18ª Dica p/ Novos Jogadores – BG Modernos Pré-Catan – Anos 60

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Acquire 2023 - Ludopedia

Esse é texto (18ª Dica p/ Novos Jogadores – BG Modernos Pré-Catan – Anos 60), é o décimo oitavo da série, e abordará os jogos de tabuleiro com características modernas, lançados nos anos 60, ou seja, muito antes do Catan e dos chamados board games modernos.

 

Dentro do universo dos jogos de tabuleiro, não há dúvida de que 1995 marcou o início da Era Moderna dos Board Games, com o lançamento do Catan. Por conta disso, falar em jogos modernos anteriores a 1995, inicialmente parece uma heresia, mas não é bem assim. Só para recapitular, os jogos de tabuleiro foram uma das principais diversões da família até o final dos anos 70. Nessa época, os computadores já começavam a chamar atenção, inclusive para utilização em residências.

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Imagem Ludopedia: Catan o início de uma era

 

Do mesmo modo, os videogames, em especial o Atari, já começavam a atrair o interesse da molecada. Obviamente essa ainda era uma diversão muito cara. Por isso muita gente continuou a jogar board games nos anos 80, mas cada vez mais eles foram perdendo espaço e relevância. E para quem não tinha videogame em casa, os fliperamas eram paradas obrigatórias. Quem viveu essa época sabe muito bem o fenômeno que isso representou e quanto se gatou de mesada nesses estabelecimentos.

 

No final dos anos 80, videogame já era uma coisa comum, mesmo no Brasil. Para piorar o cenário, com o início dos anos 90, a Internet passou a ser usada comercialmente em larga escala, e por pessoas comuns, em não apenas acadêmicos. Nesse cenário parecia que jogo de tabuleiro ficaria só na lembrança mesmo. Porém, em 1995 surgiu o Catan e tudo mudou. Não que o jogo seja superior aos outros, porque analisando friamente não é. Mas o que o torna tão importante é que ele apresentava uma proposta lúdica nova (vamos negociar ao invés de resolver no dado), que cativou corações e mentes. Isso ocorreu nos dois lados do Atlântico, tanto na Europa quanto nos USA. De repente, jogos de tabuleiro não se resumiam mais a apenas rolar o dado, e andar a quantidade de casas correspondente.

 

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Imagem Google: Atari 2600 e Apple II

 

Isso fez com que o gênio saísse da garrafa, para nunca mais voltar, e diversos outros jogos surgiram com propostas cada vez mais inovadoras. Não havia mais eliminação de jogadores, se ganhava mais por uma melhor gestão de recursos, os jogos coop começaram a ganhar relevância e a competição não era mais a única opção, a preponderância do fator sorte passou a ser um elemento totalmente ultrapassado, e diversas novas mecâncias deram as caras.

 

Essas, entre outras características, passaram a ser automaticamente vinculadas aos jogos modernos pós-Catan. No entanto, o que nem todos sabem é que diversos jogos, em maior ou menor medida, já apresentavam tais características, ou pelo menos uma delas, décadas antes do surgimento do Catan. Claro que o fato do Catan ter iniciado a Era dos Board Games modernos não admite qualquer discussão. Mas também é preciso considerar que muitos jogos já apresentavam características modernas muito antes do Klaus Teuber lançar sua obra prima.

 

Desse modo, os próximos textos da série vão destacar board games anteriores ao Catan, mas já com elementos modernos, começando pelos anos 60. No entanto é bom destacar que, por uma questão de espaço serão abordados apenas os aspectos gerais de cada jogo. Por isso, quem se interessar e quiser saber mais por alguns desses jogos, terá de procurar textos mais específicos.

 

ANOS 60

 

A década de 60 foi uma época marcada pela incerteza com a escalada da Guerra Fria. Havia um medo real de que uma terceira guerra mundial (dessa vez nuclear) eclodisse a qualquer instante. Na Europa, a antiga União Soviética construiu o Muro de Berlim, em 1961. Nas Américas, Cuba foi o palco da Revolução Cubana (1959), da frustrada Invasão da Baía dos Porcos (1961), e da Crise dos Mísseis (1962). Essa década também testemunhou a Corrida Espacial, colocando o homem em órbita, pela primeira vez em 1962 e depois o levando à Lua em 1969. Apesar do temor com a Guerra Fria, houve um aumento expressivo da taxa de natalidade no mundo todo, dando origem à geração “baby boomer”.

 

Nas artes, o mundo assistiu o nascimento da contracultura, do Movimento Hippie, e do Rock Progressivo. A Bossa Nova que surgiu no final da década anterior ganhou força e divulgou ao mundo a arte, cultura e música brasileira, de uma forma nunca vista, nem antes, nem depois. No cinema, o nouvelle vaugue francês propôs uma nova forma de filmar, que repercute até hoje. Esse movimento juntamento com o neorrealismo italiano influenciou o cinema brasileiro, dominado pelas chanchadas dos anos 50, o que levou ao Cinema Novo, que se consolidou na década de 60.

 

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Imagem Google: Frank Sinatra e Tom Jobim cantando “Garota de Ipanema”

 

Com o golpe de estado de 1964 teve início a Ditadura Militar, que duraria mais 20 anos. Esse foi um período de muita repressão, que provocou o surgimento da MPB politizada e músicas de protesto como reação à censura. Também foi o início dos grandes festivais de música das TVs.

 

Houve também um grande desenvolvimento da indústria, das técnicas e dos meios de produção, como resultado dos avanços da 2ª Guerra mundial. Isso foi fundamental para atender as demandas de uma população mundial em franca expansão. O setor dos jogos também se beneficiou, e muito, dos avanços industriais desse período, principalmente com o uso do plástico.

 

Seguem abaixo os board games com características modernas dessa época, organizados em ordem cronológica, de lançamento.

 

DIPLOMACIA (1959)

 

O Diplomacia é o jogo onde se manda o adversário para “aquele lugar”, mas de um modo tal, que ele fica louco para iniciar a viagem.

 

Logo de cara o primeiro jogo já sai um pouquinho do critério estabelecido, porque Diplomacia é de 1959, então tecnicamente não é um jogo dos anos 60. No entanto, devido a sua importância e grande influência ele foi incluído, entre os demais jogos da década. O Diplomacia é um jogo que aborda o período anterior à 1ª Guerra Mundial, lançado em 1959, com design de Allan B. Calhamer, e arte de Blake Beasley, Hugh Bredin, entre outros. O jogo é para 3 a 7 jogadores, com tempo médio de partida de 360 minutos. Seu peso é 3.34 e sua posição no ranking geral do BGG é 745 e no Ludopedia 1363. As principais mecânicas utilizadas no jogo são: Negociação, Controle de Área, Seleção de Ação Simultânea, Apostas e Blefes.

 

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Imagem BGG: Caixa original do Diplomacia

 

Esse é um wargame, mas que foge um pouco da receita criada por Charles S. Roberts em 1954, com o Tatics. Primeiro porque o tabuleiro não é uma grade hexagonal, e segundo porque comporta diversos jogadores e não apenas dois, como ocorre nos wargames mais tradicionais. Além disso, é preciso considerar que as regras de combate do jogo não são muito realistas e detalhadas, outra característica dos wargames. Isso porque esse não é um simulador de conflitos armados nos campos de batalha, mas sim da diplomacia por trás de tais conflitos.

 

No Diplomacia, os jogadores representam as potências europeias no período que antecedeu a 1ª Guerra Mundial, no início do século XX. Assim sendo, é possível jogar com Grã-Bretanha, França, Itália, Alemanha (Império Alemão), Rússia (Império Russo), Áustria-Hungria (Império Austro-húngaro) e Turquia (Império Otomano). Outra inovação é que diferente de outros wargames, no Diplomcacia os jogadores fazem suas ações simultaneamente, como será explicado adiante. Nos demais wargmaes as jogadas são aternadas entre os jogadores.

