19ª Dica p/ Novos Jogadores – BG Modernos Pré-Catan – Anos 70
Imagem Ludopedia – Dune: a Game of Conquest and Diplomacy
Esse é o décimo nono texto da série (19ª Dica p/ Novos Jogadores – BG Modernos Pré-Catan – Anos 70), que abordará os jogos com elementos modernos, lançados na década de 70, bem antes do Catan. Só para esclarecer, esse introito constou no texto anterior, portanto aqueles que já o tiveram lido podem pular direto para a seção “anos 70”.
Dentro do universo dos jogos de tabuleiro, não há dúvida de que 1995 marcou o início da Era Moderna dos Board Games, com o lançamento do Catan. Por conta disso, falar em jogos modernos anteriores a 1995, inicialmente parece uma heresia, mas não é bem assim. O diferente do que se pode pensar o Catan não criou a noção de jogos modernos. Não é como se jogos não existissem antes dele e depois dele passassem a existir. O grande mérito do Catan, e daí a sua importância, é porque foi ele que causou o “redespertar” do interesse, principalmente das empresas e do público norte-americano, pelos jogos de tabuleiro, como nenhum outro.
Os EUA tem uma grande tradição de jogos de tabuleiro, mas nada no estilo dos jogos euro representados pelo Catan. Quando o jogo surgiu no mercado norte-americano foi um verdadeiro vendaval. Só para recapitular, os jogos de tabuleiro foram uma das principais diversões da família até o final dos anos 70. Nessa época, os computadores já começavam a chamar atenção, inclusive para utilização em residências.
Imagem Ludopedia: Catan o início de uma era
Do mesmo modo, os videogames, em especial o Atari, já começavam a atrair o interesse da molecada. Obviamente essa ainda era uma diversão muito cara. Por isso muita gente continuou a jogar board games nos anos 80, mas cada vez mais eles foram perdendo espaço e relevância. E para quem não tinha videogame em casa, os fliperamas eram paradas obrigatórias. Quem viveu essa época sabe muito bem o fenômeno que isso representou e quanto se gatou de mesada nesses estabelecimentos.
No final dos anos 80, videogame já era uma coisa comum, mesmo no Brasil. Para piorar o cenário, com o início dos anos 90, a Internet passou a ser usada comercialmente em larga escala, e por pessoas comuns, em não apenas acadêmicos. Nesse cenário parecia que jogo de tabuleiro ficaria só na lembrança mesmo. Porém, em 1995 surgiu o Catan e tudo mudou. Não que o jogo seja superior aos outros, porque analisando friamente não é. Mas o que o torna tão importante é que ele apresentava uma proposta lúdica nova (vamos negociar ao invés de resolver no dado), que cativou corações e mentes. Aliás, isso ocorreu nos dois lados do Atlântico, tanto na Europa quanto nos USA. De repente, jogos de tabuleiro não se resumiam mais a apenas rolar o dado, e andar a quantidade de casas correspondente.
Imagem Google: Atari 2600 e Apple II
Isso fez com que o gênio saísse da garrafa, para nunca mais voltar, e diversos outros jogos surgiram com propostas cada vez mais inovadoras. Não havia mais eliminação de jogadores, se ganhava mais por uma melhor gestão de recursos, os jogos coop começaram a ganhar relevância e a competição não era mais a única opção, a preponderância do fator sorte passou a ser um elemento totalmente ultrapassado, e diversas novas mecânicas deram as caras.
Essas, entre outras características, passaram a ser automaticamente vinculadas aos jogos modernos pós-Catan. No entanto, o que nem todos sabem é que diversos jogos, em maior ou menor medida, já apresentavam tais características, ou pelo menos uma delas, décadas antes do surgimento do Catan. Claro que o fato do Catan ter iniciado a Era dos Board Games modernos não admite qualquer discussão. Mas também é preciso considerar que muitos jogos já apresentavam características modernas muito antes do Klaus Teuber lançar sua obra prima.
Desse modo, os próximos textos da série vão destacar board games anteriores ao Catan, mas já com elementos modernos, começando pelos anos 60. No entanto é bom destacar que, por uma questão de espaço serão abordados apenas os aspectos gerais de cada jogo. Por isso, quem se interessar e quiser saber mais por alguns desses jogos, terá de procurar textos mais específicos.
ANOS 70
A década de 70 foi um período marcado por grandes mudanças nos mais variados aspectos. A rebeldia e ideais utópicos da contracultura dos anos 60 atingiram seu auge, e começaram a declinar mais para o meio da década, perdendo popularidade. Os jovens cada vez mais “acordavam do sonho” e se deparavam com a frieza da vida real cotidiana e prosaica. Por isso, o “Peace and Love” virou “Ban the Bomb”, e a rebeldia começou a tomar outros rumos menos pacíficos.
Na questão social e comportamental os anos 70 foram uma época muito hedonista e dada ao exagero. O uso de cocaína e outras drogas era corriqueiro, especialmente nas “discotecas” da moda, onde a calça boca de sino era onipresente. Fumar era mais que um mau hábito, mas quase que uma obrigação social e reafirmação de independência, principalmente para as mulheres. Os casais começaram a se separar com mais frequência, e constituírem novas famílias, o que começou a deixar de ser um tabu. A revolução sexual explodiu com a utilização da pílula anticoncepcional em larga escala, que mudou os hábitos sexuais de toda uma geração. Isso foi especialmente relevante para as mulheres, que passaram a ter maior controle e poder de escolha sobre engravidar ou não. Isso causou um abandono de outros métodos contraceptivos, como o preservativo, o que contribuiu para o surgimento da Aids uma década depois.
Imagem Google: Tony Maneiro e os Embalos de Sábado à Noite
O movimento feminista nos EUA ganhou força com a luta pela emancipação da mulher, com destaque para a Emenda dos Direitos Iguais (Equal Right Amendment) de 1972. Essa emenda procurava garantir a igualdade de direitos entre homens e mulheres, e mesmo tendo pouco impacto prático real, provocou profunda reflexão sobre o tema. No mesmo sentido, o famoso julgamento “Roe vs Wade” legalizou o aborto, marco fundamental para aumentar a autonomia das mulheres em relação a seus corpos. O movimento negro norte-americano também se desenvolveu bastante, como forma de cobrar resultados práticos, das conquistas das lutas pelos direitos civis da década anterior. Nesse aspecto merecem destaque os Panteras Negras e o Congresso pela Igualdade Racial.
Esses dois movimentos (negro e feminista) repercutiram bastante no resto do mundo, na luta pela igualdade de gênero, emancipação feminina e contra o racismo, inclusive no Brasil. Esse período também foi marcado pelo aumento da autoestima da população negra, tanto na música (funk e soul), quanto no cinema (blakxploitation).
Imagem Google: Soul Train
As artes também passaram por mudanças no início dos anos 70. Na música, o mundo viu o fortalecimento e popularização do Rock Progressivo, do Heavy Metal, e da Black Music na primeira metade da década. Na segunda metade surgiu o Movimento Disco, que mesmo de curta duração mudou o cenário da vida noturna e influenciou toda a música pop que veio depois. O programa Soul Train e artistas como James Brown, Stevie Wonder, Earth Wind & Fire, Kool and the Gang, Diana Ross, Marvin Gaye, Aretha Franklin, The Jackson Five e Dona Summer estavam no auge. No Brasil, nomes como Tim Maia, Hyldon e Cassiano faziam a cabeça da juventude negra e, nos bailes, a Furacão 2000, dava seus primeiros passos.
Surgiu na mesma época, o Movimento Punk, do “faça você mesmo” e o Punk-Rock de bandas como Ramones, Sex Pistols e The Clash. No Brasil a MPB de protesto e com forte cunho político ganhavam muita força apesar da fortíssima censura da época. Do mesmo modo, a Tropicália surgiu de forma avassaladora. Nas artes plásticas ganhou força a arte conceitual, que abrangia textos, fotografia, instalações e performances e priorizava os conceitos reflexões e ideias sobre a estética.
Imagem Google: Ramones Seal um símbolo do movimento punk
No cinema europeu surgiram vários filmes de arte do cinema francês, que dividiam espaço com o cinema italiano caracterizado pelas comédias e o western spaghetti. Nos Estados Unidos surgiram filmes Blaxploitation com temas, elencos e equipe de produção predominantemente afro-americanos.
Essa época também se caracterizada pelo lançamento de alguns dos melhores, e mais influentes, filmes da história do cinema. São filmes como “Laranja Mecânica” (1971), “O Poderoso Chefão I” (1971) “O Poderoso Chefão II” (1974), “Taxi Driver” (1976), “Superman” (1978) e Apocalypse Now (1979). O cinema de terror moderno praticamente se iniciou com “O Exorcista” (1973), o “Massacre da Serra Elétrica” (1974), “Tubarão” (1975), “Carrie, a Estranha” (1976), “Halloween” (1978) e “Alien: o Oitavo Passageiro” (1979). Na ficção científica surgiram “Solaris” (1972) do russo Andrei Tarkovski, “Contatos Imediatos do Terceiro Grau” (1977), Battlestar Galatica (1978) e dois dos maiores fenômenos culturais de todos os tempos “Star Wars” (1977) e Star Trek: o Filme (1979).
Do cinema europeu surgiram “Gritos e Sussurros” e o “Discreto Charme da Burguesia” de Buňel (ambos de 1972), “Cenas de um Casamento” de Bergman, “Amacord” de Fellini e “O Último Tango em Paris” de Bertolucci (todos de 1973). Do Japão vieram “Dersu Uzala” de Kurosawa (1975) e “O Império dos Sentidos” de Nagira Oshima (1976).
No Brasil as pornochanchadas de teor erótico iam “de vento em popa”, junto com os primeiros filmes dos Trapalhões. Também foram produzidos filmes mais sérios como “Dona Flor e seus Dois Maridos”, “Como Era Gostoso o Meu Francês”, “Toda Nudez Será Castigada”, “2 Perdidos Numa Noite Suja”, “Chuvas de Verão”, “Lúcio Flávio o Passageiro da Agonia”, “Xica da Silva” e “Bye Bye Brasil”.
