Crítica: A Garota do Livro (The Girl in the Book)
A Garota do Livro (The Girl in the Book)
Direção: Marya Cohn
Elenco: Emily VanCamp, Michael Nyqvist, Ali Ahn, David Call, Jordan Lage, Talia Balsam, Michael Cristofer e Ana Mulvoy
Vivendo sob a aura de fantasmas da adolescência, Alice Harvey (VanCamp) tenta levar uma vida normal: trabalho, relacionamentos e rotinas. Entretanto, por jamais conseguir superar certo trauma, todos seus fardos se tornam ainda mais pesados por ter que manter as aparências e comportamento exemplar que a sociedade exige. Uma mulher ainda tratada de maneira subestimada e qualquer tentativa de crescimento profissional é ignorada ou tomada como um pormenor.
Trabalhando como uma assistente editorial, Alice tem seu passado remexido ao reencontrar o escritor Milan Daneker (Nyqvist), que prepara o lançamento de seu próximo livro. Um homem bem mais velho e grande amigo do pai da jovem, mas que no passado da então inocente e suscetível menina, serviu como um ‘tutor intelectual’. Contudo, chegou o momento de confrontá-lo pelos fatos ocorridos no passado, principalmente quando a obra mais famosa de Daneker é relançada – obra esta que faz um paralelo com tais acontecimentos.
O roteiro da própria diretora Marya Cohn consegue construir um cenário incômodo devido a trama principal, como pelo fato de indagarmos realmente os atos da protagonista por diversas vezes. Como em determinado momento, quando toma uma decisão relacionada a um rapaz mais jovem, que não somente soa inconsequente, mas que compromete completamente seus relacionamentos mais próximos.
Cabe, portanto, a pergunta que internamente respondemos baseado na nossa concepção do cenário apresentado: reprovamos (ou não) devidos às circunstâncias ou damos margem para o preconceito? Mesmo que, todavia, sejam situações que poucos suportariam pela complexidade psicológica, sexual e social mas que ainda é tratada com desprendimento por nossa sociedade fálica e misógina. Assim, um grande mérito do filme é não transformar tudo numa ode sentimentalista ou algo forçado para causar um drama excessivo através de seu formato (pois o conteúdo, este sim, deve ser discutido, independentemente de como). A diretora conduz de maneira delicada o longa sem se exaltar na narrativa, deixando o espectador acompanhar a protagonista e seu crescimento como pessoa e as consequências dos fatos.
A montagem, quando exigida, é extremamente fluida e orgânica ao fazer o paralelo da (des) construção da então jovem Alice Harvey em sua versão adulta se aproximando da crise dos 30. Isso podemos ver na cena em que é mostrado um jantar em que os pais da jovem se mostram tão irresponsáveis, indiferentes e consequentemente negligentes aos sentimentos da filha, que cujos comportamentos causaram danos irreversíveis durante anos no estado psicológico da filha. Neste ponto também, a fotografia de Trevor Forrest simboliza de maneira simples e correta o contraste destes mundos quando a as cores quentes predominam em sua fase adolescente para diferenciar da palheta fria da fase adulta de Alice, principalmente quando esta se encontra com os pais.
A atriz Emily VanCamp faz um identificável trabalho ao transmitir uma imagem de uma pessoa determinada, mas ao mesmo tempo frágil pela sua volatilidade psicológica. E também de quem precisa diariamente lutar contra seus demônios para manter próxima as pessoas que ela realmente ama. Assim, Michael Nyqvist transforma seu Milan Daneker num homem de poucas palavras e reações, mas ao mesmo tempo de um caráter deplorável e que possui da sociedade certa benevolência e isenção de culpa pelas suas ações.
Portanto, é desprezível que o feminismo seja tratado atualmente com desdém, onde a culpa é sempre da mulher e esta é desprezada ou chamada de radical quando questiona. Ao demonstrar os seus sentimentos ou atuar em determinadas situações (sendo certo ou não, pois todos nós estamos sujeitos), as mulheres ainda são vistas como vagabundas, sendo que os homens, em contrapartida, são vistos como exemplos de virilidade.
A garota do Livro (The Girl in the book) se apresenta uma obra discreta e sensível em sua abordagem, e ratificando, sem em qualquer momento fortalecer um estereótipo, mas sim analisar um ser humano que sofre, erra e infelizmente tem seus conflitos, seus relacionamentos fugazes apenas para preencher um vazio. Mas que busca aprender, sem soar moralista, com seu erros, e busca novos rumos em sua vida – ratificando , dentro de uma sociedade machista e paternalista
Cotação 3/5
Rodrigo Rodrigues
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