Análise: o Snyder Cut é bom?

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Análise sobre a versão de Zack Snyder do filme da DC Comics, Liga da Justiça (Snyder Cut)

Finalmente o corte do diretor Zack Snyder para o longa da Liga da Justiça foi lançado. O filme tem tido ótima acolhida de público e críticas favoráveis, em termos gerais, ainda que no Brasil elas não estejam tão boas quanto no exterior.

Mas, afinal, o Snyder Cut é um bom filme mesmo? Ou só serve para os fanboys da DC e do próprio diretor (que, em um caso parecido com Cris Nolan, tem fãs próprios)?

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A pedido dos leitores do Maxiverso, resolvemos publicar esse estudo – diferente dos usuais aqui dessa seção da Análise – já sabendo de antemão que tudo o que se escreve a respeito dos filmes da DC do Snyder tem um belo potencial para polêmicas…

Qualidade x Gosto

Primeira regra para entender o filme e esta análise (e qualquer outra crítica em face de basicamente toda arte): a qualidade de uma obra não está necessariamente ligada ao seu gosto. Ou seja, você pode adorar um filme ruim, e pode detestar um filme bom. Não existe o “eu gostei então para mim é bom”. E não é porque você gosta de um filme, que ele é bom.

As especificações, qualidades e defeitos técnicos de uma obra existem com base nas convenções acerca de “certo e errado” que a maioria das artes, dentre as quais a cinematografia, possuem. Goste-se e aceite-se ou não isso.

Ou seja: existem preceitos aceitos por “todos” acerca do que é bom e ruim, tecnicamente, em um filme. Existem os jeitos certos e errados de se filmar, editar, enquadrar, fotografar e fazer quase todas as coisas que envolvem uma obra cinematográfica.

Obviamente, por não se tratar de ciência exata – e sim de arte – essas regras não são rígidas a ponta de não haverem exceções, e existem os que contornam esses preceitos de forma criativa, inventiva e até mesmo transgressora, e conseguem bons resultados.

O papel de uma boa crítica, portanto, é mostrar as nuances técnicas de uma obra e, diante disso, passar a impressão pessoal do crítico sobre aquela obra, de forma fundamentada, para que o leitor saiba o que, em termos técnicos, vai encontrar em um filme ao assistí-lo (lembrando que esse texto não é uma crítica de cinema).

E o leitor tem todo o direito de gostar ou não de um filme, independente desses preceitos técnicos. Mas os preceitos existirão, também independentemente do gosto do leitor.

Alguém uma vez disse com muita sabedoria: “Você pode não gostar do Poderoso Chefão, mas jamais poderá dizer que ele não é um bom filme”. Ou seja, você é livre para gostar ou não da obra-prima do Coppola, mas tecnicamente ele sempre será excelente, independentemente da opinião pessoal de quem o assiste, e isso porque justamente ele atende praticamente tudo o que existe no “manual do bom cinema”, em termos técnicos.

Expectativa x Realidade

Outra regra de ouro para qualquer arte é a relação entre o que se espera daquela arte que você vai apreciar, e o que você acaba encontrando quando finalmente você está diante dela.

Um filme – assim como um livro, por exemplo – deve sempre ser analisado “pelo que ele é, e não pelo que deveria ou poderia ser”. Ou seja, não se deve cometer o erro de se analisar, tecnicamente, um filme, com base no que você esperava dele ou, no caso de uma adaptação de quadrinhos, do que você leu nas revistas.

O gosto, sim, está sujeito a isso. Você pode assistir um filme com muita vontade de gostar dele, e se decepcionar nesse sentido. Mas, tecnicamente, tem que saber que a obra não foi feita para atender suas expectativas, sejam elas com relação à fidedignidade em face das HQs, sejam elas com relação ao estilo do diretor, etc.

Resumindo: Não adianta querer ver no Snyder Cut um Superman mais parecido com o dos quadrinhos, porquê Snyder vê o personagem de maneira diferente. Não adianta achar que caberiam menos câmeras lentas ou mais cores, ou que o filme deveria ter apenas duas horas de duração, porquê a obra tem que ser analisada pelo que ela entregou, e não pelo que você queria que ela entregasse. Ou pelo que ela deveria entregar, seguindo as convenções mais sacramentadas do cinema…

DarkseidSnyderCut Análise: o Snyder Cut é bom?O tal do Snyder Cut

Sem enrolação: do ponto de vista técnico, o filme é bom.

E absurdamente melhor que o de 2017, na realização. Mesmo com o cerne da história sendo o mesmo.

