentos contextualizam o tom contemplativo (como visto no momento que Patrícia Pillar surge pela primeira vez em tela) que é somente quebrado mais para o final do longo para exaltar o urgência de Maria durante e a conclusão da história. Até porque, todas as informações sobre a “trama” em si se dão através de pequenos detalhes dentro da rotina da jovem e seu relacionamento com sua mãe, a chegada do estranho (interpretado por Lee Taylor) e o próprio amadurecimento da garota através de certos simbolismos, como podemos ver no momento que Maria manuseia uma suculenta fruta vermelha (elemento representando a violência e afloramento sexual).
Inclusive, logo na primeira cena da obra somos apresentados à floresta, habitada pelo unicórnio do título, a direção já insere o tom de fábula que durante o filme terá um significado contextualizado com a personalidade da protagonista e seu ponto de vista; o que de certa maneira ajuda na atemporalidade da obra, uma vez que oficialmente pouco sabemos onde ou quando se desenvolveu os fatos (claro, que ao inserir um instrumentos típico da cultura musical gaúcha – auxiliado pela própria paisagem e figurino – deduzimos que estamos situados no sul do Brasil, provavelmente do início do século passado, mais ainda sim sem soa específico).
Portanto, a fotografia de Mauro Pinheiro Jr. é a comprovação de mais um belo trabalho do diretor (como feito em Cinema, Aspirinas e Urubus) atingindo uma plasticidade única; e não seria nenhum pecado dizer que, em conjunto com o trabalho de Walter Carvalho em O Filme da Minha Vida, se torna umas dos melhores fotografias dos últimos anos no cinema Brasileiro. Mauro Pinheiro se aproveita da direção de Nunes e transforma cada cena de Unicórnio em uma pintura através do uso de uma palheta de cores bem definidas e fortes, realçando a planície verde do local e de todos os elementos e detalhes vistos em cena, criando de maneira eficiente o contraste (ou choque) quando parte do filme se passa no local que Maria dialoga com seu pai, cujo local é tomado por uma luz fria, permeado por azulejos brancos dando claramente a entender que se trata de uma instituição de tratamento. Uma espécie de purgatório como um choque de conceitos entre vida, morte e – obviamente – loucura.
Contudo, se elogiei – merecidamente – o controle da direção e seu exuberante aspecto visual, ainda assim há momentos que a mesma não consegue se aprofundar em algumas questões e o próprio aspecto da psiquê de Maria e a sua visão do mundo, tornando certas passagens arrastadas por demais, com diálogos expositivos por demais e arriscando sua fluidez durante seus 122 minutos, como visto na conversa entre a jovem e seu pai (interpretado por Carlos Machado, fora de tom) sobre assuntos complexos, como por exemplo, Deus e sua onipresença – fora que a inserção de uma passagem em animação como uma alegoria psicológica soa deslocada e desnecessária (o que em conjunto com a própria inexperiência da atriz prejudica ainda mais sua atuação e empatia com o espectador) como se quisesse apenas confirmar certa habilidade dos realizadores.
Enfim, finalizando de maneira até impactante, mesmo que até certo ponto não houve grandes surpresas se analisarmos como um gênero de suspense como dito anteriormente (mais ainda elogiável ao ser sutil em sua abordagem), Unicórnio expõe uma drama violento de maneira eficientemente delicado. Alguns podem o acusar de pedante, ou até mesmo de que usa sua beleza para disfarçar a falta de um enredo mais sólido, como uma analogia do copo meio cheio ou meio vazio. Todavia, ainda sim é admirável e belo.
Rodrigo Rodrigues
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enfim um filme brasileiro que se libera das amarras de estilo tao afeitas aos nossos diretores
Almaxarife
Bem vindo
Obrigado pelo comentário
Concordo. Somente tenho que discordar do “Enfim”, porque tem um bom tempo que o cinema brasileiro tem grandes exemplos de sair destas amarras. O problema que muitos destes filmes não chegam ao grande público com a facilidade de uma comédia da Globo, por exemplo.
Abraço e espero que continue a acompanhar nossos textos.