Imagem Google: O Poderoso Chefão, um dos melhores filmes de todos os tempos
Na geopolítica, a Guerra Fria migrou da aniquilação do inimigo, para o aumento das respectivas áreas de influência. Em 1975, o mundo assistiu o desfecho da Guerra do Vietnã, no sudeste asiático, com a humilhante derrota dos EUA. No oriente médio ocorreu a Guerra do Yom Kipur entre Israel e Egito, Síria e Iraque. Também ocorreu a Revolução Islâmica no Irã, que transformou um antigo aliado norte-americano em seu arqui-inimigo na região. Na África, antigas colônias portuguesas como Angola e Moçambique declararam independência, em seguida mergulhando em sangrentas guerras civis. Também ocorreram diversos outros conflitos armados como as guerras Uganda-Tanzânia, Líbia-Chade, Zaire-Angola, e a Guerra Civil da Etiópia. Enquanto isso, o Brasil mergulhava no período mais sombrio, arbitrário, violento e repressor dos “anos de chumbo”, da Ditadura Militar. O mesmo se repetiu em maior ou menor grau por toda a América Latina.
Na parte econômica merecem destaque as duas Crises do Petróleo, que fizeram muitos países se voltarem para a energia nuclear. Por isso, cresceram os protestos das entidades civis como o Greenpeace (fundado em 1971), que advogava causas ecológicas e a procura por matrizes energéticas menos poluentes. Do mesmo modo, mesmo as economias desenvolvidas do primeiro mundo começaram a enfrentar o problema da inflação e do crescente desemprego, mais comuns em países em desenvolvimento. O Brasil por sua vez vivia a fase do “milagre econômico” e das “obras faraônicas” (Transamazônica, Ponte Rio-Niterói e Usina de Itaipu).
Dito isso, seguem abaixo os board games com características modernas dessa época, organizados em ordem cronológica, de lançamento. Vale lembrar que existem diversos outros jogos da década de 70, com características que não foram citados por razão de espaço. Entre estes destacam-se Masterpiece (1970), Campaign (1971), The Game of Nations (1973), Le Jeu de L’Energie (1978), Junta (1978), Alaska (1979).
THE GODFATHER GAME (1971)
The Godfather Game, uma oferta que você não pode recusar!
O The Godfather Game é um jogo de 1971, do designer Jody Porter, mas a ficha do jogo no BGG artista indica o artista gráfico. O jogo é para 2 a 4 jogadores, com tempo médio de partida de 90 minutos. Seu peso é 2.33, sua posição no ranking geral do BGG é 18.894, e o jogo ainda não possui ficha no Ludopedia. As principais mecânicas são: Negociação, Cumprimento de Contratos, Controle de Área, Gestão de Mão e Personagens com Diferentes Habilidades.
O filme “O Poderoso Chefão” de Francis Ford Coppola é, sem dúvida, um dos maiores obras de arte do cinema de todos os tempos, que fez e faz muito sucesso até hoje. Com isso, é natural que outras formas de entretenimento, como os jogos, se aproveitem de sucesso para lucrar em cima.
Esse não é a primeira versão do jogo de Eric Lang “The Godfather, o Império Corleone” (2017), mas com certeza foi a sua principal fonte de inspiração. No “The Godfather Game” os jogadores são chefes de famílias mafiosas nova-iorquinas, e o tabuleiro representa a “Grande Maçã”. Além disso, existem Cartas de Propriedade, Cartas de Personagens, Cartas de Favor, Cartas de Contrato e o principal: dinheiro.
O tabuleiro evidentemente é onde as ações se desenrolam, e representa diversos bairros de Nova Iorque. As cartas de propriedade são os locais que os jogadores podem comprar esse locais. Já as Cartas de Personagem representam os personagens do filme, e cada uma tem uma habilidade especial, à disposição do jogador, que possuir a carta. As Cartas de Favor também dão vantagens adicionais. Cartas de Contrato representam os objetivos que quando cumpridos rendem dinheiro para os jogadores. Finalmente, o dinheiro representa o dinheiro mesmo, como não poderia deixar de ser.
Imagem BGG: caixa do jogo em formato de case de violino
As diversas áreas do tabuleiro (os bairros) possuem vários espaços onde os jogadores alocam os capangas de sua família mafiosa. Aquele que tiver mais capangas em um bairro passa a controlá-lo. O jogador não pode mover seus homens após a alocação, por isso é preciso muito planejamento. Nesse aspecto, The Godfather Game se assemelha muito ao Go. Eventualmente dois jogadores vão disputar o controle de um bairro, decidindo através de uma rolagem de dados. O perdedor retira seus capangas e o vencedor mantém ou conquista o controle do bairro. O jogador também pode retirar seus capangas de um espaço, ganhando dinheiro com isso.
A alocação e manutenção dos capangas, em cada bairro, dependem de dinheiro, e a melhor maneira de obter dinheiro é cumprir cartas de contrato. Os jogadores também podem negociar entre si, para que um não entre no bairro do outro, ou ajude a atacar um terceiro jogador. Quando todos os bairros forem reivindicados, a partida termina e o vencedor é quem tiver mais dinheiro e controlar mais bairros.
Entre as características modernas do The Godfather Game um dos destaques vai para a imersão experimentada pelos jogadores. A produção investiu um dinheiro considerável para utilizar o cenário original e personagens do filme, garantindo que os jogadores realmente se sintam no universo da máfia novaiorquina. Também vale destacar a necessidade de planejamento para saber a melhor hora para atacar um oponente e equilibrar suas finanças. O The Godfather Game também apresenta diversas mecânicas, e a negociação é uma parte importante do jogo, que são outras características muito modernas.
CONQUEST (1972)
Conquest, a conquista do mundo antigo!
O Conquest é um jogo originalmente lançado em 1972, e posteriormente em 1974, pelo próprio designer Donald Benge, sem indicação do artista. A primeira versão (1972) previa um total de 2 jogadores, e a segunda versão de 1974 é para 4 jogadores. Apesar dessa alteração na quantidade máxima de jogadores trata-se basicamente do mesmo jogo. O tempo médio de partida das duas versões é de 30 minutos. Seu peso é 2.44, sua posição no ranking geral do BGG é 11.586 (versão de 1972) e 6.874 (versão de 1974). Apesar de possuir ficha no Ludopedia esse jogo não está ranqueado. As principais mecânicas são Movimento Ponto a Ponto, e Pontos de Ação.
Imagem BGG: Conquest (versão de 1972)
O Conquest é um jogo no estilo Xadrez, mas com um tabuleiro em formato de mapa representando tanto os continentes quanto os mares ao redor. Existem ilhas que ligam as enormes porções de terras. Cada uma das versões possui um continente para cada jogador (2 na versão de 1972 e 4 na versão de 1974), onde se localiza a sua capital. Cada jogador possui peças de exército alocadas incialmente ao redor da capital, e peças da marinha alocadas inicialmente na baía também próxima à capital.
A capital se divide em 5 espaços e o objetivo é ocupar cada um desses espaços na capital do adversário, ou capturar todas as peças inimigas. Cada espaço do mapa terrestre está ligado a um único outro espaço, e esse é o caminho que as peças devem seguir. Não é possível passar de um espaço para outro, que não estejam conectados. Por isso não é possível passar de um espaço da capital para o outro. Essa regra não se aplica aos espaços no mar, que têm várias conexões em si, conferindo maior liberdade de movimentação.
Imagem BGG: Mapa da versão de 1972 do Conquest para dois jogadores
Diferentemente do Xadrez, cada jogador pode movimentar diversas peças no seu turno. O primeiro jogador faz 10 movimentos no início do jogo, e em seguida cada jogador faz 20 movimentos na sua vez. Essa redução de movimentos busca equilibrar a vantagem de jogar primeiro. O jogador pode dividir seus 20 movimentos por suas peças da forma como quiser. Porém ele só pode fazer no máximo 2, 6 ou 8 movimentos com a mesma peça por turno, dependendo do tipo de peça movimentada. Cada espaço da capital de um jogador ocupada pelo adversário, reduz a quantidade de movimentos disponíveis, até um mínimo de 8 movimentos.
Os exércitos possuem peças diferentes que são os soldados, elefantes, cavaleiros e carruagens. Os soldados podem se mover 1 ou 2 espaços, e também podem montar, ou desmontar, de elefantes ou carruagens, o que conta como um movimento. Os elefantes fazem até 6 movimentos por turno, e podem levar um ou dois soldados. Os elefantes não podem ser capturados por soldados. Cavaleiros também fazem até 6 movimentos por turno. Carruagens se movimentam até 8 espaços por turno, e carregam um soldado.
A marinha também possui peças diferentes: os navios e os galeões. Os navios se movimentam até 6 espaços e os galeões até 8 espaços no máximo. Eles podem carregar dois soldados ou uma única peça de cavaleiro, elefante ou carruagem, mesmo que essas duas últimas estejam levando soldados. Para que a peça possa embarcar, o navio precisa estar em um dos espaços representando os portos. Uma peça de exército não pode passar por um espaço do mar, nem passar diretamente de um navio para outro.
Imagem BGG: Mapa da versão de 1974 do Conquest para quatro jogadores
A captura de peças ocorre como no Xadrez, onde uma peça ocupa o lugar da outra. A única exceção é o soldado que não pode capturar elefantes, como dito anteriormente. Os navios podem ser capturados por outros navios, e também por peças terrestres, desde que estejam em um porto. Nesse caso a peça de exército simplesmente embarca no navio, que passa a ser uma peça do jogador cuja peça capturou o navio. Se esse navio ancorado possuir uma peça embarcada, ela é eliminada, e a peça atacante toma o seu lugar. No entanto, a captura de uma peça possibilita que um elefante do jogador adversário possa recapturar a peça atacante, logo após a captura inicial.
