Direção: Denis Villeneuve

Elenco: Timothée Chalamet, Oscar Isaac, Rebecca Ferguson, Jason Momoa, Josh Brolin, Stellan Skarsgård, Zendaya, Sharon Duncan-Brewster, Chang Chen, Stephen McKinley Henderson, David Dastmalchian, Benjamin Clémentine, Golda Rosheuvel, Charlotte Rampling, Dave Bautista e Javier Bardem

Anúncios

Nota 4/5

Tenho problema com a versão do filme de 1984 dirigida, inacreditavelmente, por David Lynch. Demorei muito para conseguir ter forças para assisti-lo além dos seus 15 minutos iniciais, apesar do rico visual que o obra de ficção cientifica apresentava. Aquela narração inicial, feita por uma belíssima Virginia Madsen, servindo com uma maneira de inovar/copiar em relação de Star Wars, fazia a trama soar completamente confusa, afastando o espectador logo de cara; não preciso lembrar, por exemplo, também daquela incômoda luta com escudos visualmente incômodos protagonizada por Patrick Stewart.

(clique aqui para saber mais sobre as versões anteriores de Duna)

Assim, acredito que a complexidade do livro de Frank Herbert (1920-1986) precisava de mais tempo para ser adaptado. E me arrisco a dizer que agora é o momento certo devido aos avanços tecnológicos quase ilimitados que permitam dar vida ao universo criado pelo autor, através das mãos de Denis Villeneuve. Como fã do diretor canadense, acho que a obra não poderia estar em melhores mãos. Villeneuve já demonstrou na sua irrepreensível filmografia que consegue lidar com universos estabelecidos sem descaracterizá-lo, como visto em Blade Runner 2049.

Dito isso, essa nova versão de Duna consegue atender como uma genuína obra de sci-fi por vezes intimista, trazendo elementos visualmente complexos de uma jornada de um herói dentro do contexto político/religioso/histórico. Entretanto, pontuais problemas existem (falta de um roteiro mais enxuto e atos mais definidos, talvez), que podem incomodar no ritmo e no tratamento épico dado pelo diretor, em algo que será completado futuramente em outro(s) capítulo(s); assim esperamos. Caso não aconteça, aí sim, pode ser considerado um grande problema.

Quanto à história, por volta do ano de 10.100 aproximadamente, a humanidade colonizou o espaço e as várias castas de um império interestelar precisam de uma valiosa substância encontrada no desértico planeta Arrakis para tornar possível as viagens espaciais. Planeta esse habitado pelo povo fremen, mas dominado pela Casa Harkonnen, que foi enviada pelo imperador para extrair e controlar o envio da tal substancia, além de controlar os fremen em si. Contudo, os Atreides são incumbidos de substituírem os Harkonnen na tarefa de extração, causando uma disputa entre essas duas castas. Assim, ao mesmo tempo em que o Duque de Atreides (Isaac) procura governar de maneira diplomática, seu jovem herdeiro Paul (Chalamet) traz a responsabilidade de substituir o pai no futuro e lidar com a sina de ser um eventual messias que libertaria os fremen da tirania do império.

Esse contexto, por mais complexo que possa aparentar, traz elementos que nos permitem desnudar aquele mundo dos humanos; e talvez seja esse o aspecto que mais me atrai em uma obra assim (como seria a humanidade daqui a milhares de anos?). O roteiro de Jon Spaihts, Eric Roth e do próprio Villeneuve traz um pouco de excesso de informações e nomes que podem pegar um espectador desatento – com toda razão-, mas ainda acredito que no livro essa situação deve ser bem maior. Mas, depois do primeiro ato, quando os personagens estão mais estabelecidos, acredito que conseguimos adentrar na história sem grandes percalços.

Até porque, trazendo uma clara alusão política (algo que parte dos fãs de ficção costuma ignorar ao dizer que “estragaram sua infância”), Duna também é uma representação de como a humanidade progrediu (ou não) diante de novos mundos e planetas. Se o imperador seria um poderoso líder mundial na realidade, as castas (reinos) seriam os novos colonizadores que invadem países (planetas) em busca de suas riquezas (leia-se: petróleo) para manter seu poder e status quo; não é um exercício difícil substituir tais planetas pelas grandes potências atuais. Uma humanidade que traz elementos de diversas culturas antigas como uma herança, mas ainda toma seus rumos através de guerras (ditas santas), fanatismo e ganância movida a capital.

