Crítica: Shazam!
Diretor: David F. Sandberg
Elenco: Zachary Levi, Asher Angel, Jack Dylan Grazer, Mark Strong, Marta Milans, Cooper Andrews, Djimon Hounsou, Grace Fulton, Faithe Herman, Ian Chen , Jovan Armand , Ava Preston e John Glover.
Nota 3/5
O conceito de super-herói através da história assume diversas interpretações, podendo ser visto tanto como uma crítica à própria mortalidade e fragilidade humana (como visto, por exemplo, através do ponto de vista de Tarantino no diálogo final de Kill Bill 2 sobre o Superman), como também um expurgo e metáfora para superação de personalidades conflitantes, que buscam dentro de si a identidade e solução para seus conflitos – e traumas – do passado através de um alter-ego. Assim, Shazam! do diretor David F. Sandberg traz uma obra divertida, com contornos bem típicos de filmes aventuras (as ditas “sessão da tarde”), que dentro de sua proposta, sem grandes riscos, leve, agradável e até “rasteira” consegue impor uma inspiração clara em Quero ser Grande de Penny Marshall, ao mesmo tempo que trabalha de maneira equilibrada os conflitos de seus personagens dentro de um contexto de super-heróis de maneira bem didática da jornada do escolhido de “coração puro”.
Vivendo entre instituições para menores, Billy (Angel) busca o paradeiro de sua mãe biológica, da qual se perdeu quando criança. Mas ao mesmo tempo em que é adotado pela família Vasquez, o jovem acaba sendo o escolhido para assumir os poderes do mago Shazam e proteger o mundo dos pecados capitais, depois de décadas de candidatos que não cumpriram os requisitos necessários para tal “cargo”! Bem, a trama principal em si não é das mais importantes, pois trata-se sim de um subterfúgio para discutir o dito amadurecimento e as responsabilidades do protagonista – ratificando no caso, o arco padrão dos super-heróis.
Se fôssemos resumir o filme, poderíamos chamá-lo literalmente de “família”; entretanto, o conceito familiar aqui é mais amplo e menos conservador e se torna um grande atrativo do filme por trazer seus personagens como pessoas que têm no abandono algo em comum. Assim, a presença, por exemplo, do casal formado pelo simpático Cooper Andrews e Marta Milan é importante para que seja visto um cenário em que o poder maior daquele local, mesmo não sendo o mais luxuoso, seja o acolhimento, a união, a capacidade de se colocarem no lugar do outro e entender o que eles passam.
O roteiro de Henry Gayden dedica boa parte de seus atos ao autoconhecimento do protagonista em busca de seu passado, e é interessante que resolve posteriormente situações que aparentemente são apresentadas como buracos ou barrigas (como o fato do sumiço materno de Billy ser aparentemente “mal explicado” e ficar relegado boa parte do tempo). Todavia, o desfecho da situação é corajoso o suficiente por não entregar algo previsível e traz uma dureza que engrandece o conflito do personagem. Assim, se o filme aborda o contexto dos jovens, a presença de um elemento em cena que remete, por exemplo, ao Batman – um personagem órfão em sua origem, nos faz associarmos a situação imediatamente ao estado dos personagens. Ajudado por um carismático elenco juvenil, Shazam! traz a diversidade nos jovens, os conflitos de crianças que superam as adversidades diárias como bullying e a própria “invisibilidade” (um “poder” que não desejam ter) dentro da escola, como visto na presença de Jack Dylan Grazer como amigo e confidente do protagonista e a jovem Darla (Herman), com sua doçura em querer sempre demonstrar afeto, mesmo que o mundo ao ser redor não entenda.
Inclusive, ao brincar como outros personagens famosos e apostando em um exercício de metalinguagem, Shazam! não apela para um humor apelativo como visto em Deadpool e as referências a outros personagens soam bem colocadas (inclusive, ao usar a cidade de Filadélfia e as inevitáveis referências a Rocky Balboa, e não uma cidade que remeta a New York, o filme tem um identidade própria). E até mesmo quando o humor se torna previsível, como a cena do carro, ainda assim somos compelidos a torcer pelos protagonistas, algo fundamental para qualquer cena de humor funcionar. Fora que ao querer falar para adultos, as piadas que envolvem a sexualidade são discretas, como o uso de uma boate de Strip Tease (nunca vista por dentro) servir como pano de fundo para um personagem masculino dizer que “não gostou” do que viu e o fato de ter uma cena como uma coxinha de frango me remete (pode ser minha mente adulta e suja) à cena de Killer Joe de William Friedkin.