 

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Imagem Ludopedia: WAR x 1914

 

A Grow lançou o Diplomacia em 1973, incialmente com o nome “1914 o Jogo da Diplomacia” (estratégia comum e condenável da época, para evitar o pagamento de royalties). Curiosamente já existia outro jogo também chamado 1914, do designer Jim Dunnigan, publicado pela editora Avalon Hill em 1968, igualmente sobre a 1ª Guerra Mundial. Mas esse era um wargame para duas pessoas bem pesado, até mesmo para os padrões da época (peso 3.63 no BGG). Basta dizer que só o livro de regras possui 34 páginas e as partidas duravam mais de 6 horas. O jogo era super detalhado, com linha de suprimentos, unidades específicas, fog of war, e em algumas situações era necessário uma terceira pessoa como árbitro.

 

Alguns anos depois a Grow relançou o Diplomacia já com seu nome original. No início ele não fez tanto sucesso, porque as partidas demoravam muito, e porque era preciso muitos jogadores para o jogo ficar bom. Em contrapartida, o WAR de 1971, o maior sucesso e o jogo que levou à fundação da Grow, também demorava horas, mas era bem mais fácil de jogar, necessitando de menos pessoas.

 

Com isso, o WAR meio que ficou sendo o jogo de guerra para crianças e o Diplomacia o jogo de guerra para adultos. O WAR acabou prevalecendo pela simplicidade e porque desde essa época já havia a noção de que jogo de tabuleiro era jogo de criança. Esse é um preconceito que perdura até hoje, e dificulta bastante o desenvolvimento do hobby no país.

 

Uma coisa interessante é que as primeiras edições, tanto do 1914 quanto do WAR, utilizavam aquele mesmo esquema de caixa preta com letras brancas. Quando o jogo ressurgiu como Diplomacia a caixa ficou muito mais bonita e estilosa, com um mapa ao fundo e a imagem dos respectivos monarcas.

 

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Imagem Google: Diplomacia da Grow

 

Essa comparação Diplomacia x WAR é muito interessante porque demonstra bem o caráter moderno do jogo. No WAR a sorte exerce uma influência quase absoluta, e há uma grande possibilidade de eliminação de jogadores, já no começo da partida.

 

Já no Diplomacia não há sorte, e a negociação e formação de alianças é o forte do jogo, e daí o seu nome. Portanto, no Diplomacia o jogo não se resume a uma disputa de dados entre defesa e ataque, e vai muito além disso. A consquista dos territórios acontece através de movimentações estratégicas feitas em segredo e apoio de aliados.

 

O jogo começa na primavera de 1901 ocorre em duas fases, primavera e outono. Na primeira fase os jogadores declaram o que pretendem fazer e formam alianças. Na segunda fase os jogadores escrevem secretamente suas movimentações reais que em seguida são reveladas e os conflitos resolvidos. Cada jogador conta com dois tipos de unidades militares: exércitos e armadas.

 

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Imagem Ludopedia: Diplomacia – Tabuleiro e Componentes

 

Os jogadores têm quatro ações possíveis por turno. A primeira é mover uma unidade militar para um território adjacente, para tentar conquistá-lo. A segunda é apoiar uma unidade aliada no ataque a um território adjacente. A terceira é apoiar uma unidade aliada, na defesa de um território adjacente. A quarta e última possibilidade é manter a posição. Na fase de resolução, os jogadores podem ver se as alianças foram realmente honradas, ou se eram puro blefe.

 

Caso dois exércitos, ou armadas, ocupem a mesma posição compara-se os apoios e quem tiver mais peças ocupa o território. Em caso de empate, os dois exércitos, ou armadas retornam para a sua posição original. Assim sendo, a tensão constante, porque nunca se sabe se um aliado vai trair ou honrar uma aliança, e isso durante horas. Uma curiosidade sobre o Diplomacia é que ele foi o primeiro board gamer jogado pelo correio, isso se for desconsiderado o Xadrez, evidentemente.

 

O que faz do Diplomacia um jogo moderno, e o que o diferencia dos outros wargames da época é o seu foco. Nesse jogo as miniaturas e os mapas são o que menos importa. O espírito do jogo está na capacidade negocial do jogador de convencer os outros jogadores a se aliarem a ele. Isso faz do Diplomacia um jogo com uma interação altíssima.

 

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Imagem Ludopedia: Twilight Struggle e Rising Sun

 

Do mesmo modo a estratégia, principalmente de longo prazo também é crucial. A necessidade de antecipar as intenções dos oponentes é a mesma de jogos como Twilight Struggle. Do mesmo modo, a coordenação de ações com aliados, e o planejamento de movimentos cuidadosos também está presente em jogos como Rising Sun. Todas essas características do Diplomacia são marcantes e estão muito presentes nos jogos modernos.

 

Não há nenhuma dúvida de que o Diplomacia é um jogo datado e que talvez não tivesse a mesma relevância e influência se fosse lançado atualmente. Mas é preciso considerar que o Diplomacia já é um senhor de quase 65 anos de idade. Independente disso, Diplomacia é, sem dúvida alguma, um jogo de tabuleiro muito à frente do seu tempo, devido às suas características modernas apontadas acima.

 

 

MANAGEMENT (1960)

 

Esse é o jogo dos empresários e do mundo dos negócios dos anos 60!

 

O Management é um dos avôs dos jogos euros modernos e de administração de recursos. Ele é um jogo do lendário designer de wargames Charles S. Roberts de 1960, em que os jogadores são homens de negócios e magnatas. A Avalon Hill, empresa fundada por Roberts, já ganhava muito dinheiro com diversos wargames, e essa foi uma tentativa de diversificar seus produtos. Conforme o costume da época, não há nenhum crédito para o artista, então não se sabe quem foi o responsável pela arte do jogo. O jogo é para 2 a 4 jogadores, com tempo médio de partida de 60 a 90 minutos. Seu peso é 2.43, sua posição no ranking geral do BGG é 18.788 e, por enquanto não há ficha do jogo no Ludopedia. As principais mecânicas utilizadas no jogo são: Negociação, Leilão, Aposta, Blefe e Gerenciamento de Recursos.

 

Nesse jogo, os jogadores são empresários que atuam em diversos setores da economia como indústria automobilística, energia, mídia, energia. O objetivo é construir o maior império empresarial e se tornar o empresário mais bem sucedido.

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Imagem BGG: Caixa do Management

 

O jogo é composto por um tabuleiro cartas de evento e expansão, fichas de recurso e marcadores de indústrias. No tabuleiro ficam as áreas de expansão e investimento, das diversas empresas. As Cartas de Evento representam as diversas situações que afetam o andamento do jogo. As Cartas de Expansão representam as oportunidades de investimento e crescimento das empresas. As Fichas de Recurso são o “dinheiro” ou, melhor dizendo, os elementos que os jogadores utilizarão para viabilizar o desenvolvimento e crescimento das empresas. Os Marcadores de Indústrias representam o “poder”, ou influência de cada empresa.

 

A cada rodada os jogadores possuem duas ações: coletar recursos e investir em expansão. Assim sendo, primeiro os jogadores coletam recursos e em um segundo momento usam esses recursos para investir em suas empresas. Na fase de coleta, os jogadores recebem recursos de duas formas, ou diretamente conforme o nível de desenvolvimento e influência de suas empresas, ou através da venda de cartas de expansão em troca desses recursos. Na fase de investimento, os jogadores gastam os recursos coletados na compra de cartas de expansão para desenvolverem suas empresas, aumentando o seu poder e influência. O jogo tem um número pré-definido de turnos, e quando eles chegam ao fim, vence o jogador com mais pontos de vitória, calculados a partir da influência e poder se suas empresas.

 

Diferentemente do Diplomacia, o Management não fez tanto sucesso, nem é tão conhecido, e atualmente até existe alguma material sobre o jogo, e algumas imagens no BGG, mas não muito. Isso se deve a dois motivos, o primeiro que a temática é muito prosaica e pouco atraente, e as regras são muito complicadas para a época.

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Imagem BGG: Management – Componentes e Tabuleiro

 

Em relação ao tema, no Management o jogador é um homem de negócios, muito próximo de um homem de negócios real da década de 1960, e isso faz muita diferença. No Monopoly o objetivo também é ser o jogador mais bem sucedido, mas nesse caso isso significa apenas teminar o jogo com mais dinheiro. Então os dois jogos têm objetivos semelhantes, os papéis dos jogadores são semelhantes, mais o Management é praticamente de conhecido e o Monopoly é talvez o board game mais vendidos de todos os tempos, excluídos os jogos ancestrais, como Xadrez, Go, Gamão, etc.