O Conquest é um jogo um pouco injustiçado, porque ele tem uma importância desproporcional à sua popularidade e fama. No início dos anos 70 os únicos jogos estratégicos existentes eram os wargames, com enorme complexidade e que exigiam muita dedicação para aprender a jogar. Os jogos 18xx que também são muito estratégicos só surgiriam em 1974, dois anos após o lançamento da versão original do Conquest. No outro extremo havia o Risk, que era muito mais simples, porém muito menos estratégico e com grande dependência do fator sorte. Assim sendo, o Conquest surgiu para preencher essa lacuna dos jogadores que gostariam de jogar algo mais estratégico que o Risk, mas não tão complexo quanto os wargames.
Imagem BGG: Grand Conquest (2006) com miniaturas de catapultas, armas de cerco, etc
Apesar disso o jogo fez bastante sucesso, sendo relançado nos anos 80 e 2000, com novos elementos como fortificações e catapultas, e com peças de metal em algumas versões.
Mesmo sendo um jogo ponto-a-ponto, o Conquest ainda possui fortes características modernas, principalmente a versão para 4 jogadores. Para início de conversa o jogo tem aleatoriedade nula, e não utiliza dados, com era muito comum nos jogos dos anos 60/70/80. O sucesso depende exclusivamente da capacidade estratégica dos jogadores e da habilidade de antever as jogadas dos adversários. Ele é profundamente estratégico, e dá ampla variedade de movimentos e táticas para seus jogadores. O jogo também requer muito planejamento, para poder capturar as peças inimigas, sem se expor ao contra-ataque do adversário.
1829 (1974)
1829, o início dos 18xx!
O 1829 é um jogo muito famoso de 1974, criado pelo famoso designer Francis Tresham, sem indicação do artista. O jogo é para 3 a 9 jogadores, com tempo médio de partida de 360 minutos. Seu peso é 3.76, sua posição no ranking geral do BGG é 6.377, e apesar de possuir ficha no Ludopedia esse jogo não está ranqueado. As principais mecânicas são Construção de Rotas e Redes, Mercado de Ações, Especulação de Comodites e Alocação de Peças.
No 1829 os jogadores disputam o controle acionário das companhias ferroviárias e precisam criar novas rotas, promover o desenvolvimento tecnológico ferroviário, bem com gerir as ações das suas companhias. O jogo é muito complexo e também muito imersivo, tanto a ponto de algumas pessoas realmente sentirem que estão trabalhando ao invés de se divertirem. Essa é principal crítica ao 1829 e demais jogos 18xx em geral.
Os componentes principais do 1829 são o tabuleiro, marcadores de trilhos, cartas de ações das companhias, cartas de desenvolvimento de trens e fichas de dinheiro. O tabuleiro é onde a ação ocorre e representa o mapa de algum país e nele são alocados os marcadores de trilhos. O 1829 possui um tabuleiro que difere dos demais jogos 18xx, por não ter o contorno de cada hexágono, apenas alguns e a borda do mapa que também é hexagonal. No meio do mapa existem alguns hexágonos preenchidos e o resto é espaço vazio, mas como os hexágonos precisam se encaixar isso não é problema. Nos jogos 18xx lançados em seguida os mapas mostram o contorno dos hexágonos, mesmo nos espaços não preenchidos, e isso se tornou o padrão.
Imagem BGG: 1829, o início dos jogos 18xx
Os marcadores de trilhos representam a rota das ferrovias, e para poder alocar um hexágono no tabuleiro é preciso que os trilhos encaixem nos trilhos dos hexágonos já alocados. As cartas de ações das companhias representam o controle acionário que cada jogador tem em cada empresa, e quanto mais ações, maior o seu controle. As cartas de desenvolvimento de trens representam as melhorias tecnológicas e na capacidade de transporte de cada trem. Por fim as fichas de dinheiro representam quanto dinheiro cada jogador tem e que deve ficar separado do dinheiro das companhias. Isso é importante, porque quando um jogador assume o controle acionário de uma companhia, ele passa a administrar o dinheiro daquela companhia.
O jogo é dividido em três fases: construção de trilhos, operação das companhias e dos trens, e melhorias das ferrovias. Na primeira fase os jogadores constroem e ampliam as rotas ferroviárias. Já na segunda fase os jogadores operação as empresas e os trens transportando pessoas e bens e auferindo lucros. Por fim, na terceira fase os jogadores aprimoram as ferrovias, implantam novas tecnologias e trens melhores, para tornar as empresas mais lucrativas. Desse modo, o objetivo do jogo é terminar sendo o jogador com mais dinheiro.
Imagem BGG: 1830
Esse board game é muito mais que um jogo de tabuleiro. Ele foi o pontapé inicial para a criação de uma família de jogos, os prestigiadíssimos 18xx. Nesse board game os jogadores fazem o papel de presidentes e gestores de companhias ferroviárias do século XIX, daí o seu nome. É preciso esclarecer que a importância do 1829 é principalmente por ele ser o primeiro jogo 18xx. Isso porque o jogo ainda tinha algumas falhas e fez um sucesso moderado. Em contrapartida, seu sucessor 1830, um sucesso fenomenal de Francis Tresham, é o verdadeiro responsável por tornar os jogos 18xx o que eles são hoje.
Só para esclarecer, os jogos 18xx adotam sempre uma data em que ocorreu um acontecimento ou desenvolvimento significativo das ferrovias em um determinado país/cenário. Com o tempo as datas foram se esgotando e também ocorria de duas datas serem significativas para dois países/cenários. Nesse caso, os jogos 18xx começaram a adotar subtítulos que especificavam onde se passava aquele jogo.
Imagem BGG: Comparativo de Tabuleiros 1829 e 1830
O 1829 bem como os principais jogos da família 18xx são muito conhecidos de modo que nem é preciso se estender muito. Como o jogo é muito famoso, existe muito material a respeito na Internet, inclusive alguns sites especializados em jogos 18xx.
Na questão da modernidade vale destacar, a imersão proporcionada pelo 1829, bem como a profundidade estratégica. O jogo usa algumas mecânicas e o planejamento a curto, médio e longo prazo é fundamental, para obter a vitória. Além disso, o jogo quase não tem aleatoriedade privilegiando muito mais a estratégia e a boa gestão. Outro fator importante é a alta interação direta e a importância da negociação entre os jogadores, que são muito exploradas nos board games atuais. Desse, modo sem sombra de dúvida o 1829 é um jogo moderno, mesmo tendo surgido nos anos 70.
KINGMAKER (1974)
Kingmaker, a luta pela coroa da Bretanha!
O Kingmaker é um jogo de 1974, do designer Andrew McNeil, e contrariando a prática da época, os artistas gráficos são creditados. Eles são Don Greenwod, W Scott Moores, Randall C. Reed, entre outros. O jogo é para 2 a 7 jogadores, com tempo médio de partida de 240 minutos. Seu peso é 3.06, sua posição no ranking geral do BGG é 2.523, e esse é mais um que possui ficha mas não está ranqueado no Ludopedia. As principais mecânicas são Movimento de Área, Votação, Rolagem de Dados, Negociação, Pontos de Ação (porém essa última mecânica envolve apenas a movimentação das peças, diferentemente do seu uso tradicional).
O cenário do Kingmaker é a história medieval inglesa, mais especificamente o período que ficou conhecido como Guerra das Rosas. Nessa época, duas casas reais, disputavam o trono inglês: a Casa de York (Rosa Branca) e a Casa de Lancaster (Rosa Vermelha). Como obviamente não poderia deixar de ser com jogos históricos, há uma real possibilidade de que o resultado altere eventos da história como se conhece. O jogo é belíssimo e os componentes tem uma excelente qualidade em especial o tabuleiro e os marcadores, repletos de símbolos e brasões heráldicos.
Além da versão original da Philmar (1974), existem também outras versões como as da Avalon Hill (1976), Gibson Games (1983)e TM Games (1988). Muitas dessas versões simplificaram o jogo, em relação ao cenário e ambientação, para o público norte americano, que não tem tanto conhecimento da história inglesa. Recentemente (2023), a Gibson Games lançou uma nova edição do jogo, o que é admirável, considerando que esse é um board game dos anos 70.
Imagem BGG: Caixa do Jogo, edição original da Philmar 1974
Os principais componentes são: o tabuleiro, cartas de personagens, eventos e combates, peças de exército, e marcadores de facção. O tabuleiro trás um mapa da Inglaterra medieval, mostrando cidades, regiões, castelos e rotas entre outros elementos. As cartas de personagem representam as figuras históricas da nobreza inglesa, que podem morrer, alterando o curso da história real. As cartas de eventos adicionam aleatoriedade ao jogo, afetando as estratégias dos jogadores. Um exemplo é a carta da praga, que pode eventualmente atacar uma cidade, matando os nobres que lá estavam, e pertenciam a um dos jogadores.
As cartas de combate influenciam o resultado dos combates diretos. As peças de exército representam a força bélica de cada jogador, que sofre alteração por conta da influência política e diplomática. Finalmente os marcadores de facção demonstram se o jogador apoia a casa de York ou Lancaster, bem como as casa nobres sobre o seu controle.
Esse board game se joga em rodadas, e os jogadores recebem cartas de recursos, em cada um delas. Essas cartas podem ser, por exemplo, um personagem nobre, um título de nobreza (para conceder a um vassalo sem título), um cargo governamental (para os nobres com título), mercenários, cidades, navios, e etc. As rodadas são divididas em fases: eventos, recrutamento, movimento, combate e manutenção.