Pautando as sequências de ação basicamente na descoberta dos tais poderes, o diretor evita a todo custo transformar o longa em algo narrativamente frenético e descabido. Assim a cenas em que Shazam voa pela cidade, ou na perseguição ao vilão, se mostram na medida certa sem problemas na sua mise-en-scéne ou cortes rápidos. Inclusive, a personificação dos setes pecados capitais na figura de demônios é bem realizada, como podemos ver pelo cuidado da produção em trazer figuras distintas em suas aparências, mesmo que o fato de cada uma representar tais elementos não tenha grande importância para a trama; contudo, tais criaturas soam sempre funcionais e fornecem uma cena esteticamente bem trabalhada de terror, como visto durante um ataque onde a fotografia toma uma decisão importante em mostrar a sequência através de um vidro esfumaçado, tornando a conclusão da cena mais impactante do que se mostrasse realmente o que aconteceu (claro que neste caso pesou a questão da censura e do tom abordado no restante do filme).
Quanto ao personagem principal em si, Zachary Levi poderiam facilmente tornar seu Shazam algo incômodo e até deslocado, mas o fato do diretor ter o cuidado em construir a evolução de Billy e sua adaptação aos poderes, que se tornam justamente o grande atrativo de Shazam!, acaba ajudando ainda mais a atuação do ator que mostra carisma ao interpretar uma criança presa em um corpo adulto e com comportamento abobalhado pelo poder em mãos – mas, repetindo, sem soar ofensivo. E as comparações com o filme estrelado por Tom Hanks em 1988 são inevitáveis, até porque em ambos os casos, o processo acelerado em se transformar em adulto geram situações parecidas (sim, tem uma pequena homenagem à famosa cena do piano). Portanto, o uso do humor é algo fundamental para a química entre Billy/Shazam e Freddy e a direção de Sandberg consegue trazer na adaptação aos poderes bons momentos do longa, seja por ser um adolescente em plena era das mídias sociais, onde a discrição é algo quase impensável – e ele faz questão disso! Fora que o bom timming para a comédia acaba realçando outros momentos como aqueles em que Billy se transforma em Shazam! e vice-versa, como a cena na loja, quando usa os poderes pela primeira vez para evitar um assalto (algo que dificilmente dá errado ao apresentar um herói).
E mesmo a caricatura de Mark Strong como vilão típico, ainda assim, mesmo como os clichês possíveis (busca de poder, aparência soturna, etc.) conseguimos enxergar um arco construído pelo personagem como um verdadeiro antagonista do herói por ser uma espécie de “um outro lado de uma mesma moeda”, de alguém que nunca se sentiu em um ambiente familiar. Em seu clímax (evitando spoilers), Shazam! se assume de vez como um filme de super-heróis, mas sem deixar de ser um filme de “família”; e como diria aquela famosa frase “Grandes poderes, trazem grandes responsabilidades” (ops), entendemos que a maior virtude é se manterem juntos onde o coletivo é visto como prioridade.
O longa poderá ser até chamado de inocente ou mesmo infantiloide (não estaria errado), mas é justamente sua sinceridade e ciência de onde quer chegar que é seu mérito. Pode não ser muito ambicioso, e não é, mas sem dúvida funciona.
Rodrigo Rodrigues
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bem legal o filme gostei, concordo com a critica, quem reclama do tom leve e da comedia é um chato
gostei bastante… queria um universo compartilhado igual da Marvel, queria ver a Liga em um filme decente com o Capitao junto, mas desisti disso, melhor aproveitar os filmes solo mesmo e pronto
bom filme, divertido, leve, descompromissado, faz as pessoas rirem, trata com respeito o legado do heroi (dentro do possivel), nao se importa nem pretende ter um peso epico ou ser uma obra prima, atende tudo o que se propoe, eu gostei, achei bem legal
podia botar um alerta de spoilers e um paragrafo analisar as cenas pos creditos pq eu nao entendi nenhuma delas
Geninho
Bem vindo
Eu não costumo comentar cenas pós crédito.No máximo poderia avisar que tem. Enfim…
Até porque , como não faz parte do filme não vejo porque comentar (fora que nem lembro mais como foi a cena rs)
De qualquer maneira obrigado pelo comentário.
Abraço
é só a DC fazer uma comedia e pronto, como ficou igual Marvel, todo mundo passou a gostar
ficou bem legal esse filme, bom ver que todos estao gostando e o ranço geral contra a DC vai passando… que erro que foi deixar o Snyder decidir como seria a DC no cinema heim olha só o prejuizo que tiveram