 

Apesar da semelhança que é muito superficial, os jogos são bem diferentes. O Management é um jogo muito cerebral em que cada decisão conta. Já o Monopoly é muito mais simples, pois basta rolar o dado, andar as casas e ver o resultado. Além disso, no Monopoly o jogador não personifica nada, ele é apenas um jogador, enquanto que no Management ele tem um papel definido como homem de negócios, responsável por um império empresarial. As decisões do jogador no Management são bem próximas daquelas que um empresário na vida real teria de tomar, considerando evidentemente as limitações da época.

 

Com isso, não há como o Management fugir daquela sensação incômoda de que a pessoa está trabalhando ao invés de se divertindo. Isso é muito comum também nos jogos 18XX. Basta dizer que, por anos, diversos cursos universitários de administração, e universidades utilizaram o jogo como ferramenta de treinamento. Um exemplo de universidade que usou o jogo é a Harrisburg University of Science and Technology, da Pensilvânia.

 

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Imagem BGG: 18xx, o problema dos jogos “de volta ao trabalho…”

 

 

Outro fator que facilitou, mas ao mesmo tempo complicou a divulgação do jogo, foi a sua procedência. Nos anos de 1960 até os anos 1980, a Avalon Hill foi sem dúvida a maior empresa de wargames do mundo. Do mesmo modo, Charles S. Roberts era um designer famoso por criar esse tipo de jogo, que reconhecidamente é muito complexo. Desse modo, quando surgiu o Management essa fama da editora, e do designer, certamente facilitou a divulgação do jogo. No entanto, essa mesma fama dificultou sua popularização entre as pessoas comuns, justamente pela complexidade média dos jogos da Avalon Hill e do célebre designer.

 

Conta também em desfavor da popularização do Management o fato dele se aproximar muito mais dos jogos euro, do que dos ameritrashs, e de batalhas, que os norte-americanos tanto gostam. Nele o objetivo não é eliminar os adversários, mas sim ser mais bem sucedido financeiramente, através de uma gestão melhor de suas próprias empresas. Possivelmente, se o jogo surgisse em outra época e na Alemanha, se fosse menos complexo, e se tivesse novas edições que o atualizassem, talvez fizesse sucesso até hoje.

 

O passar do tempo e o progresso tornaram o Management cada vez mais datado e ultrapassado, e as instituições de ensino universitário paulatinamente abandonaram o jogo. Ao mesmo tempo ele não conseguiu um sucesso tão significante junto ao público em geral, apesar de ter uma pequena base de fãs. Com isso o jogo foi descontinuado em meados da década de 1970 e hoje é bem raro de encontrar.

 

A necessidade de um bom planejamento, a mitigação do fator sorte, e a marcação cerrada dos adversários, fazem do Management um jogo à frente de sua época, e lhe conferem sem sombra de dúvida características de um board game moderno.

 

 

FÓRMULA 1 (1962)

 

O ancestral do Downforce e dos jogos Rallyman

 

O Formula 1 é um jogo de 1962, do designer John Howarth e Trevor Jones, sem indicação do artista gráfico. O jogo é para 2 a 6 jogadores, com tempo médio de partida de 30 a 120 minutos. Seu peso é 1.70, sua posição no ranking geral do BGG é 4.667 e ele não tem posição no ranking Ludopedia. As principais mecânicas utilizadas no jogo são: Movimento de Área, Rolagem de Dados e Seleção de Ação Simultânea.

 

O jogo é composto por um tabuleiro, miniatura de carros, cartas de piloto, cartas de estratégia e marcadores de pista e tabuleiros individuais. O tabuleiro é onde fica a pista de corrida. As miniaturas dos carros são as peças que se movimentam pelo tabuleiro. As “cartas de piloto” mostram as características e habilidades únicas de cada piloto. As cartas de estratégia mostram as decisões e ações que os pilotos podem tomar durante a corrida. Os marcadores de pista marcam os pontos de vitórias. Os tabuleiros individuais conferem um chame único e muito temático ao jogo, ao reproduzirem o painel de um carro de corrida. Esses painéis marcam a velocidade, e o desgaste dos pneus e dos freios, indicando o momento em que é melhor trocar essas peças.

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Imagem BGG: Painéis Individuais do Formula 1

 

O objetivo do jogo é conseguir mais pontos de vitórias. Os jogadores conquistam esses pontos de vitória, cruzando a linha de chegada em primeiro lugar, completando mais voltas na frente e alcançando objetivos específicos. No Formula 1 é possível organizar campeonatos com várias partidas, em que o resultado de cada corrida dá pontos para cada piloto. Isso funciona exatamente como o circuito real de Fórmula 1.

 

No seu turno o jogador seleciona e joga uma carta de piloto e outra de estratégia, e essas cartas determinam a movimentação do carro. Além da movimentação, as cartas de estratégia possibilitam a realização de outras ações como bloqueios dos outros jogadores ou ultrapassagens. Ao longo da corrida alguns eventos podem ocorrer como mudança de clima, acidentes e problemas de pit stop. Além das ações extras, as cartas de estratégia lidam justamente com esses imprevistos.

 

O Formula 1 utiliza rolagem dados, o que implica que ele possui alguma aleatoriedade e algum fator sorte. Mas isso ocorre de forma muito específica, porque os dados não determinam a movimentação dos carros ao longo do tabuleiro, no estilo “role e mova”. Os dados entram em cena somente para definir a penalidade de um piloto que ultrapassa a velocidade máxima de segurança de uma curva. Por outro lado, a movimentação dos carros é determinada pelas cartas.  Essa é uma das características modernas do Formula 1.

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Imagem Ludopedia: caixa do Formula 1

 

Outra característica dessas é que há um equilíbrio entre simplicidade e profundidade estratégica, muito comum aos jogos modernos. Isso implica que o jogo moderno precisa ser simples para facilitar o entendimento das regras, mas não ser simplório a ponto de sacrificar totalmente a estratégia. Nesse aspecto, o Formula 1 inclui desgaste de pneus e de freios que são substituídos nos pit stops, o que confere uma camada estratégica muito maior. Por isso, o Formula 1 vai muito além de apenas rolar o dado, e fazer o carro andar a quantidade de casas equivalentes ao resultado da rolagem.

 

Do mesmo modo, o uso das habilidades diferentes para cada jogador também é uma característica moderna. O normal dos jogos clássicos é que todos os jogadores tenham as mesmas ações disponíveis. Criar ações ou habilidades específicas para cada um dos jogadores é algo bem mais sofisticado, e dá muito mais trabalho principalmente por razões de equilíbrio. Além disso, o Formula 1, apesar de usar rolamento de dados, valoriza muito mais a estratégia e o planejamento, o que também é uma característica moderna.

 

Evidentemente, o Formula 1 é um jogo muito antigo e datado, e teria muita dificuldade de competir com jogos mais modernos como o Downforce ou os Rallymans. Seria mais ou menos o mesmo que colocar para correr, lado a lado, o BRM de Jackie Stewart e o Mercedes de Lewis Hamilton. Mas, apesar disso não há dúvida quanto a modernidade do Formula 1, enquanto board.

 

HIGH-BID (1963)

 

O ancestral dos jogos de leilão de arte.

 

O High-Bid é um jogo de 1963, segundo o BGG (no Ludopedia o jogo conta como sendo de 1965). Os designers são Larry Winters e P. Winters, e a arte é de Stefan Thulin e Olle Sahlin. O jogo é para 2 a 4 jogadores, com tempo médio de partida de 25 minutos. Seu peso é 1.82, sua posição no ranking geral do BGG é 12.309 e ele não possui posição no ranking Ludopedia. As principais mecânicas utilizadas no jogo são: Negociação, Leilão e Colecionar Conjuntos.

 

Esse é outro jogo relativamente obscuro, de modo que existem poucas informações a seu respeito nos sites de jogos. No High-Bid os jogadores são colecionadores e negociantes do mundo das obras de arte. A mecânica central do jogo é “Colecionar Conjuntos”, de modo que as obras de arte são agrupadas em grupos de 3 a 6 peças. Evidentemente quanto maior a quantidade de peças de um conjunto mais valiosas elas são.