Visualmente Duna é ostensivo na maior parte do tempo ao criar um mundo com prédios e corredores enormes remetendo às pirâmides e permeando as cenas com elementos retirados de cultura oriental e/ou medieval (seja um elemento em cena, como um guarda sol japonês ou até mesmo uma gaita de fole para apresentar um exército chegando ao planeta) e naves com um curioso aspecto remetendo a insetos, que soam bastante funcionais; apesar de que em que nenhum momento há algum elemento naquele universo que pudessem inspirar tal conceito. Da mesma maneira que transforma o planeta dos Harkonnen numa mistura de cultura maia e seus sacrifícios, entoados por uma espécie de canto gregoriano. Mas claro que de toda essa salada de cultura, a mais explícita é aquela que se refere ao planeta Arrakis como uma espécie de Egito antigo e todo seu contexto religioso, daquele povo “árabe” em busca de seu salvador.

Cabe, portanto, uma pergunta fundamental: Villeneuve conseguiu diferenciar a criatura do criador, uma vez que alguns elementos que inspiraram George Lucas estão aqui? E todos os elementos estão ali mesmo: Um imperador, um herói em dúvida sobre o bem ou mal e ser a salvador, o mentor se sacrificando para salvar vida do protagonista, um poder de manipular mentes… etc.

Bem, talvez seja esse o grande peso que o filme carrega em sua narrativa, ao trazer uma personalidade própria (algo que o filme de Lynch tentou em vão, até porque foi lançado um ano após Retorno de Jedi) como se tentasse diferenciar-se da narrativa-base de Star Wars (devemos lembrar que Duna  foi uma das várias inspirações de George Lucas, e não o contrário). Portanto, ainda é elogiável a concepção do universo de Duna, seu verme gigante caçando embaixo da areia e  mistura de raças traga ações calculadas – para bem ou para os mal – para quem esperava por batalhas espaciais (vide a cena do resgate do deserto).

Mas mesmo assim, se tais elementos são referências ou não, nada poderia funcionar sem que tivéssemos algum apreço pelos personagens. Timothée Chalamet serve bem para transmitir a valentia e hesitação de Paul e seu dilema, assim com Oscar Isaac traz toda segurança e nobreza necessária como líder dos Atreides. Se Jason Momoa e Javier Bardem trazem seus habituais carismas e força, respectivamente, como Duncan e Stilgar, Josh Brolin também serve ao propósito de ser uma espécie de capitão da guarda. Ao ponto de Rebecca Ferguson, como mãe de Paul, ser um porto seguro e guia para o filho em seu autodescobrimento. E se a presença ilustre de Charlotte Rampling fica oculta atrás de véus de sua mística personagem, Stellan Skarsgård – como barão Harkonnen em uma pesada maquiagem para deformar sua aparência e torná-lo ainda mais grotesco -, traz uma interessante pitada de Coronel Kurtz.

Enfim, como episódio inicial, Duna trás um interesse sim, é inevitável para uma produção desse porte. As perguntas foram lançadas, inimigos colocados em lados opostos e um mundo com grande potencial apresentado. Se em outras trilogias grandiosas (como Senhor dos Anéis) a expectativa de cara aumentava para saber o que iria acontecer no próximo filme, em Duna nossa ansiedade parece que precisa ser um pouco mais provocada. Mas ainda existe.

printfriendly-pdf-email-button-notext Crítica: Duna (2021)
The following two tabs change content below.
FB_IMG_1634308426192-120x120 Crítica: Duna (2021)

Rodrigo Rodrigues

Eu gosto de Cinema e todas suas vertentes! Mas não aceito que tentem rescrever a historia ou acharem que cinema começou nos anos 2000. De resto ainda tentando descobrir o que estou fazendo aqui!