Considerando todo o acima exposto; considerando que o filme entrega uma obra coesa em tom, estilo, roteiro, edição e montagem; considerando que a visão do Snyder de cinema e dos heróis em particular é essa e não temos que esperar coisa diversa, mas sim analisar o que foi entregue por ele;

Considerando tudo isso, essa versão de Liga da Justiça é um bom filme de super heróis, que entrega o que promete a contento.

Dito isso, o espectador pode ou não gostar dele, por diversos motivos. O fã do “Snygod”, imagino eu, vai amar o filme. O cinéfilo, provavelmente não vai gostar muito, justamente pelos maneirismos do diretor e as regras cinematográficas que ele infringe. O leitor mais antigo de quadrinhos, principalmente o admirador do Superman, vai continuar torcendo o nariz para a maneira como Snyder entende – mal – o personagem (não importa quantas referências cristãs ele faça, aquele jamais será o Superman “dos quadrinhos”). Mas essas coisas não mudam a questão relativa aos aspectos técnicos desse (muito)longa metragem.

Marvel x DC

Infelizmente, vivemos em um mundo binário. Ou você é A ou B.

As pessoas parecem esquecer que você pode apreciar, ou não, ambos os lados, e ver neles defeitos e virtudes. Sem ser fanático por nenhum.

Aliás, o fanatismo é uma coisa absolutamente antinatural. Os extremos são.

E estou obviamente falando de tudo, não só de artes ou cinema.

Mas no cinema, tal qual nos quadrinhos, infelizmente esssa dualidade idiota existe. O brasileiro, ruim como poucos, importou mais essa bobagem sem tamanho da gringa. Muita gente, ao invés de apreciar o que há de melhor em ambas as editoras – ou estúdios – prefere torcer por um e contra o outro, e com isso, nubla seu julgamento e seu bom senso em detrimento de um fanboysismo infantil e estúpido. E estupidizante.

Lamentável.

Dito isso, o Snyder Cut não pode ser considerado nenhuma obra-prima como alguns fãs da DC já começam a dizer, e não é a porcaria que os fãs da Marvel tentam fazer parecer, por pura rixa. O filme tem defeitos e virtudes, mas no geral, consegue compreender qualidades que o deixam em um bom patamar.

Gostar ou não dele, como já dito, é outra história…

Mas, sem evocar os filmes da Marvel e nem o polêmico BvS, dá para comparar sem medo essa versão da Liga da Justiça, por exemplo, com o Homem de Aço, de 2013, do mesmo diretor, e dizer que os dois filmes estão em um mesmo patamar técnico.

Observações sobre o filme

Nota-se facilmente que, com a liberdade obtida, Snyder fez o filme que queria, como queria. Ele não parece querer agradar ninguém, a não ser ele mesmo. Virtude de um artista que se vê livre para fazer uma obra exatamente como quer e como raramente alguém pode, ou ego inflado de alguém que prefere pensar em si ao invés dos consumidores da sua arte? Você decide.

Por conta justamente dessa liberdade total, Snyder exagera em algumas coisas, para bem e para mal. A duração é uma delas, pois parece que ele não quis dispensar nenhum take filmado, de modo que muita coisa ali não serve à história diretamente, mas está no filme. Isso é um problema? Não deveria, considerando as questões mencionadas no início desse artigo. Se as quatro horas vão te cansar ou não é outra questão, mas o fato do filme ser longo e ter gordura na narrativa não é, necessariamente, um defeito, diante do fato, por exemplo, de que alguns fãs queriam mais quatro horas mostrando uma eventual batalha com Darkseid (até eu queria ter visto isso).

Da mesma forma, os ganchos deixados para uma eventual segunda parte, não são tecnicamente um problema. Diferentemente do apêndice final, que – ali sim – temos algo dissonante.

Os personagens novos ganharam, nessa versão, mais tempo de tela e, consequentemente, tiveram mais profundidade, algo obrigatório nesse quesito, diga-se. Deixar com o Ciborgue o “protagonismo” em termos de solução para o problema apresentado aos heróis, no entanto, foi algo dúbio: se tem o lado bom de sair do lugar comum e dar a um “coadjuvante” um papel importante na resolução da questão – assim como o Flash também acabou sendo crucial – por outro lado acaba fazendo pensar se, em uma equipe com o Batman, a Mulher Maravilha e o Superman, as pessoas querem ver um herói secundário sendo “protagonista”. Enfim, não deixo de pensar que se fosse diferente, isso desagradaria alguns que pediriam mais importância aos heróis secundários…

Uma pena, portanto, que o ator Ray Fisher, que interpreta o Ciborgue, seja tão inexpressivo, de modo que todo o drama pelo qual o personagem viveu acaba sendo demonstrado por ele de forma tão apática e rasa. Aproveitando, não dá para deixar de notar que com mais tempo de tela que não esteja relacionado a batalhas, ou seja, onde é mais exigida a técnica de atuação, a atriz Gal Gadot mostra-se tão fraca. Está ótima em Mulher Maravilha e até no BvS, e não chega a comprometer agora, mas é limitadíssima.