Imagem BGG: Tabuleiro do Kingmaker
Na fase de recrutamento os jogadores convocam suas forças e adicionam personagens aos seus exércitos. Em seguida ocorre a movimentação, em que cada jogador move e organiza suas forças. Na fase de movimentação pode ocorrer de dois nobres de jogadores adversários terminarem no mesmo local do tabuleiro. Isso ocasiona a fase do combate, definida através das cartas de combate, somadas aos modificadores aplicáveis. Por fim, há a fase de manutenção, em que se resolvem as cartas de eventos, formam-se alianças e ocorrem traições.
As rodadas vão se sucedendo até que todos os herdeiros reais, tanto York quanto Lancaster, sejam eliminados, e sobre apenas um último herdeiro. Quando isso ocorre, o jogador que controlar o herdeiro remanescente vence a partida.
Esse foi um jogo que marcou época, principalmente por ter bom grau de complexidade e ser uma alternativa aos wargames tradicionais, dos anos 70. Para começar, o tabuleiro do Kingmaker representa o mapa da Inglaterra, dividido em regiões irregulares, ao invés do tradicional mapa com grade hexagonal. Além disso, o jogo envolve além do conflito direto, um sistema de votações, negociações e traições muito interessante. Um jogador pode ter um exército mais forte, mas perder para outro jogador que tenha uma influência mais forte.
As características modernas do Kingmaker dizem respeito principalmente à imersão e o uso da negociação, diplomacia e estabelecimento de alianças. A interação entre os jogadores é fundamental nesse jogo. Aliás, salta aos olhos a sua profundida estratégica, que faz com que os jogadores tenham de combinar estratégias políticas e militares na mesma medida. Por isso o Kingmaker é um jogo muito equilibrado entre tema e mecânica, e ambas servem uma a outra. Isso resulta em um excelente jogo moderno, mesmo com meio século de idade.
DUNGEON! (1975)
A primeira versão board game do RPG, e ancestral direto dos jogos ameritrash!
Em 1975 surgiu o Dungeon!, um jogo do designer David R. Megarry, com arte de Daniel Gelon, Keith Hill, Richard Hill, James Holloway e muitos outros. O jogo é para 1 a 8 jogadores, com tempo médio de partida de 30 minutos. Seu peso é 1.56, sua posição no ranking geral do BGG é 4.694, e 2.256 no ranking Ludopedia. As principais mecânicas são Movimento de Área, Rolamento de Dados e Poderes Variáveis.
No Dungeon! os jogadores são aventureiros que exploram cavernas, matam monstros e coletam tesouros. Quem conseguir primeiro uma determinada quantidade de tesouros vence. Por isso, esse jogo pode ser considerado o tataravô dos atuais dungeons crawlers. Ele representa a primeira tentativa de fazer uma versão board game do RPG, criado um ano antes. O próprio Gary Gygax, criador do RPG, fez parte da equipe de desenvolvimento desse board game.
Os componentes do Dungeon! são: o tabuleiro, peças de personagens, cartas de monstros, cartas de tesouros, e dados de seis lados. O tabuleiro representa a masmorra que os personagens exploram, com seis níveis de dificuldade crescente, conforme se desce (monstros mais poderosos e maiores tesouros). As peças dos personagens representam os heróis de cada jogador. Já as cartas de monstros são criaturas que os personagens precisam enfrentar. As cartas de tesouros representam aquilo que os personagens ganham ao derrotarem os monstros (sacos de dinheiro, joias e artefatos mágicos). Algumas cartas de monstros na verdade são armadilhas do tipo alçapão, que fazem os heróis descerem mais um nível da masmorra. Os dados servem para determinar se o ataque do jogador matou o monstro, e o que ocorre se o ataque falhar. Por fim, a movimentação não usa dados e cada personagem se move até cinco espaços.
Imagem BGG: Caixa da Edição Original do Dungeon!
Inicialmente o Dungeon! era mais simples, havia apenas quatro classes de heróis, e os monstros não contra-atacavam. As edições posteriores trouxeram novas classes, mais possibilidades e novos elementos. Na versão original os jogadores poderiam escolher entre o elfo, o herói, o super-herói (ambos guerreiros) e o mago. O elfo é o personagem mais fraco em combate, mas descobre passagens secretas mais facilmente, e precisa de apenas 10.000 peças de ouro, para vencer. O herói é melhor de combate e também só vence com apenas 10.000 peças de ouro. O super-herói que não tem “super-poderes”, é melhor em combate, mas precisa de um tesouro maior (20.000 peças de ouro) para ganhar a partida. O mago é o pior dos lutadores, mas tem ao seu dispor magias poderosas que causam mais dano, o que é equilibrado pela necessidade do maior tesouro para a vitória (30.000 peças de ouro).
Por conta dessas características, o elfo e o herói exploram os níveis mais altos e mais fáceis da masmorra (monstros mais fracos e tesouros menores). Por outro lado, o super-herói e o mago enfrentem os níveis mais baixos e mais difíceis (monstros mais fortes e tesouros meais valiosos).
No mapa da edição original do Dungeon! as salas da masmorra eram grandes o suficiente para acomodarem as cartas de monstros, as cartas de tesouro e os peões dos personagens. O jogo funcionava com os jogadores entrando nas salas e atacando os monstros. Se o ataque do jogador fosse bem sucedido o personagem ganhavam o tesouro do monstro. Caso o ataque falhasse, diversas efeitos poderiam ocorrer com o personagem, como recuar, perder tesouros e eventualmente até morrer, mas essa era uma possibilidade pequena. Para o jogador morrer ele deveria rolar 6 em cada um dos dois dados.
Imagem BGG: Dungeon!, Tabuleiro da Edição Original
Quando o personagem morria, o jogador poderia recomeçar com outro personagem, mas no início da masmorra, e sem nenhum dos tesouros obtidos pelo personagem anterior. Após conseguir a quantidade de peças de ouro suficiente, o jogador ainda precisava retornar para o início da masmorra, para vencer.
Uma partida de RPG tradicional precisa de poucos componentes essenciais, ou seja, dois ou três livros e alguns dados poliédricos. Opcionalmente pode-se utilizar um mapa e algumas miniaturas, mas apesar de enriquecer a partida, esses outros recursos não são essenciais. No entanto, a preparação dá um trabalho enorme principalmente para o Mestre ou Dungeon Master. Assim sendo, a proposta do Dungeon! é apresentar um jogo que desse a sensação de uma partida de RPG tradicional, sem que alguém tivesse todo o trabalho de montar a aventura.
Obviamente o formato de board game trás uma série de limitações, especialmente a falta de liberdade de ações. Em um RPG o jogador pode fazer praticamente tudo o que quiser ou, melhor dizendo, tudo o que puder fazer. Em um jogo de tabuleiro as opções de ação são limitadas. Outra diferença marcante diz respeito à questão da cooperação entre jogadores. Nos anos 70, o conceito de jogo cooperativo já existia, antes mesmo do próprio RPG. Isso porque até onde se sabe, o primeiro jogo cooperativo que surgiu foi o Community de 1972. Esse era um jogo inspirado nos ideais hippies de paz e amor, onde os jogadores não competiam, mas cooperavam para construir uma comunidade.
Imagem BGG: Community de 1972
O Community era um jogo muito simples, mas o importante foi a construção do conceito de cooperação nos jogos. Porém, apesar do conceito já existir, ainda demorou muito anos para que ele fosse largamente utilizado nos jogos de tabuleiro, como ocorre atualmente. Por isso, o Dungeon!, mesmo sendo uma simulação de uma partida de RPG, ainda é um jogo competitivo, porque há apenas um vencedor, e essa é outra grande diferença em relação ao RPG.
Quanto à questão da modernidade, o Dungeon! antecipou diversos elementos importantes dos jogos modernos. Inicialmente destaca-se a ideia de aventureiros explorando uma masmorra, que é a base dos modernos dungeons crawlers. Claro que isso ocorria de forma individual, e os dungeons crawlers são cooperativos na sua maioria, mas fora isso o conceito é o mesmo. Outro fator que merece destaque é a preocupação com o cenário e a imersão, que caracteriza boa parte dos jogos modernos. Além disso, o Dungeon!, mesmo sendo da escola americana de jogos, também antecipou métodos para mitigar a eliminação de jogadores. Essa é uma das principais diferenças entre jogos modernos e clássicos. Por fim, o Dungeon! também apresentava um conceito rudimentar de evolução do personagem e o seu fortalecimento, através do uso dos itens mágicos. Portanto esse é mais um jogo moderno da década de 70.
SANDOKAN (1976)
As aventuras do Tigre da Malásia, em formato de board game!
O Sandokan é um jogo um tanto o quanto obscuro, que surgiu em 1976. Na ficha do BGG não há informação sobre o designer ou os artistas, sobre tempo de duração das partidas, nem posição no ranking do site. Do mesmo modo não há ficha do jogo no Ludopedia, pelo menos até a publicação desse texto. Por outro lado o BGG indica que o jogo é para 2 a 6 jogadores e seu peso é 2.00, e as principais mecânicas são Pegue-e-Entregue e Gestão de Mão.
Esse jogo é praticamente desconhecido, e fez parte de uma prática muito comum na década de 70. Nessa época era comum criar jogos baseados em filmes e seriados de televisão, utilizando as fotos da obra original, para ilustrar o jogo. Outro exemplo dessa prática foi o Star Wars: Fuga da Estrela da Morte de 1977. Apesar de praticamente desconhecido atualmente, o jogo Sandokan é um dos ancestrais dos jogos de pirata e combate naval. Isso levou, décadas mais tarde à criação de jogos como Merchand & Marauders, Maracaibo, Jamaica e Dead Men’s Doubblon.
Sandokan é um jogo de piratas, mas diferentemente do padrão, o cenário não é o Caribe, e sim a Malásia e o Sudeste Asiático. Ele se baseou na mini série de TV, que fez muito sucesso na Itália nos anos 70, com Kabir Behdi, estrela do cinema indiano. No entanto, esse personagem, “Sandokan o Tigre da Malásia” é muito mais antigo, surgindo em 1883, nos romances do escritor E. Salgari. No Brasil dos anos 80, algumas locadoras de fitas VHS possuíam os episódios da série divididos em dois filmes para a TV.