 

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Imagem BGG: High-Bid (caixa da edição original)

 

No início da partida, cada jogador inicia com uma carta de obra de arte, e com US$ 2.000,00, o jogador da vez revela a carta de cima do monte de cartas e tem início o leilão por essa carta. O jogador da vez também pode vender de 1 a 3 cartas para o banco, especialmente aquelas que não lhe interessam para adquirir mais dinheiro.

 

Cada carta traz o seu valor impresso, porém a venda para o banco depende de um rolamento de dois dados que determina o percentual do valor da venda, variando de 25% a 100% do valor da carta. A carta comprada pelo banco vai então para o local do tabuleiro correspondente ao percentual que o banco pagou e o vendedor pode comprar uma dessas cartas pagando o percentual correspondente.

 

Entretanto, se o resultado de um dos dados for “0”, o banco não compra a carta e ocorre outro leilão, iniciando por 25% do valor da carta. Dependendo da demanda por esse item, seu preço pode sair bem abaixo, ou bem acima do seu valor normal. Caso não haja nenhum lance nesse leilão, a carta volta para a mão do vendedor.

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Imagem BGG: High-Bid (tabuleiro)

 

O fim do jogo ocorre quando o monte de cartas se esgota, ou quando um jogador declara o final da partida. Só que para isso ele precisa ter US$ 5.000,00 somando seu dinheiro com o valor de suas cartas. Nesse momento, cada jogador revela quanto possui, em espécie e em cartas e quem tiver mais dinheiro vence o jogo.

 

Apesar de ter alguma sorte envolvida, o High Bid é um jogo bastante estratégico que vai muito além do simples “role e mova” dos jogos clássicos. É fundamental ter sangue frio e saber até onde se pode ir, ou até onde se pode forçar seus adversários a irem, nos leilões. Isso também demanda bastante estratégia, planejamento a longo prazo e boa leitura de mesa, o que demonstra o caráter moderno do High-Bid.

 

ACQUIRE (1964)

 

Acquire um clássico da gestão de recursos e administração do setor hoteleiro!

 

O Acquire é um jogo de 1964, do famoso designer Sid Sackson, com arte de Eric Hibbeler Scott Okumura e Peter Whitley. O jogo é para 2 a 6 jogadores, com tempo médio de partida de 90 minutos. Seu peso é 2.50, sua posição no ranking geral do BGG é 331 e no Ludopedia 688. As principais mecânicas utilizadas no jogo são: Negociação, Colocação de Peças, Controle de Área.

 

O jogo fez muito sucesso no mundo todo, a ponto de ter uma edição brasileira, lançada como Cartel, pela Grow em 1973. No Acquire os jogadores são operadores da bolsa de valores, comprando e vendendo ações de empresas do ramo imobiliário, realizando fusões e fundando novas empresas.

 

Aqui há um fato interessante, na comparação entre o Acquire e o Managemente, porque os dois têm como cenário o mundo dos negócios. Assim, se o cenário foi o que dificultou a popularização do Management, não há como explicar o sucesso do Acquire, que tem o mesmo cenário. Talvez a diferença seja que qualquer um pode comprar ações (Acquire), e muitos norte-americanos de classe média o fazem. Mas quase ninguém chega à presidência de uma grande empresa (Management).

 

Possivelmente o que determinou o sucesso do Acquire é que ele é mais divertido, e não aparentemente tão sério quanto Management. Talvez a diferença esteja no marketing dos dois jogos, e o do Acquire foi mais eficiente. Simplesmente não dá para saber, com certeza o motivo do sucesso muito maior do Acquire, mas o fato é que ele realmente foi muito mais bem sucedido que o Management. Basta dizer que mesmo sendo um jogo norte-americano, o Acquire foi um dos jogos recomendados (um degrau abaixo dos finalistas) pelo prêmio Spiel des Jahres de 1979.

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Imagem BGG: Acquire

 

O jogo é composto por um tabuleiro, peças de hotel, fichas de empresas, cartas de ações e dinheiro. O tabuleiro tem 108 espaços, onde se alocam as peças dos hotéis construídos. As Peças de Hotel (também no total de 108) são marcadores que serão alocados no tabuleiro, indicando em que local surgiu um novo hotel. Isso desencadeará uma série de efeitos, inclusive sobre outras peças. As Fichas de Empresas são alocadas sobre as Peças de Hotel, e representam as empresas fundadas, que podem se fundir com outras empresas.

 

As Cartas de Ações representam as ações de cada empresa, que são compradas e vendidas e determinam qual jogador controla cada empresa. O Dinheiro são os recursos financeiros utilizados para comprar as ações das empresas. O objetivo do jogo é terminar sendo o jogador mais rico. Para isso contam o valor do dinheiro, o valor das ações e o valor das empresas controladas.

 

No Acquire, a cada turno o jogador aloca as peças de hotel no tabuleiro, ocasionando efeitos diferentes, dependendo do local da alocação. Se o jogador colocar uma peça de empresa ou hotel, em um local sem nada em volta, nada acontece. Se o jogador colocar uma peça de hotel ao lado de outra peça ou entre duas peças “sozinhas”, ele funda uma rede de hotéis.

 

O jogador então coloca uma das fichas das sete empresas disponíveis, sobre as peças unidas, para indicar que fundou aquela empresa ou rede de hotéis. Esse jogador então ganha a primeira ação dessa empresa por ser o seu fundador, e passa a ter a possibilidade de comprar até três ações das empresas em jogo. O jogador também pode alocar uma Peça de Hotel ao lado de uma empresa que já existe. Isso aumenta o valor e o custo da ação daquela empresa.

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Imagem Ludopedia: Cartel – a versão brasuca do Acquire

 

Por fim o jogador pode alocar a peça unindo duas empresas. Quando isso ocorre, acontece uma fusão de empresas e a empresa maior absorve a empresa menor, que deixa de existir. Mas isso só ocorre com empresas com 10 ou menos hotéis. Nesse momento, são contabilizadas as ações da empresa maior, e quem tiver mais ações passa a ser o primeiro acionista, o jogador com mais ações em segundo lugar, passa a ser o segundo acionista, e assim por diante.

 

Cada jogador também recebe uma quantidade de dinheiro correspondente à sua posição na composição societária da empresa. Isso é importante porque o primeiro acionista pode trocar as ações da empresa absorvida por ações da empresa remanescente. Ele também pode guardar as ações da empresa absorvida, reabrindo-a em outro local, mas já possuindo diversas ações dela, e praticamente garantindo o controle acionário. Outra possibilidade é vender essas ações para outro jogador que tenha essa mesma estratégia.

 

O final da partida acontece quando quatro empresas atingem um tamanho de 11 ou mais hotéis, ou quando uma única empresa cresça ao ponto de sozinha ocupar 41 espaços do tabuleiro. Nesse momento, o dinheiro de cada jogador conta seu dinheiro, incluindo o valor de suas ações, e quem tiver mais dinheiro é o vencedor.

 

O Acquire foi um jogo muito importante, porque representou mais uma tentativa de aproximar o mercado americano dos jogos mais negociais e de gestão que já surgiam na Europa, em especial na Alemanha. Em 2023, a Renegade Studios, uma editora de jogos parceria da Hasbro que detém os direitos do jogo, lançou uma nova versão atualizada do Acquire.

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Imagem BGG: Acquire – componentes

 

Merece destaque também a pessoa do designer, porque Sid Sackson é um verdadeiro mito dentro do cenário de board games norte-americano. Isso especialmente nos anos 70, quando esteve mais ativo e seus jogos obtiveram mais sucesso.  Ele criou bons jogos como Acquire e Can’t Stop, e também atuava como um grande divulgador do hobby, escrevendo para revistas e participando de convenções.

 

Sid Sackson também era um grande colecionador, principalmente porque recebia uma infinidade de jogos para resenhar e divulgar. Quando ele faleceu, sua coleção já tinha atingido um tamanho praticamente inimaginável de mais de 18.000 títulos.

