Críticas: As Viúvas (Widows)

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Direção: Steve McQueen

Elenco: Viola Davis, Michelle Rodriguez, Elizabeth Debicki, Cynthia Erivo, Colin Farrell, Liam Neeson, Daniel Kaluuya, Carrie Coon, Manuel Garcia-Rulfo, Molly Kunz, Garret Dillahunt, Kevin J. O’Connor, Jon Bernthal, Brian Tyree Henry, Jacki Weaver e Robert Duvall.

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Nota 2/5

Um dos fundamentos básicos sobre um filme é que, durantes seus 10 a 15 primeiros minutos iniciais são importantes para que o espectador sinta-se interessado naquela história que esta sendo apresentada. Obviamente há inúmeras exceções em que um filme consiga supera as expectativas mesmo que seu início se apresente confuso e desalinhado, algo que este As Viúvas não consegue fazer. Dirigido por Steven McQueen, a obra se apresenta verborrágica e vai se mantendo desta maneira durante boa parte de sua exibição.

Claro que o diretor de 12 anos de Escravidão e Shame traz consigo toda uma qualidade narrativa e uma série de contextos através de personagens conflitantes dentro de um cenário de opressão, principalmente contando com a ajuda de sua protagonista; o problema é que ao abraçar um gênero (algo que comentarei mais a frente), McQueen faz com que todas a discussões sejam diluídas como se não conseguisse manter um norte de onde desejava ir e tornado a experiência até frustrante, exigindo um esforço incomum ao espectador para identificar tais causas (o que neste caso, é um esforço prejudicial à obra).

Depois de morte de seus respectivos maridos em uma tentativa de roubo, quatro mulheres lideradas por Veronica (Davis) e sem nada em comum, decidem levar adiante um dos planos deles. Basicamente isso! Ou seja, um filme de assalto. Contudo, a trama ainda é recheada de sub-tramas envolvendo a questão imobiliária que prejudicam tanto os menos favorecidos, a disputa eleitoral entre Jack Mulligan (Farrell) e Jamal Manning (Henry) que pode se tornar o primeiro negro a vencer a eleição para vereador daquele local, a necessidade de incluir a igreja (que influencia milhares de seguidores) para se vencer esta ou qualquer outra eleição, a própria questão racial envolvendo Veronica e sua perda familiar e os conflitos particulares das outras mulheres envolvendo, por exemplo, violência doméstica, etc.

Assim, é facilmente percebido uma… não diria bagunça… mas peso demasiado ao longa, que faz com que a atenção do espectador se perca em seus longos 128 minutos. Sentimos e nos identificamos com aquelas mulheres que foram obrigadas a saírem de uma “zona de conforto” e lutarem por suas vidas diante de uma sociedade machista e misógina que as oprime (principalmente as personagens Linda e Belle, respectivamente interpretadas por Michelle Rodriguez e Cynthia Erivo, que  tem o peso na maternidade). Inclusive, para engrandecer o aspecto feminista, a maioria dos personagens masculinos seja vistos como moralmente reprováveis e frágeis, como o fato do personagem de Colin Farrell se mostrar dominado e inseguro principalmente através da figura paterna simbolizado na bem vinda presença de Robert Duvall – ou como o fato de Mulligan não agir sem uma aprovação de sua assistente (Molly Kunz).

E no extenso elenco, podemos dizer que não há ninguém ali que destoe. Portanto, a presença de Viola Davis é fundamental para trazer a credibilidade que não faz a obra se tornar enfadonha, onde a atriz imprime força, frieza ao mesmo trazendo uma dimensionalidade e dor diante da perda do marido e agora se vê sozinha. Sendo elogiável que o restante do elenco não se permita cair em caricaturas frágeis e mantenha seus dramas próprios sem sobrepor um ao outro.