Imagem BGG: Sandokan Board Game
Os jogadores precisam navegar explorando o mapa, coletar tesouros, defender seus portos, saquear portos inimigos e atacar os navios dos demais jogadores.
Os componentes do jogo são: um tabuleiro, 24 cartas de Oráculo, 52 cartas Sandokan, 6 navios e diversas peças de tesouro. O tabuleiro representa o mar da Malásia, as diversas ilhas, bem como os portos de cada jogador. As cartas de oráculo são os eventos aleatórios. As cartas de Sandokan se dividem em pretas (movimento) e vermelhas (força de combate). Por fim, as peças do tesouro são diamantes e rubis (5 pontos), esmeraldas e ouro (4 pontos), pérolas (3 pontos) e barris de rum (2 pontos). Quem obtiver 25 pontos de tesouro primeiro, vence a partida.
A navegação é feita através de cartas pretas em posse do jogador. O navio se move a quantidade de espaços correspondente à suas cartas. A navegação termina quando o jogador chega até uma ilha, ao seu porto, a outro navio, ou fica sem pontos de movimento. No próximo turno são compradas novas cartas de movimento, e a navegação continua.
O combate ocorre através da comparação das cartas vermelhas de cada jogador. Cada um seleciona as cartas que pretende usar para atacar e se defender. Vence o jogador cujo somatório das cartas vermelhas for maior. Quando o navio atacante vence, ele ganha todo o tesouro do navio defensor derrotado, que vai para o porto do atacante. Se o navio atacante perde, um dos tesouros do jogador vai direto para a ilha do jogador do navio atacado, que venceu. Depois disso, as cartas vermelhas são descartadas e o jogador precisa visitar novamente a ilha Mompracem, e pegar mais cartas vermelhas. Existem outras Ilhas como Oracle (com cartas de oráculo) e Labuan (com tesouros), que podem ser exploradas e um de seus tesouros conquistados.
Imagem BGG: Sandokan – Tabuleiro e Componentes
O ataque a um porto inimigo também utiliza cartas vermelhas do atacante comparadas à defesa do porto. A defesa inicial é de 3 pontos, porém o jogador dono do porto pode deixar algumas cartas vermelhas para fortalecer as defesas. Se o atacante vencer ele ganha dois tesouros daquele porto e vira uma carta de oráculo. Se o ataque falhar, o atacante deve retornar diretamente ao seu próprio porto, para reparar os estragos no navio.
O jogo Sandokan possui algumas características modernas. Seu sistema de combate não é aleatório, nem utiliza dados, como era o padrão dos jogos, nos anos 70. Cada jogador deve decidir conforme a mão de cartas vermelhas que possui, se vale a pena entrar em combate ou não. Do mesmo modo, ele deve avaliar se os outros jogadores vão atacar seu porto, ou não, e se é necessário fortalecê-lo, enfraquecendo o navio. Por isso o jogo tem camadas estratégicas, muito além do simples rolar-andar-rolar-atacar.
Outro fator interessante, e que não era comum na época de seu lançamento, é que Sandokan possui regras para partidas em equipe. Os jogadores podem se agrupar em duas equipes de três piratas cada uma, ou em três duplas. Nesse caso, a pontuação para a vitória sobre para 50 pontos. Isso propicia a possibilidade de estratégias conjugadas e aumenta a interação entre os jogadores. Também vale destacar a preocupação da produção com a imersão, que é um ponto forte do jogo. Isso, entre outros fatores faz do Sandokan um jogo moderno sem dúvida.
COSMIC ENCOUTER (1977)
O Bisavô do Twilight Imperium!
O Cosmic Encouter é um jogo de 1977 dos designers Bill Eberle, Jack Kittredge, Bill Norton e Peter Olotka. A arte é de John Blanche, Chris Ferguson, Anders Jepsson, entre outros. O jogo é para 2 a 6 jogadores, e o tempo médio de partida é de 90 minutos. Seu peso é 2.37, e sua posição no ranking geral do BGG é 1.398 e 2.084 no ranking Ludopedia. As principais mecânicas são: Negociação, Gestão de Mão, Poderes Variáveis, Formação de Alianças e Tabuleiro Modular. Só a título de esclarecimento, esses dados se referem à primeira edição da Eon Games. Esse esclarecimento é importante, porque o jogo teve diversas expansões e edições, que modificavam a quantidade de jogadores, tempo de partida, introduziam novos elementos, etc.
Esse jogo teve um enorme sucesso no seu lançamento, e inclusive chegou até o Brasil, lançado como Contatos Cósmicos pela Grow em 1983. Cosmic Encouter, Diplomacia e Acquire (Grow lançou como Cartel), provavelmente, foram os primeiros contatos do público brasileiro com jogos mais complexos, e de características modernas.
É sempre bom lembrar que ficção científica era o assunto do momento em meados dos anos 70. A série Star Trek que não fez tanto sucesso no lançamento original (1966-69), passou a ser reprisada nesse período, tornando-se um fenômeno. Outros seriados de sucesso foram Battlestar Galatica lançado em 1978 e Buck Rogers de 1979. No cinema, 1977 foi o ano de lançamento do ícone Star Wars, e 1979 do primeiro filme de Star Trek. Dessa mesma época, também merecem destaque os filmes de ficção científica: Dark Star (1974), Logan’s Run (1976), Contatos Imediatos do Terceiro Grau (1977) e Alien (1979).
Imagem BGG: Cosmic Encouters
O Cosmic Encouters teve diversas expansões e várias edições, cada uma delas acrescentando algo novo. Por isso fica inviável falar de todos os elementos adicionados ao jogo. Mas no geral, esse material extra sempre procurou adicionar novas raças. Outro destaque nesse sentido foi acréscimo de tecnologias, e de um fator econômico que trouxe mais camadas estratégicas ao jogo. Porém, o jogo padrão é composto basicamente por: um tabuleiro, fichas de destino, um maço cartas (encontro, negociação e eventos), um cone de hiperespaço, peças de naves e cartões de raças alienígenas.
O tabuleiro padrão é modular, ou seja, são sete placas hexagonais, que se encaixam. As peças externas são os sistemas planetários e a peça central é a dobra, ou falha no espaço tempo, para onde vão as naves derrotadas. Os sistemas planetários representam as bases de onde saem as naves de cada jogador, e que ele tem de defender quando atacadas. Um detalhe interessante é que além dos planetas, cada sistema “doméstico” também conta com duas luas. Originalmente essas luas eram meramente decorativas, mas em algumas versões elas passam a contar como planetas auxiliares. Algumas versões locais utilizam uma peça central hexagonal e as peças exteriores trapezoidais. Com isso, o tabuleiro total fica quadrado e não levemente redondo como é o padrão.
Imagem BGG: Tabuleiro hexagonal e quadrado de Cosmic Encouters
As fichas de destino são peças coloridas que indicam a cor do jogador, cujo sistema planetário poderá sofrer um ataque. Se a peça comprada for da sua própria cor, o jogador deverá devolvê-la ao monte de compra, pegar outra peça, e repetir o processo até que saia uma peça de cor diferente. As cartas de encontro são as cartas numeradas, utilizadas para atacar, para se defender e para reforçar o ataque ou defesa. As cartas de negociação são as cartas usadas durante um ataque, em que nem o atacante nem o defensor queiram arriscar suas naves. Como o local do ataque é determinado pelas fichas de destino, possivelmente o atacante pode achar que não compensa atacara aquele jogador. Tanto o atacante, quanto o defensor podem convocar aliados (os outros) jogadores para apoiá-lo no ataque ou na defesa.
O sistema de ataque não utiliza sorte, ou rolagem de dados. Ao invés disso, o vencedor é o jogador e aliados que tiverem a maior pontuação, considerando o somatório das cartas de ataque, defesa e reforço, bem como, a quantidade de naves envolvidas. Essa pontuação pode ser modificada pelas cartas de evento, que podem inclusive neutralizar os poderes específicos de cada raça alienígena.
O cone do hiperespaço é o local onde tanto o atacante, quanto o defensor, e seus respectivos aliados colocam suas naves envolvidas no confronto. As peças de naves representam a frota espacial de cada jogador, que atacará os outros sistemas planetários e defenderá o seu próprio. Por fim, a estrela do jogo são os cartões de raças alienígenas, que concedem poderes específicos para cada jogador e estabelecem as estratégias mais adequadas.
Imagem BGG: Encontros Cósmicos – versão brasileira (Grow) do Cosmic Encouters
Esse jogo foi um marco no universo dos board games. Em um primeiro olhar, o jogo parece uma mistura de WAR com Diplomacia. Cada jogador tem sua frota de naves e precisa conquistar planetas de outros jogadores, contando com o apoio de aliados, para atacar e se defender. Porém a grande sacada do Cosmic Encouter é que, diferentemente de WAR e Diplomacia, cada jogador representa uma raça com poderes e habilidades únicas. Isso faz com que cada jogador adote uma abordagem e estratégias diferentes para vencer. Mesmo que um jogador jogue sempre com a mesma raça, ele precisará variar suas estratégias, caso os outros jogadores joguem com outras raças. Desse modo, a quantidade de combinações é enorme, o que concede uma rejogabilidade quase que infinita, em termos práticos.
A edição original, comportava até 4 jogadores e contava com 15 raças diferentes, mas com o lançamento das expansões essa quantidade subiu muito. Com o tempo, o padrão de número máximo de jogadores passou a ser 6. Esse foi o padrão da edição lançada no Brasil pela Grow ( 2 a 6 jogadores 18 raças). Entretanto, algumas edições vão muito além, em termos de variedade de raças. Só para se ter uma noção disso, algumas edições do Cosmic Encouters permitem que o jogador escolha até 50 raças alienígenas diferentes.