30 thoughts on “Crítica: Duna (2021)

  1. grande diretor… bom roteiro… efeitos sensacionais… casting exuberante… material original (livro) espetacular… filme “bom”… o que evidencia a dificuldade de adaptar Duna, ja que a tentativa terrivel do Lynch e a pior ainda do Jodorowski foram malsucedidas… ok a do Lynch tem seu valor, mas envelheceu mal demais, hj parece um filme da Globo Filmes…

  2. claro que o filme é bom, ninguem vai dizer o contrario… mas que foi uma decepçãozinha foi…

  3. gosto do vileneuve mas ele tem um estilo e ritmo que me incomodam pela lentidao… se ele dirigisse 2001 uma odisseia no espaço eu acho que eu dormia na cadeira

  4. Eu gostei, mas como conheço a história, não me senti perdido… Acho que quem não conhece, fica sem entender o começo

    1. Peterson
      Bem vindo;
      Concordo, mas temos um porém: um filme não precisa ser totalmente atrelado ou fiel ao livro (mesmo famoso). Até porque nem todos o leram.
      E se alguém quem não leu o livro , achou confuso então o filme realmente pode ter um problema.
      Obrigado pelo seu comentário

    1. Gilloti
      Bem vindo
      Discordo um pouco. Chamar a filmografia do Villeneuve sem sal e enfadonho é desconhecer, ao meu ver, sua filmografia.
      Filmes com INCENDIOS, OS SUPEITOS, SICARIO e A CHEGADA passam longe disso.
      Obrigado

    2. eu concordo como Gilioti… A Chegada por exemplo nem tem climax, é arrastado e parado, mesmo tendo otimo argumento… Sicário é um bom filme policial, descartável e esquecível… Os Suspeitos é um drama meio forçado… bom, mas nada de mais. Aí tem o Blade Runner 2049 que nossinhora que filminho ruizinho perto do original… e agora Duna, que parece um capitulo do meio de uma serie, nao tem começo e nao tem fim, a gente nao sabe pq ta do jeito que ta qd começa e nao sabe o que acontece qd termina…

  5. sem exageros, pessoal… muitos comentarios detonando o filme, e outros alçando ele à categoria mestra do cinema… nem tao la nem tao ca, é um filme legal, muito bem produzido, mas so anima muito quem nao manja dos paranauês do cinema

  6. uma analise bem tecnica e interessante, profunda na medida certa, meus cumprimentos, qt ao filme, sem sal até o talo, uma pena

  7. toda adaptação acaba tem modificações em relação ao livro o quadrinho original nao tem jeito e levando isso em conta o filme ficou otimo, muito bom mesmo

    1. Correa
      Bem vindo
      Realmente , TODAS as adaptações tem modificações. Cinema é uma linguagem diferente da literatura e tem regras próprias.
      E por varias questões muita coisa não tem como colocar.
      Abraço

    2. vcs dois tem razao, mas vejo que a reclamacao maior do filme nem é algo sobre fidelidade ou nao, é problema de filme mesmo, coisa de cinema, como falta de motivacao de personagens e ausencia de um final e de um climax, o filme ficou em um limbo entre o mediano e o bom, apesar do visual espetacular

  8. como leitor e fã de Duna eu digo que a melhor coisa ja feita sobre a saga foi a série do Sy Fy, mesmo sendo tosca nos efeitos, pois ela é bem fiel e respeita o livro, ja os filmes inclusive esse aqui não são fieis são so pra lucrar mesmo

    1. Bem vindo
      Fidelidade é sempre algo polemico. Pois com não há um obrigação de seguir o material ao pé da letra, sempre causa confusão
      Isso não significa que não deve respeitar o livro, pelo contrário. Mantendo a essência, o resto vem naturalmente.
      Mas se mesmo assim não achou satisfatório, não tem problema. ok?