Contudo, ratificando o que foi dito anteriormente, o roteiro do próprio diretor com auxilio de Gillian Flynn baseado no romance de Lynda La Plante, cria um emaranhado político-social que me parece demasiadamente mais complexo do que possa aparentar, mas ainda assim insuficientemente capaz de propor toda a discussão que sua fonte possa trazer. E quando a trama se direciona para o plano do roubo em si, tudo parece um grande esforço que acaba por se mostrar inútil, principalmente quando o roteiro aposta em velhos clichês de um típico filme de roubo que nem em obras como Oito Mulheres e um Segredo apresentavam. Claro que aqui é nítida impressão que o roubo em si soe mais como uma vingança social que propriamente uma vingança particular para viajar o mundo em roupas de grife; entretanto, tal situação passa por momentos forçados e coincidências que enfraquecem suas intenções. E nem estou falando pelo fato delas, que nunca demonstraram aptidão para o crime, conseguirem fazê-lo de forma tão competente (isso até é possível se relevar), mas alguns momentos soam tão inverossímeis que é difícil entender como o fato de não terem um mínimo cuidado em estudar o local do assalto para saber se haviam pessoas lá ou o fato de, ao precisar de uma informação que poucas pessoas saberiam, Alice (Debicki) use da sedução (que nunca teve, apesar de bela) para se envolver com alguém que ela conheceu e que coincidentemente tinha tal informação – assim como ficaram expostas demasiadamente indo a um hospital depois que uma delas se fere.

Fora que a necessidade de criar um conflito entre as integrantes do grupo soa expositiva, apenas como se houvesse a obrigação de projetar os dramas pessoais de cada uma no relacionamento entre elas como herança de seus maridos, como podemos ver em uma discussão entre Veronica e Alice que não agrega em nada apenas para soar um momento mais para um folhetim (ademais, se tentarmos discutir todo a relação entre o personagem de Liam Neeson, e o fato de que ele é o ponto em comum destas tramas, as coisas ainda se tornam ainda mais problemáticas; pois no fim ficamos sem entender realmente o que ele planejava e mesmo que tenho apresentado algum motivo, o mesmo se torna muito frágil para ser um estopim de tudo que acontece depois de sua morte).

Entretanto, por mais problema que possam trazer, a narrativa de McQueen se mostra efetiva principalmente quando se faz presente à única figura masculina que se impõe como Veronica de Viola Davis: Jatemme Manning de Daniel Kaluuya. Sempre imprevisível, o ator impõe uma presença e traz uma crueldade que por momentos me remeteu ao personagem Zé Pequeno de Leandro Firmino em Cidade de Deus.

Surgindo com um longo plano e com a câmera lentamente se movendo ao redor de uma de suas vítimas, Kaluuya demonstra realmente explorar um lado pouco visto depois de Corra! Como também podemos elogiar a capacidade da direção em criar uma tensão durante o clímax (mesmo com as decisões do roteiro citadas) através da trilha sonora, por exemplo. Assim como o fato do diretor invocar planos colocando os personagens fora de cena, aumentando a distancia para eles e entre eles, como na seqüência em que Mulligan discute com sua assessora dentro do carro. Como até mesmo na seqüência inaugural a montagem agiliza o entendimento e estabelece logo de cara o tipo de relacionamento entre os assaltantes e suas respectivas esposas. Mas, McQueen demonstra novamente problema ao inserir de maneira absurda uma reviravolta que por mais que alguém possa dizer que não esperava, ela é tão desnecessária e forçada que o conseqüente “embate” final soa deveras risível… Enfim. Fora que o uso de flashback contando a tragédia pessoal de Veronica é abrupto em sua colocação dentro da obra (soa deslocado); todavia, a seqüência é forte o suficiente por trazer o racismo escancarado, racismo este que tira vidas baseada na cor da pele.

Sem saber aonde ir e como ir dentro daquilo que se propõe ao apresentar, As Viúvas fica no meio do caminho e correndo o sério risco de se perder (e se perde). Podemos elogiar suas abordagens sociais como tentativas nobres de trazer a tona os problema de uma sociedade, mas longe de efetividade que se esperava e que o próprio diretor já se mostrou capaz.

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Rodrigo Rodrigues

Amante inexperiente da sétima arte, crítico por insistência, mas cinéfilo acima de tudo. Descobriu, nem tão jovem, diretores como Sergio Leone, Billy Wilder, Fellini, Bergman, Antonioni, Scorsese e sua vida nunca mais foi a mesma! De resto ainda tentando descobrir o que estou fazendo aqui!

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