Imagem BGG: Cosmic Encounter – versão comemorativa do 42º aniversário
Em termos gerais, o jogo é até simples de certa forma. Cada jogador representa uma raça alienígena, possui uma frota de naves espaciais e precisa conquistar 5 planetas de outros sistemas para vencer. Quando o jogador ataca, ele pode formar uma aliança com outros jogadores, que serão seus aliados. Do mesmo modo, o jogador atacado também pode formar suas próprias alianças para auxiliá-lo na defesa de seus planetas.
O sistema de combate utiliza cartas, que são somadas à quantidade de naves para estabelecer a força de ataque e de defesa. Quem tiver a força maior vence. Se o atacante vencer ele conquista aquele planeta e as naves do defensor são enviadas para um local específico do tabuleiro que é a dobra. Se o ataque falhar, as naves do ataque é que vão para a dobra, e o defensor mantém o domínio de seu planeta. As recompensas dos aliados dependem daquilo que foi acordado quando forjaram a aliança.
Imagem BGG: Cosmic Encounter – Versão Duel
No quesito modernidade a grande inovação do Cosmic Encouter é realmente a grande quantidade raças disponíveis, gerando diversas camadas estratégicas, e uma rejogabilidade incrível. Por isso essa alta possibilidade de personalização e customização, torna cada partida única. Também vale mencionar o sistema de alianças e negociações, que confere ao jogo um alto grau de interação entre os participantes, outra característica moderna. O Cosmic Encouter vai além do mero ataque e defesa. Isso porque também é possível os beligerantes negociarem ao invés de chegarem às “vias de fato”, dependendo das cartas jogadas. Dessa forma abre-se um leque muito maior de opções e camadas estratégias envolvidas.
Outro destaque fica por conta do seu tabuleiro modular. Atualmente, muitas pessoas acham o máximo um jogo moderno ter um tabuleiro composto de placas que podem ser intercambiadas, resultando em um cenário único. Só que nem todas sabem que esse conceito é tão antigo, e já existia em jogos dos anos 70 como o Cosmic Encounter, entre outros.
O Cosmic Encouter fez muito sucesso e influenciou diversos jogos lançados posteriormente, mais notadamente o Twilight Imperium, bem como outros jogos com temática “space opera”. Mas não foi só isso. Essa possibilidade de milhões de combinações também influenciou outro jogo de muito sucesso, que nada tem a ver com o tema espacial. Conforme reconhecido pelo próprio Richard Garfield, os elementos de análise combinatória presentes no Cosmic Encouters foram determinantes para a criação do Magic: The Gathering. Isso por si só já atesta, incontestavelmente, a importância, influência e modernidade do Cosmic Encounter.
DAWN OF THE DEAD (1978)
Dawn of the Dead, o Tataravô do Zombicide!
O Dawn of the Dead (1978) é a versão board game do clássico filme de terror de George Romero. O designer é John H. Butterfiled e arte do próprio John H. Butterfiled e de Redmond A. Simonsen. Ele é para 1 a 4 jogadores, com tempo médio de partida de 90 a 180 minutos. Seu peso é 2.15, sua posição no ranking geral do BGG é 11.420 e ele não tem posição no ranking do Ludopedia. As principais mecânicas são: Pontos de Ação, Grade Quadrada, Rolagem de Dados, Movimento em Grade, Set-Up Variável.
O cenário desse jogo é um apocalipse zumbi, onde um grupo de humanos, tenta cumprir uma missão e coletar recursos e armas para sobreviver, dentro de um shopping infestado de mortos-vivos. Qualquer pessoa, que conheça um pouco sobre board games modernos, dirá, só pela descrição, que o jogo se trata do Zombicide. Portanto, resta claro que, provavelmente, o Dawn of the Dead foi a principal inspiração, para essa franquia de board games tão famosa. Basta lembrar que o Zombicide teve um edição ambientada justamente em um shopping center. Outro jogo de zumbis, influenciado pelo Dawn of the Dead, foi o Last Night on Earth.
Apesar dessa enorme similitude, obviamente, Dawn of the Dead (1978) e Zombicide (2012) são diferentes, principalmente considerando que mais de três décadas separam esses dois jogos. E não é só isso. Desde o final do século XX e nesse início do século XXI, a tecnologia progride geometricamente, em um ritmo alucinante e cada vez mais acelerado. Isso, evidentemente, repercute em todos os aspectos da sociedade humana, principalmente na indústria. Portanto, um jogo feito mais de trinta anos depois de outro, certamente contará com um novo padrão de componentes, bem como melhoramentos nos elementos imateriais.
Imagem BGG: Dawn of the Dead
Acresce também que o Dawn of the Dead foi um jogo lançado originalmente pela editora SPI, que foi a principal concorrente da Avalon Hill em termos e wargames, na sua era de ouro (anos 70/80). Por isso é até natural que essa fórmula de sucesso fosse adotado inclusive nos eventuais jogos da editora, que não fossem propriamente wargames. Esse é o caso do Dawn of the Dead. Desse modo, ao invés de miniaturas de zumbis e de humanos, o jogo utiliza marcadores de papelão, característicos dos wargames. Curiosamente, segundo alguns relatos, era comum na época do lançamento do Dawn of the Dead, que as pessoas jogassem com miniaturas genéricas de zumbis e humanos em cima dos marcadores, para melhorar a experiência do jogo.
Os componentes do jogo são: um tabuleiro, 50 marcadores de zumbis normais, 8 marcadores de zumbis furiosos, 4 marcadores de humanos, 12 marcadores de porta bloqueada, marcadores de armas, e finalmente três dados d6. Como dito anteriormente, a edição inicial do jogo não trazia miniaturas como o Zombicide, mas muitas pessoas utilizavam miniaturas genéricas, dando origem ao conceito.
O tabuleiro representa o mapa do shopping center, e nele cada humano começa em um canto (bastante vulnerável), e precisa encontrar os demais sobreviventes. Marcadores de zumbi representam essas criaturas, que têm parâmetros diferentes (resistência e velocidade) que ficam na face virada e só aparecem após sofrerem ataque. Os marcadores de zumbis furiosos representam criaturas que se tornam mais rápidas e resistentes conforme uma rolagem de dados. Os marcadores dos humanos representam os sobreviventes que também têm parâmetros diferentes (os dois guardas são bem mais “fortes” que os dois civis).
Imagem BGG: Dawn of the Dead – tabuleiro original com marcadores
Os marcadores de armas representam os dois rifles que os humanos precisam encontrar para conseguirem ter uma chance melhor de sobreviver. Os bloqueadores de porta impedem a entrada de novos zumbis dentro do shopping, ou dentro de uma loja ou aposento. Por fim, os dados d6 obviamente servem para as rolagens, que determinam o resultado dos testes no jogo.
O jogo incialmente era para dois jogadores, um com os zumbis e outro com os humanos, seguindo a tradição dos wargames da SPI. Porém, da mesma forma que as pessoas começaram a utilizar miniaturas genéricas, elas também começaram a jogar com mais pessoas, cada uma controlando um sobrevivente. O movimento dos zumbis não é muito complicado, eles se movem na direção dos humanos quando eles entram na linha de visão e não param até morrerem. Por isso, além do esquema dois jogadores, também era comum todos os jogadores controlarem os quatro sobreviventes, contra os zumbis. Também era comum, se houvessem 5 pessoas para jogar, que quatro ficassem com os sobreviventes e o quinto com os zumbis, no estilo um-contra-todos.
Essas adaptações demonstram claramente a influência do Dawn of the Dead sobre o Zombicide. Evidentemente os designers do Zombicide dificilmente reconheceriam essa influência. Isso ocorre da mesma forma que Francis Meyer “jura de pé junto” que nunca tinha ouvido falar em wargames antes de criar os 18xx, e que Sid Meyers “jura de pé junto” que nunca tinha ouvido falar no Civilization Board de Game do Treshan, antes de criar o Side Meyer’s Civilization para o PC. É aquela história, na vida nada se cria, tudo se copia, e com os board games não seria diferente. Mas essa é uma polêmica para outra hora e local.
Imagem BGG: Dawn of the Dead – tabuleiro com miniaturas
Os humanos vencem a partida cumprindo a missão de bloquear todas as quatro entradas do shopping e matarem todos os zumbis restantes lá dentro. Os zumbis vencem se conseguirem infectar, ou matar três humanos, ou apenas dois, se um deles for a mulher.
Uma das características modernas mais marcantes do Dwan of the Dead é a interação entre os jogadores, quando várias pessoas controlam os sobreviventes. Isso torna o jogo cooperativo, que talvez seja aquilo de mais marcante que os board games tenham, em comparação aos jogos de tabuleiro clássicos. Além disso, apesar de ter algum fator sorte, o Dwan of the Dead também abre espaço para alguma estratégia. Ela é fundamental para os humanos vencerem, dada a disparidade entre a quantidade de zumbis e de sobreviventes, compensada pela diferença de características entre eles.
Mas acima de tudo, o Dwan of the Dead é absurdamente imersivo, em relação ao material original, ou seja, o filme de George Romero. O jogo passa exatamente toda a tensão e sensação de se estar dentro do filme, principalmente no início, quando os sobreviventes estão espalhados pelo shopping. Essa preocupação com a imersão é outro elemento muito presente nos jogos modernos, em especial nos dungeon carwlers.
Magic Realm (1979)
Magic Realm, um Épico dos Board Games de Fantasia.
O Magic Realm é um jogo de 1979 do designer Richard Hamblen, com arte do próprio e de George Goebel, Kim Gromoll, Randall C Reed e Chris White. O jogo é para 1 a 16 jogadores, e o tempo médio de partida é de 60 a 240 minutos. Seu peso é 4.55, sua posição no ranking geral do BGG é 1.538 e ele não está ranqueado no Ludopedia. As principais mecânicas são: a Personificação de Papéis, Tabuleiro Modular, Rolagem de Dados, Seleção Simultânea de Ações, Movimento Ponto a Ponto, Set-up Variável.