      Obrigado

    2. mas a boa adaptação é aquela que consegue ser o mais fiel possivel, veja so o Senhor dos Aneis

  9. Sou forçado a discordar. Parece que a crítica se apega muito a detalhes que não deveriam ser importantes. Apesar das inevitáveis comparações a Star Wars, Duna é de natureza diferente. Há um protagonista em amadurecimento, uma jornada de descobrimento pessoal e um império galáctico perigoso, mas aqui as consequências são muito mais reais. Não há heróis. Assim como o livro, uma gigantesca mas recompensadora leitura de 900 páginas, o filme está interessado em questionar cada uma das decisões de personagens e sistemas governamentais presentes. Esta é uma história séria, sem piadas e com temas pesados. Paul pode usar seu posicionamento de lenda para criar um exército e derrotar os Harkonnen, entretanto, revela a Visão, isso desencadeará numa guerra santa e numa jihad em seu nome no futuro. Qual é o caminho certo? Não à toa, o Duna de Villeneuve conta com duas horas e meia de duração e adapta apenas a primeira metade do livro, encerrando exatamente no ponto no qual Herbert finaliza a parte inicial do romance. Essa é uma narrativa de proporções épicas. Aliás, este adjetivo, épico, tão abusado e banalizado, é quase um eufemismo aqui. A escala faz jus ao material base. Melhor visto num IMAX, o longa-metragem filmado nos Emirados Árabes Unidos conta com vistas majestosas, efeitos especiais da mais alta qualidade e um escopo assombroso; ao seu lado, as mais caras produções da Disney parecem brinquedos. Villeneuve sabe a importância do impacto visual ao adaptar Duna, e por meio de naves, criaturas, estruturas gigantes e design de personagens, entrega quadro após quadro de energia cinemática visível.

    1. Bom, sou forçado a discordar de vc kkkkkkk se Duna é sobre questionar cada decisão, então ele falhou miseravelmente pq a gente nunca sabe pq alguém ta fazendo alguma coisa, a não ser depois da batalha e a [spoiler] fuga do Paul. Até agora não entendi o lance das bruxas, pq elas tao fazendo aquilo, pq o Barão Balofo traiu o primo, pq o Poe Dameron topou ir pro deserto…………. Duas horas e meia e eu saí boiando kkkkkkk…… realmente, muito bonito, naves legais, mas ficou nisso. Um filme bonito e ruim.

    2. vejo o Jacobs se esforçando pra valorizar o filme que é sobre um livro que ele pelo jeito adora, porém infelizmente, o filme é só isso mesmo: um espetáculo visual de enormes proporções e quase sem conteúdo, mesmo baseado em um dos livros de maior conteúdo já escrito de FC

  10. parabens pelo texto captou aspectos importantes do filme que nos fazem refletir sobre o que vimos eu gostei dessa parte onde vc cita os paralelos com o mundo real, o oriente medio, etc, ao contrario do cara ai de baixo que achou ruim

    1. Jose
      Bem vindo
      Muito obrigado pelo elogio
      É fundamental que a crítica (boa crítica) traga essa visão a quem ler.
      Se o texto ficar somente no “vi e não gostei” acho falho.

      Abraço

  11. sinceramente, esse lance de homem branco salvador dos povos de cor ou subdesenvolvidos… sera mesmo que o Herbert tinha isso em mente qd escreveu o livro? pq ca entre nos ele realmente nao parece traçar esse tipo de paralelo… ja o lance do petroleo é escancarado

    1. Bruno
      Bem vindo
      Você esta correto em sua visão do homem branco sim , algo que não mencionei inclusive. Isso realmente é um problema crônico !
      Eu não saberia dizer se Herbert tinha isso em mente, acredito que não ! Seria algo a ser pesquisado.
      A questão do petróleo é descarado mesmo rs.

      Muito Obrigado pelo comentário
      Abraço

  12. Fui com muito hype e me dei mal, o filme é chatinho, do nada os aliados viram inimigos e os inimigos viram aliados kkk

    1. Bem vinda Jacqueline
      Sempre que for ver um filme jamais tenha hype.rs
      Por experiência posso dizer que atrapalha mais que ajuda.
      Mas se o filme não agradou, você tem razão de reclamar sim, ok? rs

      Abraço

    1. Bem vindo
      Obrigado pelo elogio. Se tem propaganda Nerd em uma crítica , algo esta errado! rs
      Abraço e mais uma vez obrigado por ler nosso texto.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *