Crítica: No Ritmo do Coração (CODA)

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No Ritmo do Coração (CODA)

Direção: Sian Heder

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Elenco: Emilia Jones, Marlee Matlin, Troy Kotsur, Daniel Durant, Ferdia Walsh, Amy Forsyth e Eugenio Derbez.

Nota 2/5

A votação para melhor filme do Oscar, ao contrário das outras categorias, tem a particularidade de várias rodadas de votação e o filme que menos divide o público acaba resistindo. Ou seja, é quase certo que esse No Ritmo do Coração tenha estado sempre em último entre os mais cotados, mas sempre avançando nas votações. Assim, quando chegou à última rodada em disputa com filmes que dividem mais os votantes – seja por conservadorismo ou ignorância mesmo – como Ataque dos Cães de Jane Campion ou Licorice Pizza de Paul Thomas Anderson, ele acabou “sobrando” e vencendo.

Somente isso explica a inacreditável vitória no Oscar de “melhor filme”, pois como obra dirigida pela estreante em longas Sian Heder  – e também um remake da comédia francesa La Famille Belier – arrisco-me a dizer que, das últimas dez edições da cerimônia, No Ritmo do Coração tenha sido a que mais me deixou incrédulo (até mesmo mais que Green Book ganhando de Infiltrado na Klan ou Discurso do Rei ganhando de Cisne Negro ou A Rede Social, pois nesses casos era de se esperar a covardia da academia devido aos antecedentes).

O problema da obra não é obviamente sua intenção de trazer uma família de deficientes auditivos em que a caçula Ruby Rossi (Jones, aliás, uma excelente e segura atriz) – a única sem a deficiência – torna-se a porta voz do pai Frank (Kotsur) e irmão Leo Rossi (Durant), pescadores diante das dificuldades do dia a dia em conseguir sustentá-los. O que me estou tentando dizer é que a obra é um amontoado de clichês românticos, familiares e estudantis; que a obra é uma mistura de filme da Disney com uma série musical adolescente, com pitadas de enredos dos anos 80. Absolutamente uma pobreza narrativa!

E não são poucas as razões para isso!

Protagonista com vergonha da família e sofrendo bullying das estudantes mais populares? Tem.

Amiga descolada que só pensa “naquilo”? Tem.

Professor excêntrico e caricato que enxerga potencial na jovem e decide “treiná-la”? Tem (nesse ponto eu ia ter um colapso se ele pedisse para ela encerar carros da esquerda para direita ou pintar cercas de cima para baixo…).

Pais com atitudes decoladas diante dos filhos falando abertamente sobre sexo? (e envergonhando-os) Tem.

Depois das despedidas finais, voltar correndo para o último abraço faltando apenas ser em câmera lenta? Tem.

Ah, tem uma ceninha cantando de costas com o interesse romântico da jovem? Tem.

Protagonista com a família ao redor do computador para saber se ganhou a bolsa de estudos? Tem.

Agora a questão inclusiva do filme que devo mencionar: os atores (no caso, pai, mãe e irmão da protagonista) são adultos não auditivos na vida real. E se Marlee Matlin (vencedora do Oscar de Melhor atriz em 1987 por Filhos do Silêncio) traz uma interessante homenagem com sua presença, os únicos poucos bons momentos do filme são diante da participação do ator Troy Kotsur (cujo prêmio de ator coadjuvante estaria de bom tamanho para o filme). Demonstrando uma doçura e franqueza, o ator é capaz de emocionar durante alguns segundos (ratifico o poucos segundos) com sua incapacidade de ouvir a filha cantar e ainda fazer uma ou duas tiradas mais cômicas com a linguagem de sinais. Mas sinceramente ]e muito pouco.

E isso tudo não seria tão prejudicial se, ainda por cima, a direção de Sian Heder soubesse trazer algum peso para a obra, mas em nenhum momento a diretora consegue apresentar alguma coisa além de um roteiro previsível e inofensivo. Não sendo a toa que no único momento em que tenta de usar alguma lógica narrativa decente é quando a família assiste a jovem cantar, e para nos colocarem no ponto de vista deles, o filme fica sem som. Mesmo assim é tão previsível o desfecho (fácil adivinhar o momento exato que o som iria voltar à cena) que soa quase um exercício inútil quando comparado ao ótimo O Som do Silêncio (2021) que insere de maneira muito mais eficiente o espectador no drama do protagonista, ao ponto de nos causar uma agonia e uma identificação muito maior pelo seu isolamento social crescente.

Outro exemplo da fragilidade da direção é no momento em que Roby aguarda a resposta da faculdade e a cena seguinte já mostra a jovem indo de encontro ao professor para contar. Ora, se a cena foi cortada justamente para criar um suspense é obvio que soaria inútil,  mas de qualquer forma é tão artificial a cena (a personagem fazendo uma expressão inicial de tristeza com a trilha sonora ao fundo) que chegar ser constrangedor. A obra é de uma mediocridade narrativa tão grande que já ia esquecendo: tem clímax numa disputa de talentos onde a protagonista se redime com a família e vice versa ? Tem.

Enfim, No Ritmo do Coração é tão formulaico ao extremo que fica difícil se envolver com a história, e não há um “tapa” no mundo que posso mudar isso agora.

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Rodrigo Rodrigues

Eu gosto de Cinema e todas suas vertentes! Mas não aceito que tentem rescrever a história ou acharem que Cinema começou nos anos 2000! De resto ainda tentando descobrir o que estou fazendo aqui!

16 thoughts on “Crítica: No Ritmo do Coração (CODA)

  1. tem critico ai fazendo uma ginastica danada pra dizer que o filme é bom… e tem outros que realmente acham que esse filmeco é bom… depois reclamam qd os fãs acham ruim que tem critico por ai que nao merece nenhum elogio

  2. como se Ataque dos Cães fosse um filme incrivel maravilhoso e sesacional… ta tudo no mesmo balaio, gente… vcs querem o Ataque dos Cães vencedor mais pelo aspecto relacionado à sexualidade abordada do que pelo filme em si, sejam sinceros… um filme que desagradou meio mundo pq foi rodado na Nova Zelandia dizendo que era Montana, o que a Jane Campion sabe de velho oeste, nem americana ela é, será que o Stevenm Spielberg rodar um filme sobre favelas no Brasil ele vai conseguir retratar a realidade de uma favela??? claro que nao! O Texano que malhou o filme foi homofobico, mas muita coisa ele tem razao: os atores sequer montam em cavalos em um suposto faroeste!

    1. nunca imaginei que fosse concordar com um argumento assim… mas concordo com vc

  3. concordo plenamente com o crítico… achei um absurdo esse filme ganhar um premio importante… é bonitinho, sessão da tarde mesmo, filminho pra ver so se nao tiver nada mais interessante passando…

  4. quem nao entende de cinema assiste e acha maravilhoso, lindo, emocionante, carismatico, bonitinho, lição de vida, bla bla bla… filme ruim, ou no minimo, nao é bom o suficiente pra ganhar um premio

  5. Bom, vou pela opinião da Karina. Apesar de ser um remake de um ótimo drama francês chamado “A Família Bélier”, lançado em 2014, o longa consegue apresentar um diferencial e encantar, com uma história repleta de amor, família e empatia. O filme soa um tanto quanto previsível e segue uma mesma fórmula padrão de drama familiar? Sim. Não está errado, pois aqui o foco não é esperar grandes reviravoltas, cenas muito trabalhadas ou grandes estrelas de Hollywood. “No Ritmo do Coração” aborda o subjetivo, a união, e justamente emociona pela simplicidade e pelas situações do cotidiano. Foi destaque em Sundance e outros festivais. Mereceu.

    1. me lembrou o Pequena Mis Sunshine… tb clichê, mas muito emocionante e legal

    2. Bem vindo Artur.

      Quanto ao filme, merecimento é algo bem relativo na premiação do Oscar. É possível fazer uma lista infindável para isso…
      Quanto ao diferencial, quem disse que esperava reviravoltas ou grande estrelas? Um filme não é somente isso, claro. Mas um conjunto de fatores (direção, atuação, edição, contextos, significados…)
      Ele deve ser analisado pelo que ele é e não o que poderia ou deveria ser.
      E nesse caso , CODA, é um filme medíocre repletos de personagens unidimensionais e estereotipados sem identificação.
      Um roteiro frágil que é um amontoado de clichês datados como citei.

      Como exemplo, compare o filme que citei (O Som do Silencio) e veja diferença. Não estou dizendo que não há drama num filme de adolescente, mas a abordagem não precisa ser tão medíocre.

      Mas se gostou , sem problema. Mas merecedor , por mais injusto que Oscar costuma ser, jamais!
      Abraço

  6. interessante que todo mundo cai de pau no filme mas ele foi la e ganhou oscar, tem algo errado ai nao tem berenice?

    1. Bem vindo Mari
      Como disse no texto: A votação para melhor filme é por rodadas eliminatórias.
      Ele foi ficando até que na ultima rodada ele angariou os votos de quem não tinha votado nos outros finalistas que provavelmente dividiam mais os votante (principalmente se um deles fosse Ataque dos Cães)

      Abraço

    1. Bem vinda Talita
      Realmente não deveria ser surpresa. Mas acho que esse ano foi muito absurdo.
      Abraço

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