Esse board game é composto basicamente por: um tabuleiro modular, cartas de ação (movimento, combate e magia), algumas tabelas e uma quantidade enorme de marcadores. O tabuleiro representa o reino de fantasia que os jogadores devem explorar, composto basicamente de clareiras e passagens. As clareiras podem ser normais (floresta), subterrâneas (cavernas) ou elevadas (montanhas) e se interligam por caminhos, pontes, e passagens secretas ou escondidas. Além disso, a característica modular do tabuleiro permite que as partidas sejam customizadas, o que aumenta significativamente a rejogabilidade. As cartas de ação, evidentemente servem para os jogadores realizarem as ações possíveis, e definem o resultado dos combates. Finalmente, os marcadores representam uma infinidade de elementos. Tais elementos vão muito além dos monstros e tesouros, e incluem locais, pessoas e pistas, por exemplo.
O Magic Realm, juntamente com o Dungeon!, foram as primeiras tentativas de transportar o RPG para os jogos de tabuleiro. Curiosamente, nenhum dos dois é totalmente cooperativo, o que é o traço mais distinto e revolucionário do RPG. Apesar da similaridade na ambientação, os dois boardgamers são bem diferentes, o que decorre da diferença entre as duas editoras de cada um.
Imagem BGG: Magic Realm
O Dungeon! era, originalmente, um jogo da TSR, uma editora de jogos de RPG, principalmente o D&D, portanto, trata-se de um jogo bem mais simples. Já o Magic Realm era um jogo da Avalon Hill, a gigante dos wargames, sendo assim, um jogo muito mais complexo. Para se ter uma ideia da diferença de complexidade, basta comparar o peso de cada um: Dungeon! 1.55 e Magic Realm 4.55.
Além disso, o lançamento do Dungeon! ocorreu apenas um ano após o lançamento do RPG, quando nem mesmo essa nova proposta de jogo ainda estava consolidada. Ainda não se sabia exatamente o que era RPG, até onde se poderia ir, em termos de jogo, nem mesmo se ele daria certo. Isso inclusive explica porque o Dungeon! não é cooperativo, mas semi-cooperativo.
A TSR queria inovar, mas não tanto assim, mantendo alguma coisa dos board games tradicionais competitivos, em que há um vencedor. Assim, considerando a novidade que era o RPG, especialmente no aspecto cooperativo, naturalmente a editora não quis arriscar demais ao lançar sua versão board game. Por isso, o Dungeon! acabou sendo uma versão limitada em relação à quantidade de ações que um jogador pode fazer em um RPG. E é aí que entra a Avalon Hill com o seu Magic Realm.
A ideia da Avalon Hill era lançar um board game que emulasse da maneira mais próxima possível uma partida de RPG. Evidentemente isso implica em um jogo muito mais complexo, que possibilite outras ações além de se mover, atacar e explorar. Isso por sua vez implica em uma quantidade muito maior de regras, capaz de abranger outras ações, e especificar ainda mais as ações básicas. Entretanto, isso nunca foi um problema para Avalon Hill, porque sendo uma empresa de wargames, ela estava mais do que acostumada com jogos complexos.
Imagem BGG: Magic Realm – componentes
A dificuldade do Magic Realm inclusive afastou muitas pessoas do jogo, que acharam simplesmente que o jogo não valia a pena todo o trabalho necessário para aprendê-lo. E em alguns aspectos isso faz todo o sentido. Por outro lado, esse alto nível de complexidade também atraiu muitas pessoas. Só para ficar em um exemplo, o sistema de mágica do jogo envolve o tipo de magia e a cor da magia, para usar os feitiços. Evidentemente esses requisitos poderiam ser unificados em um requisito único. Isso descomplicaria o jogo, porém, a utilização de dois requisitos expande as camadas estratégicas e exige muito mais planejamento para jogar com o mago.
A enorme complexidade, e a quantidade de detalhes, das regras torna inviável fazer uma análise mais profunda, especialmente em um artigo que trata de outros jogos complexos também. Todavia dá para dar uma ideia superficial de como o jogo funciona. É sempre bom lembrar que o Magic Realm é de uma época anterior aos “jogos euros”, com folhetos de regras, e uma infinidade de estratégias. Só para efeito de comparação, o livro de regras da primeira edição do Magic Realm tem mais de 200 páginas. O jogo é praticamente um RPG tradicional, mas usando obrigatoriamente um tabuleiro, com cartas ao invés de dados, e com os jogadores competindo entre si.
Então boa parte da complexidade do jogo reside na tentativa de cobrir a maior quantidade possível de situações recorrentes em uma partida de RPG. Assim sendo, normalmente se descreve o Magic Realm como um jogo de exceções, mas com um funcionamento bem menos complexo, em termos gerais. Apenas para exemplificar, boa parte do design e das regras cobrem o intricado sistema de magia. Porém se nenhum dos jogadores for capaz de realizar magias, toda essa parte é ignorada durante a jogatina.
Imagem BGG: Magic Realm – Tabuleiro Normal e Tabuleiro 3D
Apesar de difícil, o jogo possui uma base de fãs muito fiéis, especialmente nos EUA, que realizam convenções, encontros e campeonatos. Nesses eventos, e até na casa dos fãs mais ardorosos, é possível encontrar maquetes, terrenos em 3D, e diversas miniaturas (normalmente de 15mm).
Outro aspecto interessante é que para um jogo com tal nível de complexidade, as partidas não são tão longas, durando em média 2:30 horas. Isso é bem menos que uma partida de Twilight Imperium 4, com mesa cheia. Claro que isso considerando que ninguém será louco o suficiente para jogar Magic Realm com mais de 6 pessoas, mesmo do jogo acomodando até 16 jogadores.
Apesar de competitivo, o jogo permite alguma cooperação entre os jogadores, e cada um deles representam uma classe diferente de aventureiro, tais como guerreiros, magos, ladrões, etc. Além de explorar o tabuleiro matando monstros, os jogadores também podem caçar comida, visitar aldeias para conseguir suprimentos e interagir com personagens do jogo. Uma partida de Magic Realm dura um total de 28 dias, e cada turno é dividido entre dia e noite. A movimentação, o combate e a magia utilizam as cartas de ação, que são descartadas após o uso e repostas no dia seguinte (próximo turno).
Imagem BGG: Magic Realm com miniaturas
O jogo também tem um sistema de evolução de personagens, como todo bom RPG. Antes do início da partida, cada jogador estabelece um nível de evolução, alocando pontos em diversas características. O jogador que alcançar primeiro o nível de desenvolvimento pré-estabelecido (em todos os pontos) é o vencedor.
A alta complexidade do Magic Realm tem um lado bom que é a profunda imersão que o jogo proporciona. E isso mesmo após mais de 40 anos de lançamento, de modo que ele ainda é um dos jogos mais imersivos já feitos até hoje. Outra característica muito moderna é a alta complexidade das regras que propiciam diversas camadas estratégicas. Por isso, ele exige um alto grau de planejamento, na utilização das cartas de açõe,s que são descartas e somente repostas no turno seguinte. Isso dá aquela familiar sensação de “cobertor curto”, em que há muito o que fazer, mas nunca se dispõe da quantidade de cartas (ações) necessárias.
A progressão de personagem é outra característica moderna e muito marcante do jogo, e que é largamente utilizada em jogos atuais como o Gloomhaven. Nesse aspecto, o Magic Realm foi sem dúvida um dos pioneiros, em termos de board game. Por isso, ele é um jogo moderno por excelência.
Dune (1979)
Um das melhores adaptações de uma obra literária para o mundo dos board games!
O Dune é um jogo de 1979, dos designers Bill Eberle, Jack Kittredge, Peter Olotka e com arte de Jean Baker, Linda Bound, Fabrice Lamy, entre outros. O jogo é para 2 a 6 jogadores, com tempo médio de partida de 60 a 180 minutos. Seu peso é 3.44, sua posição no ranking geral do BGG é 435, e do Ludopedia 2.874. As principais mecânicas são: Negociação, Controle de Área, Movimento de Área, Leilão, Gestão de Mão e Personagens com Diferentes Habilidades.
Os criadores do Dune, também são responsáveis por outro jogaço dessa mesma época que foi o Cosmic Encounter. Aliás, há quem diga que o Dune seria quase uma expansão do Cosmic Encounter, ambientada no universo criado por Frank Herbert. Essa afirmação é muito exagerada, porque os dois jogos são bem diferentes, a começar pela quantidade de facções disponíveis, que é muito maior em Cosmic Encouter. Além disso, apesar de toda a sua importância e qualidade, Cosmic Encouter tem um cenário genérico, enquanto Dune é uma adaptação de um universo pré-existente. Por isso, naturalmente a imersão no cenário do jogo é muito mais relevante em Dune, do que em Cosmic Encounter. Todos os dois jogos têm negociação e traição, mas esses elementos não têm a mesma importância em Cosmic Encouter, do que têm em Dune. E por aí vai.
Outor fator importante a considerar quando se fala no jogo Dune, é que ele teve diversas versões lançadas ao longo dos anos. Entretanto, diferentemente de outros jogos do texto, Dune efetivamente chegou aos tempos atuais e não ficou nos anos 70, vivendo apenas através de sua grande influência.
Imagem BGG: Dune 1979
A popularidade do jogo cresceu bastante, principalmente após o lançamento do filme homônimo de 1984, que se tornou um clássico do cinema de ficção científica. Aliás, existe outro jogo chamado Dune, de 1984, mas que é mais baseado no filme do que nos livros, como ocorre no Dune de 1979. O Dune de 1984 é um jogo diferente e não uma re-edição do Dune de 1979 (relançado recentemente), e, por isso, ambos não devem ser confundidos. Também não se deve confundir o Dune (relançado em 2019 e 2021) com o Dune Imperium (2020). Os dois jogos têm a mesma temática, evidentemente, mas são jogos totalmente diferentes, focados em mecânicas diferentes.