Por outro lado, vemos agora o Batman com uma personalidade mais adequada, principalmente com o mostrado em BvS, e sem as infames piadinhas que Whedon havia incluído. O Superman mostrado aqui é aquele esperado em termos narrativos (não se deve evocar as HQs para tal, como já dito), considerando o que ele passou nos dois primeiros filmes.

Aliás, falando em “termos narrativos”, vemos aqui uma Liga propensa à atos extremos, como inclusive matar vilões. Novamente, considerando apenas os filmes e não os quadrinhos, faz todo sentido, dentro do que foi mostrado e do “universo” criado por Snyder nessas três obras. Pode agradar ou desagradar quem assiste, mas não é nenhuma incoerência o modo de agir dos heróis, com exceção talvez da cena da Mulher Maravilha no começo do filme, onde vislumbra-se ali muitas outras medidas que ela poderia tomar sem chegar ao extremo de aniquilar o chefe da quadrilha, em uma cena que serve apenas para mostrar, no final, que o que ela faz com o Lobo da Estepe não é algo sem sentido.

Essa visão do Snyder acerca dos heróis e seu comportamento é influenciada pela Era Image? Ao que parece sim. Os heróis da DC, em seu âmago, são assim? Não. Mas, como já dito, a análise deve se ater ao que foi entregue nos filmes e não a comparações com outras mídias, mesmo em se tratando de uma adaptação.

Ainda, não há como não falar do personagem novo, alienígena, inserido no filme. Claramente sem orçamento para ter um CGI digno, ainda contou com um desenho de produção horrível, que nos faz pensar em “como foi que aprovaram essa concepção artística?”. E sua aparição só se justifica mesmo por sabermos que no futuro ele estaria ao lado da Liga, nas futuras batalhas que ela teria.

E falando em CGI, o maior problema do longa, além do equivocado formato 4:3 (já que desde a retomada do projeto o alvo era a TV), é justamente a qualidade ruim de alguns efeitos especiais que certamente não puderam ficar melhores porque havia uma verba limitada da HBO para tal, como por exemplo nas sequências envolvendo a batalha antiga contra os invasores de Apokolips.

Por fim, a trilha sonora também é problemática, é importante frisar. Sem uma linha visível de critério para sua adoção (o oposto do visto em Watchmen, por exemplo), e com dissonâncias incompreensíveis que fazem dela uma “salada” exagerada, a trilha se torna um ponto negativo da obra, ainda que acabe caindo no gosto de muita gente. E gostar ou não disso não tem relação com a sua qualidade técnica, como já vimos, de modo que cabe dizer que a única coisa nessa versão, que ficou pior que a de 2017 (que não era grande coisa, mas era coerente consigo própria) é justamente a trilha sonora.

Conclusão

A versão de Zack Snyder da Liga da Justiça (Snyder Cut) é um bom filme de super-heróis, e dá para gostar da obra se – como eu – você não se incomoda com os maneirismos, com o estilo e a estética do diretor, e nem com a maneira como ele vê os personagens, pois ela é bem diferente do que vemos nos quadrinhos.

Ou se você se incomoda, mas consegue separar as coisas e ver o Snyder Cut “pelo que ele é”.

Então, se aceitar que o filme terá câmera lenta em profusão, longa duração, tom soturno, heróis representados de uma forma bem particular, e uma visão característica de universo cinematográfico – totalmente distinta da Marvel, mas nem melhor nem pior, apenas diferente, diga-se – então é possível apreciar o filme e se divertir muito, pois agora (ao contrário da versão de 2017) o longa é coeso, bem montado, bem editado e linear em seu tom, além de ter uma narrativa que fecha o arco da DC iniciado com Homem de Aço e continuado com Batman vs. Superman, de forma coerente, mesmo com uma história que se resume a “mais do mesmo” em se tratando de super heróis, o que por si só também não é um defeito.

É basicamente a mesma história do longa original lançado nos cinemas, de fato, mas desta vez a execução está muito mais bem realizada.

P.S.:

E, para finalizar: não há nada de errado em alguém ser fã do Snyder e amar seus filmes, a despeito das “excentricidades” que eles trazem. Assim como ninguém é obrigado a gostar – e aprovar – seus maneirismos e seu estilo. E essas coisas nada têm a ver (ou não deveriam) com preferir editora A ou B ou analisar os aspectos técnicos de seus filmes.

Que fique bem claro.


