Crítica: O Filme da Minha Vida

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o-filme-da-minha_cartaz Crítica: O Filme da Minha VidaO Filme da Minha Vida

Direção: Selton Mello

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Elenco: Johnny Massaro, Selton Mello, Vincent Cassel, Bruna Linzmeyer, Bia Arantes, João Prates, Antonio Scarmeta, Ondina Clais , Martha Nowill e Rolando Boldrin.

“Gosto do início para saber a história e o fim porque sempre é bonito”.  A frase que pontua o começo do belo O Filme da Minha Vida aos poucos vai sendo acrescida pelo fato de somente com a passagem do tempo e as devidas particularidades de cada experiência podemos comprovar que o caminho percorrido normalmente será mais válido e importante que o destino em si.

Em seu terceiro filme como diretor, Selton Mello definitivamente se declara a sétima arte desde que começou um relacionamento sério com o cinema quando dirigiu o belo O Palhaço (2011), transformando esta sua nova obra num exercício atemporal de sensibilidade e existencialismo. Povoado de personagens exalando sentimentos de culpa, resignação, amor, descobertas e amadurecimento vistos em momentos como o primeiro beijo no cinema, as festinhas ao som de vinil , as primeiras paixões e tantas histórias que inerentes às nossas vidas, é notável que o diretor tenha tanta delicadeza – e demonstrando toda a sua capacidade – para contar, por exemplo, uma época não vivida por ele (tanto que o mesmo dedica o filme ao seus pais).

Tornado como ponto de partida o distanciamento da figura paterna, a direção pauta toda a narrativa com um ar nostálgico, de lembranças e do tempo que passa em nossas mãos. Quando conhecemos o jovem Tony (Massaro), ele esta retornando a cidade de Remanso dos anos 60 (depois de concluir os estudo) , mas acaba testemunhando seu pai Nicolas (Cassel) abandonando a família sem qualquer explicação aparente, assim estamos não somente diante de uma obra baseada no livro de Antonio Skármeta (fazendo uma pequena ponta na cena do bordel), mas diante de uma declaração do ator de maneira introspectiva as memórias familiares e ao cinema em si. Um exercício de metalinguagem devido ao fato do filme Rio Vermelho estrelado por John Wayne servir como metáfora para o conflito paterno do protagonista , assim como visto no clássico de 1948 – e quando Paco diz que “não gosta de cinema por perder duas horas da vida no escuro”, soa como um interessante exercício de ironia.

Todas as percepções do filme são pautadas no brilhante trabalho de fotografia a cargo de Walter Carvalho, onde cada plano, cada enquadramento realça um sentimento e o trabalho deste que umas das maiores referências do cinema nacional. E qualquer pessoa que jamais tenha atentado para a qualidade das sua obras, ela se faz presente mesmo que inconsciente, tanto que tal elemento já tinha me chamado a atenção no filme A Máquina (2005) . Lembro-me de quando fui procurar o responsável pelo belo trabalho do filme, lá estava o nome de Walter Carvalho – e assim se repetiu em Central do Brasil, Carandiru, Céu de Sueli e tantos outros. Cobrindo o filme predominantemente com o tom amarelado/sépio remetendo ao antigo, a fotografia puxa o espectador para aquela atmosfera pulsante de conforto e nostalgia, principalmente quando as cenas exaltam as belas paisagens.

Auxiliado pelo igualmente belo trabalho do design de produção, o filme reconstitui de maneira detalhada cada local das cenas, ao ponto de em conjunto com a fotografia formarem planos aconchegante e trabalhando com sincronismo com os elementos naturais (reparem atentamente nas cenas ocorridas internamente, onde a luz do sol entra delicadamente pelas frestas dos cenários, como numa determinada cena ocorrida no bordel ou na própria  na casa do protagonista). E até mesmo nas cenas um pouco forçadas (como o fato de Tony sair na chuva após uma descoberta) a fotografia engrandece os closes como no momento da despedida da cena citada,  onde os rosto dos atores imergem dentre de um clarão como fantasmas presos no passado.

O roteiro do próprio diretor serve com base para exaltar contemplação e beleza. E mesmo que assuma uma pequena dose novelesca em seu terceiro ato, o diretor é suficientemente inteligente em não deixar que tal elemento se torne exagerando ou prejudicial à narrativa que independente do contexto abordado acaba cooptando qualquer fragilidade da história. Narrativa que a direção conduz com delicadeza nos planos e cortes, como na cena de umas das conversas entre Tony e Paco em que a câmera lentamente se aproxima do primeiro e captando suas emoções para aos poucos se afastando de acordo com o diálogo desmotivador de Paco. Ou como na bela sequência em que Tony, andando de bicicleta, traz uma metáfora obviamente simples, mas cheio de importância ao som do clássico “Hier Encore” de Charles Azsnavour (” Brincava de viver, como se brinca de amar e vivia a noite sem contar os meus dias que se esvaíam no tempo”). E claro por servir também como rima visual ao amadurecimento do jovem ao criar o contra ponto quando este usa a motocicleta do pai.

Ademais, outro veículo tem grande simbolismo dentro de um contexto parecido: A locomotiva. Trazendo e levando as pessoas como um indo e vindo na maioria de sagas anônimas, tal conceito é engrandecido pela presença do ator e apresentador Rolando Boldrin – repetindo a lógica de resgatar uma importante figura que o diretor também fez com Moacyr Franco em O Palhaço. Com sua face marcada pelo tempo (ressaltada pelos closes), nada mais simbólico que ele seja visto com o condutor, um guardião do tempo e do conhecimento, trazendo com orgulho as pessoas para “resolverem seus problemas”.o-filme-da-minha_meio Crítica: O Filme da Minha Vida

Com um elenco competente, a bela atuação de Johnny Massaro transita de maneira natural entre o rapaz em processo de amadurecimento diante das revelações e descobertas até o momento em que toma a consciência das decisões que precisa tomar diante do futuro.  Inclusive a cena em que Tony reencontra um importante personagem é emocionante pois vislumbramos no primeiro momento a surpresa para posteriormente sua expressão se mostrar de choro motivado pela saudade, até culminar no momento de perplexidade pelo acontecimento em si e toda a gama de sentimentos que aquela figura traz. Assim, vale ressaltar também a dinâmica entre Tony e Paco ser pontuada em detalhes discretos, pois devido a ausência do pai, a aproximação dos personagens soa natural (reparem quando numa cena Tony passa a mão rapidamente pelos ombros de Paco aumentando a dubiedade da figura do amigo em se tornar paterna).

Apresentando seu personagem sempre de atitudes secas, mas por vezes com tiradas irônicas, Selton Mello transforma seu personagem num homem prático e que mesmo com certa dose de vilania do roteiro, entendemos suas atitudes e atos com relação a historia do filme (nobres ou não). Onde a presença de Vincent Cassel torna-se importante por mostrar um homem passível da condenação do público, mas , assim como Paco, compreendemos seus atos (não que necessariamente concordamos). Claro que as atitudes apresentadas ao fim do filme são dignas de nossos julgamentos, mas jamais podemos simplesmente condená-los sem nos colocarmos em seus lugares e escolhermos entre uma possível desonra, dor e deixar que o tempo cure tudo.

Todavia, Luna (Linzmeyer) surge como uma jovem sonhadora e um dos interesses romântico de Tony, mas soando um pouco gratuito em sua abordagem onírica e sem grandes funcionalidades, assim como a própria presença da personagem Pietra (Arantes), apesar de ser motivadora de um dos segredos da trama, não tem seu arco bem desenvolvido ao ponto de criar tanto impacto no protagonista e suas respectivas mudanças de atitude. Fora que a mixagem do som apresenta alguns problemas (algo que já tinha notado em outras produções nacionais), como o fato de Vincent Cassel falar muito bem o português, é visível que numa determinada sequência há certa falta de sincronismo na fala e atuação (a ponto da câmera fica por vezes, atrás do ator para ocultar tal elemento) ou numa cena entre Paco e Tony dentro do restaurante claramente falta certa harmonia entre a ação e o som. Contudo, mesmo soando com tais elementos sejam um pouco depreendidos e esporádicos não chegam a subjugar o restante da narrativa (como disse anteriormente, devido a  condução da narrativa ser tão segura)

Numa época de mudança em que o rádio dominava a cultura popular e a chegada da TV simbolizava o moderno, O Filme da Minha Vida transforma a estrada desconhecida de memórias a ser trilhado numa nova etapa para aqueles personagens, cujas resoluções talvez fiquem para sempre no anonimato. E assim fico feliz que o cinema brasileiro possa proporcionar tantos sentimentos e emoções sem ficar apelando constantemente para modelos pobres e arcaicos.

Cotação 4/5

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Rodrigo Rodrigues

Eu gosto de Cinema e todas suas vertentes! Mas não aceito que tentem rescrever a história ou acharem que Cinema começou nos anos 2000! De resto ainda tentando descobrir o que estou fazendo aqui!

2 thoughts on “Crítica: O Filme da Minha Vida

  1. Passarela
    Bem vindo
    Sim, podemos dizer. rs
    O ator mora no RJ há alguns anos (ou pelo menos reside também na cidade)
    Abraço

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