 

Quanto à modernidade do Acquire vale destacar que o jogo não tem sorte, que ele exige uma estrtatégia de longo prazo, que não há eliminação de jogadores, entre outras. Essas características são totalmente diferentes dos jogos de tabuleiro padrão da época, principalmente os da escola norte-americana.

 

Outro ponto também é que Acquire se baseia na gestão eficiente de recursos, e nada é mais moderno que isso, em termos de board games. Essa característica inclusive une jogos bem simples (Splendor), jogos médios (Power Grid) e jogos mais pesados (Brass: Birmingham). Também não se pode esquecer a variabilidade estratégica, muito presente em jogos como Agricola e Terra Mystica. Mesmo não havendo tantas ações disponíveis, ainda assim a estrutura do jogo oferece diversos caminhos para o jogador adaptar sua estratégia em busca da vitória. Isso tudo faz do Acquire um genuíno board game moderno, em plena década de 1960.

 

 

NUCLEAR WAR (1965)

 

Nuclear War, o jogo do absurdo da guerra absurda!

 

O Nuclear War é um jogo de 1965, do designer Douglas Malewicki, e com arte de Steven S. Crompton, Gary Freeman e Brian McCrary. O jogo é para 2 a 6 jogadores, com tempo médio de partida de 60 minutos. Seu peso é 1.44, sua posição no ranking geral do BGG é 3.558, e não há colocação no ranking do Ludopedia. Esse jogo é uma sátira bem humorada, de um assunto muito sério nos anos 60 que era a Guerra Fria e a proliferação das armas nucleares. As principais mecânicas utilizadas no jogo são: Toma Essa, Negociação e Movimento Programado.

 

Alguns anos após o enorme susto causado pela Crise dos Mísseis de Cuba em 1962, o mundo já conseguia respirar aliviado. Nunca se chegou tão perto da 3ª Guerra Mundial e de um holocausto nuclear. Três anos depois já dava até para fazer piada da situação. Foi nesse cenário que nasceu o board game Nuclear War. Em Nuclear War, cada jogador representa uma potência nuclear da época. O jogo é composto por tabuleiros individuais, um tabuleiro com um ponteiro giratório, cartas de população, cartas de ataque, cartas de defesa, e cartas especiais.

 

Os tabuleiros individuais são os locais onde o jogador alocará suas cartas de população e baixará as outras cartas. O tabuleiro com o ponteiro giratório determina se o ataque nuclear falhou ou funcionou, e seus efeitos. As cartas de população representam a quantidade de habitantes de cada nação, se essas cartas se esgotarem o jogador está eliminado. Cartas de ataque servem para lançar ataques nucleares contra os adversários. Para isso é necessário jogar uma carta de plataforma de ataque (um foguete) e logo em seguida uma carta de ogiva (que possuem força variável) que estará nesse foguete.

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Imagem Ludopedia: Nuclear War 1965

 

As cartas de defesa são as contra medidas que uma nação utiliza para se defender de um ataque nuclear bem sucedido, como cartas antimísseis. As cartas especiais são as que trazem efeitos imediatos que modificam o jogo. Entre essas, estão as cartas de propaganda que são a alma do jogo. Elas permitem que você roube parte da população de um adversário sem que isso implique em um ataque nuclear direto. Além disso, como as pessoas vão para o seu país, isso te dá mais condições de sobreviver a um eventual ataque de outro jogador.

 

O jogo se divide em duas fases: a paz e a guerra. Cada jogador começa com uma mão de nove cartas e coloca duas delas na ordem que pretende jogá-las. Quando todos fazem isso, é aberta a primeira carta do primeiro jogador e seu efeito resolvido. Após isso ela é descartada, a segunda passa a ser a primeira carta, e o jogador baixa mais uma carta. Por enquanto, o jogo está na fase da paz, e só nessa fase, as cartas de propaganda têm algum efeito. Estas cartas interferem diretamente nas outras nações, “roubando” seus habitantes.

 

Em dado momento, um jogador pode abrir uma carta de plataforma de lançamento de ogivas (foguetes ou bombardeiros). Nesse momento todas as outras nações ficam em alerta máximo, porque se a carta seguinte desse jogador for uma ogiva nuclear, isso significa que ele atacará um dos outros jogadores. Para evitar isso, os jogadores fazem alianças entre si, e pactos para atacarem outros países, que podem ser honrados ou não. Da mesma forma, os jogadores mais precavidos podem lançar cartas de defesa, para o caso de serem alvos de ataques bem sucedidos.

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Imagem BGG: Nuclear War – componentes

 

Se a segunda carta do jogador atacante não for uma ogiva, na verdade tudo foi um blefe, e nenhum ataque acontece. Mas se a carta for uma ogiva, esse jogador efetivamente fará um ataque e deve escolher um alvo. Em seguida ele roda o ponteiro do tabuleiro geral, para ver se o ataque funcionou e o quanto. O jogador atacado por em prática suas defesas caso tenha jogado a carta correta, e inclusive contraatacar seu atacante.

 

Começa a fase da guerra e as cartas de propaganda lançadas não tem mais efeito algum, mesmo nos países fora do conflito. É muito comum que um ataque de um jogador contra o outro desencadeie uma onda de ataques e contra ataques entre os outros jogadores. Quando se esgotarem as cartas de ataques ou após a resolução de todos os ataques, o jogo retorna à fase da paz e o processo se reinicia.

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Imagem BGG: Nuclear War – cartas

 

Se um jogador perder totalmente sua população devido a um ataque, mesmo que ele não tenha jogado as cartas corretas, ele ainda pode fazer um contra -taque com todas as cartas da mão. Ele é eliminado, mas leva o atacante junto com ele. Isso inicia uma reação em cadeia, que pode eliminar todos os jogadores e a partida terminar sem ganhador. Isso porque o atacante eliminado por um contra ataque final, por sua vez também pode fazer um contra ataque final e assim por diante. Na verdade essa possibilidade de ninguém ganhar é propositalmente comum, porque o objetivo do jogo é justamente demonstrar, com muito bom humor, o absurdo de um conflito nuclear, em que não há vencedores e todos acabam perdendo no final.

 

Nuclear War é um jogo muito datado, por razões óbvias, e a própria arte do jogo é bem característica da época. Atualmente a probabilidade das nações iniciarem um conflito nuclear umas contra as outras é bem baixo, apesar de alguns governantes ameaçarem seus vizinhos, o tempo todo. Mesmo que se destrua o inimigo, ninguém quer ser o responsável pela destruição de parte do seu próprio país. Por isso, hoje em dia, as ameaças de usos de armar nucleares não passam de meras ameaças. Isso principalmente porque as atuais armas nucleares modernas têm um poder de destruição absurdamente maior que nos anos 60.

 

Esse cenário faz com que o Nuclear War não faça tanto sentido hoje, nem seja tão engraçado, quanto foi na época do lançamento. Por isso, ele talvez não seja tão atraente para o atual público boardgamer, apesar de ainda valer uma olhada, nem que seja pela importância histórica. Ele já foi bem mais raro, só que em 2015 saiu a edição de aniversário de 50 anos que ainda se encontra, mas com algum esforço.

 

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Imagem BGG: Nuclear War – edição de 50 anos

 

O jogo tem uma característica que atrai um verdadeiro “anátema lúdico”, em termos de jogos modernos que é a eliminação de jogadores. Mas é preciso considerar que alguns jogos modernos também tem essa característica como Coup, King of Tokyo, Zombicide, Bang!, Love Letter, entre outros. Isso leva a crer que o problema não é apenas a eliminação de jogadores per si, mas sim que isso ocorra em jogos muito demorados, porque a pessoa ficará muito tempo sem jogar. Esse não é o caso do Nuclear War, porque normalmente após a eliminação de um jogador, o jogo não prossegue por muito mais tempo.

 

Por isso, o fato de ter eliminação de jogadores não impede seu reconhecimento como um jogo moderno dos anos 60. Isso porque além de ter muita negociação, o jogo exige uma boa leitura de mesa, o que é característico dos board games modernos. Portanto, o Nuclear War não se resume a apenas jogar cartas e girar o ponteiro, pois a interação é fundamental.