Jabá:

Para quem gosta da Liga da Justiça, segue um guia informativo sobre o grupo, desde sua criação, passando por todas as fases nos quadrinhos, e terminando com as versões para a televisão (incluindo a aclamada animação Justice League Unlimited).

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Ralph Luiz Solera

Escritor e quadrinhista, pai de uma linda padawan, aprecia tanto Marvel quanto DC, tanto Star Wars quanto Star Trek, tanto o Coyote quanto o Papaléguas. Tem fé na escrita, pois a considera a maior invenção do Homem... depois do hot roll e do Van Halen, claro.

25 thoughts on “Análise: o Snyder Cut é bom?

  1. talvez a melhor analise desse filme que eu li, engraçado que vc começa o texto já destruindo os argumentos dos haters isso foi um tapa na cara do lacrador e do nerd tetudo que reclama de tudo kkk parabens

  2. melhor coisa é essa, esquece esse lance de Marvel x DC, assiste o filme e se divirta… ta bem melhor que o de 2017 mesmo, da pra curtir sem problema, é só não ver de madrugada pq ai vai bater o cansaço kkkkkkk ah e tb nao pode ser hater do Snyder senao vc nao vai curtir mesmo, ai nao da

  3. é, concordo com o autor… eu tava mega hypado pro filme mas agora repensando, nem tinha motivo, por mais que o Whedon mudou coisas, a espinha dorsal é a mesma, mas concordo com o autor, o filme do Snyder é muito legal e melhor que o do Whedon sim, nao tenham duvida, inclusive quem assistir sem muita expectativa como eu, deve gostar ainda mais

  4. Concordo em partes. Eu achei o filme mediano. Melhor que o do Whedon sim, mas mediano. A historia continua fraquinha. Superman continua um chato. Flash um babaquinha. Mas melhorou sim. Dar protagonismo pro Cyborg foi um erro colossal do Snyder.

    1. O filme é maravilhoso, chato é vc. Pra mim está no mesmo nível de Guerra Infinita, só abaixo de Ultimato, em termos de filme de equipe de heróis. Amei.

  5. Como é bom ler uma crítica de filme da DC sem achar que o cara é um fanboy da Marvel… parabens!

  6. perfeito o texto, so discordo da parte da trilha sonora, pra mim ficou otima, adorei mas so encheu o s*aco qd a MM aparece ai vem o tema do coral de igreja junto rs

  7. se todos os artigos sobre filme de heroi fossem assim, o mundo seria um lugar melhor e sem brigas kkkkkkk

  8. Vc é leitor antigo de quadrinhos e fã do Superman, a gente sabe. E mesmo assim gostou do Snyder Cut. Mas no seu texto vc diz que o fã de quadrinhos não vai gostar. Mas heim???

    1. Eu não disse que esse leitor antigo não ia gostar do filme, eu disse que ia continuar achando que a visão do Snyder pro Superman não bate com o personagem nas HQs. E realmente, eu não curto o modo como ele retrata o Superman. Mas, paciência, é o jeito dele de ver o Kal-El… rs… mesmo assim, gostei do filme 🙂

    1. Pois é, amiguinho, a gente bloqueou pq acreditamos no seu potencial! Temos certeza que vc consegue mandar um novo comentário, mas sem ofensa gratuita. Aceitamos opinião contrária sim (o site ta cheio de comentários contrários à visão dos textos), mas sem ofensas. Tenta lá, vc consegue!

  9. Ganharam um leitor assíduo! Parabéns por ser tão imparcial e analisar o filme sem ser um fanboy ou um hater.

  10. Parabéns Ralph por conseguir ser uma ilha de lucidez em um meio cada vez mais fanático e sem noção. Abordou o filme no que importa, relevando os aspectos técnicos e deu sua conclusão da forma mais lógica possível. Meus cumprimentos.

    1. Obrigado, Eliseu. A ideia é sempre analisar a parte técnica mesmo.

  11. Vcs criticos sao todos iguais cheios de querer dizer o que a gente deve gostar ou nao, pois pra mim vcs nao valem nada, eu assisto os filmes mesmo que vcs digam que é ruim

    1. Pelo contrário, Liz, se vc “ler” o texto (pq evidentemente não leu), eu informo justamente o contrário: nosso papel é te mostrar o lado técnico, e vc é quem vai gostar ou não do filme, independentemente dessa parte técnica. Outra coisa: engraçado como vcs tratam os críticos como se fosse uma massa unicelular agindo em conjunto com as mesmas ideias… qd na verdade são pessoas diferentes, cada qual com sua formação, ideias, cultura, conhecimento e opiniões distintas. Já imaginou se a gente tratasse “todos os leitores” como sendo uma coisa só? Pois é, não faria sentido.

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