Em um jogo complexo, produzido tanto tempo atrás, é natural que algumas modificações e atualizações sejam feitas no design original. Só para ficar em dois exemplos, no jogo original, o mapa era redondo, mas o tabuleiro quadrado. Nas pontas do tabuleiro ficavam locais para por as cartas e a câmara de ressureição. Já o tabuleiro das versões atuais é efetivamente redondo. Do mesmo, a função dos dois discos redondos também foi alterada. Então só para esclarecer, este texto está considerando a versão de 1979 do jogo. Por questões de limitação de espaço, e considerando a complexidade do Dune, as regras serão tratadas superficialmente, apenas para dar uma ideia do seu funcionamento.
O jogo é composto basicamente por um tabuleiro, cartas, biombos dos jogadores, diversos marcadores (exército, líderes, facção, e tempestade) e dois discos de combate. O tabuleiro é um mapa redondo (um formato bem diferente do usual), que representa o planeta Dune. Esse mapa possui diversas áreas irregulares, representando os locais do planeta. Ele também é dividido em 18 setores diferentes, no esquema “gráfico pizza”, e cada um desses setores é por onde “a tempestade” vai passar.
Imagem BGG: Dune 1984
As cartas são de dois tipos: artefatos e spice. Cartas de artefato são recursos usados ao longo do jogo e vão desde armas, eventos e até habilidades, algumas úteis, outras nem tanto. Cartas de spice indicam a quantidade e os locais onde o “spice” é encontrado no tabuleiro. Spice é a substância mais valiosa da galáxia, nos livros e filmes, e as facções lutam para controlar suas fontes, encontradas exclusivamente em Dune. Do mesmo modo, spice é muito importante no jogo, porque representa a moeda corrente.
Os marcadores representam o tamanho do exército de cada um, os líderes que eles estão usando e a que facção o jogador pertence. A quantidade de exércitos, seus locais iniciais e forças de reserva dependem da facção de cada jogador. O marcador de tempestade é muito importante porque determina em que setor a tempestade se encontra. Isso influencia diretamente o andamento do jogo, especialmente o equilíbrio dos exércitos. Para ganhar, no final do turno, o jogador precisa controlar 3 das 5 fortalezas do tabuleiro, ou 4 se estiver em uma aliança.
Cada turno de Dune possui várias fases, a saber: tempestade, alocação de spice, leilão, ressureição, movimentação, combate, coleta de spice e controle. Na fase da tempestade, ela se move para um dos setores. A tempestade começa em um setor determinado e se move conforme o número do marcador que for sorteado, andando no sentido anti-horário. Nos setores pelos quais a tempestade passar e no qual ela para, todos os exércitos desabrigados que estejam ali são destruídos. Eles são removidos do tabuleiro e colocados na câmara de ressuscitação. O mesmo ocorre com os marcadores de spice, qe retornam para a reserva. A tempestade também determina quem será o primeiro jogador do turno, que é aquele ocupando o setor mais próximo de onde ela parou.
Imagem BGG: Dune 1979 – componentes
Na fase de alocação de spice, revela-se a carta de spice do topo do baralho, que indica a quantidade e local onde o spice surge. Se esse local indicado estiver em um setor da tempestade, nenhum spice é alocado. O mesmo ocorre se a carta de spice for um “verme da areia” (Shai-Hulud). É nessa hora que os jogadores podem se unir e formar alianças, que devem durar até essa mesma fase no próximo turno. A fase seguinte é a do leilão, em que são disputadas cartas de artefato, através de lances pagos com spice. Esse leilão ocorre de forma fechada, de modo que o jogador não sabe que carta de artefato está comprando. Na fase de ressureição, os jogadores podem pegar de volta exércitos ou líderes que foram mortos em combate ou destruídos pela tempestade. Cada um tem um custo específico em spice.
Depois vem a fase de movimento, que se divide entre alocação e manobras. Na subfase de alocação, o jogador coloca seus exércitos nos territórios do tabuleiro ou nas fortalezas, pagando um custo em spice. Já na subfase de manobras, os jogadores deslocam seus exércitos para os locais que pretende atacar.
Quando a fase de movimentação termina, começa a fase de combate, entre dois exércitos inimigos ocupando o mesmo local. A exceção é o polo norte (território central do tabuleiro) onde não pode haver combates, mesmo com exércitos inimigos ocupando o local. Do mesmo modo, dois exércitos ocupando o mesmo local não podem combater, se parte do setor de tempestade dividir esse local. Para resolver o combate, cada adversário pega um dos discos de combate e escolhe, secretamente, um número até o total de seus exércitos no local. O jogador então adiciona um marcador de líder que possui uma numeração própria e adiciona cartas de artefato.
Imagem BGG: Dune 2019
Em seguida os discos de combate são revelados simultaneamente para se apurar quem venceu o combate. Primeiro se verifica se o líder escolhido é um traidor, a serviço da facção adversária. Nessa hipótese, a facão que escolheu o traidor é derrotada imediatamente e independente dos outros parâmetros. Caso não haja traidor, verifica-se o efeito das cartas de artefato e respectivas defesas. O líder de uma facção que não conseguir se defender é morto, retirado do combate e posto na câmara de ressureição. Se os líderes se defenderem ou as cartas de artefato não tiverem efeito prático, eles participam do combate. Com isso, cada jogador compara a numeração de seu disco de combate somada à numeração de seu líder. Quem tiver o somatório mais alto vence o combate.
O jogador derrotado perde todos os seus exércitos e o seu líder, que vão para a câmara de ressureição, e descarta suas cartas de artefato. O vencedor mantém o seu líder e suas cartas de artefato, mas perde a quantidade de exércitos correspondente ao número do seu disco de combate. È necessário manter ao menos um exército no local disputado, por isso cada jogador não pode comprometer todas as suas forças em um combate.
Uma vez resolvidos todos os combates, ocorre a fase de coleta de spice. Cada jogador em um local que contenha spice pode coletá-lo, mas apenas dois marcadores de spice, para cada marcador de exército do jogador. Por fim, acontece a fase de controle em que se verifica se algum dos jogadores alcançou a condição de vitória. Para isso é preciso que um único jogador controle 3 das 5 fortalezas, ou mais dependendo do tamanho da aliança em que esteja.
Imagem BGG: Dune 2021
Jogos focados em diplomacia e traição não eram novidade, nem mesmo na época do lançamento de Dune, em 1979. Basta dizer que o Diplomacia já fazia isso vinte anos antes. Porém, apesar de ser a alma do jogo, Dune vai muito além da diplomacia. Isso porque o jogo possui diversos outros elementos que expandem significativamente a experiência proporcionada aos jogadores.
Vale destacar também, que o Dune foi uma das primeiras adaptações, para os board games de uma obra literária e que obteve enorme sucesso. O filme só veio alguns anos depois do jogo. Isso provou que a adaptação de livros de sucesso, e não apenas filmes, era um filão muito interessante a ser explorado pela indústria dos jogos. Isso faz com que Dune seja um jogo muito focado na imersão, que é uma das principais características modernas.
Além disso, sendo um jogo da mesma equipe do Cosmic Encounter, Dune não poderia deixar de ter diversas raças com poderes totalmente diferentes. Isso é bastante temático, porque representa fielmente as diferenças entre as facções da famosa série de livros. Essa diversidade garante a assimetria do jogo, que é outra característica marcante dos modernos bard games. Por isso, o jogo tem uma variada e considerável profundidade estratégica, tornando cada partida única, além de exigir um cuidadoso planejamento. Sem sombra de dúvida, mesmo bastante anterior ao Catan, esse é outro board game moderno, ou, melhor dizendo, com significativas características modernas.
Por fim, essas são alguns dos jogos modernos dos anos 70, no sentido de auxiliar os novos jogadores a conhecerem melhor a história dos board games e a compreender melhor esse hobby maravilhoso.
Um forte abraço e boas jogatinas!
Iuri Buscácio
P.S. Aqueles que porventura tiverem interesse nos outros textos da série, e outros mais, podem encontrá-los em https://maxiverso.com.br/blog/category/nerdgeek/jogostabuleiro/
Iuri Buscácio
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Comprei um Brass Birmingham. Vamos ver se ele é tudo isso mesmo pra ser considerado o melhor jogo do mundo, liderar rankings e etc. Que tal um texto sobre esses jogos considerados “assumidades” como Brass, Terraforming Mars, Terra Mystica, Gaia, Gloohaven, Puerto Rico…?
Caro Taquiometro
Sua pergunta é excelente, porque me permite esclarecer que o Dune e o Dune Imperium são jogos totalmente diferentes, apesar de terem a mesma temática. Eu inclusive já retifiquei o texto para incluir esse esclarecimento.
O Dune é um jogo mais leve (peso 2.68 no BGG), com partidas mais curtas de até 60 minutos em média, e focado principalmente no controle de área. E isso não é de espantar considerando que esse jogo foi criado mais de 40 anos atrás.
Já o Dune Imperium é outra história. Ele é um jogo criado recentemente em 2020, que é consideravelmente mais pesado (peso 3.03 no BGG), com partidas que duram em média 120 minutos (o dobro do Dune), e que utiliza uma quantidade enorme de mecânicas, com destaque para a alocação de jogadores.
Portanto, como se pode ver, os dois jogos são bem diferentes, tendo em comum apenas o cenário. Espero ter esclarecido a sua dúvida.
Um forte abraço e boas jogatinas!
Iuri Buscácio
Nunca consegui terminar uma partida de Duna Imperium com menos de 3h… essas durações encontradas nas caixas muitas vezes não batem rs
Esses Duna ai sao o mesmo com edicoes novas? Esse de 2021 ai é a versao mais recente ou é uma capa nova do Imperium?