 

No Nuclear War só se vence formando alianças temporárias, eventualmente trair essas alianças, conseguir escapar ileso, e repetir todo o processo. Isso para não falar da exploração de um tema que abrange o mundo todo e encontra eco no Pandemic. Essa exploração de acontecimentos em escala global de alcance é ainda mais evidente no Twilight Struggle, que aborda o mesmo cenário da Guerra Fria.  Além disso, a forma como o tema é explorado e muito bem explorado por sinal, tem tudo a ver com os jogos mais esculachados e descontraídos, citados no parágrafo anterior.

 

 

FEUDAL (1967)

 

O Feudal é o Xadrez com esteroides!

 

Feudal é um jogo de 1967, do designer Fred Buestchler, e mais um que segue o estilo da época enão informa os responsáveis pelo design gráfico e artistas. Esse jogo é para 2 a 6 jogadores, com tempo médio de partida de 90 minutos. Seu peso é 2.31, sua posição no ranking geral do BGG é 5.148, e a ficha do jogo no Ludopedia não indica sua posição no ranking do site. As principais mecânicas do jogo são: Movimento em Grade, Captura de Peças, Eliminação de Jogadores, Negociação, Posicionamento Secreto e Preparação Variável.

 

Só de ver o tabuleiro já dá para ter uma ideia de que esse jogo é uma espécie de “Xadrez vitaminado”, a começar pela quantidade de jogadores que chega à meia dúzia. Além disso, o tabuleiro de Xadrez possui invariavelmente 64 casas (8×8). Já o tabuleiro do Feudal possui 4 placas de 12×12, na configuração padrão, o que resulta em absurdos 576 espaços, Mas o tabuleiro do Feudal pode aumentar ainda mais, com adição de mais placas, criando um campo de batalha verdadeiramente épico. No Feudal, o exército de cada jogador também possui mais peças diferentes que o Xadrez.

 

Outra diferença é que o Xadrez é abstrato, e o Feudal tem um cenário, uma história por trás, inclusive com personagens definidos. No jogo, de um lado estão as forças de Elthred, o Grande, e do outro Aelfric, o Bárbaro, e que disputam a zona de fronteira entre os seus respectivos reinos vizinhos. Cada monarca tem o apoio de dois reinos vassalos, e vence eliminando toda a nobreza adversária (Rei, Príncipe e Duque), ou capturando o castelo inimigo. As cores também são diferentes do Xadrez, porque um lado usa três tons de azul e outro três tons de marrom.

 

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Imagem BGG: Feudal – capa da primeira edição

 

O jogo conta com 6 exércitos (três de cada lado) com 14 personagens cada, uma tela divisora e 4 suportes de tela. Essa tela serve para que cada jogador monte a disposição seus exércitos em segredo, depois ela é removida e o jogo começa. Cada exército possui um Rei, um Príncipe, um Duque, um escudeiro, um arqueiro, dois cavaleiros, dois sargentos, quatro piqueiros, e uma peça de castelo.

 

A peça do castelo é dividida entre castelo e entrada (gramado), cada um ocupando um espaço no tabuleiro. Para capturar o castelo e vencer o jogo, é necessário colocar uma peça no gramado, aguardar um turno e no seguinte, entrar no castelo. Por sua vez, um jogador pode defender o castelo colocado uma peça dentro dele, desde que não seja nem um arqueiro, nem um escudeiro.

 

Conforme dito anteriormente, na configuração padrão o tabuleiro possui quatro placas cada uma com uma grade de 12×12 espaços, mas é possível aumentar o tabuleiro muito mais. Uma possibilidade é colocar uma placa para cada um dos 6 exércitos, o que já eleva a quantidade de 576 espaços, ou casas, para 864. Também é possível acrescentar mais uma placa entre as placas de cada exército, para representar a chamada “terra de ninguém”. Isso eleva a quantidade de espaços disponíveis para inacreditáveis 1.296 casas.

 

Uma configuração com mais de 9 placas, caso alguém seja ousado o suficiente não é recomendável. Nesse caso, os exércitos ficariam distantes e espalhados demais, o que postergaria demasiadamente o conflito real, que é a parte legal do jogo. Na maior parte do tempo da partida (que demoraria horas), os exércitos apenas se deslocariam um na direção do outro. Isso para não falar que um tabuleiro com 1.296 espaços possíveis é mais do que suficiente, até para os jogadores mais megalomaníacos.

 

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Imagem BGG: Feudal – tabuleiro e peças

 

Existe outra diferença fundamental entre o tabuleiro de Xadrez e do Feudal, que são ás áreas de diferentes tipos de terreno que barram a movimentação das peças. No Xadrez o tabuleiro é plano e as peças circulam livremente, de acordo com sua movimentação específica. No tabuleiro do Feudal, além dos espaços livres, existem áreas verde escuras (montanhas), e áreas com linhas sinuosas (planícies, ou terrenos acidentados). As peças só podem se movimentar até o espaço anterior a esses terrenos.

 

Como ocorre no Xadrez, cada peça tem regras específicas de movimentação e captura. Na versão de regras da 3M havia diferença entre locomoção apenas para mudar de posição e locomoção para captura. As peças podem apenas se movimentar e o alcance era maior, ou capturar uma peça, mas o seu alcance para fazer isso é menor. Além disso, uma peça pode capturar ou eliminar outra peça com exceção do arqueiro que só pode eliminar as peças e não captura-las. Uma peça eliminada saía do jogo definitivamente, mas uma peça capturada se tornava um prisioneiro, e poderia eventualmente retornar ao jogo, após uma troca.

 

Para ocorrer a troca de prisioneiros um dos jogadores precisava pedir uma trégua, de um turno, e o outro jogado precisava aceitar a trégua. Nesse momento, ambas as partes discutiam a troca de prisioneiros apenas capturados, e ainda vivos. Isso faz muita diferença, porque uma das formas de vencer é eliminar todas as três peças de nobreza do adversário. Por isso, dificilmente alguém apenas capturaria um nobre, mas outras peças serviriam perfeitamente como moeda de troca. Uma vez efetuada a troca de prisioneiros, a partida reiniciava com os prisioneiros trocados começando nos espaços ao redor do castelo.

 

Imagem BGG: Feudal com miniaturas pintadas

 

Em uma variante, para vários jogadores, se toda a nobreza de um reino é eliminada, os demais jogadores ganham todas as peças capturadas desse adversário. Essa é uma proposta interessante, mas que torna tudo muito caótico, porque é preciso lembrar qual peça de cor diferente pertence a qual reino.

 

Originalmente o Feudal saiu pela editora 3M, em 1967. Alguns anos depois, a Avalon Hill comprou a 3M, e relançou o Feudal em 1973, com regras simplificadas, que agilizavam o jogo e diminuíam o tempo de partida. Essas novas regras alteraram principalmente a movimentação das peças e o significado da trégua. No Feudal, os jogadores podem mover todas as suas peças ou apenas uma, em seu turno, mas pelo menos uma peça precisa se mover. Essa é outra diferença para o Xadrez, em que cada jogador move uma única peça de cada vez. Já a captura de peças funciona mais ou menos como Xadrez, ou seja, o atacante se move e toma o espaço da peça capturada.

 

A nova versão das regras da Avalon Hill alterou a dinâmica da trégua, porque ela ficou mais parecida com a proposta de empate do Xadrez. Nas novas regas, se um jogador propuser uma trégua e o outro aceitar, a partida termina empatada. Com isso, a diferença entre capturar ou eliminar a peça inimiga perdeu o sentido, porque deixou de haver a possibilidade de troca de prisioneiros. Assim sendo, as peças eram apenas eliminadas e não mais capturadas. Uma regra muito interessante, mantida nas duas edições envolvia a captura ou eliminação do rei. No Xadrez, se um Rei é atacado e não consegue tomar a peça atacante, bloquear ou fugir do ataque, é xeque-mate e a partida acaba.

 

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Imagem BGG: Feudal – tela para o posicionamento em segredo dos exércitos

 

No Feudal as coisas ocorrem de forma diferente e mais realista, porque nunca se fica sem um Rei no tabuleiro, isso enquanto restar algum nobre. Se o Rei for eliminado, o Príncipe é coroado e passa a ser o Rei. A peça do Príncipe sai do tabuleiro e a do Rei é colocada em seu lugar. Se o Rei for novamente eliminado, dessa vez é o Duque que é coroado, e ocorre a mesma troca com as respectivas peças. Uma terceira eliminação do Rei implica em derrota do jogador, porque acabam os nobres possíveis de se coroar. Um detalhe interessante é o modo como as peças do Príncipe, do Duque e do cavaleiro, se diferenciam entre si, para o jogador saber quem é quem. Todos três estão montados em cavalos, mas o Príncipe empunha uma lança, o Duque um machado e o cavaleiro uma espada.

 

Em ambas as versões, 3M e Avalon Hill, as peças se movimentam até que encontrem um obstáculo (castelo, montanhas ou planícies), parando obrigatoriamente. Peças montadas (Príncipe, Duque e Cavaleiro), não podem subir as montanhas ou planícies, portanto elas precisam contornar os obstáculos. Os personagens a pé (o Rei e todos os demais), podem atravessar as montanhas e planícies, mas não diretamente. Com isso elas param seu movimento em frente ao obstáculo, entram no terreno no turno seguinte, e depois prosseguem seu movimento.

 

Esse detalhe é importante porque a entrada de um castelo poder ser colocada em uma montanha ou planície, reduzindo as peças que poderiam tomar o castelo, entrando pelo gramado. Os arqueiros também não podem atirar através de um obstáculo, mas uma vez em cima dele, libera-se a linha de tiro em todas as direções. Alguns vídeos na internet (em inglês) explicam as regras básicas de captura e movimentação para cada peça.

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Imagem BGG: Feudal – diagrama de movimentação das peças

 

Como o Feudal comporta até 6 jogadores, isso abre um leque maior de possibilidades, além do esquema padrão de um jogador contra o outro. É possível jogar com apenas seis exércitos (ou apenas quatro), cada um por si. Também dá para jogar com três times cada um com dois exércitos, e até com uma configuração ímpar de jogadores. O importante é que cada time tenha apenas uma peça dupla de castelo, mesmo na configuração três exércitos para cada lado. Isso porque a conquista do castelo determina a eliminação daquele time, ou a vitória de um lado, no esquema um time contra o outro.

 

Apesar de ser um jogo lançado quase 60 anos atrás, o Feudal tem muitas caraterísticas dos jogos modernos, algumas delas implementadas com se fossem grandes novidades. Talvez a principal sejam os tabuleiros modulares, porque dá para girar as placas quadradas do Feudal possibilitando quatro posições cada uma. Com isso o tabuleiro padrão tem diversas possibilidades de configuração, que sobem para centenas com 6 placas, e milhares com 9 placas.

 

Também merece destaque a forma como o Feudal explora tanto decisões táticas, quanto estratégicas, como ocorre, por exemplo, no Scythe. Do mesmo modo há grande ênfase na interação entre os jogadores, no sentido de definir estratégias conjuntas, no formato em times, quanto na questão da trégua e troca de prisioneiros no formato um contra um, na versão da 3M. A própria adoção de diferentes formatos de jogo e diferentes configurações de jogadores já é por si só uma característica moderna.

 

No mesmo sentido, chama a atenção que o Feudal utiliza como base um jogo clássico e conhecidíssimo, como o Xadrez, mas apresenta uma reiplementação elegante e inteligente, como ocorreu no Kingdomino, em relação ao dominó. Isso faz do Feudal um jogo moderno décadas antes do lançamento do Catan.

 

 

BAZAAR (1967)

 

O Bazaar é mais uma jóia em formato de board game do lendário Sid Sackson

 

Não bastasse ter criado o Acquire, Sid Sackson também é o designer do jogo Bazaar, um dos abstratos dos bons, lançado em 1967. Infelizmente não há a indicação do designer gráfico do jogo, que é muito colorido, e cuja arte é muito característica dos bazares ficitício dos filmes e contos das 1001 noites.  Esse jogo é para 2 a 6 jogadores, com tempo médio de partida de 45 minutos. Seu peso é 2.03, sua posição no ranking geral do BGG é 2.883, e ele possui a ficha, mas nenhuma posição no ranking do Ludopedia. As principais mecânicas uitilizadas no jogo são: Negociação e Coleção de Conjuntos.

 

Esse jogo fez muito sucesso na época do lançamento, não apenas pela fama do designer, mas também por atender um verdadeiro mantra do Sid Sackson, para criar bons jogos. O Bazaar tem regras simples sem sacrificar a estratégia, suas partidas são rápidas (menos de uma hora) e ele é muito divertido de jogar. Basta dizer que esse foi mais um ótimo jogo lançado pela Estrela com nome diferente (“Troca”) nos anos 70, para fugir ao pagamento dos royalties. No caso da Hasbro que já era uma empresa gigantesca nos anos 70, a Estrela estabelecia parcerias e pagava royalties. Porém, com editoras de jogos mais modestas, como é o caso da Eagle-Gryphon que lançou o Bazaar, a conversa e postura da Estrela era outra.

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Imagem BGG: Bazaar – caixa da versão original da Eagle-Gryphon

 

Em Bazaar os jogadores são negociantes em um mercado do oriente médio, e apesar de não estar explícita a época do jogo, é de se imaginar que ele se passa na Antiguidade ou Idade Média. O jogo tem diversas peças coloridas, cartões contendo fórmulas de trocas dessas peças, cartas de objetivo, um dado com lados coloridos, e cartas de pontuação.

 

As peças coloridas representam gemas preciosas, que o jogador compra ou troca, para cumprir as cartas de objetivo. Os cartões de troca estabelecem as condições em que uma gema pode ser trocada, como por exemplo, uma gema amarela vale uma azul e uma vermelha, e vice versa. As cartas de objetivo mostram a combinação de gemas necessárias para comprá-las, que são sempre cinco. O dado D6 com lados coloridos indica as gemas que o jogador pode comprar na sua vez. O dado inclui uma face coringa, com uma lâmpada, que permite comprar uma peça de qualquer cor. As cartas de pontuação serve como apoio para o jogador calcular quantos pontos fez sempre compra uma carta.

 

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Imagem BGG: versão nacional do Bazaar

 

Na preparação sorteiam-se dois cartões de troca, que representam o bazar, bem com quatro pilhas de cartas de objetivo, cada uma com cinco cartas. No seu turno o jogador tem três ações possíveis. A primeira é rolar o dado e pegar uma peça da mesma cor da face que saiu, ou de qualquer cor, se sair a lâmpada. A segunda é realizar uma única troca, se o jogador tiver gemas suficientes, para atender a uma das possibilidades do cartão de troca.  A terceira é eliminar uma carta de objetivo de uma das quatro pilhas, descartando as gemas correspondentes.

 

Quando um jogador elimina as cartas de objetivo ele marca pontos segundo a tabela das cartas de pontuação. Quanto menos gemas o jogador tiver na mão, após eliminar a carta de objetivo, mais pontos ele marca. Isso faz com que não adiante acumular muitas gemas, porque o excesso delas gera menos pontos.

 

Existem também cartas de objetivo com uma ou duas estrelas no centro das gemas. Essas cartas com estrelas funcionam exatamente igual às cartas de objetivo comuns, mas geram mais pontos quando eliminadas.

 

Algumas cartas contêm apenas uma estrela e nenhuma peça colorida, de modo que não podem ser eliminadas. Porém elas têm o efeito de acrescentar uma estrela a cada uma das demais cartas do topo das outras pilhas de cartas objetivo. Quando as três cartas do topo das outras pilhas são eliminadas cessa o efeito da carta com estrela e ela é eliminada. A partida termina quando duas pilhas de cartas de objetivo terminam, e quem tiver mais pontos é o vencedor.

 

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Imagem BGG: edição especial do Bazaar

 

O jogador não pode ficar com mais de 10 gemas no final de seu turno. O primeiro jogador que primeiro perceber, e declarar esse eventual excesso, pode escolher quais gemas o jogado deverá descartar até retornar ao limite de gemas.

 

O Bazaar é um jogo muito simples, porém, bastante estratégico e muito elegante. Simplesmente e não dá para olhar o jogo, sem lembrar de jogos igualmente abstratos como Azul e Splendor, dois fenômenos dos board games modernos. A estratégia e a leitura dos objetivos dos outros jogadores são fundamentais, o que comprovam a modernidade o Bazaar.

 

 

LENSMAN (1969)

 

O tio-bisavô do Twilight Imperium 4!

 

O Lensman é um wargame com tema espacial de 1969, do designer Philip N. Pritchard, sem indicação do artista ou responsável pelo design gráfico. Ele jogo é para 2 jogadores, com tempo médio de partida de 180 minutos e peso 4.33. As principais mecâncias do jogo são: Controle de Área, Grade Hexagonal e Jogadores com Diferentes Habilidades.

 

Até onde se sabe o Lensman é o primeiro board game a abordar a ficção científica, o que deveria por si só, torná-lo popular. No entanto, ele é um jogo muito obscuro, e bem pouco se sabe a seu respeito. Quase não há material disponível na Internet, nem mesmo no BGG, onde há indicação de peso, mas não posição no ranking geral. Este é outro jogo que não possui ficha no Ludopedia, até o presente momento. Existem apenas duas fichas, mas de suplementos do RPG Gurps, que não fazem referência ao board game Lensman. Esses materiais se referem aos livros e ao universo fictício, que também deram origem ao jogo, escritos por E. E. Smith. Há também um anime, de 1984/1985, baseado nesses livros.

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Imagem do Google: Romances de Lensman Board Game

 

Apesa da escassez de informações é possível apurar algumas características muitos interessantes sobre o jogo. A primeira delas é que ele possui três modos de jogo, para adequar ao grau de experiência dos jogadores. Isso é algo muito moderno e que não se vê nos demais board games dos anos 60. O sistema de combate é muito sofisticado e dispensa dados. Ao invés disso os confrontos se resolvem comparando atributos das naves, ajustados previamente e com o uso de cartas de combate. Isso também difere do padrão da época em que eventuais combates se resolviam com lançamentos de dados. Além disso, ao invés de entrar em combate, quando as naves dos jogadores se encontravam eles poderiam optar por negociar ao invés de se atacarem.

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Imagem do Google: anime Galactic Patrol Lensman, anime dos anos 80 baseado nos livros

 

 

Do mesmo modo a movimentação das naves também não usava dados, mas sim cartas de movimento. Outra inovação é o uso de raças diferentes e com habilidades específicas, que confere ao jogo enorme rejogabilidade. Porém, o Lensman é bem mais do que isso, porque ele também envolve exploração dos diversos planetas, bem como o desenvolvimento da civilização através do uso de recursos. E isso vinte anos antes do Civilization de Tresham.

 

 

Só que essa enorme quantidade de elementos e sofisticação no uso das mecânicas cobrou um preço caro. O jogo ficou complexo e pesado demais para sua época (peso 4.33 no BGG), e até hoje em dia ele seria um jogo para poucos. Isso certamente impactou negativamente na sua comercialização, o que fez com que ele praticamente caísse no esquecimento. Nem mesmo o fato de ter surgido no ano em que o homem pisou na Lua e a temática espacial estava em alta ajudou. Aparentemente os apreciadores de wargame dessa época davam preferência aos jogos retratando batalhas reais e históricas, principalmente da Segunda Guerra Mundial.

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Imagem do BGG: Lensman Board Game

 

Como dito anteriormente o Lensman foi o pioneiro em termos de jogos de tabuleiro abordando a ficção científica e exploração espacial. Assim, de certo forma, é possível dizer que o Lensman é o “tio-bisavô” do Twilight Imperium 4. Esse pioneirismo, bem como o fato do jogo incluir além de combate, a exploração, industrialização e o desenvolvimento de civilização, garantem o seu lugar na lista. Independente de sua obscuridade, o fato do jogo contar com diferentes maneiras de jogar, conforme o grau de dificuldade desejado aproxima muito o Lesman dos jogos modernos.

 

Por fim, essas são alguns dos jogos modernos dos anos 60, no sentido de auxiliar os novos jogadores a conhecerem melhor a história dos boardgamers e a compreender melhor esse hobby maravilhoso.

 

Um forte abraço e boas jogatinas!

 

Iuri Buscácio

 

P.S. Aqueles que porventura tiverem interesse nos outros textos da série, e outros mais, podem encontra-los na seção de jogos de tabuleiro do Maxiverso.com.

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Imagem-Iuri-Buscacio-120x120 18ª Dica p/ Novos Jogadores – BG Modernos Pré-Catan - Anos 60

Iuri Buscácio

Leitor voraz de filosofia, teatro, literatura brasileira e estrangeira, suspense, e de romances históricos, de fantasia e ficção científica, além de ser fã de quadrinhos americanos e europeus, desde os tempos da saudosa Ebal, amante do cinema e das séries, e também um grande entusiasta e pesquisador dos jogos de tabuleiro, tanto clássicos quanto modernos, cuja trilha sonora é o bom samba, a MPB de qualidade, black music e música pop dos anos 70 e 80.

4 thoughts on “18ª Dica p/ Novos Jogadores – BG Modernos Pré-Catan – Anos 60

  1. Sugiro posts sobre jogos especificos que ou fizeram sucesso demais (Terraforming Mars, Gloonhaven, Brass, Projeto Gaia, Scythe, Puerto Rico) ou lideraram o BGG ou ranking Ludopedia seria legal heim

    1. Caro Neville

      Agradeço a sugestão, mas infelizmente ela fica além das minhas parcas capacidades. Existem uma infinidade de jogos que fizeram sucesso demais, então fica inviável escrever sobre cada um, mesmo considerando uma quantidade mínima.

      Além disso, existem centenas de textos sobre tais jogos, em inglês no BGG e em português no Ludopedia, de modo que os meus textos seriam “apenas mais um”. Por isso ao invés disso, eu procuro tratar de assuntos mas gerais em relação aos board games, mesmo quando os textos incluem uma lista de jogos.

      No caso desse texto a ideia era passar para as pessoas que mesmo que a Era dos Board Games Modernos tenha se iniciado em 1995 com o lançamento do Catan, ainda assim, muitas das características ditas “modernas”, já estavam presentes em jogos lançados décadas atrás.

      Já uma lista com os top1 do BGG já é uma coisa mais dentro das minhas possibilidades, e por isso vou pensar com muito carinho a respeito.

      Um forte abraço e boas jogatinas!

      Iuri Buscácio

  2. vou te falar que de todos esses ai so conhecia dois… mas a grande pergunta é? pq Catan fez sucesso e marcou uma epoca e nenhum desses outros ai fez isso, e Catan é bem fraquinho perto de vários jogos ai…?

    1. Caro Magricelinha

      Certamente existem jogos melhores que o Catan, que foram lançados tanto antes, quanto depois. Os três próximos textos, referentes às décadas posteriores aos anos 70, vão deixar isso ainda mais claro.

      Porém, independente de ser melhor ou pior que outros jogos, o que faz o Catan ocupar o lugar de destaque, que ele ocupa, é o fato de nenhum outro jogo ter despertado o interesse por jogos de tabuleiro da mesma forma. As pessoas nunca deixaram de jogar board games. A GenCon, maior convenção de jogos de tabuleiro do mundo acontece desde 1968, em Indianápolis, nos EUA. O Spiel de Jahres (o Oscar dos board games) ocorre initerruptamente desde 1978. A feira de Essen (a mais importante do setor) acontece desde 1983, na Alemanha.

      Então não é que o Catan tenha criado o hábito de jogar jogos de tabuleiro. Mas esse passatempo havia perdido a força, principalmente após o surgimento dos vídeo games, da popularização dos computadores e principalmente depois da Internet. Porém, quando foi lançado o Catan, em 1995, o hobby dos board games ressurgiu com toda a força, tanto na Europa quanto nos EUA. Isso fez com que as empresas voltassem a se interessar em lançar jogos de tabuleiro, e o resultado é essa indústria global que nós vemos hoje, e que cresce a cada dia, inclusive no Brasil.

      Um forte abraço e boas jogatinas!

      Iuri Buscácio

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